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14:26, qui nov 21

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Revisão


Ocorrência e degradação de quinolonas por processos oxidativos avançados
Occurrence and degradation of quinolones by advanced oxidation processes

Caio Rodrigues-Silva; Milena G. Maniero; Marcela S. Peres; José Roberto Guimaraes*

Departamento de Saneamento e Ambiente, Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo, Universidade Estadual de Campinas, Avenida Albert Einstein, 951, CP 6021, 13083-852 Campinas - SP, Brasil

Recebido em 14/08/2013
Aceito em 16/12/2013
Publicado na web em 20/02/2014

Endereço para correspondência

*e-mail: jorober@fec.unicamp.br

RESUMO

In this review, the presence of quinolones in the environment, their risks and the available processes for water decontamination were addressed. Their occurrence in surface waters and also in soil raises concerns about the risk of the development of resistant bacteria and other potential chronic effects. AOPs (UV/H2O2, Fenton, photo-Fenton, and UV/TiO2) and ozonation proved effective for degrading these emerging contaminants due to hydroxyl radical formation, surpassing the efficacy of conventional methods. In addition, the main degradation mechanisms of these drugs as well as data on residual biological activity were analyzed.

Palavras-chave: antimicrobials; degradation mechanisms; toxicity.

INTRODUÇÃO

Antimicrobianos são definidos como compostos naturais, sintéticos ou semi-sintéticos, cuja finalidade é prevenir ou tratar doenças infecciosas causadas por micro-organismos patogênicos,1 tanto nos seres humanos como na medicina veterinária. Visto que não são totalmente metabolizados durante o uso terapêutico, os antimicrobianos estão presentes no esgoto doméstico principalmente como resultado da excreção humana. O uso de antimicrobianos na atividade pecuária contribui, também, para a sua introdução no meio ambiente, como resultado de processos de manufatura, disposição irregular ou excreção metabólica.2 Dessa forma, esses compostos são continuamente lançados no ambiente e, considerando sua característica recalcitrante de difícil remoção/degradação, são considerados pseudopersistentes.

Existem aproximadamente onze diferentes classes de antimicrobianos,3 que se diferenciam por sua estrutura química ou mecanismos de ação no tratamento específico de determinado patógeno. As quinolonas, antimicrobianos sintéticos, são eficientes no tratamento de infecções por bactérias Gram-positivas e Gram-negativas e são largamente empregadas tanto na medicina humana como veterinária. Bactérias Gram-negativas são aquelas que possuem uma parede celular com poucas camadas de peptideoglicana e uma segunda membrana de lipopolissacarídeo. No processo de coloração, a lavagem com álcool rompe a camada externa de lipopolissacarídeo e o corante é removido por meio da camada de peptideoglicana. Consequentemente, as células Gram-negativas permanecem incolores até serem coradas com a safranina (segundo corante), adquirindo tonalidade rosa-avermelhada. Como exemplo, pode-se citar: Pseudomonas aeruginosa (causadora de infecções no aparelho pulmonar, urinário e respiratório), Escherichia coli (causadora de infecções urinárias) e Salmonella (causadora de intoxicações alimentares). As bactérias Gram-positivas, como por exemplo, a Streptococcus pneumoniae, possuem uma parede com mais camadas de peptideoglicana que as bactérias Gram-negativas. Empregando-se a coloração de Gram, apresentam-se com coloração púrpura quando fixadas com cristal violeta (primeiro corante), uma vez que essas bactérias retêm esse corante mesmo quando expostas ao álcool.4,5

Dentre os principais riscos da presença de quinolonas no ambiente destacam-se o desenvolvimento de bactérias resistentes, a possibilidade desses poluentes afetarem o sistema endócrino e a toxicidade e/ou efeitos ecotoxicológicos ainda pouco conhecidos para espécies não-alvo.6-10

Pesquisas científicas têm reportado a capacidade de estações de tratamento de esgoto em apenas reduzir parcialmente a concentração de compostos farmacêuticos.9 Além disso, a diminuição da concentração de fármacos durante as etapas da ETE não indicam a degradação dos mesmos, uma vez que o lodo da ETE pode apresentar elevada concentração desses poluentes.10-12 Os processos oxidativos avançados (POA) têm sido apontados como uma tecnologia eficiente para o tratamento de efluentes contendo fármacos, inclusive os pertencentes à classe das quinolonas.

O objetivo desse trabalho foi apresentar dados de ocorrência de quinolonas em matrizes aquosas e solo, bem como possíveis rotas de contaminação; realizar uma discussão da degradação desses compostos por processos convencionais e oxidativos avançados, relacionando-os com dados de atividade antimicrobiana residual e de toxicidade, da solução original e dos intermediários formados; e mostrar alguns mecanismos de degradação.

 

QUINOLONAS

A primeira quinolona, o ácido nalidíxico, foi sintetizada em 1962 a partir da cloroquina (um fármaco destinado ao tratamento da malária).4,5 Desde então, subsequentes alterações no núcleo da quinolona, por meio da adição de diferentes substituintes nas posições N-1, C-6, C-7 e C-8 (Figura 1), deram origem aos demais agentes antimicrobianos dessa classe de compostos.6 A adição de selecionados substituintes nos ligantes-chave da estrutura principal da quinolona viabilizou o desenvolvimento de antimicrobianos que fossem mais potentes e capazes de agir contra um maior grupo de micro-organismos.

 


Figura 1. Estrutura química básica das quinolonas

 

Uma das principais mudanças na estrutura das quinolonas foi a adição de um átomo de flúor na posição C-6, que ampliou o espectro de ação das quinolonas para as bactérias Gram-positivas. A adição de um segundo átomo de flúor na posição C-8 resultou no aumento da absorção e aumento da meia-vida da quinolona no organismo humano; no entanto, aumentou a fototoxicidade do composto. A adição de um grupo piperazina na posição C-7 ampliou a ação contra as bactérias aeróbias Gram-negativas. Com a adição de um grupo metila ao nitrogênio da piperazina, observou-se um aumento do tempo de meia-vida no organismo e da biodisponibilidade. Um aumento da ação contra bactérias aeróbias patogênicas Gram-negativas e Gram-positivas foi observado com a adição de um grupo ciclopropil na posição N-1.4

Não é totalmente claro na literatura como as quinolonas são classificadas com relação às gerações, uma vez que cada autor emprega um método diferente. A única divisão aceita universalmente é a separação entre compostos com flúor (também denominadas como fluoroquinolonas) das quinolonas de primeira geração, que não possuem flúor em sua composição. King et al.,7 Ball,8 Xiao et al.,9 e Bolon5 relacionaram as quinolonas com o seu espectro de abrangência contra micro-organismos patogênicos, classificando esses antimicrobianos em quatro gerações diferentes, apresentadas na Tabela 1.

