JBCS



15:14, qui nov 21

Acesso Aberto/TP




Artigo


Determinação voltamétrica de amitriptilina em formulações farmacêuticas com eletrodo de diamante dopado com boro explorando medidas em meio Ácido
Voltammetric determination of amitriptyline in pharmaceutical formulation with boron-doped diamond electrode exploiting measures in acid medium

Eduardo Henrique DuarteI; Felipe Augusto GorlaI; Elen Romao SartoriI; César Ricardo Teixeira TarleyI,II,*

IDepartamento de Química, Centro de Ciências Exatas, Universidade Estadual de Londrina, Rodovia Celso Garcia Cid, PR 445 Km 380, 86050-482 Londrina - PR, Brasil
IIInstituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Bioanalítica, Departamento de Química Analítica, Instituto de Química, Universidade Estadual de Campinas, Cidade Universitária Zeferino Vaz s/n, 13083-970 Campinas - SP, Brasil

Recebido em 09/04/2014
Aceito em 25/06/2014
Publicado na web em 11/08/2014

Endereço para correspondência

*e-mail: ctarleyquim@yahoo.com.br

 

RESUMO

A simple and reliable voltammetric method is presented for the determination of amitriptyline using a boron-doped diamond electrode in 0.1 mol L-1 sulfuric acid solution as the support electrolyte. Under optimized differential pulse voltammetry conditions (modulation time 5 ms, scan rate 70 mV s-1, and pulse amplitude 120 mV), the electrode provides linear responses to amitriptyline in the concentration range 1.05 to 92.60 µmol L-1 and at a detection limit of 0.52 µmol L-1. The proposed method was successfully applied in pharmaceutical formulations, with results similar to those obtained using UV-vis spectrophotometric method as reference (at 95% confidence level), as recommended by the Brazilian Pharmacopoeia.

Palavras-chave: differential pulse voltammetry; quality control; BDDE; tricyclic antidepressant.

INTRODUÇÃO

A amitriptilina (AMT) faz parte dos grupos de antidepressivos tricíclicos (ADTs), nome este que provém da sua estrutura molecular, na qual apresenta três anéis característicos interligados, e a partir do anel central tem-se uma cadeia lateral de três átomos de carbono com um grupo amina terminal (Figura 1). É um fármaco amplamente usado em casos de depressão,1,2 sendo que em doses inferiores a 50 mg por dia pode ser empregado como analgésico, já que este fármaco foi primeiramente prescrito para casos de analgesia e não como antidepressivo. Doses excessivas de AMT podem ser nocivas à saúde provocando confusão mental, alucinações visuais transitórias, rigidez muscular, hipotermia e sonolência.3 Dessa forma, é importante o monitoramento de AMT em formulações farmacêuticas, com a finalidade de garantir a qualidade dos medicamentos liberados para consumo da população.

 


Figura 1. Estrutura química da amitriptilina

 

Os métodos oficiais descritos pela Farmacopéia Americana para a determinação de AMT empregam a cromatografia líquida de alta eficiência ou a titulação com ácido perclórico.3,4 Já a Farmacopéia Brasileira descreve o método espectrofotométrico na região do visível para a dosagem de AMT em formulações farmacêuticas.5

Outros métodos espectrofotométricos também foram desenvolvidos para a quantificação de antidepressivos tricíclicos. No trabalho de Misiuk,6 foi utilizado o metavanadato de amônio como agente oxidante para determinação de imipramina e desipramina, sendo aplicado em amostras de fármacos comerciais. Em outro trabalho, utilizando a espectrofotometria, descreve-se a determinação de trazodona, amineptina e AMT em formulações farmacêuticas de diferentes procedências. Neste trabalho, a estratégia utilizada foi a metodologia de transferência de carga da reação entre esse antidepressivos (doadores de elétrons) e o reagente 7,7,8,8-tetracianoquinodimetano (receptor de elétrons), formando um complexo de cor verde intensa, no qual foi medido em um comprimento de onda de 842 nm.7

A quimiluminescência também foi empregada para a quantificação de AMT e de outros antidepressivos tricíclicos (doxepina, nortriptilina, promazina, clorpromazina, imipramina, clomipramina, desipramina, protriptilina e trimipramina).8 Os mecanismos de reação desta técnica são baseados na reação entre o tris-(2,2-bipiridil) rutênio (II) [Ru(bpy)32+] e a amina terciária do grupo dos antidepressivos. No entanto, apenas para a doxepina foi desenvolvido um procedimento analítico e aplicado em amostras farmacêuticas. Em outro trabalho, é descrito um método condutométrico para a determinação de AMT, dotiepina e tranilcipromina, obtendo-se boa recuperação quando aplicados em formulações farmacêuticas de diferentes procedências (comprimidos).9

