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10:32, seg dez 2

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Artigo


Emprego de dispositivos de difusão em filmes finos por gradiente de concentração (DGT) preparados com agarose, um hidrogel ambientalmente amigável, na avaliação da labilidade de cádmio, cobre e cromo em águas naturais
Use of diffusive gradients in thin films (DGT) devices prepared with agarose, an environmentally friendly hydrogel, in the evaluation of the lability of cadmium, copper and chromium in natural water

Karine Andréa Costa; Bruna de Fátima Pereira Schmite; Renata Martins da Silva; Vanessa Egéa dos Anjos*

Departamento de Química, Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), 84030-900 Ponta Grossa - PR, Brasil

Recebido: 28/03/2024
Aceito: 18/07/2024
Publicado online: 13/09/2024

Endereço para correspondência

*e-mail: veanjos@uepg.br; vanessaegea.quim@gmail.com

RESUMO

Diffusive gradients in thin film (DGT) is an attractive method for dynamic studies of metal speciation. Conventional DGT devices consists of diffusion and binding layers that utilize a polyacrylamide hydrogel, a synthetic polymer considered toxic, for the determination of labile metals. In this work, a simple method for the preparation of DGT devices using environmentally friendly and sustainable materials was proposed. Consequently, the polyacrylamide hydrogel was replaced with agarose, a low-cost and non-toxic biopolymer. The modified DGT was employed to determine the labile concentrations of Cd, Cu and CrIII in natural waters. The diffusion coefficients (D) for agarose were determined with a diffusion cell. The obtained values of D ranged from 2.05 to 4.53 × 10-5 cm2 s-1. The relationships between diffusion mass and time were linear for all trace metals. The binding layer with Chelex-100® and agarose was evaluated in retention and extraction of metals. The elution factors were within the range of 0.775 and 0.86 for Cd, Cu and CrIII. The proposed device was evaluated through recovery tests. Recoveries were greater than 80%. DGT devices were deployed in the determination of labile metals in river water from Cará-Cará River (Paraná, Brazil). The concentration of labile species in Cará-Cará sample proceeded as follows: Cd > Cu ≥ CrIII. The results suggest that DGT devices with agarose can be effectively used for speciation analysis.

Palavras-chave: trace metal; chemical speciation; DGT; agarose hydrogel.

INTRODUÇÃO

A sustentabilidade está diretamente relacionada com o gerenciamento e qualidade dos recursos hídricos. A água é indispensável para os seres vivos, e desempenha papel fundamental em questões sociais e econômicas.1,2 A qualidade das águas superficiais depende de vários fatores, dentre eles o aporte e comportamento de espécies químicas oriundas dos processos naturais e das atividades antrópicas.3

Metais traço são contaminantes ambientais e podem apresentar ameaças à qualidade ambiental e a saúde humana devido as suas propriedades, tais como não degradabilidade, toxicidade, capacidade de bioacumulação, etc.4,5 Por exemplo, o cobre é um elemento essencial para os organismos vivos, porém apresenta toxicidade em elevadas concentrações e formas químicas. Com relação ao cádmio, é um elemento normalmente encontrado em baixas concentrações no ambiente, porém é considerado carcinogênico. O cromo pode ser encontrado em dois estados de oxidação nos ambientes aquáticos. A forma hexavalente é considerada carcinogênica e mais tóxica. A forma trivalente atua como nutriente essencial dependendo da concentração, responsável pelo metabolismo de lipídios, carboidratos e proteínas. Assim, os estudos ambientais relacionados com os metais traço envolvem estudar os fatores que influenciam a toxicidade e biodisponibilidade. Portanto, é essencial avaliar a especiação química, pois é bem estabelecido que o comportamento biogeoquímico, mobilidade, toxicidade, biodisponibilidade dependem criticamente das formas e espécies químicas dessas substâncias.6,7

Especiação química pode ser definida como a determinação da concentração de várias formas e espécies de um elemento em uma matriz. Estas espécies, em conjunto, constituem a concentração total do elemento na matriz.8 A concentração total de espécies metálicas geralmente é utilizada como parâmetro de qualidade de água em programas de monitoramento ambiental e legislações ambientais. Contudo, a concentração total não é um indicador de biodisponibilidade e efeitos tóxicos. É reconhecida a importância de avaliar a labilidade dos metais traço, pois está ligada a resposta biológica dos organismos frente aos metais traço. A fração lábil refere-se a íons livres hidratados e os complexos cineticamente reversíveis dependendo da técnica de análise utilizada.6,9

Vários métodos e técnicas para a determinação da labilidade de espécies metálicas em águas naturais estão disponíveis, apresentando vantagens e limitações. A difusão em filmes finos por gradiente de concentração, do inglês, diffusive gradients in thin films (DGT), foi desenvolvida nos anos 90 para ser aplicada em medidas in situ de metais lábeis em águas naturais.10,11 No método DGT, as espécies lábeis difundem através de uma camada de hidrogel, em função do seu tamanho e cinética de dissociação de um complexo, e são coletados em um hidrogel impregnado com um trocador iônico. A fração lábil pode ser eluída com solução ácida e determinada através de uma técnica instrumental de interesse. O dispositivo DGT apresenta vantagens como o seu uso como amostrador passivo, capacidade de pré-concentração, medidas no local e minimização de alteração da amostra devido a coleta, os resultados obtidos representam uma média das flutuações que ocorrem durante o tempo de aplicação, entre outros.6

O dispositivo DGT tradicional utilizado em águas naturais é composto por uma base e tampa em forma de pistão de nylon, uma membrana de filtração de nitrato de celulose com porosidade de 0,45 µm, uma fase difusiva de hidrogel de poliacrilamida com reticulador (crosslinker) de agarose e uma fase ligante composta por uma resina de troca iônica comercial, Chelex®-100 impregnada em hidrogel de poliacrilamida.10,11 Vários estudos vêm sendo realizados visando aumentar a aplicabilidade do DGT e diminuir o seu custo de preparo. Para tal, são realizadas modificações na fase difusiva e ligante.12-14