 

 

OCORRÊNCIA

A porcentagem de um antimicrobiano excretado por um animal, em sua forma não metabolizada, depende de diversos fatores, entre os quais, a substância aplicada, a dosagem, a espécie e a idade do animal.1 Segundo Regitano e Leal,10 as fluoroquinolonas apresentam uma taxa de metabolização maior que 20%, sendo classificadas como de moderada metabolização. Dessa forma, uma vez administradas aos animais, as quinolonas podem ser excretadas in natura por meio das fezes e/ou urina. Ressalta-se ainda que as fluoroquinolonas não sofrem alterações em sua estrutura química na ausência de luz, sob aeração, variação de temperatura (10 - 55 ºC),1,11 ou mesmo durante o processo de compostagem, podendo dispersar-se no meio ambiente em sua forma inalterada.

Essa classe de fármacos não é degradada ou completamente removida nas estações convencionais de tratamento de água e esgoto,12-14 limitando as possibilidades de sua eliminação. Efluentes com traços de antimicrobianos podem atingir corpos receptores, como rios, lagos e estuários e, inclusive, lençóis freáticos e águas destinadas ao abastecimento público.

Excreção humana e animal, descargas de aquiculturas, descarte da indústria farmacêutica, disposição dos resíduos domésticos e hospitalares, que contenham, inclusive, produtos vencidos e/ou não aplicados são responsáveis pela dispersão de fármacos no ambiente (Figura 2).1,15-17 Dentre esses, a excreção animal e a aplicação de fármacos na aquicultura são os meios majoritários de disseminação das quinolonas no meio ambiente aquático.1

 


Figura 2. Rota dos antimicrobianos no ambiente (adaptada da ref. 1)

 

Não existem dados e informações disponíveis na literatura sobre o volume de produção de medicamentos, inclusive antimicrobianos, voltados à medicina humana e veterinária no Brasil e pouco se conhece sobre o destino e efeitos desses compostos no meio ambiente. No Brasil, sabe-se apenas que a produção de medicamentos destinados à medicina humana e veterinária movimentou cerca de R$ 22,1 bilhões em 2010, sendo R$ 1,3 bilhão referente à produção e venda de antimicrobianos destinados ao consumo humano e R$ 1,5 bilhão ao uso veterinário.18 Nos Estados Unidos da América, o Animal Health Institute (AHI) apresentou uma estimativa que em 2008, dos 12 milhões de quilos de antimicrobianos produzidos, apenas 30% seria empregado para fins terapêuticos.19

Pesquisas sobre o monitoramento de quinolonas em águas superficiais são escassas na literatura especializada. Dos trabalhos publicados sobre a ocorrência e identificação de tais compostos no ambiente, apenas algumas das quinolonas existentes, apresentadas na Tabela 1, são foco dos estudos, conforme apresentado nas Tabelas 2 e 3. As principais pesquisas sobre a ocorrência de quinolonas em matrizes aquosas (água superficial, água para abastecimento público, afluente e efluente de estações de tratamento de esgoto, efluente hospitalar e efluente pecuário) foram realizadas na Europa (França, Espanha, Áustria, Holanda, Suíça, Grécia, Itália e Suécia), Ásia (China, Vietnã e Taiwan) e Estados Unidos. A concentração das quinolonas variou entre ng L-1 e µg L-1 em matrizes aquosas (Tabela 2)9,20-44 e, em solo, variou entre ng g-1 a µg g-1 (Tabela 3).26,28,45-47

 

 

 

 

Das 15 quinolonas detectadas em águas superficiais e em estações de tratamento de esgoto, 13 delas (ácido nalidíxico, ácido oxolínico, ácido pipemídico, ciprofloxacina, enoxacina, enrofloxacina, fleroxacina, flumequina, gatifloxacina, lomefloxacina, moxifloxacina, norfloxacina, ofloxacina, pefloxacina e sarafloxacina) foram identificadas em ambas as matrizes na faixa de 1,3 a 9660 ng L-1. A elevada concentração desses compostos nessas matrizes pode estar relacionada ao intenso uso na medicina humana ou veterinária.

Em águas superficiais, ácido pipemídico, ciprofloxacina e ofloxacina foram detectados em concentrações superiores a 245 ng L-1. Destaca-se ainda que a gatifloxacina, uma das quinolonas desenvolvida mais recentemente, foi detectada na China, tanto no esgoto como em águas superficiais, na faixa de 16 - 66 ng L-1.

Ofloxacina, ciprofloxacina e norfloxacina foram detectadas em concentrações bastante elevadas em efluente hospitalar (35,5 µg L-1 de ofloxacina, 44 µg L-1 de ciprofloxacina e 17 µg L-1 de norfloxacina)41-42. As elevadas concentrações desses compostos nesse tipo de efluente, quando comparadas às concentrações encontradas nas outras matrizes aquosas (Tabela 2), podem indicar seu extenso uso em humanos para fins terapêuticos. Duong et al.42 relataram que colônias de E. coli que foram expostas a um efluente hospitalar contendo ciprofloxacina e norfloxacina tiveram sua população reduzida em duas escalas de grandeza; além disso, destacaram que foram identificadas bactérias resistentes a essas fluoroquinolonas. Ressalta-se também que a concentração de ofloxacina encontrada por Brown et al.41 no efluente hospitalar foi 2,6 vezes maior do que a concentração de ofloxacina necessária para causar efeito em 50% das bactérias Vibrio fischeri (ensaio Microtox) (CE50,24h).48

Tamtam et al.20 constataram a presença de 17 antimicrobianos no rio Sena, entre as cidades francesas de Paris e Le Havre; a flumequina foi detectada na faixa de 13 a 29 ng L-1. Apesar da concentração reportada por Tamtam et al.48 ter sido aproximadamente 1.450 vezes menor do que a concentração necessária para causar efeito em 50% dos organismos (CE50,24h) nos ensaios com Vibrio fischeri (CE50,24h = 19 µg L-1),48 a toxicidade nesse meio pode ser intensificada pela presença de outras quinolonas, que apresentam o mesmo mecanismo de ação (inibição do DNAgirase da bactéria).48

A concentração de determinado fármaco variou bastante nas diversas regiões reportadas. Por exemplo, nos trabalhos realizados na China, a concentração de moxifloxacina detectada nas águas superficiais foi de 7,2 a 14 ng L-1 e nas estações de tratamento de esgoto (ETE) de 17 a 72 ng L-1; essas concentrações foram inferiores às encontradas na Espanha, tanto em águas superficiais (205 ng L-1) como em ETE (200-2500 ng L-1).