Ainda, pode ser constatada na literatura a determinação de AMT empregando análise por injeção em fluxo (FIA) com detecção potenciométrica,10 utilizando um eletrodo indicador de íon seletivo construído a partir da formação de filmes de AMT e ácido fosfomolíbdico ou AMT e ácido fosfotúngstico em cloreto de polivinila (PVC). Em outra determinação de AMT foi utilizada a turbidimetria em sistema FIA, empregando o surfactante aniônico lauril sulfato de sódio, que confere a formação do par iônico AMT-surfactante, sob medidas no comprimento de onda de 410 nm.3 Também tem sido reportada na literatura a determinação de seis antidepressivos tricíclicos por cromatografia líquida de alta eficiência acoplado ao sistema FIA com detecção eletroquímica, utilizando um eletrodo de diamante dopado com boro.11 Neste trabalho, apenas os antidepressivos desipramina e imipramina foram determinados em amostras reais de plasma sanguíneo, obtendo-se recuperações de 92,3% e 90,8%, respectivamente.

Alguns métodos voltamétricos também foram desenvolvidos para a determinação de AMT.12-15 Toledo et al.12 realizaram um estudo eletroquímico e químico-quântico da AMT sobre um eletrodo de trabalho de pasta de grafite modificado com poliuretana. Os autores observaram que a oxidação irreversível de AMT ocorre em potencial de 830 mV vs Ag/AgCl, sendo a reação controlada pela adsorção do reagente e produto no eletrodo.

Ferancová et al.13 propuseram o desenvolvimento de um sensor de carbono impresso modificado com β-ciclodextrina (β-CDP) e carboximetilado-β-ciclodextrina (β-CDPA) para a determinação de AMT. Nesse trabalho, empregou-se pré-concentração da AMT na superfície do eletrodo, seguido da determinação por voltametria de pulso diferencial. O filme modificador β-CDPA apresentou um melhor desempenho quando comparado com o β-CDP. Biryol et al.14 utilizaram um eletrodo de pasta de carbono modificado com poli (N-vinilimidazol) para a determinação de imipramina e AMT em formulações farmacêuticas. Neste estudo foi observado que a presença do modificador na pasta de carbono fornece um ganho de intensidade de sinal analítico em relação ao eletrodo sem modificação. As análises foram realizadas em solução de H2SO4 0,1 mol L-1, com uma linearidade de 1,0 × 10-5 a 1,0 × 10-4 mol L-1 por voltametria cíclica a 100 mV s-1, sendo aplicado na determinação de AMT em produtos farmacêuticos. Recentemente, um sensor eletroquímico baseado no compósito grafite/SiO2/Al2O3/Nb2O5/DNA foi desenvolvido para determinação voltamétrica de AMT em formulação farmacêutica obtendo um limite de detecção de 0,12 µmol L-1.15

Cabe salientar que, apesar das vantagens inerentes dos métodos voltamétricos referentes à simplicidade, baixo custo e sensibilidade, todos os métodos supracitados necessitam de prévia modificação de eletrodos base (grafite ou carbono impresso) para viabilizar a determinação de AMT devido à baixa eletroatividade deste fármaco. Adicionalmente, a aplicabilidade destes métodos em formulações farmacêuticas tem sido restrita àqueles trabalhos reportados por Biryol et al.14 e Marco et al.,15 revelando que estudos concernentes ao desenvolvimento, aplicação e validação de métodos voltamétricos voltados à determinação de AMT ainda são incipientes.

Em vista disso, neste presente trabalho foi desenvolvida uma metodologia eletroanalítica por voltametria de pulso diferencial (VPD) utilizando um eletrodo de diamante dopado com boro (EDDB) para a determinação do antidepressivo tricíclico AMT em amostras farmacêuticas explorando medidas em meio ácido (H2SO4 0,1 mol L-1). O EDDB tem-se mostrado adequado nas análises de amostras ambientais, biológicas e, principalmente, farmacêuticas16-18 devido às suas características mecânicas serem superiores a outros eletrodos convencionais. Este eletrodo permite trabalhar em ampla faixa de potencial em meio aquoso (-1,5 a +3,0 V vs Ag/AgCl), diminuindo correntes residuais ou de fundo, resultando numa excelente razão sinal/ruído, além de melhorar a reprodutibilidade eletroquímica.19-22 Destaca-se, ainda, a simplicidade na quantificação de AMT em formulações farmacêuticas, uma vez que o EDDB não necessita de alguma modificação.