As fases do dispositivo DGT tradicional são preparadas com o hidrogel de poliacrilamida que é um polímero sintético considerado tóxico.12,13 Assim, a substituição por materiais ambientalmente mais amigáveis é relevante, como é o caso da agarose. A agarose é um polissacarídeo isolado de algas marinhas. Estruturalmente, é um biopolímero linear que consiste em D-galactose e 3,6-anidro-L-galactopiranose alternadas, ligadas por ligações glicosídicas α-(1→3) e β-(1→4). Se apresenta na forma insolúvel em temperatura ambiente e solúvel em solução aquosa com temperatura acima de 35 ºC. Após aquecimento, as cadeias formam agregados que se condensam em rede tridimensional formando um hidrogel atóxico.12-14 Características como tamanho de poro, temperatura de gelificação, presença de grupamentos carregados podem depender da purificação da agarose, intumescimento, da concentração na formação do gel, força iônica, entre outros fatores.12-15

Levando em consideração todos os aspectos mencionados, o objetivo desse trabalho foi preparar de modo homemade um dispositivo DGT com a fase difusiva composta por hidrogel de agarose e a fase ligante composta por um hidrogel de agarose com resina Chelex®-100. Avaliou-se a performance das fases difusa e ligante do novo dispositivo para os metais traço cobre, cromo trivalente e cádmio. Os dispositivos DGT preparados foram aplicados em amostras de água superficial sintética e coletada em um rio urbano, Cará-Cará, de Ponta Grossa, PR.

 

PARTE EXPERIMENTAL

Equipamentos, soluções e reagentes

As determinações dos íons de cádmio, cobre e cromo trivalente na faixa de concentração de mg L-1 foram realizadas com um espectrofotômetro de absorção atômica com chama (FAAS) da marca Varian, modelo AA 220, equipado com lâmpada de cátodo-oco (Varian) e lâmpada de deutério com corretor de sinal de fundo. Os gases utilizados foram acetileno, óxido nitroso e ar comprimido.

As concentrações de cádmio, cobre e cromo nas amostras com concentrações na faixa de µg L-1 foram determinadas com um espectrofotômetro de absorção atômica (GF AAS), modelo AA 240Z da Varian, equipado com corretor de sinal de fundo de Zeeman, atomizador de tubo de grafite (GTA 120), auto amostrador PSD 120. Nas medidas foram empregados tubos de grafite pirolítico, lâmpada de cátodo-oco, argônio como gás inerte, vazão 0,3 L min-1.

Os espectrofotômetros foram operados sob condições ótimas. Os sinais de absorbância e de fundo (background) foram obtidos em triplicata. A lâmpada de cátodo-oco para cádmio foi operada a 228,8 nm com corrente de 4 mA e largura de fenda de 0,2 nm. Para cobre, as condições de operação da lâmpada foram 324,8 nm de comprimento de onda, corrente de 4 mA e largura de fenda de 0,2 nm. Para cromo foram usados comprimento de onda de 357,9 nm, corrente de 4 mA e largura de fenda de 0,2 nm. As temperaturas de pirólise do programa de aquecimento do forno de grafite nas medidas de GF AAS para Cd, Cu e Cr foram 300, 900 e 1100 ºC, respectivamente. As temperaturas de atomização foram 1800, 2300 e 2600 ºC para Cd, Cu e Cr, respectivamente. A calibração foi realizada com padronização externa sem uso de modificador químico. As curvas analíticas preparadas para as medidas de FAAS foram de 0,0 a 5,0 mg L-1 para Cd, de 0,0 a 15,0 mg L-1 para Cu e Cr, respectivamente. As curvas analíticas foram preparadas para as medidas de GF AAS na faixa de concentração de 0,0 a 1,0 µg L-1 para Cd, de 0,0 a 20,0 µg L-1 para Cu e de 0,0 a 30,0 µg L-1 para Cr, respectivamente.

Medidas de pH foram realizadas com potenciômetro digital (Satra, modelo PHS-3E) e um eletrodo de vidro combinado. Um forno de micro-ondas doméstico (Consul) foi empregado no preparo de hidrogéis com potência de 1,1 kW.

Uma câmara de difusão foi utilizada em ensaios com hidrogel de agarose e consistiu em dois compartimentos de vidro, de 4 mm de espessura e capacidade de 600 mL cada compartimento, separados com um orifício de teflon de 3,14 cm de área de exposição onde estavam presentes os hidrogéis durante o ensaio.11 A base de pistão e tampa dos dispositivos DGT homemade foram preparados com teflon com a base contendo 4 cm de diâmetro e o pistão onde ficam alocados os hidrogéis com 2,5 cm de diâmetro, a tampa possui 3 cm de diâmetro com uma janela de 2 cm. O formato dos dispositivos DGT homemade não difere dos dispositivos DGT convencionais.

Todos os reagentes utilizados foram de grau analítico e todas as soluções aquosas foram preparadas com água ultrapura do tipo Milli-Q (Millipore) com resistividade de 18 mΩ cm. As soluções dos íons de CrIII, Cd e Cu foram preparadas por meio da diluição de soluções padrão de 1000 mg L-1 (SpecSol). Os reagentes utilizados no preparo de hidrogéis difusivos e ligante foram a agarose (Sigma-Aldrich) com as especificações: grau biologia molecular, temperatura de transição gel 36 ºC, eletrosmose 0,09-0,13; e a resina Chelex-100® na forma sódica, 50-100 mesh, seca e mantida em dessecador. Membranas de nitrato de celulose de 0,45 µm de porosidade da marca Sartorius foram empregadas na filtração de amostras e nos dispositivos DGT. O pH das soluções foi acertado com soluções 0,1 mol L-1 de HNO3 e 0,1 mol L-1 de NaOH. A força iônica das soluções foi ajustada com solução 0,01 mol L-1 de NaNO3 (Sigma-Aldrich).

Preparo de hidrogel difusivo de agarose

Para a fase difusiva de dispositivos DGT foram preparados hidrogéis de agarose com composição de 1,5% (m/v).12,13,15 Para tal, 10 mL de água ultrapura foi previamente aquecida em forno micro-ondas durante 10 s. A água aquecida foi utilizada na solubilização total da agarose. A solução obtida foi transferida e prensada entre duas placas de vidro, de 10,5 cm de altura e 12 cm de largura, separadas com espaçador de 0,8 mm de espessura. Após o resfriamento da solução, ocorreu a formação de gel na forma de filme fino e realizou-se a secção de oito géis com 2,5 cm de diâmetro. Os discos de géis foram lavados com água ultrapura e mantidos durante 48 h a 4 ºC em solução de 0,05 mol L-1 de NaNO3. Os hidrogéis obtidos foram avaliados em termos de intumescimento com a medida da sua espessura. A medida foi realizada com o uso de um paquímetro universal (Digimess, com resolução de 0,02 mm), após o tempo de intumescimento.