No solo, ciprofloxacina, norfloxacina e ofloxacina foram detectadas em concentrações de até 641,1, 288,3 e 1,6 ng g-1, enquanto que em amostras de lodo de ETE, essas concentrações foram bem mais elevadas: 1.040, 7.230 e 7.790 ng g-1, respectivamente.26,28,46 A elevada concentração das quinolonas em amostras de lodo de ETE está associada à adsorção do fármaco no lodo durante as diversas etapas do tratamento biológico.26

A ocorrência de antimicrobianos no meio ambiente é preocupante, visto a possibilidade do desenvolvimento de alterações em organismos presentes nas matrizes ambientais.

 

IMPACTO AMBIENTAL

Dentre os riscos reais de periculosidade que as quinolonas representam para os seres humanos e animais, pode-se destacar o aumento da resistência bacteriana. Fármacos podem afetar diretamente o meio ambiente e seu equilíbrio. Bactérias expostas a resíduos de antimicrobianos presentes em matrizes ambientais podem sofrer modificações em sua carga genética, resultando na resistência do micro-organismo ao fármaco a que foi exposto.49,50 Um número significativo de bactérias (tais como coliformes fecais, E. coli e enterococos) com genes de resistência a antimicrobianos tem sido encontrado em estações de tratamento de esgoto.51,52 O crescimento da resistência bacteriana a medicamentos torna necessário o uso de fármacos cada vez mais potentes e onerosos no tratamento de doenças.

Além da resistência, uma redução da população de micro-organismos foi observada em sistemas de tratamento de esgoto, quando aplicadas concentrações de antimicrobianos comumente presentes em efluentes hospitalares.53,54 As quinolonas possuem potencial para afetar a comunidade microbiana, podendo afetar seriamente o processo de degradação da matéria orgânica.

A disposição contínua no meio ambiente desperta a preocupação quanto à possibilidade de bioacumulação e persistência, devido às características recalcitrantes das quinolonas.54 Estudos de degradação de antimicrobianos são importantes para avaliar a eficácia das tecnologias de tratamento disponíveis.

 

PROCESSOS DE REMOÇÃO

Processos convencionais

Conforme apresentado na Tabela 2, resíduos de quinolonas foram detectados em diversas matrizes, até mesmo em amostras de água potável destinada ao abastecimento público. Isso indica que as estações convencionais de tratamento de água não são projetadas para promover a total remoção e/ou degradação desses compostos recalcitrantes.

A remoção de ciprofloxacina, norfloxacina e ofloxacina foi avaliada por Vieno et al.55 em uma estação piloto de tratamento de água. Os pesquisadores observaram que os processos de coagulação, floculação e sedimentação removeram juntos apenas 3% da concentração dos fármacos presentes no efluente (com exceção da ciprofloxacina: 30% de remoção). A filtração apresentou um índice de remoção de 10% dos compostos avaliados. Essa baixa remoção deve-se ao fato das etapas de coagulação, floculação e sedimentação empregarem reagentes químicos para promover a aglutinação e precipitação dos poluentes presentes no efluente e não a oxidação dos mesmos.

Batt et al.40 monitoraram a concentração de ciprofloxacina em quatro estações de tratamento de esgoto. Em três delas, havia tratamento terciário com etapa de cloração e/ou fotólise. Até a etapa secundária do tratamento, onde são removidas as maiores cargas de matéria orgânica e os sólidos, registrou-se 50% de degradação do antimicrobiano. Dos tratamentos terciários empregados, a cloração não provocou efeito e a fotólise foi ineficaz para o tratamento do efluente, sendo responsável por uma baixa remoção do fármaco detectado na entrada da estação: aproximadamente 25%.

Lin et al.23 avaliaram a presença e remoção de fármacos, inclusive duas quinolonas, em estações de tratamento de esgoto. Observaram que, mesmo atingindo índices de remoção de 46 e 88% para ácido nalidíxico e ofloxacina, respectivamente, a eficácia do processo de lodos ativados para a remoção de fármacos foi variável. Além disso, os índices de remoção de fármacos não indicam, necessariamente, a degradação dos mesmos, uma vez que o lodo da ETE pode apresentar uma concentração do contaminante até 1000 vezes maior do que a encontrada no efluente.56 Lai e Lin11 comprovaram a ineficiência dos processos aeróbio e anaeróbio na degradação de flumequina e ácido oxolínico.

Apesar dos processos biológicos serem capazes de remover parte dos antimicrobianos presentes no afluente contaminado, o sistema de lodos ativados pode ser prejudicado pela presença de elevadas concentrações das quinolonas, conferindo toxicidade ao meio.48,57

Processos que utilizam cloro têm sido frequentemente usados nas ETA para garantir a desinfecção de águas destinadas ao abastecimento público. As várias espécies comumente utilizadas (hipoclorito, cloro e dióxido de cloro) possuem alto potencial de redução (EClO- = 1,48 V, ECl2 = 1,36 V e EClO2 = 0,95 V). A avaliação da degradação de quinolonas por cloração em estações tratamento de água e esgoto é escassa. Wang et al.14 avaliaram a degradação de sete fluoroquinolonas (ácido pipemídico - 0,30 mg L-1, ciprofloxacina - 0,33 mg L-1, enrofloxacina - 0,36 mg L-1, flumequina - 0,26 mg L-1, lomefloxacina - 0,35 mg L-1, norfloxacina - 0,32 mg L-1 e ofloxacina - 0,36 mg L-1) em efluentes de ETA e ETE utilizando-se o dióxido de cloro (CClO2 = 1 mg L-1). Nesse estudo, foi observado que, em ambos os efluentes, a flumequina não sofreu degradação, mesmo após um longo período de contato (24 h). O mesmo foi observado para o ácido pipemídico, uma vez que a degradação máxima foi de 10%. Por outro lado, a adição de ClO2 promoveu a redução da concentração das fluoroquinolonas ciprofloxacina, norfloxacina, lomefloxacina, enrofloxacina e ofloxacina. Na ETE, ofloxacina e enrofloxacina foram totalmente oxidadas após 30 min de reação e, em ETA, o processo de cloração promoveu a degradação de 80 e 75% da ofloxacina e da enrofloxacina, respectivamente. Dodd et al.58 já haviam reportado a rápida oxidação de enrofloxacina com hipoclorito: 50% de degradação após 3 min de reação. Mais recentemente, Najjar et al.59 verificaram que a levofloxacina (0,04 mg L-1), assim como a enrofloxacina, foram rapidamente degradadas (1 min) usando hipoclorito de sódio como oxidante (CNaClO = 1,14 mg L-1).