 

PARTE EXPERIMENTAL

Reagentes e soluções

O cloridrato de amitriptilina (> 98%, Sigma-Aldrich, Itália), utilizado sem prévia purificação, e o ácido sulfúrico (Merck, 95-97%) foram preparados com água deionizada obtida a partir de um sistema de purificação Milli-Q (Millipore, Brasil) com resistividade superior a 18 MΩ cm. As amostras farmacêuticas (comprimidos) foram adquiridas em farmácias locais. As quantidades declaradas de AMT por comprimido, de acordo com o fabricante foram: 25 mg para as marcas Medley®, EMS®, Teuto®, Eurofarma® e 75 mg para Amytril®. A solução tampão de fosfato 0,1 mol L-1 foi preparada a partir da dissolução de sal monossódico de fosfato e ajustado o pH para os valores desejados com 1,0 mol L-1 de HCl. As soluções estoques de AMT foram preparadas em ácido sulfúrico 0,1 mol L-1.

Instrumentação

As medidas eletroquímicas foram realizadas em um potenciostato/galvanostato da Echo Chemie (PGSTAT101) em uma célula convencional de três eletrodos. O eletrodo de referência foi Ag/AgCl (KCl 3,0 mol L-1), um espiral de fio de platina como eletrodo auxiliar e como eletrodo de trabalho o EDDB (8000 ppm de boro, área exposta de 0,24 cm2; produzido pela Adamant, Suíça). Para o preparo das amostras foi utilizado banho de ultrassom UltraCleanear 1400 (UNIQUE).

No início de cada dia de trabalho foi realizado o pré-tratamento do EDDB em uma solução de H2SO4 0,5 mol L-1. Para o pré-tratamento anódico foi aplicado +0,5 A cm-2 durante 30s e para o pré-tratamento catódico -0,5 A cm-2 durante 120s. Essas medidas foram realizadas em um potenciostato/galvanostato MQPG-01 (Microquímica).

Para as medidas espectrofotométricas foi utilizado um espectrofotômetro Perkin-Elmer do modelo Lambda 25A, utilizando uma cubeta de 1 cm de caminho óptico, num comprimento de onda de 239 nm.

Preparo das formulações farmacêuticas

Para a aplicação do método proposto foram empregadas cinco amostras farmacêuticas comerciais nomeadas de I para a amostra contendo 75 mg de AMT por comprimido e de II a V para a amostra contendo 25 mg de AMT. Dez comprimidos de cada embalagem foram moídos até obtenção de pó fino. Uma quantidade apropriada do comprimido pulverizado foi misturada com 10,0 mL de ácido sulfúrico 0,5 mol L-1. A mistura foi posteriormente agitada por 10 min e filtrada usando papel qualitativo.3 A solução foi transferida para um balão volumétrico de 25,0 mL cujo volume foi aferido com ácido sulfúrico 0,5 mol L-1. Uma alíquota de 0,10 mL da solução foi transferida para a célula eletroquímica contendo 9,90 mL de ácido sulfúrico 0,101 mol L-1 e submetida a análise pelo sistema eletroquímico com parâmetros otimizados da VPD.

Para as medidas espectrofotométricas, 10 mg provenientes de vinte comprimidos pulverizados foram misturados com 75,0 mL de ácido clorídrico 0,1 mol L-1 em balão volumétrico de 100,0 mL. A mistura foi manualmente agitada e sonicada em tempos iguais de 15 min. Após esta etapa o volume do balão volumétrico foi aferido com ácido clorídrico 0,1 mol L-1. A suspensão foi filtrada em papel qualitativo e 5,0 mL do filtrado foram transferidos para um balão de 50,0 mL, cujo volume foi aferido com ácido clorídrico 0,1 mol L-1. As absorbâncias das soluções foram obtidas em comprimento de onda de 239 nm e brancos analíticos foram utilizados a fim de identificar possíveis erros sistemáticos.5

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Estudo eletroquímico de AMT

Na literatura é relatado que a utilização de ácido sulfúrico facilita a oxidação da AMT, resultando na formação de um cátion radicalar.23 Tendo em vista esta informação, as medidas voltamétricas para a AMT foram inicialmente realizadas em solução de H2SO4 0,1 mol L-1. A Figura 2A mostra o perfil voltamétrico da oxidação eletroquímica da AMT 0,222 mmol L-1 em uma solução de H2SO4 0,1 mol L-1 sobre o EDDB pré-tratado catodicamente. Como pode ser observado, a AMT apresenta um pico de oxidação bem definido em torno de 1,35 V, sem a presença de algum pico de redução, mostrando que o processo para este sistema é irreversível. O desempenho eletroanalítico do EDDB na oxidação da AMT foi comparado com o desempenho de um eletrodo de carbono vítreo comercial (ECV), como mostra a Figura 2B. Ficou claro neste experimento que a utilização do EDDB é vantajosa em relação ao ECV, uma vez que, neste eletrodo, a corrente capacitiva observada foi substancialmente grande, prejudicando a resolução do pico de oxidação da AMT. Este comportamento é explicado pelo elevado potencial utilizado.