Determinação de coeficiente de difusão (D) de Cd, Cu e CrIII para o hidrogel difusivo

A determinação do coeficiente de difusão (D) do cádmio, cromo trivalente e cobre no hidrogel de agarose (1,5%) foi realizada através de ensaios na câmara de difusão. Os ensaios foram realizados de modo individual e em triplicata. O gel de agarose utilizado na câmara apresentou uma área de 3,14 cm2 para exposição do gel entre os dois compartimentos. Em um dos compartimentos foi adicionado 500 mL de uma solução doadora da espécie metálica individual (Sdoadora) com concentrações de 5,8-8,9 mg L-1 de Cu2+ ou 4,58-6,0 mg L-1 de Cd2+ ou 6,58-10,3 mg L-1 de CrIII em pH 6,5 e na presença de 0,05 mol L-1 de NaNO3. No lado oposto, foi adicionado 500 mL de uma solução receptora (Sreceptora) composta por água ultrapura em pH 6,5 e 0,05 mol L-1 de NaNO3. As soluções foram mantidas em agitação eletromagnética e com controle de temperatura (25 ºC) durante um período de 2 h. A cada 15 min, alíquotas de Sdoadora e Sreceptora foram retiradas. As alíquotas foram preservadas com 0,05 mol L-1 de HNO3 e a 4 ºC até o momento da análise por espectrometria de absorção atômica com atomização em chama (FAAS).

A partir dos dados de concentração da Sreceptora (Conc), ou seja, do íon que difundiu no gel, calcula-se a massa do íon difundido no gel (M), através da Equação 1:

onde: M é a concentração do íon difundido através do hidrogel de agarose; Conc é a concentração de íon determinada na solução receptora (Sreceptora) e V é o volume da solução receptora.

Através da relação entre a massa do íon difundido no hidrogel em função do tempo do experimento obtém-se uma relação linear, e através dos mínimos quadrados determina-se o coeficiente angular (b) da equação de reta obtida. Partindo do pressuposto que a concentração do íon na solução doadora permanece constante, que é conhecida a temperatura do experimento, a espessura do hidrogel e a área de exposição do hidrogel com as soluções é possível determinar o coeficiente de difusão de acordo com a Equação 2:

sendo que D é o coeficiente de difusão (cm2 s-1); b é o coeficiente angular da relação entre a massa do íon difundido no hidrogel em função do tempo (µg s-1); Δg é espessura da camada difusiva (cm); CSdoadora é a concentração do íon no compartimento doador (mg L-1); A é área do orifício da câmara (cm2).

Preparo de fase ligante composta por um hidrogel de agarose e resina Chelex-100®

Os hidrogéis de agarose foram impregnados com Chelex-100® com a função de servirem como fase ligante dos dispositivos DGT homemade. O procedimento de preparo foi similar a fase difusiva com a diferença que a Chelex-100® (2,0 g) foi adicionada na solução com a agarose já solubilizada (0,3 g de agarose em 10 mL de água ultrapura) e agitação manual. A espessura do hidrogel foi determinada com o uso de um paquímetro universal (Digimess como resolução de 0,02 mm), o volume do hidrogel intumescido foi determinado por deslocamento de volume de água utilizando uma proveta.16

Avaliação da fase ligante composta por resina Chelex-100® e hidrogel de agarose

A capacidade de retenção e extração de íons de cobre, cádmio e cromo trivalente pelo hidrogel ligante preparado foi avaliada com ensaios em triplicata.11,17 Um disco de hidrogel ligante foi mantido em contato com 20 mL de solução contendo soluções individuais dos três analitos na presença de 0,01 mol L-1 de NaNO3, para ajuste de força iônica, e 24 h como tempo de contato. A solução foi agitada em shaker com velocidade 120 rpm e temperatura controlada em 23 ± 2 ºC, para evitar a formação de filme na superfície do hidrogel. Os experimentos foram realizados com diferentes concentrações das espécies metálicas para verificar a capacidade de retenção das espécies em diferentes concentrações. Para tanto, utilizou-se os valores de 5,0 e 10,0 µg L-1 de Cd2+, Cu2+ e CrIII, pH 4,5 e 6,5. O pH das soluções foi ajustado com soluções 0,1 mol L-1 de HNO3 e 0,1 mol L-1 de NaOH. Após o tempo de contato, a fase ligante foi separada da solução. As soluções sobrenadantes foram utilizadas na determinação das concentrações das espécies metálicas empregando espectrometria de absorção atômica com atomização eletrotérmica em forno de grafite (GF AAS). Os discos foram rapidamente lavados com água ultrapura e utilizados nos estudos de eluição das espécies metálicas.

Para a eluição, a fase ligante obtida após o contato com a solução contendo espécies metálicas foi mantida em contato com 5 mL de solução 1,0 mol L-1 de HNO3 por 24 h com agitação em shaker com velocidade de 80 rpm e 23 ± 2 ºC. A separação do gel e do eluente foi realizada por centrifugação (800 rpm por 15 min). A solução foi utilizada na análise por GF AAS e o material remanescente foi utilizado em um novo processo de eluição, sob as mesmas condições anteriores da eluição.

O valor do fator de eluição (fe) que pode ser definido como a capacidade de extrair o íon associado ao ligante usando uma solução ácida, foi calculado pela Equação 3, dividindo-se a massa do analito que foi eluída dos hidrogéis com a fase (m1) pela massa do analito que estava retida no hidrogel (m2). Neste trabalho foram realizadas duas eluições, visando aumentar a eficiência do processo17 e, portanto, os dois valores de fe obtidos foram somados.