Fotólise

A radiação UV compreende os comprimentos de onda entre 200 e 400 nm do espectro eletromagnético. Essa radiação pode ser classificada em UV-C (200-280 nm), UV-B (280-315 nm) e UV-A (315-400 nm). A radiação UV é normalmente obtida por meio de lâmpadas de vapor de mercúrio, as quais podem ser de baixa pressão, com emissão em comprimentos de onda próximos a 254 nm; de média pressão, com emissão desde a faixa do UV-C até a região do infravermelho; e as de alta pressão, que emitem na mesma faixa das de média pressão, mas possuem uma maior intensidade de radiação.60

Fluoroquinolonas são resistentes a alterações de temperatura ou hidrólise, porém são sensíveis à radiação ultravioleta.61 A fotólise depende da absorção da radiação pelo composto alvo, da sua estrutura, da sua concentração e da matriz em que o mesmo se encontra. Em amostras de rios, lagos e efluentes ETE, onde a elevada turbidez e cor dificultam a penetração da luz na solução, a fotodecomposição de poluentes orgânicos dissolvidos pode não ocorrer ou sofrer perda da eficácia.

As quinolonas possuem duas faixas características de banda de absorção na região do ultravioleta, uma entre 240 e 300 nm e outra, de menor intensidade, entre 300 a 380 nm, devido aos anéis aromáticos presentes na estrutura desses compostos.62

Sirtori et al.63 demonstraram que 84% da flumequina (concentração inicial de 20 mg L-1) em água deionizada foi degradada por fotólise usando radiação solar simulada (300-800 nm); porém, em solução marinha sintética, essa eficiência caiu para 66%. Pouliquen et al.64 não conseguiram uma eficiência superior a 9,1% na degradação de flumequina (1 mg L-1) e ácido oxolínico (1 mg L-1) em efluente sintético, utilizando um sistema com radiação solar. Por outro lado, sarafloxacina, lomefloxacina, difloxacina, ciprofloxacina, enrofloxacina e norfloxacina mostraram-se fotossensíveis à radiação ultravioleta e solar, com degradação superior a 50% em menos de 1 h de exposição, mesmo quando utilizada uma concentração na ordem de µg L-1.65-69

Hapeshi et al.70 verificaram que 40% da ofloxacina (concentração inicial de 10 mg L-1) em água ultrapura foram degradadas sob radiação ultravioleta em 240 min. Não foi observada remoção de toxicidade da solução utilizando Daphnia magna como organismo teste.

Dada a baixa eficiência dos métodos convencionais e devido ao longo tempo de exposição à radiação ultravioleta necessário para a degradação de quinolonas,11,14,58,59,63-67,69-86 conforme apresentado na Tabela 4, torna-se importante o estudo e a avaliação de tratamentos avançados.

 

 

Processos oxidativos avançados

Os POA podem ser definidos como processos baseados na formação do radical hidroxila (OH), um forte oxidante não seletivo com capacidade de mineralizar compostos orgânicos, devido ao seu elevado potencial de redução (E = 2,73 V), superior ao dos oxidantes convencionais.87,88 Os radicais hidroxila se destacam frente a outros oxidantes visto a sua capacidade de inativar micro-organismos e,89 principalmente, de mineralizar compostos orgânicos recalcitrantes90,91 como, por exemplo, antimicrobianos presentes em matrizes aquosas.16

O uso da radiação solar e de lâmpadas de que emitem radiação ultravioleta tem se mostrado indicado para a degradação de quinolonas em solução aquosa quando o emprego se dá em conjunto com H2O2, O3, Fe(II) e TiO2,13,61,67,70,73,74,76-79,82,83,85,92-117 conforme apresentado na Tabela 5.

 

 

UV/H2O2

O processo oxidativo avançado peroxidação assistida por radiação ultravioleta (UV/H2O2) gera radicais hidroxila quando dois processos muito conhecidos são combinados: a fotólise e a peroxidação, conforme Equação 1.

 

 

De La Cruz et al.74 comprovaram o aumento na eficácia da degradação de 32 poluentes detectados em um efluente de ETE (inclusive três fluoroquinolonas) quando empregado o processo UV/H2O2 ao invés da radiação UV254nm isoladamente. Após 10 min de irradiação, 36% da norfloxacina, 65% da ofloxacina e 48% da ciprofloxacina foram degradadas pelo processo fotolítico. Adicionando 50 mg L-1 de H2O2 e aplicando essa mesma dose de radiação (UV/H2O2), observaram que 100% da concentração das fluoroquinolonas ofloxacina e norfloxacina presentes no efluente foi degradada após 10 min de reação. Porém, para a ciprofloxacina, a total degradação foi observada apenas após 30 min de reação. Rivas et al.82 verificaram que o processo UV/H2O2 foi eficaz na degradação da norfloxacina presente em solução aquosa; no entanto, a radiação UV isoladamente não foi capaz de degradar esse fármaco.

Kim et al.94 aplicaram a fotólise para o tratamento de uma solução contendo resíduos de 39 fármacos. Para a remoção desses compostos da solução aquosa, foi necessária uma dose de radiação UV de 2,77 J cm-2, a qual pode ser considerada alta quando comparada aos 0,04-0,14 J cm-2 necessários para promover a desinfecção. Porém, com a adição de H2O2, houve um aumento significativo na porcentagem de remoção dos contaminantes, com o emprego de uma menor dose de radiação UV (0,92 J cm-2). O mesmo foi constatado por Da Silva et al.78 durante a avaliação da degradação de 0,5 mg L-1 de flumequina por UV/H2O2. Neste estudo, reduzindo a dose de radiação UV pela metade (de 5,68 para 2,84 J cm-2), na presença de 1,0 mmol L-1 de H2O2, resultados similares foram obtidos com relação à degradação da flumequina (aproximadamente 98%). Além disso, a atividade antimicrobiana da solução submetida ao processo UV/H2O2 por 15 min foi semelhante à obtida quando empregado 5,68 J cm-2 (60 min) de radiação UV isoladamente.