 


Figura 2. (A) Voltamogramas cíclicos obtidos empregando EDDB pré-tratado catodicamente: (a) H2SO40,1 mol L-1e (b) AMT 0,222 mmol L-1, velocidade de varredura 50 mV s-1. (B) Voltamogramas cíclicos empregando EDDB pré-tratado catodicamente e ECV: AMT 0,222 mmol L-1, velocidade de varredura 50 mV s-1

 

Em seguida, o efeito do pré-tratamento do EDDB na presença de AMT foi investigado, uma vez que o desempenho eletroquímico deste eletrodo é dependente de sua terminação superficial (oxigênio ou hidrogênio).24

Na Figura 3 são mostrados os voltamogramas cíclicos para a AMT obtidos com o EDDB, com pré-tratamento anódico e com o pré-tratamento catódico. Observou-se que a superfície terminada em hidrogênio apresentou um perfil voltamétrico mais bem definido, com menor potencial de oxidação e também maior repetibilidade entre as medidas, selecionando-o para a determinação de AMT. A terminação superficial do EDDB, bem como seu pré-tratamento já foi investigada na literatura. Suffredini et al.24 relataram que o pré-tratamento catódico diminui o limite de detecção eletroanalítico para moléculas orgânicas, além de garantir resultados confiáveis e reprodutíveis.25 Essas condições para o eletrodo de BDD são relatadas em recentes trabalhos para quantificações de moléculas orgânicas em formulações farmacêuticas, como a determinação simultânea de paracetamol, cafeína e orfenadrina,16 captopril,26 albendazol,27 bezafibrato,28 entre outros.

 


Figura 3. Voltamogramas cíclicos obtidos empregando EDDB com diferentes pré-tratamentos: (a) pré-tratamento anódico e (b) pré-tratamento catódico em AMT 0,222 mmol L-1, H2SO4 0,1 mol L-1, velocidade de varredura de 50 mV s-1

 

O tempo de duração do pré-tratamento catódico aplicado ao eletrodo também foi investigado em 120, 150 e 180 s. Nesse estudo, verificou-se que o tempo de 120 s garante melhor resposta tanto em termos de definição de perfil voltamétrico como de repetibilidade entre as medidas para a determinação de AMT. Este pré-tratamento foi realizado uma vez no dia, antes de iniciar as medidas voltamétricas, sendo precedido pelo pré-tratamento anódico, para garantir a limpeza da superfície do eletrodo e estabilidade entre as medidas. Cabe enfatizar que com o emprego deste eletrodo não houve necessidade de limpeza ou renovação da superfície entre as medidas, realizando-se várias medidas ao longo do dia de trabalho, sem a necessidade de realizar um novo pré-tratamento, garantindo simplicidade no desenvolvimento da metodologia analítica.

Empregando o voltamograma obtido para a AMT em solução de ácido sulfúrico (Figura 2A) e a equação Ep - Ep/2 = 47,7/αn,29 na qual Ep e Ep/2 é o potencial de oxidação e o potencial de meia onda, respectivamente, α é o coeficiente de transferência (0,5 para sistemas irreversíveis)30 e n é o número de elétrons transferidos, calculou-se o número de elétrons transferidos no processo de oxidação da AMT sobre o EDDB pré-tratado catodicamente. Sendo Ep = 1,35 V e Ep/2 = 1,25 V, n foi calculado como 0,954, indicando que a oxidação da AMT envolve um elétron. O mecanismo proposto de oxidação para a AMT é apresentado na Figura 4, no qual há perda de um elétron na oxidação do átomo de nitrogênio do grupo amina, resultando na formação de um cátion radical, facilitado pelo ácido sulfúrico, que é conhecido por ser um agente oxidante capaz de gerar cátions radicalares de trialquilaminas.23 É importante mencionar que o mecanismo proposto também tem sido reportado para oxidação eletroquímica de aminas alifáticas.31 Os resultados relativos ao efeito do pH no processo de oxidação da AMT, que serão mostrados posteriormente, também darão suporte a este tipo de mecanismo proposto.