Preparo de dispositivos DGT homemade baseados no uso de agarose e avaliação de performance

Os dispositivos DGT homemade foram preparados primeiramente com a disposição de um hidrogel ligante preparado com agarose e Chelex-100® em cima do pistão, seguido da disposição de um hidrogel difusivo de agarose e uma membrana de filtração de nitrato de celulose (Sartarius) de 0,45 µm de porosidade. Após a disposição dos materiais, uma tampa com janela de abertura de 3,14 cm de diâmetro foi utilizada para selar os hidrogéis. Os dispositivos preparados foram mantidos, até o momento do uso, em refrigeração (4 ºC) e em contato com solução de 0,01 mol L-1 de NaNO3.18

Após o preparo dos dispositivos DGT, os amostradores foram testados em soluções sintéticas contendo 1,0 µg L-1 de Cd2+, 10,0 µg L-1 de Cu2+, 10,0 µg L-1 de CrIII, 0,01 mol L-1 de NaNO3, pH ajustado em 6,5 e temperatura ambiente (25 ºC). Os ensaios de performance foram realizados em triplicata, com duração de 24 h e agitação eletromagnética, para evitar a formação de uma camada limite de difusão que poderá aumentar a espessura de difusão.6 Após o ensaio, os dipositivos foram lavados com água ultrapura, abertos e a fase ligante foi removida e tratada com 5 mL de uma solução 1,0 mol L-1 de HNO3 por 24 h com agitação em shaker com velocidade de 80 rpm e 23 ± 2 ºC. O ciclo de eluição foi realizado em 2 etapas idênticas, para maior eficiência do processo de eluição, onde as duas etapas foram somadas no final do processo. As concentrações dos íons metálicos foram determinadas na solução inicial e eluída da fase ligante usando GF AAS. Controles analíticos foram preparados em todas as etapas e as concentrações foram determinadas por GF AAS. As massas dos elementos acumulados no hidrogel ligante (Equação 4) e a concentração das espécies lábeis (Equação 5) foram calculadas baseadas na 1ª Lei de Difusão de Fick.

Na Equação 4, Mac (g) significa massa de espécies acumuladas no hidrogel da fase ligante, Ce (g cm-3) é a concentração dos íons que foram eluídos da fase ligante e determinado por GF AAS, Vgel (cm3) é o volume do hidrogel ligante, Vácido (cm3) é o volume da solução ácido usada como eluente e o fe é o fator de eluição determinado previamente para cada espécie química.

A Equação 5 é utilizada no cálculo da concentração lábil (Clábil) determinada pela técnica DGT onde Mac (g) é a massa acumulada da espécie metálica na fase ligante obtida pela Equação 4, Δg (cm) é espessura da camada difusiva (espessura do hidrogel de agarose e do filtro de filtração), D (cm2 s-1) é o coeficiente de difusão no hidrogel de agarose, A (cm2) significa a área de difusão e t (s) é o tempo de duração da difusão. Os valores de D utilizados foram previamente determinados com os ensaios em câmara de eluição.

Especiação química de Cu e Cd empregando DGT em amostras de água do Rio Cará-Cará, Ponta Grossa, PR

Amostras de água superficial de um rio urbano da cidade de Ponta Grossa, Paraná, foram coletadas usando a técnica de mãos limpas e mão sujas.19 Os pontos de coleta estão localizados no Rio Cará-Cará com influências de atividades urbanas, agrícolas e industriais. As amostras coletadas foram mantidas a 4 ºC em frascos de polietileno com capacidade de 1 L, previamente descontaminados com solução ácida. No laboratório, uma alíquota da amostra foi acidificada com 2% (v/v) de HNO3 e as concentrações totais recuperáveis (MTR) das espécies metálicas foram determinadas por GF AAS. Outra alíquota da amostra foi filtrada com membranas mistas de celulose com 0,45 µm de porosidade e acidificada com 2% (v/v) de HNO3 e as concentrações das espécies metálicas na fração dissolvida (MTD) foram determinadas por GF AAS. A partir da diferença das concentrações de MTR e MTD, a concentração de metal associado ao material particulado (MPart) foi calculada.20

Em laboratório, para a determinação dos teores de metal lábil (CLábil) foi utilizado 2 L da amostra do Rio Cará-Cará, sem filtração e acidificação, em pH 6,5. Na amostra foram utilizados 3 dispositivos DGT homemade durante 24 h com controle de temperatura, pH e em agitação eletromagnética.6 Após o tempo de exposição, os dispositivos DGT foram removidos e realizou-se a eluição das espécies metálicas. As concentrações das espécies eluídas foram determinadas por GF AAS e os resultados foram utilizados nos cálculos de metal lábil conforme as Equações 3, 4 e 5. A partir da diferença das concentrações de MTD e CLábil foram estimadas as concentrações de metal complexado (ML).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Características dos hidrogéis difusivo e ligante à base de agarose

Os hidrogéis difusivos preparados com 1,5% de agarose podem ter características de poro aberto, pois não foi utilizado nenhum tipo de agente reticulador no preparo.11,12 Conforme Figuras 1a e 1b, os discos de hidrogéis se apresentaram translúcidos, sem a presença visual de bolhas de ar e resistência física satisfatória para uso em dispositivos DGT. Os discos difusivos de agarose foram hidratados e condicionados em solução de eletrólito de suporte, imediatamente após a moldagem. Após intumescimento, a espessura medida dos discos difusivos foi em média 0,86 ± 0,02 mm para discos de 25 mm de diâmetro. Por se tratar de um hidrogel físico, pequenas alterações podem ser observadas no seu inchaço (intumescimento) em função do tempo de hidratação. Os hidrogéis dos dispositivos convencionais de DGT18 apresentam composição de poliacrilamida com reticulador derivado de agarose e possuem 25 mm de diâmetro e espessura de 0,8 mm. Colaço et al.12 estudaram o preparo e uso de gel difusivo com 1,5 e 3,0% de agarose a ser utilizado como fase alternativa em dispositivo DGT. A espessura média dos géis difusivos foram 1,00 ± 0,05 mm. Wang et al.13 estudaram o uso de agarose como fase difusiva em DGT para determinação de cátions e ânions. Os autores determinaram a espessura de 0,8 mm para géis com 1,5% de agarose. Portanto, a fase difusiva preparada neste trabalho apresentou espessura similar a outros trabalhos presentes na literatura.

