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Thomé Rodrigues Sobral (1759-1829) e a virtude febrífuga de um grande número de quinas Thomé Rodrigues Sobral (1759-1829) and the febrifuge power of a great number of peruvian and brazilian barks |
António M. Amorim Costa*
Departamento de Química, Universidade de Coimbra, 3004-535 Coimbra, Portugal Recebido em 13/02/2015 *e-mail: acosta@ci.uc.pt In the beginning of the 19th century, Portugal received from Brazil several barks that were used as cure for fevers for the purpose of chemical analysis. These analyses were intended to determine the principle compositional components responsible for the febrifuge power of these barks. At the University of Coimbra, the samples were analyzed under the supervision of Thomé Rodrigues Sobral, the Director of the university's Chemical Laboratory. In the interpretation of the obtained results, Sobral put forward his own ideas about the febrifuge principles of the analyzed barks in relation to their chemical composition. Here, we refer to both Rodrigues Sobral's reported results and his ideas about the febrifuge principle. INTRODUÇÃO As quinas e a cura de estados febris Planta da família das rubiáceas, a quina é uma árvore nativa das áreas montanhosas da América Central e da América do Sul cujas folhas e as cascas, da raiz, dos ramos e do tronco eram utilizadas pelos nativos dessas regiões para preparar infusões destinadas a curar diversos males, sobretudo estados febris. Por esta utilização, tornou-se particularmente célebre a chamada quina do Perú, frequentemente conhecida por a árvore da saúde. O seu uso empírico pelos Incas na cura das febres foi mundialmente divulgado pela narrativa da Condessa De Genlis referindo a cura, em 1638, na localidade de Loxa, da Vice-Rainha do Perú, a Condessa de Cinchon, esposa do Vice-rei D. Gerónimo Fernandez Cabrera y Bobadilla, Conde de Cinchon, e igualmente a cura de sua escrava Zuma. A partir de então, verificou-se uma intensa importação desta quina de Loxa para Espanha, tão intensa que quase se assistiu à extinção da planta nessa região. Em 1760, o botânico espanhol J. C. Mutis descobriu a mesma árvore em Santa Fé de Bogotá, donde passou a ser exportada para a Europa, via Carthagena. Com origem na narrativa da Condessa De Genlis, essa quina tornou-se mundialmente conhecida por Cortex Peruvianum, Cinchona Officinalis, Cinchona Cordifolia, Cinchona Micranta, e Cinchona Succirubra (no Perú). E também, a Cinchona Calisaya (na Bolívia); a Cinchona Pubescens, a Cinchona Macrocarpa, etc.; e o extrato que dela se fazia para uso no ataque aos estados febris, tornou-se também conhecido como o pó dos Jesuitas (Pulvis Patrum), o pó da Condessa (Pulvis Comitissae), ou ainda o pó do Cardeal (Pulvis Cardinalis), na sequência da oferta que dele se fez, um dia, ao Cardeal de Lugo, etc. Foram longos os anos decorridos entre o uso que os Incas faziam da casca destas quinas para curar os estados febris, numa base puramente empírica, e os primeiros estudos científicos a que se procedeu na tentativa de compreender e caracterizar a origem da virtude febrífuga. Ao ser usada largamente na Europa, cedo se percebeu que as quinas provenientes de diferentes regiões não tinham todas igual eficácia nos efeitos curativos esperados das infusões que a partir delas se preparavam. A eficácia de algumas delas era mesmo muito baixa, e em alguns casos, praticamente nula. Foi já nos primeiros anos do século XIX que se procedeu às primeiras análises químicas de algumas das cascas de quinas importadas para uso em tratamentos médico-farmacêuticos antifebris. Maton, Seguin e A. Duncan Junior foram os primeiros investigadores que se dedicaram ao seu estudo químico.1,2 Procuraram determinar com a maior precisão que lhes foi possível quais as componentes químicas das quinas em análise e quais dessas componentes seriam as responsáveis, e como, pelas propriedades febrífugas e antimaláricas, tonificantes e cicatrizantes exibidas. Tratando algumas infusões de cascas de cinchona com tanino, Maton observou a formação de um precipitado insolúvel em água. Esta observação levou Seguin a concluir que tais cascas continham gelatina.3 A. Ducan discordou desta conclusão de Seguin, parecendo-lhe que este teria usado na sua análise cascas de quina cinchona adulteradas por má conservação ou qualquer outra causa. Procedendo ele próprio a igual análise, concluiu que "a cinchona não contém gelatina, mas sim um outro qualquer princípio ainda não inteiramente identificado com propriedades idênticas às da gelatina, responsável pela formação com o tanino de um precipitado insolúvel em água". Este precipitado insolúvel em água era solúvel em álcool, ao contrário da gelatina. Categórico, Ducan concluía: "os resultados observados parecem-me