 


Figura 4. Mecanismo proposto para eletro-oxidação de AMT em solução de ácido sulfúrico com EDDB pré-tratado catodicamente

 

Estudo do efeito da concentração e tipo de eletrólito suporte

Inicialmente, investigou-se o efeito da influência da concentração do ácido sulfúrico na determinação de AMT. De acordo com os voltamogramas cíclicos mostrados na Figura 5A, observa-se diminuição da corrente de oxidação da AMT com o decréscimo da concentração do H2SO4, bem como deslocamento dos potenciais de oxidação da AMT para valores mais positivos. Em solução de ácido sulfúrico 0,1 mol L-1 obteve-se maior intensidade de corrente e menor potencial, selecionando-o para os estudos posteriores. Estes resultados apresentados indicam que pode ocorrer interação eletrostática do fármaco carregado positivamente em meio ácido (pKa 9,4) com o sulfato adsorvido sobre a superfície do eletrodo pré-tratado catodicamente, sobretudo em meio ácido mais concentrado, facilitando o processo de transferência de elétron.

 


Figura 5. Voltamogramas cíclicos obtidos empregando EDDB pré-tratado catodicamente em solução de AMT 0,222 mmol L-1 (A) em diferentes concentrações de ácido sulfúrico: (a) 0,0001 mol L-1, (b) 0,001 mol L-1, (c) 0,01 mol L-1, (d) 0,1 mol L-1. (B) Influência do pH na determinação de AMT (a) H2SO4 0,1 mol L-1, (b) HNO30,1 mol L-1 (c)pH 4,0, (d) pH 5,0, (e) pH 6,0, (f) pH 7,0 em solução de tampão fosfato 0,1 mol L-1

 

A resposta voltamétrica obtida para a oxidação da AMT em solução de ácido sulfúrico 0,1 mol L-1 também foi comparada com àquelas obtidas em solução de tampão fosfato 0,1 mol L-1 em diferentes valores de pH e em ácido nítrico 0,1 mol L-1 (Figura 5B). Pode-se observar que, com o aumento do pH, há deslocamento dos potenciais de oxidação para valores mais positivos e uma diminuição da intensidade da corrente, sendo que em pH 7,0 não se observa pico de oxidação. Estes resultados corroboram o mecanismo proposto com a perda de um elétron e a formação de um cátion radicalar, mas diferem do mecanismo proposto por Toledo et al.,12 no qual ocorre a perda de um elétron do átomo C16 da cadeia alifática da molécula e a saída de um próton do átomo C17, com maior densidade de carga negativa. Esta diferença nos mecanismos pode ser atribuída, conforme já mencionado, ao efeito do ácido sulfúrico no meio que facilita a oxidação da AMT protonada. Em relação ao ácido nítrico observou-se que o potencial de oxidação da AMT foi próximo às medidas realizadas em ácido sulfúrico, no entanto, com magnitude de corrente inferior. Assim sendo, adotou-se para os posteriores estudos a solução de ácido sulfúrico 0,1 mol L-1 como eletrólito suporte.

Influência da velocidade de varredura no processo de oxidação da AMT

O estudo da velocidade de varredura foi utilizado para identificar se o transporte de massa é realizado por processo de difusão ou de adsorção da AMT na superfície do EDDB pré-tratado catodicamente. Na Figura 6A são apresentados os voltamogramas de AMT 0,222 mmol L-1 em diferentes velocidades de varredura (30 a 310 mV s-1). Constata-se que o potencial de oxidação da AMT desloca para valores mais positivos com o aumento da velocidade de varredura, indicando características de um processo irreversível. Pode-se observar também que a intensidade de pico anódico varia linearmente com a raiz quadrada da velocidade de varredura (inserido na Figura 6A), descrita pela equação Ipa = -5,9 × 10-7 + 4,7 × 10-5 v1/2 (r = 0,996), indicando que o processo de oxidação é controlado por difusão das espécies à superfície do EDDB. Para confirmar o processo de difusão, pode-se observar na Figura 6B a dependência linear do logaritmo da intensidade de corrente anódica pelo logaritmo da velocidade de varredura, com um coeficiente angular de 0,53, um valor muito próximo do estimado pela literatura (0,50) para sistemas controlados por difusão.32

 


Figura 6. (A) Voltamogramas cíclicos obtidos empregando EDDB pré-tratado catodicamente em solução de H2SO4 0,1 mol L-1 contendo AMT 0,222 mmol L-1 em diferentes velocidades de varredura, de 30 a 310 mV s-1. Inserido: dependência da linear da corrente anódica com v1/2. (B) Dependência do log da corrente anódica com log n para AMT