Fenton e foto-Fenton

O POA reagente de Fenton produz radicais OH como resultado da clivagem de peróxido de hidrogênio catalisado por Fe(II), que por sua vez é oxidado a Fe(III), como apresentado na Equação 2.118,119 A taxa de reação diminui durante o processo devido ao consumo dos reagentes (Fe(II) e H2O2) e da redução extremamente lenta do Fe(III) para Fe(II), conforme apresentado na Equação 3.118 Quando o processo Fenton é conduzido sob radiação UV (processo foto-Fenton), ocorre a foto-redução do Fe(III) para Fe(II). Esta regeneração do Fe(II) gera, subsequentemente, mais radicais hidroxila no meio aquoso, conforme apresentado na Equação 4.118

 

 

O reagente de Fenton foi e continua sendo bastante empregado na remoção de cor de efluentes das indústrias têxtil, de couro e de papel. Na última década, o processo foto-Fenton tem se mostrado uma alternativa eficiente no processo de degradação de contaminantes emergentes.120

A eficácia dos processos Fenton e foto-Fenton depende das concentrações dos reagentes e da faixa do pH da solução, que deve estar entre 2,5 e 4.121 Caso o pH seja inferior a 2, haverá uma diminuição dos OH disponíveis no meio devido ao sequestro dos radicais formados, pelo H+. Em pH acima de 4, o processo foto-Fenton pode sofrer perda de eficácia devido à precipitação de complexos de ferro, inibindo assim a foto-redução do Fe(III). Estudos têm reportado que o melhor pH para o processo foto-Fenton é 2,8, não somente por evitar a precipitação do ferro, mas também porque as espécies ferrosas predominantes na solução são FeOH2+ (48%), Fe(III) (46,9%) e Fe(OH)2 (5%). Salienta-se que o complexo FeOH2+ é o mais foto-reativo.122

A radiação solar, quando comparada com a radiação emitida por lâmpadas ultravioletas artificiais, tem demonstrado ser a mais eficiente para o processo foto-Fenton,93 devido ao fato de ser mais apropriada para a foto-reducão do Fe(III) para Fe(II). Isso ocorre porque os comprimentos de onda emitidos pela luz solar são capazes de superar o efeito de filme interno gerado pelos complexos de ferro, dispersando a radiação pela solução e melhorando a fotólise dos complexos de ferro.123 Além disso, nem toda a radiação emitida pela maioria das lâmpadas ultravioletas artificiais é absorvida pelos complexos de ferro, gerando desperdício de energia e elevando o custo do processo.123

A fonte de Fe(II) comumente utilizada na literatura é o FeSO4.7H2O.79,93,98,103,105,107,120 A proporção entre Fe(II) e H2O2 para atingir a eficiência máxima deve ser avaliada, uma vez que essa relação varia de acordo com o composto a ser degradado e a matriz em que o mesmo se encontra.

A eficácia dos processos Fenton e foto-Fenton no tratamento de um esgoto sintético contendo 15 contaminantes emergentes, incluindo flumequina e ofloxacina, foi avaliada em um reator solar em escala piloto por Klamerth et al.105 Os pesquisadores observaram que a adição de 5 mg L-1 de Fe(II) e 50 mg L-1 de H2O2 resultou na redução máxima de 45% da concentração inicial de flumequina (0,1 mg L-1). Com a introdução da radiação solar no processo, a degradação da flumequina atingiu 100% após 60 min de reação, devido à regeneração de Fe(II), conforme mostrado na Equação 4. Devido ao rápido consumo de H2O2, doses extras de peróxido de hidrogênio (50 mg L-1) foram adicionadas periodicamente para manter o reagente disponível no processo. É importante salientar que a aplicação desse POA resultou em um aumento da toxicidade nos primeiros 30 min de ensaio, quando utilizada a bactéria V. fischeri como organismo teste.

Klamerth et al.79 avaliaram a degradação de um efluente de ETE por Fenton e foto-Fenton modificado e constataram que, independentemente do tempo de reação para a total degradação dos poluentes, as reações com Fenton podem ser aprimoradas pela adição de oxalato de ferro e substâncias húmicas, com a vantagem da possibilidade de utilização do pH natural do efluente, ou seja, pH em torno de 7.

Rodrigues-Silva et al.107 avaliaram a eficácia dos processos Fenton e foto-Fenton para a degradação de flumequina (0,5 mg L-1) em solução aquosa. Mesmo que a degradação máxima observada tenha sido de 94% (CFe(II) = 14 mg L-1, CH2O2 = 340 mg L-1 e UV254nm = 5,68 J cm-2), verificaram que a toxicidade da solução para V. fischeri não foi alterada após o processo foto-Fenton e que a atividade antimicrobiana da solução foi totalmente removida. Os pesquisadores concluíram também que os excessos de Fe(II) e/ou H2O2 resultam na perda de eficiência do processo Fenton e foto-Fenton.

De acordo com Sirtori et al.,93,103 as fluoroquinolonas ácido nalidíxico e flumequina presentes em soluções aquosas podem ser degradadas por foto-Fenton; porém, a complexidade das matrizes (como efluentes industriais), a salinidade das amostras e a elevada concentração de cloro presente nos efluentes podem alterar a cinética de degradação.

UV/TiO2

A fotocatálise envolve o emprego de semicondutores, os quais são caracterizados pela banda de valência, banda de condução e a diferença de energia entre elas, o bandgap. Dentre os fotocatalisadores, o dióxido de titânio (TiO2) destaca-se devido à sua alta foto-atividade, ou seja, capacidade do semicondutor de absorver a radiação numa ampla faixa do espectro eletromagnético, natureza não tóxica, valor de bandgap adequado para a utilização com radiação UV, elevada estabilidade química, baixo custo e dispensar o uso de reagentes coadjuvantes. A fotocatálise pode ser procedida de duas maneiras: empregando semicondutor em suspensão ou imobilizado.123,124

Para que seja gerado um elétron (e-) lacuna h+ (Equação 5), deve ser incidida uma energia suficiente para superar o bandgap do semicondutor. A absorção de fótons pelo semicondutor, com energia maior que o bandgap, resulta na promoção do elétron da camada de valência para a de condução. O bandgap do TiO2 varia conforme a sua estrutura cristalina, a qual pode ser constituída em anatase, rutilo e brookite. O semicondutor mais comumente utilizado em ensaios fotocatalíticos com quinolonas é o TiO2 P25 da Degussa,77,97,102,106 que possui uma fase cristalina constituída por 80% anatase e 20% rutilo. Essa composição confere uma área superficial de 55 m2 g-1 e um bandgap entre 3,00-3,15 eV.125 Nas Equações 5 a 10 são apresentadas as reações envolvidas durante a formação dos radicais pelo processo fotocatálitico com TiO2.123