suficientes para provar a diferença existente entre a gelatina e o novo princípio existente na cinchona, ainda não devidamente identificado que por razões de conveniência, ouso denominar por cinchonino". Tratar-se-ia de um princípio "solúvel em água, mas sem qualquer tendência para gelatinizar. Solubilizado em água, não precipitava por tratamento com uma solução de carbonato de potassa. Tratava-se de um princípio solúvel em álcool que se combinava facilmente com o tanino. Solúvel em álcool, este composto forma, quando se lhe junta água, ou quando usado como um mênstruo, um precipitado amarelado, quebrantiço e opaco. Não era possível separar tal princípio, o cinchonino, duma solução aquosa de tanino, sendo, todavia, precipitável por utilização duma solução de gelatina".4 A existência nas cascas de cinchona deste princípio que Ducan designou cinchonino, em todos os trabalhos de investigação do autor sobre o assunto não chegou a passar de mera suspeição, pois nunca Ducan foi capaz de o isolar. Nos anos seguintes, Vauquelin (1763-1829) tentou fazê-lo, mas também o não conseguiu.5 Thomé Rodrigues Sobral e a análise química das quinas No Brazil, nomeadamente no Rio de Janeiro, para além do uso generalizado das cascas da quina peruviana do tipo da cinchona, usavam-se cascas de outras quinas locais cujas infusões exibiam propriedades similares.6,7,8 Na sua edição de Lisboa, em 1735, e depois na edição de 1760, impressa em Roma, a Farmacopea Tubalense refere com pormenor os usos médicos das cascas da planta Aristolochia Grandiflora, conhecida no Brazil pelo nome de Mil-homens, cujo pó era utilizado em grande escala como remédio contra as úlceras gangrenosas e contra as febres, muito eficaz contra a mordedura de cobras venenosas, suprindo em muitos casos a quina, sendo-lhe mesmo muito superior em grande número de situações. Bernardino António Gomes (1768-1823), médico naval de 1797 a 1810 e botanista com longas estadas do Brazil, nas suas Observações Botanico-Medicas sobre algumas plantas do Brazil,9 deu-lhe o crédito reconhecido. Reconhecidas as suas virtudes e sendo o seu preço nimiamente inferior ao da quina, podendo o Brazil fornecer quanto a Portugal fosse mister, impunha-se empregá-la com maior frequência nos usos médicos, e "fazer mais conhecido na Europa o préstimo desta planta". Neste sentido, a esposa de D. Rodrigo de Sousa Coutinho (1745-1812), Conde de Linhares e Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, então no Brazil, "no seu zelo do bem publico; e pelo seu amor à Patria" tomou a iniciativa de enviar alguns exemplares para Portugal para que fossem devidamente estudados e as suas virtudes terapêuticas devidamente caracterizadas cientificamente.10 De facto, ca. 1804, o Governo Português recebeu do Brazil um conjunto de várias e diferentes amostras de cascas de quinas consideradas de grande importância para o tratamento hospitalar de estados febris e como substitutos possíveis das infusões preparadas a partir da casca da quina peruviana dita dos jesuítas. A própria Corte empenhou-se no seu estudo e análise. O Princípe Regente, por carta Régia de 22 de setembro de 1804, ordenou ao Physico-Mor do Reino, o Dr. Francisco Tavares, que mandasse proceder em todos os Hospitais, aos necessários exames e averiguações sobre as Cascas amargas Brazilienses, afim de se conhecer se a sua virtude era ou não igual à da Quina do Perú. A 2 de novembro desse ano, cumprindo a ordem régia, dirigindo-se a todos os Hospitais e outras Instiuições capazes de o fazer determinava que eles se envolvessem nesse projeto e dessem o devido andamento ao pedido de Sua Magestade. As amostras recebidas foram distribuídas e mandadas para os Hospitais e Laboratórios Químicos de Lisboa e de Coimbra para ensaios clínicos e químicos para que fosse considerado o seu interesse farmacêutico. Em Lisboa, por indicação da própria Academia Real das Ciências, as mostras recebidas foram distribuídas por três grupos diferentes, um chefiado pelo Doutor Bernardino António Gomes, o já acima referido médico naval; outro chefiado por José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838); e o terceiro da responsabilidade do Secretário da Academia, o Dr. Alexandre António Vandelli (1784-1862), filho de Domingos Vandelli. Usando o Laboratório Químico da Casa da Moeda, Bernardino António Gomes procedeu à análise química que lhe foi pedida e apresentou os resultados na própria Academia Real das Ciências de Lisboa, em 18 de julho de 1811 e publicou-os de imediato com as conclusões que deles tirava no Edinburgh Meddical & Surgical.11 Os resultados dos outros dois grupos seriam apresentados na Academia alguns meses mais tarde e só seriam publicados nas Memórias da mesma alguns anos depois. Os resultados da análise efetuada sob a responsabilidade