 

O coeficiente de difusão da AMT foi determinado experimentalmente, empregando-se a cronoamperometria, em um tempo de 60 s e potencial de 1,35 V, variando-se a concentração de AMT de 25,2 a 198 µmol L-1 (Figura 7A). Para esse cálculo foi utilizada a equação de Cottrell (Eq. 1)29

 

 

 


Figura 7. (A) Cronoamperograma de Ipa (µA) vs tempo (s) empregando EDDB pré-tratado catodicamente em solução de H2SO4 0,1 mol L-1 contendo AMT em diferentes concentrações (25,2 µmol L-1 a 198,2 µmol L-1); t =60s e Ea = 1,35 V. (B) Correlação de Ipa (µA) vs t-1/2 obtidos dos cronoamperogramas variando concentrações de 25,2 µmol L-1 a 198,2 µmol L-1de AMT

 

na qual n (número de elétrons) = 1 (calculado anteriormente), F é a constante de Faraday (96500 C), A é a área efetiva do eletrodo (0,085 cm2), Do é o coeficiente de difusão (cm2 s-1) e Co é a concentração (mol cm-3). Foram construídos gráficos de I (µA) vs t-1/2 (s-1/2) para as diferentes concentrações de AMT (Figura 7B), cujo coeficiente angular de cada equação de reta foi utilizado para o cálculo do coeficiente de difusão, encontrando-se coeficiente de difusão médio para AMT de 4,14 × 10-5 cm2 s-1.

Escolha da técnica analítica e validação do método proposto para determinação de AMT

Para a determinação de AMT foram empregadas as técnicas de voltametria de pulso diferencial (VPD) e voltametria de onda quadrada (VOQ). A influência dos parâmetros da VPD sobre a intensidade de corrente e potencial de oxidação da AMT foi investigada, sendo eles, o tempo de modulação (t): 5 - 95 ms, a velocidade de varredura (v): 20 - 130 mV s-1 e a amplitude de pulso (a): 30 - 130 mV. Os valores selecionados foram: t = 5 ms, v = 70 mV s-1 e a = 120 mV. Para a VOQ, os parâmetros e respectivas faixas de investigadas foram: frequência (f): 10 - 200 Hz, amplitude (a): 10 - 100 mV e incremento de varredura (∆E): 1 - 7 mV. Os valores selecionados foram: f = 120 Hz, a = 40 mV e ∆E = 4 mV. Esses estudos foram realizados em solução de H2SO4 0,1 mol L-1 contendo AMT 30 µmol L-1.

Os parâmetros experimentais otimizados foram utilizados para a construção das curvas analíticas utilizando o EDDB pré-tratado catodicamente. Os resultados do desempenho analítico para ambas as técnicas VPD e VOQ estão reunidos na Tabela 1. Nota-se que os melhores resultados em termos de sensibilidade e limite de detecção foram obtidos empregando a VPD, justificando a escolha desta técnica para determinação de AMT.

 

 

A Figura 8A apresenta os voltamogramas de pulso diferencial obtidos por sucessivas adições de AMT a solução de H2SO4 0,1 mol L-1. Observa-se linearidade na faixa de concentração de 1,05 a 92,60 µmol L-1, descrita pela equação Ipa = 0,57 c + 5,01 × 10-8 (r = 0,998), na qual Ipa é a corrente anódica em µmol L-1 e c a concentração de AMT (Figura 8B). Os valores calculados de limite de detecção (3 Sb/m) e limite de quantificação (10 Sb/m) foram 0,52 µmol L-1 e 1,75 µmol L-1 respectivamente, de acordo com as recomendações da IUPAC,33 na qual Sb é o desvio padrão de 10 leituras do branco e m é o coeficiente angular (sensibilidade) da curva de calibração. Os voltamogramas de onda quadrada também obtidos por adições sucessivas de AMT em H2SO4 0,1 mol L-1 são mostrados na Figura 8C. Para esta técnica, a faixa linear foi de 20 a 200 µmol L-1 com equação Ipa = 0,21 c - 8,85 × 10-7 (r = 0,998), como mostra a Figura 8D.