 

 

Os hidrogéis ligantes foram preparados com 3,0% de agarose impregnada com resina Chelex-100® (Figura 1c). A maior percentagem de agarose em relação ao hidrogel difusivo deve-se a resistência do material, pois com 1,5% de agarose o hidrogel ficou bastante quebradiço. A Figura 1d mostra que os discos de hidrogéis ligantes se apresentaram um pouco mais opacos que o hidrogel de agarose, sem a presença visual de bolhas de ar. Após intumescimento, a espessura medida dos discos difusivos foi em média 0,86 ± 0,02 mm para 25 mm de diâmetro. Os hidrogéis dos dispositivos convencionais de DGT18 apresentam composição de poliacrilamida com reticulador derivado de agarose e possuem 25 mm de diâmetro e espessura de 0,4 mm. O volume do hidrogel ligante com agarose foi medido e apresentou valor de 0,26 cm3. O hidrogel ligante convencional da DGT Research Ltda. possui volume de 0,16 cm3.18 A diferença dos volumes dos hidrogéis ligantes pode estar relacionada com a diferença de espessura dos mesmos.

Determinação de coeficiente de difusão (D) de Cd, Cu e CrIII para o hidrogel difusivo de agarose

A determinação do coeficiente de difusão (D) de espécies metálicas em fases difusivas alternativas ao DGT convencional18 é essencial para a aplicação confiável dos dispositivos homemade. A maioria dos trabalhos empregam a determinação do coeficiente de difusão aparente (D') que envolve a aplicação de diversos dispositivos em soluções contendo as espécies metálicas em função do tempo. Porém, outros trabalhos12,15 utilizam as câmaras de difusão e a medida se refere apenas ao hidrogel difusivo. Assim, nesse trabalho foram realizados ensaios pelo método da câmara de difusão. Os experimentos foram conduzidos separadamente para cada espécie metálica e em duas concentrações iniciais diferentes, buscando avaliar a robustez analítica. As concentrações utilizadas na solução doadora foram escolhidas de acordo com os limites de detecção da técnica empregada nas determinações. As diferentes condições experimentais mostram informações úteis sobre a tendência dos valores de coeficiente de difusão para os analitos. As concentrações das espécies metálicas na solução doadora (Sdoadora) foram determinadas para cada tempo de estudo utilizado no ensaio. De modo em geral, as concentrações da fase doadora se mantiveram constantes e de acordo com o esperado. As concentrações de Cd, Cu e CrIII determinadas na fase receptora (Sreceptora) da câmara de difusão em função do tempo foram utilizadas na Equação 1 para calcular a massa dos analitos que difundiram pelo hidrogel de agarose (1,5%). A Figura 2 mostra as massas dos íons metálicos que difundiram pelo gel de agarose na câmara de difusão em função do tempo.

 

 

Para todos os casos apresentados na Figura 2, pode-se observar uma relação linear entre as massas acumuladas no compartimento receptor da câmara de difusão em função do tempo, com coeficientes de determinação (R2) acima de 0,97. Os coeficientes angulares (slopes-b) das curvas da Figura 2 foram obtidos e usados no cálculo do coeficiente de difusão (D) para o hidrogel de agarose, de acordo com a Equação 2. Os coeficientes de difusão para os íons de cádmio, cobre e cromo trivalente, a 25 ºC estão apresentados na Tabela 1.

 

 

Com relação a difusão do cádmio no disco de hidrogel de agarose (1,5%) pode-se observar na Figura 2 que as curvas de massa difundida do metal em função do tempo de difusão apresentaram valores de inclinação muito similares para os dois ensaios, que continham concentrações iniciais diferentes de Cd, o que pode ser evidenciado pelos valores calculados conforme Tabela 1. O valor médio do coeficiente de difusão medido foi 2,05 ± 0,3 × 10-5 cm2 s-1. Os valores de coeficiente de difusão podem variar dependendo da composição do hidrogel e da presença de cargas no material, do pH, força iônica do meio, e do método utilizado na obtenção dos valores (DGT ou câmara de difusão). De modo em geral, comparando com os dados obtidos com dados descritos em outros trabalhos que empregam agarose, nota-se que o valor médio de D para cádmio foi cerca de 3 a 4 vezes maior que os valores apresentados na literatura. Colaço et al.12 obtiveram valor de 5,22 × 10-6 cm2 s-1 para gel de agarose 1,5% obtida com câmara de difusão. Wang et al.13 descreveram o valor de coeficiente de difusão aparente (determinado com a aplicação de dispositivos DGT em função do tempo) para cádmio igual a 6,38 × 10-6 cm2 s-1. Caetano21 obteve um coeficiente angular para Cd em agarose igual a 9,0 ng s-1 e D igual a 5,09 × 10-6 cm2 s-1. Para o gel difusivo de poliacrilamida reticulado com agarose modificada, o coeficiente de difusão apresenta valor de 6,09 × 10-6 cm2 s-1, 25 ºC.18

Para as duas concentrações de cobre estudadas nos ensaios com a célula de difusão, observa-se o mesmo comportamento com curvas crescentes, lineares e com valores de inclinação muito próximos (Figura 2). Assim, nota-se na Tabela 1 que a média dos coeficientes angulares para as curvas foi 5,4 ± 0,23 ng s-1 e o valor médio do coeficiente de difusão medido foi 2,09 ± 0,5 × 10-5 cm2 s-1. Comparando com outros estudos, Caetano21 obteve um coeficiente angular para o estudo com câmara de difusão de Cu em agarose igual a 5,0 ng s-1 com valor de coeficiente de difusão de 2,83 × 10-6 cm2 s-1. Colaço et al.12 determinaram um valor de D igual a 4,82 × 10-6 cm2 s-1 para gel de agarose 1,5%, obtido com câmara de difusão. Wang et al.13 obtiveram 6,59 × 10-6 cm2 s-1 para o coeficiente de difusão aparente para cobre. O gel difusivo de poliacrilamida reticulado com agarose modificada apresenta valor de 6,23 × 10-6 cm2 s-1, 25 ºC.18 Portanto, pode-se observar que de forma similar ao íon cádmio, o coeficiente de difusão para o cobre determinado neste trabalho foi cerca de 3 a 4 vezes superior aos valores encontrados na literatura.