de José Bonifácio de Andrada e Silva foram tornados publicos só em 181412 e os da responsabilidade de Alexandre António Vandelli só em 1818.13 Retomando a suposição de Ducan, com os resultados das amostras das quinas que efetuou, Bernardino António Gomes defendeu não só que nelas havia de facto, um princípio responsável pelas suas virtudes febrífugas, o cinchonino, como se reclamava tê-lo isolado. Esta sua posição tornou-se pomo de acesa discórdia com o médico responsável do Hospital de Coimbra e Diretor do Jornal de Coimbra, o Doutor José Feliciano de Castilho (1770-1827), discórdia esta que redundou em avinagrada controvérsia que se prolongou por vários anos: J. Feliciano de Castilho não só discordava da interpretação que Bernardino António Gomes fazia dos resultados da análise química feita, como punha em causa a fiabilidade dos mesmos, indo ao ponto de considerar que Bernardino António Gomes não possuia habilitações bastantes para fazer uma análise química credível, e que o escasso tempo de que dispusera para a fazer não podia ser o bastante que um tão complexo procedimento químico exigiria.14 Em Coimbra, o estudo e a análise química das amostras de cascas de quina enviadas foram confiados ao Diretor do Laboratório Chymico, o Doutor Thomé Rodrigues Sobral. Nascido a 21 de dezembro de 1759, em Felgueiras, Moncorvo, filho de João Rodrigues e Isabel Pires, Thomé Rodrigues Sobral matriculara-se nas Faculdades de Matemática e de Filosofia da Universidade de Coimbra. Em 1782 foi ordenado presbítero, em Braga, e, em 1783, formou-se em matemática e filosofia. Em 1786 foi nomeado demonstrador de História Natural; em 1786, lente-substituto de Física; em 1787, lente de História Natural; e, em 1789, lente de Química e Metalurgia. Em 1791, sucedeu a Domingos Vandelli (1730-1816) no cargo de Diretor do Laboratório de Química. Provido nesta categoria, Sobral foi encarregado pela Congregação da Faculdade de Filosofia de redigir um compêndio de química para uso da cadeira ministrada na Universidade que se encontrava há muito em falta. Em 25 de Abril de 1792, Sobral apresentou na mesma Congregação, a primeira parte do plano desse compêndio de química e, em julho, as restantes partes. Em 1793, publicou o Tractado das Affinidades Chimicas, artigo que no Diccionario de Chimica, fazendo parte da Encyclopedia por ordem de materias, deu Mr. de Morveau.15 Em meados de 1798, como o compêndio ainda não estivesse pronto para ser impresso, foi libertado da docência durante os anos de 1798 e 1799 de modo a facilitar-lhe o trabalho que faltava. Entretanto, a Universidade adotara o compêndio baseado na teoria do flogisto da autoria de Scopoli, intitulado Fundamenta Chemiae-Praelectionibus Publicis accomodata.16 Sobral não era um adepto do flogisto. O naturalista alemão Heinrich F. Link, que visitou Portugal nos anos 1797-1799, tendo convivido e conversado demoradamente com ele durante a sua estadia em Coimbra, refere que ele estava a par dos desenvolvimentos recentes da química francesa, nomeadamente, da teoria do oxigénio de Lavoisier: "Don Thomé Rodrigues Sobral, professeur de Chimie est un homme très-habile. Il connnait les procédés actuels des Français dans cette science; il enseigne la chimie d'après les nouveaux principes antiphlogistiques; il a même traduit leur nomenclature en portugais, et s'occupe maintenant à publier un manuel de chimie qui manque en Portugal. Je ne doute nullement de son succès".17 O destino do compêndio de química que Sobral deveria ter elaborado é desconhecido e, se alguma vez o concluiu, nunca viria a ser publicado. Entretanto, o ensino da química em Coimbra mudou em 1801, com a divisão da cadeira de Química e Metalurgia em duas disciplinas distintas, o que pode ter desencorajado Sobral. Em 1807, a Congregação decidiu adotar os Elementa Chemiae Universae et Medicae - Praelectionibus suis accomodata de J. F. A. Jacquin.18 Em 1808, com o ataque a Coimbra dos exércitos de Napoleão sob o comando do general Junot, Sobral tornou-se o responsável pela produção de pólvora em larga escala, no Laboratório de Química da Universidade. A sua ação foi elogiada pelos oficiais britânicos, aliados dos portugueses contra os invasores, que lhe deram o título de mestre da pólvora. As tropas francesas retaliaram, destruindo a propriedade de Sobral nos arredores de Coimbra, que perdeu assim a sua biblioteca, notas de investigações e, alegadamente, o manuscrito do compêndio que se encontrava ainda em fase de impressão. Em 1809, com a região de Coimbra devastada pela peste, Sobral empenhou-se por completo na orientação e execução de várias medidas de desinfeção, nomeadamente, as fumigações com ácido muriático em aquartelamentos, hospitais e outros locais e edifícios públicos, servindo-lhe de mestre, nos procedimentos