 


Figura 8. (A) Voltamograma de Pulso Diferencial empregando EDDB com pré-tratamento catódico em H2SO4 (0,1 mol L-1), variando a concentração de AMT em 1,05 µmol L-1 a 92,60 µmol L-1. Tempo de modulação 5 ms; Velocidade de varredura 70 mV s-1; Amplitude de pulso 120 mV. (B) Correlação de Ipa vs [AMT], LD de 0,52 µmol L-1(Sb/N = 3) (C) Voltamograma de Pulso Diferencial empregando EDDB com pré-tratamento catódico em H2SO4 (0,1 mol L-1), variando a concentração de AMT em 20,0 µmol L-1 a 200,0 µmol L-1. Frequência 120 Hz; Incremento de varredura 4 mV; Amplitude de pulso 40 mV. (D) Correlação de Ipa vs [AMT], LD de 12,4 µmol L-1(Sb/N = 3)

 

Na Tabela 2 estão reunidos alguns parâmetros analíticos obtidos a partir de métodos eletroanalíticos desenvolvidos para determinação de AMT. Em comparação com os referenciados, o método proposto apresenta satisfatório limite de detecção e simplicidade por não requerer modificação do eletrodo.

 

 

A precisão intra e inter-dia foi avaliada por meio de repetições de análises (n = 6), em solução de AMT de três diferentes concentrações, cujos valores encontram-se dentro da faixa linear da curva analítica, abrangendo valores baixos (5,2 µmol L-1), valores médios (48,5 µmol L-1) e valores altos (84,1 µmol L-1). A Tabela 3 apresenta os resultados obtidos da precisão intra-dia e inter-dia para todas essas concentrações. Verifica-se que o desvio padrão relativo para as medidas intra-dia variou de 0,25 até 0,86%, enquanto a precisão inter-dia obteve uma variação de 1,07 até 2,85%.

 

 

Os excipientes usualmente presentes nas formulações farmacêuticas (estereato de magnésio, fosfato de cálcio, dióxido de silício, talco, dióxido de titânio e lactose monoidratada) contendo como princípio ativo a AMT foram avaliados como possíveis interferentes. Nenhum dos excipientes avaliados apresentou eletroatividade no EDDB na janela de potencial de trabalho, mesmo em concentrações 3 vezes maiores que a AMT, revelando a seletividade do método para aplicação em formulação farmacêutica contendo AMT.

Aplicação do método em formulações farmacêuticas

O método proposto foi aplicado em cinco formulações farmacêuticas comercias de diferentes procedências (I a V). A Tabela 4 apresenta os resultados obtidos para as diferentes amostras empregando o método proposto em comparação ao método espectrofotométrico descrito pela Farmacopéia Brasileira. Os resultados obtidos entre os métodos foram comparados por meio do teste t pareado ao nível de confiança de 95%. O valor t calculado (2,67) foi menor que o valor tabelado (2,77), mostrando não haver diferenças entre o método proposto e o método de referência, o que confirma a exatidão da aplicação do método em formulações farmacêuticas visando à determinação de AMT.

 

 

CONCLUSÃO

A determinação de AMT utilizando EDDB com pré-tratamento catódico foi realizada com sucesso em amostras farmacêuticas e dosagens diferentes. Foi constatada ausência de eletroatividade de AMT no EDDB em pH 7,0 tampão fosfato. No entanto, com emprego de H2SO4 0,1 mol L-1 como eletrólito suporte, observou-se significativo aumento na corrente de pico anódico e descolamento do potencial de pico para valores menos positivos, confirmando o efeito do H2SO4 na eletro-oxidação da AMT. O método de VPD desenvolvido apresentou baixo limite de detecção de 0,52 µmol L-1, satisfatória precisão intra e inter-dia e maior simplicidade quando comparado a outros métodos eletroanalíticos desenvolvidos para determinação de AMT. Além disso, utilizando o EDDB não há necessidade de limpeza ou renovação da superfície eletródica.

 

REFERÊNCIAS

1. Lermer, H.; Avni, J.; Bruderman, I.; Eur. J. Pharmacol. 1971, 13, 266.

2. Ali, M. S.; Rub, M. A.; Khan, F.; Al-Lohedan, H. A.; Kabir-ud-Din.; J. Mol. Liq. 2012, 167, 115.

3. Silveira, G.; Tarley, C. R. T.; Quim. Nova 2008, 31, 1653.

4. The United States Pharmacopeia - The National Formulary - USP 24, NF - 19, 2000, p. 122-123.

5. Farmacopéia Brasileira, Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 5ª ed., Brasília, 2010, pp. 806.

6. Misiuk, W.; J. Pharm. Biomed. Anal. 2000, 22, 189.

7. Mohamed, G. G.; El-Dien, F. A. T. N.; Mohamed, N. A.; Spectrochim. Acta, Part A 2007, 68, 1244.

8. Greenway, G. M.; Dolman, S. J. L.; Analyst 1999, 124, 759.

9. Ghani, N. T. A.; El-Nashar, R.; Bioumy, A. A.; J. Pharm. Sci. 2004, 29, 195.

10. El-Nashar, R. M.; Ghani, N. T. A.; Bioumy, A. A.; Microchem. J. 2004, 78, 107.

11. Ivandini, T. A.; Sarada, B. V.; Terashima, C.; Rao, T. N.; Tryk, D. A.; Ishiguro, H.; Kubota, Y.; Fujishima, A.; J. Electroanal. Chem. 2002, 521, 117.