 

 

A adsorção do composto alvo na superfície do catalisador é uma das principais etapas do mecanismo de reação da fotocatálise. No estudo de Paul et al.,61 5% da ciprofloxacina (1,65 mg L-1) foi adsorvida em 0,5 g L-1 de TiO2 em suspensão em 5 min de contato. Rodrigues-Silva et al.106 reportaram a adsorção máxima de 29,6% de flumequina (concentração inicial de 0,5 mg L-1) em 150 mg L-1 de TiO2 após 30 min de agitação. Esse resultado está de acordo com o estudo de Palominos et al.,77 os quais reportaram que a adsorção máxima de flumequina (concentração inicial de 20 mg L-1) em 1,5 g L-1 de TiO2 foi de aproximadamente 26%. A adsorção de compostos no semicondutor varia em função da concentração do poluente, da concentração do adsorvente e da complexidade da matriz.

A fotocatálise com TiO2 têm sido aplicada com sucesso na degradação de quinolonas presentes em soluções aquosas.13,61,67,70,73,76,77,83,95-97,100,102-104,106,109-111,113,114 Dos trabalhos publicados, poucos são aqueles aplicados para a remoção de quinolonas nas concentrações reais presentes em efluentes. Bernabeu et al.102 detectaram 2,0 × 10-4 mg L-1 de ofloxacina e 1,8 × 10-4 mg L-1 de enrofloxacina em um efluente de ETE na Espanha e aplicaram a fotocatálise como uma etapa de polimento (tratamento terciário), visando à remoção desses contaminantes. Utilizando 200 mg L-1 de TiO2 em suspensão, após 6 h de exposição à radiação solar, observaram a degradação de 78,5 e 90% da ofloxacina e enrofloxacina, respectivamente. Mesmo não sendo atingida a total remoção dessas fluoroquinolonas, observou-se que a fotocatálise foi altamente eficaz em relação à desinfecção, removendo 99% dos coliformes fecais após 1 h de tratamento. No entanto, os autores ressaltaram que a aplicação em larga escala desse processo não seria tecnicamente vantajosa quando comparada ao processo de fotólise e UV/H2O2, devido à necessidade de remoção do TiO2 ao final do processo.

Palominos et al.77 analisaram a degradação da flumequina utilizando TiO2 em suspensão na presença de uma fonte luminosa simulando a radiação solar. Verificaram total degradação da flumequina e 80% de mineralização após 30 min de ensaio. Além disso, não foi detectada atividade antimicrobiana nas soluções submetidas ao processo de degradação, indicando alteração da estrutura da quinolona estudada. Nieto et al.13 utilizaram a oxidação fotocatalítica com dióxido de titânio, obtido pela técnica sol-gel, e dopado com uréia (u-TiO2) ou tiouréia (t-TiO2), para a degradação de flumequina em solução aquosa, atingindo 55, 90 e 90% de degradação, respectivamente, após 15 min; a dopagem do semicondutor diminuiu o bandgap, ampliou a faixa de absorção, tornando-a mais próxima da faixa do visível, resultando em uma maior eficiência de degradação da quinolona. No processo de fotocatálise com TiO2 em suspensão, a avaliação da faixa de concentração do catalisador a ser aplicada no processo é imprescindível para se atingir a máxima eficiência de degradação. Rodrigues-Silva et al.106 utilizaram concentrações de TiO2 em suspensão variando de 5 a 150 mg L-1, com o objetivo de degradar 0,5 mg L-1 de flumequina em água ultrapura. Foi observada uma total degradação do fármaco após 30 min de radiação UV, utilizando 50 mg L-1 de TiO2.

Ozônio

O ozônio possui elevado potencial de redução (E = 2,07 V), superior ao de compostos oxidantes, como o H2O2 e o cloro. Em meio básico, decompõe-se levando à formação de radicais hidroxila, cujo potencial de redução é ainda mais elevado. O ozônio é um gás tóxico em altas concentrações, possui odor peculiar similar ao do cloro e sua taxa de decomposição aumenta com o aumento da temperatura. É instável em água, possuindo uma meia-vida de minutos; portanto, deve ser produzido in-situ (no local e no momento a ser consumido). A decomposição do ozônio pode ser acelerada pelo aumento do pH, pela adição de peróxido de hidrogênio ou pela radiação UV.126 Desta maneira, a oxidação de quinolonas durante a ozonização pode ocorrer via ozônio molecular (reação direta - predominante em meio ácido) ou radical hidroxila (reação indireta - predominante em meio básico). Em meio neutro, ambos oxidantes podem estar atuando.

Vários estudos têm avaliado a aplicação de ozônio para a remoção de fluoroquinolonas presentes em soluções aquosas e efluentes.31,67,72,82,108,127 Nesses estudos, concluiu-se que elevando-se o pH acima de 10, a eficiência da degradação aumenta.

Balcioglu e Otker127 avaliaram a aplicação de ozônio em efluente de ETE sintético contendo enrofloxacina. Três valores diferentes de pH foram avaliados: 3, 7 e 12. A ozonização foi combinada com H2O2 e com radiação UV254nm. Os pesquisadores concluíram que a melhor condição de trabalho foi em pH 12, para o qual obtiveram resultados de remoção de enrofloxacina similares aos obtidos para o processo O3/H2O2. O processo O3/UV apresentou uma eficiência de degradação do fármaco de 20% acima da obtida utilizando a fotólise isolamente.

Rivas et al.113 concluíram que, mesmo que o processo de ozonização tenha sido capaz de degradar rapidamente 90% da norfloxacina presente no efluente, 70% do teor de carbono orgânico total inicial continuou presente na solução, devido aos intermediários formados, os quais poderiam contribuir para a atividade antimicrobiana residual da solução.

 

INTERMEDIÁRIOS FORMADOS

Para que os produtos formados das reações entre os radicais hidroxila e as quinolonas possam ser identificados, normalmente utiliza-se a espectrometria de massas, massa em tandem e distribuição isotópica.66,68,73,85,93,95-97,101,103,106,107,128-130 As estruturas dos possíveis produtos formados são propostas baseando-se na composição elementar dos fármacos e mecanismos de reações orgânicas apresentados na literatura especializada. Salienta-se que a identificação dos produtos formados durante os processos de degradação é uma etapa bastante trabalhosa devido às baixas concentrações em que esses intermediários se encontram. É importante ressaltar que para comprovar a identidade dos intermediários formados e propostos é necessária a aquisição de padrões analíticos desses intermediários, os quais nem sempre se encontram disponíveis,97,130 ou sintetizar os mesmos.