adotados, como ele próprio o reconheceu, o químico francês Guyton de Morveau.19,20 A análise química da Raiz da planta Mil-homens As múltiplas atividades e serviços em que se envolveu no decorrer das invasões napoleónicas e, no dizer do próprio, "a fatal situação em que o havia deixado o Inimigo" que barbaramente reduzira a cinzas com a sua habitação, todos os seus livros, poderiam ter "servido de justo motivo" para que Rodrigues Sobral desistisse da incumbência antes assumida da análise das amostras de quina enviadas pela Corte: a privação de Livros e a escassez de meios laboratoriais em que se caiu tornaram-se em obstáculos de grande peso ao desempenho digno da incumbência antes assumida de bem poder realizar os trabalhos que uma tal análise exigia. Tal não aconteceu. Como ele próprio fez questão de deixar claro, os seus desejos de ser útil, que sempre o animaram, foram nesta ocasião mais imperiosos que as suas desgraças.10 As análises necessárias continuaram, mas o ritmo a que deveriam ser feitas sofreu notório abrandamento, a ponto de se chegar a pensar que teriam parado por completo. Tanto assim que o Ex.mo Bispo-Conde Reformador da Universidade, D. Miguel Pereira Forjaz, alertado para o empenho que Sua Alteza Real continuava a depositar na análise comparativa e utilização das quinas do Brasil por relação às quinas do Perú, em setembro de 1813, "espontaneamente ordenou de Lisboa, onde então se encontrava", que o Laboratório Chimico da Universidade, "embora achando-se mui falto de utensílios pela invasão dos Francezes, fosse largamente provido de tudo o necessário para que nele se procedesse às referidas análises e estudos". Para maior brevidade, ordenava, cumprindo ordens de Sua Alteza Real e determinações anteriores, que de tudo isso fosse encarregado o Lente de Química, Dr. Thomé Rodrigues Sobral.21 Os trabalhos de estudo e análise química foram realmente acelerados, quer no Laboratório Químico, quer no Hospital, onde os Médicos Clinicos procediam à aplicação prudente dos resultados obtidos, pondo em prática as conclusões já tiradas da análise química das quinas do Rio de Janeiro e do Perú. Não demorou muito para que José Feliciano de Castilho pudesse anunciar publicamente no Jornal de Coimbra que dirigia, que tinha já em seu poder quatro escritos do Dr. Thomé Rodrigues Sobral para publicação com os títulos: (i) Ensaio Chimico da planta chamada no Brasil ‘mil homens', Aristolochia Grandiflora segundo o Dr. Bernardino António Gomes, assinado pelo próprio autor em 10 de setembro de 1814; (ii) Carta ao Doutor José Feliciano de Castilho em resposta a outras, emque se tratava de huma nova applicação do Gaz Muriático oxigenado (Gaz oximuriatico), sem data de radação; (iii) Reflexões geraes sobre as difficuldades de uma boa analyse principalmente vegetal, também sem data de redação; e (iv) Análise de uma mina de chumbo que foi enviada por Francisco Xavier de Almeida Pimenta, médico militar d'Abrantes ao Dr. José Feliciano de Castilho, Lente de Medicina na Universidade e um dos Redatores do Jornal de Coimbra, com data de 2 de dezembro de 1813. Sem seguir a ordem cronológica por que haviam sido redigidos, estes quatro escritos foram publicados em diferentes números do volume VII, Parte I, do Jornal de Coimbra correspondente ao ano de 1814, respetivamente, a páginas 149-198; 101-136; 251-266; e 91-96. É no Ensaio Chimico da planta chamada no Brasil ‘Mil-Homens', Aristolochia Grandiflora segundo o Dr. Bernardino António Gomes,10 que encontramos os resultados e as considerações sobre os mesmos da análise química que Rodrigues Sobral fez da quina Aristolochia Grandiflora, trabalhando sobre uma amostra que fora remetida para a Academia Real das Ciências de Lisboa a partir da Corte do Rio de Janeiro pela Ex.ma Condessa de Linhares, cunhada do Principal Sousa, "um dos Senhores Governadores do Reino e Digmo irmão do Ex.mo Conde de Linhares, seu marido, com grandes recomendações sobre as suas virtudes médicas". A Academia das Ciências remeteu-a para Universidade, onde foi "entregue a T. Rodrigues Sobral em 16 de agosto de 1813, achando-se já muito carunchosa e estragada". Isto mesmo fez questão de referir Rodrigues Sobral ao apresentar à Academia de Ciências de Lisboa os resultados que obteve na análise química a que procedeu, manifestando a sua inteira disponibilidade para proceder a nova análise usando nova porção da mesma Raiz que estivesse em melhores condições e fosse possível ser-lhe remetida para o efeito, se assim fosse tido por conveniente. Não temos conhecimento de qualquer relato que refira que tal tivesse acontecido. Analisemos o essencial dos resultados e considerações que constituem o teor deste Ensaio Químico. Ciente das dificuldades de uma boa analise química, principalmente vegetal, assunto sobre