No que diz respeito, ao ensaio da célula de difusão para o CrIII, é possível observar na Figura 2 que as curvas de massa difundida no hidrogel de agarose foram lineares e com ótimo coeficiente de determinação, contudo apresentaram uma considerável diferença na inclinação. Portanto, nota-se na Tabela 1 que os valores de coeficiente angular para as duas equações de reta apresentam uma maior diferença, e influenciam no valor médio do coeficiente de difusão. Observa-se que os teores de CrIII utilizados apresentam maior diferença entre eles, do que outros íons estudados, influenciando na taxa de difusão do íon pelo hidrogel. Além disso, o elemento é um cátion trivalente, enquanto os outros cátions são divalentes. Em média, o valor de D para CrIII apresentou o dobro do valor do coeficiente de difusão em relação aos outros cátions avaliados, com valor de 4,53 ± 3 × 10-5 cm2 s-1. Poucos estudos para CrIII em hidrogel de agarose foram encontrados. Wang et al.13 determinaram o valor de 7,95 × 10-6 cm2 s-1 para o coeficiente de difusão aparente para CrVI. Chostak et al.22 encontraram o valor de 4,08 × 10-6 cm2 s-1 para o coeficiente de difusão aparente para cromo trivalente e hidrogel de agarose. O gel difusivo de poliacrilamida reticulado com agarose modificada apresenta valor de D a 25 ºC igual a 5,94 × 10-6 cm2 s-1 e 5,05 × 10-6 cm2 s-1 para CrIII e CrVI, respectivamente.18

De modo em geral, os valores de coeficiente de difusão para Cd, Cu e CrIII obtidos para hidrogel de agarose foram superiores aos outros trabalhos que também utilizaram a agarose e para o hidrogel de poliacrilamida. Essas diferenças podem estar relacionadas com as diferenças na composição de agarose, com a força iônica do meio, forma de preparo do gel e devido a presença de sítios de ligação na agarose. O hidrogel de agarose apresenta cargas negativas que podem afetar a difusão de íons em solução aquosa, devido a capacidade de ocorrer interações atrativas e repulsivas. A agarose possuiu sítios de ligações carregados negativamente, principalmente pela presença de grupos funcionais sulfônicos e piruvatos. Assim, significativos potenciais de Gibbs-Donnan têm sido observados nos hidrogéis de agarose, que podem favorecer o aumento do coeficiente de difusão no gel em relação à água. Isso ocorre, porque a formação do potencial entre o gel e a solução, enriquece a concentração dos analitos na superfície do gel, devido a atração eletrostática dos sítios de ligação carregados negativamente e os cátions em solução. Assim, existe um gradiente de concentração no gel e um aumento do fluxo da solução através do gel pode ocorrer, causando um aumento no valor do coeficiente de difusão.13,15 Esse fato pode explicar o comportamento diferenciado observado para a solução com maior concentração de um cátion trivalente. Em relação ao hidrogel difusivo convencional nos dispositivos DGT, pode existir uma diferença de tamanhos de poro no material, com poros maiores em hidrogel de agarose.

Na técnica DGT é essencial estabelecer os parâmetros de difusão de analitos no hidrogel difusivo, pois as medidas baseiam-se no fluxo das espécies químicas que se difundem no hidrogel para a fase ligante. Portanto, é essencial se estabelecer o comportamento difusivo dos analitos no hidrogel proposto em um dispositivo não convencional, conforme foi realizado neste trabalho.

Avaliação do hidrogel ligante de Chelex-100® e agarose frente aos íons de Cd, Cu e CrIII

A fase ligante proposta neste trabalho foi avaliada frente a sua capacidade de reter os íons de cádmio, cobre e cromo trivalente, bem como a eficiência de extração dos íons retidos usando solução ácida. A Figura 3 mostra os resultados para os ensaios com diferentes concentrações das espécies metálicas e valores de pH. Os resultados obtidos estão apresentados na forma de percentagem em massa dos íons retidos e eluídos em ensaios

 

 

Observa-se na Figura 3a que a retenção das espécies metálicas em pH 4,5 pelo hidrogel ligante de agarose e Chelex-100® variou entre 26 ± 2,1% (10,0 µg L-1 de CrIII) e 67 ± 2,2% (5,0 µg L-1 de Cu2+). Independente da concentração inicial dos analitos, a retenção pela fase ligante segue a ordem Cu2+ > Cd2+ ≥ CrIII. A baixa interação dos cátions analisados com a fase ligante pode estar relacionada com o pH do meio, uma vez que o processo de interação com a resina Chelex-100® está relacionado com os fenômenos de troca iônica e complexação. Em pH mais baixo, o excesso de íons hidrônio pode competir com os cátions metálicos pelos sítios de ligação, desfavorecendo a retenção das espécies metálicas.17 Comportamento diferente foi observado na Figura 3b, uma vez que em pH 6,5, as percentagens de retenção para as espécies metálicas foram superiores ao pH 4,5. Os valores de retenção pelo hidrogel ligante, em pH 6,5, variaram entre 61 ± 2,2% (5,0 µg L-1 de CrIII) e 87 ± 1,1% (5,0 µg L-1 de Cu2+). Comparando os resultados obtidos em pH 6,5, nota-se que a retenção foi independente da concentração dos analitos empregados, pois as percentagens foram similares considerando a estimativa de desvio padrão.

Com relação a eluição, neste trabalho foram realizados dois ciclos usando como extrator uma solução de 1,0 mol L-1 de HNO3. Observa-se na Figura 3a (pH 4,5) que a eluição para os analitos foi satisfatória, com valores superiores a 77% para as duas concentrações estudadas. A eluição variou entre 77,5 ± 0,73% (10,0 µg L-1 de CrIII) e 87 ± 3,9% (10,0 µg L-1 de Cu2+). Para o ensaio realizado em pH 6,5 (Figura 3b), os resultados foram similares ao pH 4,5, com valores na faixa de 77 ± 2,8% (5,0 µg L-1 de CrIII) e 87 ± 1,5% (5,0 µg L-1 de Cu2+). De forma em geral, para ambos os valores de pH avaliados, a eluição da fase ligante seguiu a tendência Cu2+ > Cd2+ > CrIII. Apesar dos valores de eluição não terem sido 100%, o material preparado neste trabalho é adequado para o uso nos dispositivos DGT homemade, pois a concentração de metal lábil calculada é possível de ser corrigida através do fator de eluição (fe), Equação 4. O valor de fe proposto para uso dos dispositivos DGT em águas naturais, foi baseado na média dos resultados obtidos em pH 6,5 (Figura 3b), conforme Tabela 2.