O ataque do radical hidroxila a compostos orgânicos não é seletivo, ou seja, o radical pode interagir com qualquer região da molécula alvo. Dependendo da estrutura química do analito, a investigação dos intermediários formados pode ser dificultada.130

A elevada concentração de compostos orgânicos presentes nos efluentes pode interferir na eficiência do POA, bem como dificultar o processo de identificação dos intermediários formados, devido à possibilidade de formação de produtos a partir dos outros compostos que são diferentes da molécula alvo do estudo, ou seja, dos interferentes.63,107,130

Além da presença de matéria orgânica, soluções contendo excesso de sais de sódio, potássio e amônio podem promover a formação de adutos. Adutos são íons formados pela combinação direta entre a molécula ionizada e outro íon que não seja um próton (H+); eles não se fragmentam quando empregada a energia de ionização comumente utilizada em análise de massa em tandem,131 o que dificulta a sua caracterização ao longo do processo de degradação.

De acordo com Albini e Monti,132 não é esperado que as fluoroquinolonas sofram rearranjo em sua estrutura química durante a exposição à radiação UV. A principal modificação que deve ocorrer na estrutura da fluoroquinolona durante o processo de fotólise é a perda do átomo de flúor (F), seguida da eliminação do grupo carboxila (COOH).103,132

Sirtori et al.103 e Klamerth et al.79 constataram um aumento da concentração de flúor em soluções aquosas contendo flumequina e ofloxacina submetidas aos processos foto-Fenton e fotocatálise. Os autores demonstraram que reações com ŸOH provavelmente promovem também a remoção do átomo de flúor ligado ao C-6 das fluoroquinolonas avaliadas. Giraldo et al., 95 em seus estudos de degradação do ácido oxolínico por fotocatálise, relataram que o processo de hidroxilação das quinolonas deve ocorrer por reações do tipo photo-Kolbe, resultando na substituição do grupo carboxila (COOH) ligado ao C-3 por um próton ou uma hidroxila. Sirtori et al.,63,103 An et al.,97 Rodrigues-Silva et al.,106-107 Sturini et al.,129 e Vasquez et al.85 propuseram que as quinolonas ácido nalidíxico, ciprofloxacina, danofloxacina, ofloxacina e flumequina perdem o grupo carboxila (COOH) durante reações com o radical hidroxila pelos processos foto-Fenton,63,103,105 e fotocatálise.85,97,106,129

Liu et al.133 propuseram que, durante a ozonização, a principal rota de degradação da ciprofloxacina, norfloxacina e lomefloxacina ocorre na região alcalina (N-1 e/ou anel piperazínico) dessas fluoroquinolonas. Pretali et al.128 concluíram que, quando soluções de marbofloxacina são submetidas à radiação ultravioleta, o caminho de degradação inicia-se com reações no anel piperazínico, corroborando com o trabalho de Kusari et al.,66 os quais avaliaram os produtos da degradação da sarafloxacina por fotólise.

 

TOXICIDADE E ATIVIDADE ANTIMICROBIANA RESIDUAL

Toxicidade

A reabsorção do efluente tratado pelo ambiente é uma peça importante para definir os ganhos com o processo aplicado. Os POA têm sido largamente empregados para o tratamento e remoção de contaminantes orgânicos e inorgânicos, assim como para aumentar a biodegradabilidade de efluentes. Entretanto, a oxidação incompleta de contaminantes pode resultar na formação de intermediários de degradação mais tóxicos do que o composto original. Por esse motivo, ensaios para o monitoramento da toxicidade são desejáveis, principalmente quando a total mineralização dos contaminantes não é atingida.112

A cloração, um dos processos mais comumente usados nas ETA, foi aplicada na degradação da levofloxacina por Najjar et al.59 Mesmo atingindo 93% de degradação da fluoroquinolona, houve uma aumento de 88% da toxicidade da solução, avaliada pela inibição da fluorescência da bactéria V. fischeri. O mesmo foi observado por Li et al.31 em soluções contendo enrofloxacina submetidas à fotólise: a inibição da fluorescência da bactéria V. fischeri aumentou de 26,5% para 67,2% em 60 min. Pode-se concluir, portanto, que o tratamento empregado para a degradação de contaminantes não resulta necessariamente na remoção e/ou diminuição da toxicidade da solução.

Klamerth et al.105 avaliaram a toxicidade aguda para V. fischeri de um efluente real contendo 15 contaminantes (inclusive flumequina e ofloxacina) e concluíram que, após a aplicação do processo foto-Fenton, apesar da concentração desses compostos ter diminuído, a toxicidade da solução aumentou. Por outro lado, Rodrigues-Silva et al.107 não observaram alteração na fluorescência da bactéria V. fischeri quando em contato com soluções aquosas de flumequina em água ultrapura submetidas ao processo foto-Fenton.

Segundo Backhaus et al.,48 a toxicidade de uma solução não pode ser atribuída apenas a um dos contaminantes presentes na solução. Devido aos diferentes mecanismos de ação biológica de cada composto presente na amostra, três tipos de efeitos na toxicidade podem ser verificados: sinérgico, antagônico e aditivo. Sinergismo e antagonismo podem ser definidos como o desvio da soma dos efeitos previstos para cada composto testado. Sinergismo e antagonismo significa que a combinação dos compostos resultou num efeito maior e menor, respectivamente, que o esperado. Quando é obtida apenas a soma de tais efeitos, o resultado pode ser definido como efeito aditivo. Do ponto de vista ambiental, ensaios biológicos são de fundamental importância para a avaliação da eficácia de um processo de degradação.

A toxicidade residual pode ser diferente em função do processo aplicado para a degradação dos contaminantes. Michael et al.114 avaliaram a toxicidade residual de soluções de ofloxacina submetidas aos processos foto-Fenton (radiação solar) e fotocatálise, utilizando o microcrustáceo Daphnia magna como organismo teste (48 h). Concluíram que a toxicidade da solução aumentou ao longo do tempo de reação (0 a 60 min) após a aplicação do processo foto-Fenton. Resultados opostos foram obtidos quando empregada a fotocatálise: a toxicidade da solução diminuiu. Essa diferença pode ser explicada pelos diferentes intermediários formados durante a aplicação desses dois POA.