que refletira e escrevera longamente por mais que uma vez, e consciente também da referida fraca qualidade da amostra da raiz de quina que tinha para analisar,22,23 T. Rodrigues Sobral empenhou-se totalmente em realizar uma análise química o mais completa, rigorosa e fiável possível, para saber de que partes ou princípios se compunha que permitisse bem conceber e explicar a sua ação como medicamento, ainda que profundamente convencido de que o estado de desenvolvimento em que química de então se encontrava estar ainda bem longe de poder estabelecer uma rigorosa relação entre cada um dos princípios encontrados em qualquer medicamento, ainda que incontestáveis, e a ação química imediata de tal ou tal. Sobre esta sua convicção haveria de escrever e publicar, mais tarde, uma Memória em que alongadamente exporia o seu pensar e posição sobre o assunto.24 Passando ao relato pormenorizado dos resultados da análise química efetuada, T. Rodrigues Sobral começa por referir as qualidades sensíveis da raiz da Mil-Homens, caracterizadas por uma observação sensorial direta e toda uma sequência de experiências com infusões aquosas e alcoólicas preparadas com porções da raiz reduzida a pó, conservadas por espaços de tempo muito variáveis, chegando, em alguns casos, aos seis meses. Os resultados gerais das experiências feitas permitiram--lhe estabelecer a textura (esponjosa, pouco compacta), a grossura (muito variável, podendo atingir algumas polegadas), a cor (um amarelo escuro e terroso), o cheiro (forte, sem ser desagradável, com um aroma que passa facilmente às suas infusões em água ou em álcool), o sabor (subamaricante e um pouco nauseativo), e o peso específico determinado com um areómetro de Nicholson (0,4821 relativamente ao peso específico da água destilada, tomado este como unitário) da raiz examinada25 Na tentativa de saber quais os princípios constituintes da raiz em análise, várias porções da raiz pura e várias infusões aquosas e alcoólicas preparadas com pó da mesma foram tratadas com água, com álcool e com ácido nítrico e feitos diversos ensaios por destilação, por precipitação e incineração direta26 Dispensando-nos de reproduzir aqui os valores numéricos referidos pelo autor, citaremos apenas as principais conclusões que deles tirou sobre o número e natureza dos princípios que detectou na sua composição:
E conclui: "além dos mencionados cinco princípios, entram mais na composição da raiz da Mil homens, entre os alcales, a potassa; entre as terras, a cal; e entre os óxidos metálicos, o ferro. E posto que eu não pudesse ainda determinar as quantidades absolutas de cada huma destas substancias nas pequenas quantidades de cinzas que obtive da incineração direta da raiz, nem possa por consequência fixar neste momento as proporções das mesmas substancias tanto entre si, como com os outros princípios; reservando para objeto de um segundo ensaio a determinação d'estas proporções, bastará saber-se por agora que estas últimas substancias parecem existir em pequena quantidade; e que por isso mesmo a sua influência nas propriedades tanto chimicas, como medicamentosas da mesma raiz não pode considerar-se de muita importância, nem modificar muito os seus efeitos".27 O princípio febrífugo das quinas Conhecidos os princípios químicos constitutivos da quina analisada, impunha-se tentar saber qual seria nela o verdadeiro princípio responsável pela virtude febrífuga. A questão não se punha só quanto à quina Mil homens proveniente do Brazil; punha-se, de igual modo, em relação às demais quinas com virtudes curativas de febres, a começar pela própria quina do Perú. Thomé Rodrigues Sobral não se considerou capaz de o dizer de imediato concluída que fora a análise química que fizera da Raiz da Mil-homens. Só passados mais de cinco anos sobre a publicação dos resultados obtidos, tornou público um escrito especificamente dedicado ao assunto que datou de novembro de 1819.20 Nele explica que "não obstante os trabalhos, e os esforços dos grandes homens e Mestres que mais se ocuparam, nos ultimos 168 anos àcerca das quinas, nomeadamente Fourcroy (1755-1809),28 Vauquelin,5 Seguin3 e Cadet29 não era ainda possível encontrar e caracterizar nelas um princípio febrifugo". Na sua opinião, nenhum desses grandes homens e Mestres haviam conseguido achar nas quinas analisadas um caracter botânico, físico ou químico, seguro e constante, para distinguir sem equivoco a casca da quina verdadeiramente com virtudes febrífugas das quinas que o não são; nenhum deles havia conseguido concluir por uma análise que não deixasse lugar a qualquer dúvida, qual é a verdadeira composição química da quina genuina e qual a natureza e proporção de cada um dos seus princípios imediatos e em qual reside exclusivamente a virtude febrífuga. E taxativamente conclui: "sou autorizado a afirmar que nós ignoramos ainda o que ha de mais essencial a respeito da virtude febrifuga da quina; e que a sua aplicação é ainda hoje quasi tão empírica como era quando curou a Condessa Hespanhola de Cinchon".30 Se os resultados da análise quimica da raiz da Mil homens que efetuara e acabava de apresentar satisfaziam - como escreveria meses depois de os apresentar - ao problema que qualquer análise quimica se propõe resolver, qual é determinar "quantos e quais sejam os princípios ou elementos, sejam próximos, sejam remotos, que compõem o corpo que se analisa e quais são as proporções respetivas d'estes princípios, seja dos immediatos e ainda compostos; seja dos elementares, e sobre os quais os meios d'análise atuais já nada podem",31 achava-se na obrigação de reconhecer publicamente que "uma análise química qualquer, e muito especialmente uma análise vegetal ou animal, he o trabalho mais difícil de toda a Química" e "que uma análise bem feita assim como faz o escolho perigoso e dificil de evitar ainda aos mais insígnes Mestres, é também a pedra de toque que distingue o Chimico profundo, daquelle que o não he".32 Uma boa análise "para merecer alguma confiança deve necessariamente ser longa, extensa e vagarosa, que toda a precipitação nas experiencias e toda a impaciência em esperar pelos seus resultados devem ser oppostos e fataes ao fim da mesma análise. Além das operações preparatórias, uma analyse comprehende dissoluções, precipitações, infusões a frio, e a calor, decocções mais ou menos longas, filtrações mais ou menos difficeis e morosas; destillações, evaporações ou espontâneas ao ar livre, ou promovidas e acceleradas pela ação do fogo, cristallizações, combustões, carbonizações, incinerações, etc, etc. , de cada huma das quaes nascem novas séries de outras, por isso que os productos de umas fazem a base de novos ensaios até chegar à resolução do problema que por meio d'elles se-intenta resolver".33 Bem consciente de todos estes requisitos de uma boa análise química, particularmente de uma boa análise quimica de material vegetal ou animal, Rodrigues Sobral ao apresentar os seus resultados de análise da raiz da Mil-Homens, sem ter razões para os pôr em causa, não se considerava ainda à vontade para concluir por qual deveria ser nela, o verdadeiro princípio febrífugo, como entendia que outros químicos a trabalhar no mesmo assunto e melhor colocados para resolver o problema, como era o caso, por exemplo, de Fourcroy com a análise química que fizera da quina de S. Domingos, ou de Vauquelin com a análise quimica que fizera de diversas quinas, não haviam ainda ousado fazê-lo. Todos eles haviam detetado nas quinas analisadas princípios idênticos, classificáveis na categoria duma resina, duma gelatina, de um tanino, de um ácido gálico ou de um outro ácido sui generis, o ácido kinico, como princípio adstringente; mas não conseguiam estar de acordo numa conclusão que apontava para a atribuição da virtude febrifuga das quinas analisadas se ao acido gallico nelas encontrado sem intervenção do tanino, ou se a este sem intervenção daquele, ou se à intervenção conjunta de ambos.34 Face a esta situação e considerada a falta de consenso entre os químicos melhor colocados para opinar sobre a matéria, e ainda face ao pouco sucesso nela verificado, Rodrigues Sobral entendia que se devia pensar dum modo bem diferente e não hesitou avançar com a sua própria posição, demorando, porém, quase cinco anos para a expor publicamente, alegando a favor dela múltiplos exemplos. Fê-lo, como acima referimos, no longo trabalho acima mencionado, datado de novembro de 1819, publicado, como todos os outros seus escritos científicos, no Jornal de Coimbra.35 Começa por dizer: "a hypothese da existência d'um princípio exclusivamente febrifugo tanto nas verdadeiras quinas, como em outras cascas ou substancias quaesquer, nas quais as propriedades de curar as febres intermittentes tenham sido bem provadas, me-parece ser uma daquellas admitidas, sustentadas e transmitidas sem outro fundamento sólido mais que a autoridade dos AA. que primeiro as estabelecerão, e a respeito da qual eu creio poder applicar sem muita violência aquele pensamento do cel. Macquer escrevendo a Guyton-Morveau ainda que sobre objeto bem differente - "vous sçavez combien les homes meme éclairés sont des animaux d'habitude". "Com effeito, a Chimica muito principalmente nos offerece um grande número d'exemplos d'este espírito de generalisar: mas ella nos mostra ao mesmo tempo que é quasi sempre com risco de errar que se fazem taes generalizações. Quando se observou uma propriedade qualquer competindo a uma classe de corpos semelhantes mais ou menos numerosa, o modo mais óbvio, e simples para a- explicar, parece sem dúvida ser o admittir em todos