 

 

Observa-se na Tabela 2 que os valores de fator de eluição variaram entre 0,775 e 0,86 para a fase ligante proposta com agarose e Chelex-100®. Nota-se que a estimativa de desvio padrão para os ensaios apresenta valores bastante baixos. Zhang e Davison11 consideraram 0,8 como fe para o hidrogel de poliacrilamida e Chelex-100®. Portanto, os resultados obtidos podem ser considerados adequados, indicando a eficiência da fase ligante proposta para uso no dispositivo DGT.

Avaliação dos dispositivos DGT homemade baseados no uso de agarose

Os dispositivos DGT preparados com hidrogel de agarose na fase difusiva e com hidrogel de agarose impregnado com Chelex-100® foram avaliados com testes de adição e recuperação. Observa-se na Figura 4 que a percentagem de recuperação para os íons de cádmio, cobre e cromo trivalente foi acima de 80%. Também é possível notar na Figura 4 os baixos valores de estimativa de desvio padrão. Portanto, os resultados indicam valores de exatidão e precisão satisfatórios. Dessa forma, os dispositivos DGT homemade podem ser considerados adequados para o uso em meio aquoso.

 

 

Aplicação de dispositivos DGT homemade na avaliação da labilidade de Cu, Cd e CrIII no Rio Cará-Cará

Em um estudo, amostras de água superficial foram coletadas em quatro pontos no Rio Cará-Cará. O primeiro ponto (P1) de coleta está próximo da nascente e apresenta menor atividade urbana e pouca atividade agrícola. O segundo local de coleta (P2) localiza-se após a cidade de Ponta Grossa. O terceiro ponto (P3) sobre influência da região industrial de Ponta Grossa e o quarto ponto (P4) refere-se ao ponto de desague no Rio Tibagi. Para essas amostras, foram determinadas as concentrações totais dissolvidas (MTD) das espécies metálicas e os dispositivos DGT homemade foram aplicados nas amostras durante 24 h (Tabela 3). As concentrações de cromo e cobre foram determinadas, pois os valores foram superiores aos limites de quantificação que foram de 0,05 µg L-1 para Cr e 0,2 µg L-1 para Cu, respectivamente. As concentrações de cádmio não foram quantificadas, pois as concentrações foram inferiores ao limite de quantificação que foi 0,05 µg L-1.

 

 

Na Tabela 3 pode-se observar que as concentrações de cobre total dissolvido (CuTD) foram similares para os pontos de coleta no Rio Cará-Cará e variaram entre 3 ± 1,2 (P2) e 6,1 ± 0,5 µg L-1 (P4). As concentrações de cobre lábil (CuLábil) foram inferiores aos teores dissolvidos, com valores na faixa de 0,077 ± 0,005 (P4) a 0,1 ± 0,021 µg L-1 (P1). Portanto, a fase lábil do cobre representa de 1,23 a 3,8% da fração dissolvida. Esses resultados podem indicar que o cobre se encontra em formas complexadas a ligantes orgânicos que não se dissociam rapidamente durante o processo de difusão no dispositivo DGT.6,9,11 Dessa forma, o cobre está em formas pouco biodisponíveis no Rio Cará-Cará, independente do ponto de coleta e da influência das atividades antrópicas. Com relação ao cromo trivalente, as concentrações totais dissolvidas para os quatros pontos de coleta no Rio Cará-Cará (Tabela 3) foram inferiores aos teores de CuTD, os valores de CrTD variaram entre 0,081 ± 0,001 (P4) e 1,520 ± 0,005 µg L-1 (P3). Os valores de CrLábil, se referem apenas a forma trivalente, determinados com o dispositivo DGT variaram de 0,015 ± 0,001 (P4) a 0,026 ± 0,005 µg L-1 (P2). Essas concentrações de CrIIILábil (biodisponível) representam de 4, 3, 1,1 e 19% do teor total dissolvido para os pontos de coleta P1, P2, P3 e P4, respectivamente. Pode-se afirmar que, de maneira similar ao observado para o íon cobre, o cromo trivalente encontra-se majoritariamente na forma complexada no Rio Cará-Cará. É importante relatar que os baixos teores determinados para a fração lábil do CrIII e Cu, nesse estudo, só foram possíveis devido a capacidade de pré-concentração de analitos que ocorre na fase ligante no dispositivo DGT. Além disso, o gel difusivo proposto foi capaz de discriminar entre a forma complexada inerte e lábil dos íons metálicos na fração dissolvida de águas naturais.

Outro estudo foi conduzido com águas coletadas no ponto 2 do Rio Cará-Cará e os dispositivos DGT homemade, visando realizar uma avaliação da especiação de cobre, cádmio e cromo trivalente. A Tabela 4 mostra as concentrações determinadas de metal total recuperável (MTR), metal total dissolvido (MTD) e metal lábil (CLábil) usando DGT.

 

 

As concentrações totais para o P2 do Rio Cará-Cará variaram entre 0,57 e 2,9 µg L-1 e seguiram a ordem CrIII > Cu > Cd. Os teores totais determinados foram inferiores aos valores preconizados para rios classe 2 pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA),23 que indicam valores totais máximos permitidos de 1,0 µg L-1 para cádmio e 50,0 µg L-1 para cromo total. Com relação ao cobre, para classe 2, o valor máximo permitido refere-se a forma dissolvida com 9,0 µg L-1.23 E os teores totais dissolvidos determinados variaram de 0,315 e 2,03 µg L-1 e seguiram a ordem CrIII > Cu > Cd. Portanto, a concentração dissolvida de cobre está abaixo do valor indicado pelo CONAMA.23 A partir dos dados de MTR e MTD é possível estimar a fração particulada (MPart) dos íons metálicos avaliados. No que diz respeito ao fracionamento entre a fração dissolvida e particulada, os analitos apresentaram uma maior percentagem na fração dissolvida, com valores de 55% para Cd, 71% para Cr, 74% para Cu, respectivamente, em relação ao teor de MTR. A fração particulada para o Cd, Cr e Cu representou, 45, 29 e 26% do teor total recuperável, respectivamente. Esses resultados podem indicar que as espécies metálicas podem apresentar maior tempo na coluna de água, permitindo uma interação com a biota aquática.6 Dessa forma, é importante, também conhecer a labilidade das espécies metálicas. As concentrações lábeis (biodisponíveis) foram determinadas com o uso dos dispositivos DGT homemade e foram inferiores a 0,5 µg L-1. A partir dos dados da labilidade das espécies metálicas, foi possível estimar a forma complexada na fração dissolvida. A especiação dos metais traço no ponto 2 do Rio Cará-Cará está apresentada na Figura 5.