12. Toledo, R. A.; Mazo, L. H.; Santos, M. C.; Honório, K. M.; Silva, A. B. F.; Cavalheiro, E. T. G.; Quim. Nova 2005, 28, 456.

13. Ferancová, A.; Korgová, E.; Buzinkaiová, T.; Kutner, W.; Stepanek, I.; Ján Labuda, J.; Anal. Chim. Acta 2001, 447, 47.

14. Biryol, I.; Uslu, B.; Kuçukyavuz, Z.; J. Pharm. Biomed. Anal. 1996, 15, 371.

15. Marco, J. P.; Borges, K. B.; Tarley, C. R. T.; Ribeiro, E. S.; Pereira, A. C.; J. Electroanal. Chem. 2013, 704, 159.

16. Eisele, A. P. P.; Clausen, D. N.; Tarley, C. R. T.; Dall'Antonia, L. H.; Sartori, E. R.; Electroanalysis 2013, 25, 1734.

17. Lourencão, B. C.; Medeiros, R. A.; Rocha-Filho, R. C.; Mazo, L. H.; Fatibello-Filho, O.; Talanta 2009, 78, 748.

18. Santos, M. C. G.; Tarley, C. R. T; Dall'Antonia, L. H.; Sartori, E, R.; Sens. Actuators, B 2013, 188, 263.

19. Azevedo, A. F.; Ferreira, N. G.; Quim. Nova 2006, 1, 129.

20. Pleskov, Y. V.; Russ, J.; Electrochem. 2002, 38, 1275.

21. Compton, R. G.; Foord, J. S.; Marken, F.; Electroanalysis 2003, 15, 1349.

22. Swain, G. M.; Ramesham, R.; Anal. Chem. 1993, 65, 345.

23. Grigoryants, V. M.; Anisimov, O. A.; Molin, Y. N.; J. Struct. Chem. 1982, 23, 327.

24. Suffredini, H. B.; V.A. Pedrosa, V. A.; Codognoto, L.; Machado, S. A. S.; Rocha-Filho, R. C.; Avaca, L. A. Electrochim. Acta 2004, 49, 4021.

25. Salazar-Banda, G. R.; Andrade, L. S.; Nascente, P. A. P.; Pizani, P. S.; Rocha-Filho, R. C.; Avaca, L. A.; Electrochim. Acta 2006, 51, 4612.

26. Vitoreti, A. B. F.; Abrahão, O.; Gomes, R. A. S.; Salazar-Banda, G. R.; Oliveira, R. T. S.; Int. J. Electrochem. Sci. 2014, 9, 1044.

27. Lourenção, B. C.; Baccarin, M.; Medeiros, R. A.; Rocha-Filho, R. C, Fatibello-Filho, O.; J. Electroanal. Chem. 2013, 707, 15.

28. Ardila, J. A.; Sartori, E. R.; Rocha-Filho, R. C.; Fatibello-Filho, O.; Talanta 2013, 103, 201.

29. Bard, A. J.; Faulkner, L. R.; Electrochemical Methods: Fundamentals and Applications, 2nd ed., John Wiley & Sons: New York, 2001.

30. Li, C.; Colloids Surf. B 2007, 55, 77.

31. Jurva, U.; Wikström, H. V.; Weidolf, L.; Bruins, A. P.; Rapid Commun. Mass Spectrom. 2003, 17, 800.

32. Gosser, D. K.; Cyclic Voltammetry, VCH: New York 1994.

33. Long, G. L.; Winefordner, J. D.; Anal. Chem. 1983, 55, 712.

34. Duarte, E. H.; Santos, W. P.; Hudari, F. F.; Neto, J. L. B.; Sartori, E. R.; Dall'Antonia, L. H.; Pereira, A. C.; Tarley, C. R. T.; Talanta 2014, 127, 26.

On-line version ISSN 1678-7064 Printed version ISSN 0100-4042
Qu�mica Nova
Publica��es da Sociedade Brasileira de Qu�mica
Caixa Postal: 26037 05513-970 S�o Paulo - SP
Tel/Fax: +55.11.3032.2299/+55.11.3814.3602
Free access

GN1