elles um princípio identico, ao qual todos devessem a mesma propriedade". E concretiza: foi assim que para explicar a diferença entre os corpos combustíveis e os imcombustíveis se admitiu a existência do pabulum ignis, o flogisto; foi assim com a hipótese dum princípio acidificante comum a todos os ácidos, (o oxigénio) e de um princípio alcalificante em todos os alcales, etc. Foi assim, por exemplo, com os chamados inscindentes e os venenos, explicando a sua ação pela doutrina da cunha, ou com a ação dos medicamentos explicada na base de princípios totalmente imaginários, flogísticos uns, antiflogísticos outros, tendo-se chegado a admitir um fogo-frio etc, etc. Mas todo este tipo de hipóteses, a Historia da Química se encarregou de refutar e destruir.36 Face a tais considerações, entende Rodrigues Sobral que o único e mais admissível modo de conceber o princípio febrífugo das quinas, face a quanto até então se sabia sobre as suas cascas, seria considerá-lo como uma propriedade nova resultante da combinação dos diferentes princípios que as compõem, envolvendo-os no seu todo, ou, pelo menos alguns deles. Numa palavra, a virtude febrífuga das quinas não seria devida a um princípio sui generis distinto de qualquer dos outros nelas existente, mas da união de todos ou tão somente de alguns deles, em proporções bem definidas pela natureza, com a formação de um composto dotado das propriedades febrífugas que nos oferece a melhor quina.37 Assim concebido o princípio febrífugo das quinas, entendia Rodrigues Sobral, tornar-se-ia evidente que a virtude febrífuga exibida não residiria nem nas partes resinosas das mesmas, como o defendiam alguns, nem nas partes resino-extrativas, como defendido por outros, nem residiria tão pouco na substância que precipita o tanino, análoga à gelatina, como defendera Seguin. Pela mesma razão, não deveria ser atribuida exclusivamente ao sal das quinas descoberto por Dechamps, nem ao acido kínico ou ao kinato de cal, o princípio amargo das quinas, para que apontara Vauquelin nas suas determinações. Muito menos deveria ser atribuida ao princípio denominado Cinchonino admitido e defendido primeiro por Duncan e depois pretensamente estremado pelo Dr. Bernardino António Gomes no seu Ensaio sobre o Cinchonino, apresentado primeiramente na Academia Real das Ciências de Lisboa, em 1811, e publicado, nesse mesmo ano, no Edinburgh Meddical & Surgical Journal e que tanta discussão gerara na acesa controvérsia havida com José Feliciano de Castilho.12 Mais. Posto que a identidade de composição produzirá identidade de propriedades, ao conceber-se a virtude febrífuga das quinas como uma propriedade dum novo composto formado a partir dos princípios gerais que as compõem e não de um princípio específico, no entender de Sobral, tornar-se-ia possível prever a maior ou menor virtude febrífuga de uma qualquer quina por comparação da sua composição química geral com a composição química da quina do Perú, sem ter de se andar à procura da presença de um princípio bem determinado e específico, mas procurando apenas a presença de substâncias análogas na virtude antiperiódica, o que "poderá até conduzir-nos um dia a poder compor, para o assim dizer, uma boa quina artificial": uma vez "conhecidos por uma boa análise os princípios que compõem por exemplo a boa quina vermelha, e as suas proporções, será possivel, tomando separadamente cada hum d'estes princípios, ou d'outras quinas inferiores, ou ainda d'outras substâncias que não pertenção ao mesmo género, e combinando-os devidamente nas mesmas proporções, obter-se um composto febrífugo semelhante à mesma quina". Regenerar pela síntese uma substância com as virtudes febrífugas idênticas às da quina que se analisou seria, a seu ver, grande prova a favor da validade das suas ideias sobre o princípio febrífugo das quinas.38 Para terminar a defesa da conceção que apresentava para este princípio, dedicou toda uma segunda parte da sua Memória sobre o assunto, à consideração de vários e numerosos factos inequívocos e não contestáveis que lhe pareciam fundamentos suficientes da teoria que defendia e que poderia resumir dizendo que "jamais podemos concluir das propriedades d'um composto qualquer, para as propriedades dos seus componentes; nem reciprocamente das que estes possuem quando separados, para aquelas que terá o composto que elles formarão pela sua união". Isso acontece na generalidade dos óxidos e dos ácidos relativamente aos elementos que os compõem, como acontece na generalidade dos sais relativamente aos reagentes de que se obtêm, e não só no que respeita a uma, mas sim, em muitos casos, no que respeita a mais que uma das suas propriedades. Nos óxidos metálicos formados por diferentes metais por combinação com oxigénio, quer no caso de iguais proporções