 

 

Na Figura 5 observa-se que o cádmio foi o elemento com maior porcentagem (45%) na fração particulada, em relação aos outros elementos, indicando uma maior capacidade de interação com o material particulado que poderá ser sedimentado, removendo o elemento da coluna d'água. Na Figura 5 ficou evidente que o cádmio, em relação aos outros metais avaliados, apresentou maior porcentagem de fração lábil (32 ± 1% do CdTR). Dessa forma, pode-se afirmar que provavelmente os ligantes orgânicos no Rio Cará-Cará, como a matéria orgânica dissolvida (MOD), apresentaram menor afinidade pelo cádmio. O cádmio presente como complexos que não são cineticamente reversíveis durante a difusão no dispositivo DGT representa apenas 23% do total. Denney et al.24 utilizaram DGT com a fase de ligação formada pela Chelex®-100 e obtiveram porcentagem próxima à 16% de cádmio na fração lábil em águas naturais em um rio da Austrália. Dakova et al.25 determinaram a fração lábil de cádmio no Golfo Bourgas, na Bulgária, através da técnica DGT utilizando na fase difusiva o hidrogel de poliacrilamida e na fase ligante Chelex®-100 em hidrogel de poliacrilamida. A razão entre a fração lábil/dissolvida para o Cd foi de 0,6 sugerindo uma maior labilidade do elemento, em relação a complexação desse metal por ligantes orgânicos cineticamente estáveis.

Com relação ao cobre no Rio Cará-Cará, nota-se que foi o elemento com menor interação com a fração particulada (26% do CuTR), com forte complexação por ligantes orgânicos estáveis (54% do total) e com uma labilidade intermediária (20 ± 9% do CuTR). Esses resultados estão concordantes com outros estudos realizados com DGT. Dakova et al.25 também avaliaram a labilidade do cobre no Golfo Bourgas, na Bulgária. A razão entre a fração lábil e dissolvida para o Cu variou de 0,2 a 0,38. Os autores sugerem que os resultados foram consistentes com a alta complexação do Cu pela matéria orgânica dissolvida. Diviš et al.26 utilizaram o dispositivo DGT no Rio Svitva, na República Tcheca, e verificaram que a maior parte do Cu pode estar complexado a ligantes com elevada constante de estabilidade e, portanto, não foi detectado pelos dispositivos DGT.

O comportamento observado para o cromo no Rio Cará-Cará pode ser observado na Figura 5. O cromo apresentou uma percentagem intermediária na forma particulada (29% do total) em relação aos outros elementos. Além disso, o CrIII apresentou uma elevada percentagem da fração complexada (59%), indicando uma forte interação com ligantes orgânicos, como a MOD. E o CrIII apresentou uma menor percentagem lábil (12 ± 1%). É importante ressaltar, que o uso da resina Chelex-100® no hidrogel ligante faz com que as medidas realizadas com DGT sejam apenas para a forma trivalente. Nota-se que o cromo foi o elemento com maior concentração total, porém foi o elemento que apresentou uma menor labilidade, ou seja, uma forma menos biodisponível. Assim, está demonstrada a necessidade de avaliar a especiação de contaminantes ambientais e que seja incorporado o conceito em legislações ambientais. A técnica DGT pode ser uma ferramenta valiosa e de fácil uso que permite avaliar a especiação, através das medidas das formas lábeis, capacidade de pré-concentração e uso in situ. O dispositivo homemade com a substituição da poliacrilamida pela agarose na fase difusiva e ligante permite aumentar a aplicabilidade do uso dos dispositivos DGT como não há necessidade de importar dispositivos comerciais, e assim é possível reduzir os custos e minimizar os riscos ambientais associados ao descarte dos resíduos da aplicação da técnica. Isso ocorre porque a agarose, presente nesses dispositivos, é de natureza não tóxica.

 

CONCLUSÕES

Neste trabalho foi preparado de modo homemade um dispositivo de difusão em filmes finos por gradiente de concentração (DGT) baseado no uso da agarose na fase difusa e ligante, uma vez que é um biopolímero ambientalmente amigável e de menor custo que a poliacrilamida. Foram determinados os valores de coeficiente de difusão (D) da fase difusiva e do fator de eluição (fe) para a fase ligante para os íons de cádmio, cobre e cromo trivalente. O emprego de duas etapas de eluição se mostrou eficiente no processo de extração dos íons metálicos da fase ligante. E o comportamento observado nos ensaios com célula de difusão com hidrogel de agarose indica que está de acordo com a Primeira Lei de Difusão de Fick. Os parâmetros determinados foram adequados, pois os ensaios de adição e recuperação para os íons Cd, Cr e CrIII proporcionaram resultados superiores a 80%, podendo ser considerados satisfatórios. Os dispositivos foram utilizados em estudos de labilidade em amostra real, água superficial do Rio Cará-Cará, Paraná. De modo geral, o CrIII apresentou maior concentração total e menor labilidade em relação aos outros metais traço. O cádmio foi o elemento com menor afinidade com a matéria orgânica dissolvida, devido aos menores valores da fração complexada (23% do total). O cobre foi o elemento com baixa interação com o material particulado, labilidade intermediária e forte interação com os ligantes orgânicos não dissociáveis durante a medida do dispositivo DGT. Portanto, os dispositivos preparados de modo homemade se mostraram adequados para uso em soluções aquosas e os resultados sugerem que podem ser utilizados de forma exata e precisa.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a CAPES, CNPq (448270/2014-5), UEPG e C-LABMU pelo apoio financeiro. K. A. Costa e B. F. P. Schmite agradecem a CAPES pela bolsa de doutorado. R. M. Silva agradece a UEPG pela bolsa de doutorado.

 

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Editor Convidado responsável pelo artigo: Marco T. Grassi

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