Os ensaios de toxicidade agudos e crônicos fornecem uma informação rápida e preliminar da periculosidade que uma solução pode causar à biota. No entanto, nem sempre esses ensaios fornecem resultados devido à baixa concentração dos contaminantes no efluente e à baixa toxicidade das fluoroquinolonas. Em ensaios agudos utilizando Daphnia magna, vários trabalhos na literatura reportam que concentrações maiores que 10 mg L-1 causam algum efeito em 50% nos microcrustáceos.57,69,70

Atividade antimicrobiana

A atividade antimicrobiana das quinolonas está relacionada com a formação de ligações de hidrogênio entre os grupos aceptores (COOH, C=O e F) desses compostos com o DNA-girase das bactérias, resultando na inibição da duplicação dos micro-organismos. O DNA-girase é uma enzima que evita o emaranhamento da fita de DNA da bactéria durante e após sua duplicação. Ao inibir a atuação dessa enzima, ocorre uma síntese descontrolada de RNA mensageiro e de proteínas, determinando a morte das bactérias.134

Caso ocorram alterações nos sítios da molécula da quinolona, onde se formam as ligações de hidrogênio, espera-se que a atividade antimicrobiana diminua. As reações entre os radicais hidroxila e as quinolonas não são facilmente identificáveis, uma vez que o radical hidroxila não é seletivo, podendo entrar em contato com qualquer região da molécula alvo.

São raros os dados na literatura sobre a atividade antimicrobiana de soluções que foram submetidas a um POA.76-78,85,95,96,106,107,135 Destaca-se que essa avaliação é de fundamental importância, uma vez que, mesmo o composto sendo altamente degradado, os intermediários formados podem apresentar atividade biológica. Com os ensaios de atividade antimicrobiana, é possível prever possíveis impactos no meio ambiente.

Nos trabalhos de Mansilla et al.,76 Palominos et al.77 e Giraldo et al.,95 a atividade antimicrobiana foi avaliada baseando-se na medida do halo de inibição formado no filme de ágar de uma placa de Petri inoculada com a bactéria E. coli. Porém, os resultados desses estudos podem ser considerados apenas qualitativos ou semi-quantitativos para a avaliação da atividade antimicrobiana residual de uma solução, visto que essa avaliação não ocorre pela contagem do número de bactérias presentes na solução.

Dodd et al.,135 Paul et al.,96 da Silva et al.78 e Rodrigues-Silva et al.106-107 avaliaram a atividade antimicrobiana residual de soluções de quinolonas submetidas aos POA por ensaios de inibição do crescimento da bactéria Escherichia coli. As soluções iniciais e as soluções submetidas aos processos de degradação foram serialmente diluídas e expostas a uma concentração definida de micro-organismos. Nesses estudos, os autores concluíram que a atividade antimicrobiana da solução decaiu conforme a quinolona foi degradada. É importante salientar ainda que esses estudos foram realizados apenas para ciprofloxacina, enrofloxacina e flumequina e em água ultrapura.

É possível que a desativação da atividade antimicrobiana ocorra mesmo quando não seja alcançada a total mineralização do composto alvo presente na solução. No trabalho de Paul et al.,96 a atividade antimicrobiana da solução de ciprofloxacina foi reduzida após a mesma ser submetida ao processo de fotocatálise, mesmo quando o núcleo da quinolona permaneceu intacto. Portanto, podem ser considerados eficientes os tratamentos que desativem a atividade biológica ou que modifiquem a estrutura dos antimicrobianos.96

Da Silva et al.78 avaliaram a remoção da atividade antimicrobiana de uma solução de flumequina submetida aos processos de H2O2, UV254nm e UV/H2O2. O processo oxidativo avançado foi capaz de remover totalmente a atividade antimicrobiana da solução em apenas 30 min, enquanto que para a fotólise, foram necessários 60 min de ensaio. Os ensaios com H2O2 não resultaram na diminuição da atividade antimicrobiana da solução. Rodrigues-Silva et al.107 observaram que o processo foto-Fenton foi eficaz na remoção da atividade antimicrobiana da solução: em apenas 15 min, a mesma foi completamente removida. Similar eficiência foi atingida utilizando o processo de fotocatálise com TiO2 em suspensão.106 Além disso, Rodrigues-Silva et al.107 constataram que os produtos formados deveriam apresentar baixa atividade antimicrobiana devido às modificações no sítio de ligação com o DNA-girase. Esses estudos demonstraram a eficácia dos POA na desativação da atividade antimicrobiana de soluções contendo flumequina.

 

CONCLUSÕES

Os métodos analíticos de detecção disponíveis permitem a quantificaçao,, , das quinolonas em matrizes aquosas na ordem de µg L-1 a ng L-1. Os processos convencionais de tratamento de águas e efluentes não são completamente eficientes na degradação desses compostos. Destaca-se a presença desses contaminantes emergentes na ordem de ng L-1 em água destinada ao abastecimento público.

Vários processos oxidativos avançados foram avaliados e mostraram ser eficientes na degradação das quinolonas. No entanto, muitos trabalhos ainda utilizam uma concentração inicial do analito bastante alta (ordem de mg L-1), quando comparada com a concentração encontrada nas matrizes aquosas ambientais (ordem de µg L-1 a ng L-1).

Apenas alguns trabalhos publicados abordaram ensaios ecotoxicológicos. Nesses trabalhos, a toxicidade residual das soluções foi avaliada utilizando apenas um organismo teste. A toxicidade das quinolonas pode ser considerada baixa para a maioria dos organismos utilizados, tornando também de fundamental importância a avaliação da atividade biológica das soluções submetidas aos processos de degradação, ou seja, no caso das quinolonas, da atividade antimicrobiana.

Finalmente, é importante destacar que há uma carência de estudos relacionados à degradação de quinolonas em baixas concentrações, principalmente aqueles que contemplam a avaliação da redução da concentração do fármaco, da toxicidade, da atividade antimicrobiana residual e a identificação dos intermediários e produtos de degradação, tópicos esses de fundamental importância para elucidação de problemas ambientais envolvendo micropoluentes.

 

AGRADECIMENTOS

À FAPESP pelo apoio financeiro (2008/06470-0) e pela bolsa concedida a M.G. Maniero (2013/07817-2), à CAPES pela bolsa concedida a C. Rodrigues-Silva e ao CNPq pela bolsa concedida a M.S. Peres.

 

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