de oxigénio com metais diferentes, quer no caso de diferentes proporções de oxigénio com um mesmo metal, os compostos formados diferem muito nas suas propriedades, nomeadamante na cor, na solubilidade, no sabor, etc, propriedades estas que, na generalidade dos casos, são também muito diferentes das respetivas propriedades de qualquer dos componentes. E o mesmo acontece no caso dos diversos ácidos e dos diversos sais em que os componentes sejam os mesmos, diferindo entre si apenas por proporções relativas de um ou mais deles; ou, no caso de iguais proporções de combinação, por diferença dos elementos presentes participantes no composto obtido. Não há um princípio específico da cor, como não há um princípio específico do sabor ou da solubilidade nas substâncias que se utilizam para formação de diversos compostos, resulte esta duma simples combinação dos elementos constituintes ou duma reação química entre eles. De princípios sem cor resultam compostos corados, ou de princípios corados resultam muitas vezes compostos incolores ou com cor muito diversa da original; de elementos voláteis resultam quer compostos voláteis, quer compostos não-voláteis; de princípios insípidos ou com um determinado sabor resultam compostos saborosos ou compostos com um sabor muito diferente; princípios solúveis formam compostos insolúveis e vice-versa, etc…etc… Numa palavra, as propriedades exibidas pertencem ao composto formado, podendo ou não ser iguais, ou totalmente diferentes, seja para mais, seja para menos, ou até inexistentes, nos elementos que levaram à formação do composto que as exibe, não sendo pois, nada de impossível que de princípios não febrífugos possa resultar nas quinas um composto que o seja.39 Com este raciocínio apoiado em muitos e diversos exemplos tirados de situações bem concretas de sais, óxidos e ácidos com que lidamos no nosso dia a dia e bem conhecidos pelas propriedades que exibem, a conclusão impõe-se: "se das propriedades d'um composto se não pode concluir para as propriedades dos seus componentes, nem das propriedades destes para as d'aqueles", segue-se que ainda que as boas quinas tenham as propriedades febrífugas em um grau qualquer, não é isto fundamento seguro para concluir que os seus princípios devem ser febrífugos; ou que n'ellas reside um princípio dotado d'esta propriedade exclusivamente aos outros".40
CONCLUSÃO Os termos em que Thomé Rodrigues Sobral tentou caracterizar o princípio febrífugo das quinas, não admitindo que a existência duma virtude febrífuga em certas quinas se devesse necessariamente a um princípio febrífugo específico universal, entendendo antes que tal virtude poderia ser sim uma propriedade de um composto que resultaria da interação mútua entre as várias componentes químicas dessas mesmas quinas, foi por ele apresentado como uma hipótese de trabalho, uma hipótese científica, uma conjetura da sua lavra que tinha como inteiramente verosímil e que lhe parecia apoiada em muitas, boas e plausíveis razões aduzidas para a compreensão e explicação de observações atentas de outros e variados fenómenos químicos. E terá sido provavelmente, um modo airoso que ele encontrou para contornar a "feroz" controvérsia que estalara entre Bernardino António Gomes e José Feliciano de Castilho, diretor do Hospital de Coimbra e redator do Jornal de Coimbra, amigo e colaborador de T. Rodrigues Sobral, em muitos dos trabalhos em curso no Laboratório Chimico da Universidade. Na verdade, no ardor da controvérsia, cansado dos muitos argumentos avançados por ambas as partes, J. Feliciano de Castilho acabara por remeter para a autoridade científica de T. Rodrigues Sobral, a quem tinha como "o melhor e mais autorizado químico português da altura", a última palavra sobre o assunto, como conclusão das reflexões que sabia ele estava a preparar neste domínio e que outras não eram senão as que acabariam por ser o conteúdo deste seu escrito. As palavras com que termina este escrito são uma leitura possível nesse sentido, como ele próprio o confessa: "mesmo que não passe de mera hipótese de trabalho, este novo ponto de vista com que encarei o princípio febrífugo das quinas abriria um novo campo de experiência de que a sagacidade de outros grandes chimicos muito aproveitaria, e de que não deixariam de resultar verdades úteis às duas Sciencias Chimica e Médica que se interessam de mãos dadas na resolução do problema importante de que se trata". É forçoso mencionar aqui que nos anos em que Thomé Rodrigues Sobral, em Portugal, assim pensava e trabalhava sobre a composição das quinas febrífugas, em França, Pierre J. Pelletier (1788-1842) e Joseph B. Caventou (1795-1877), nas suas investigações sobre alcalóides em vegetais, em curso na Escola de Farmácia de Paris, anunciavam publicamente, no ano de 1820, a descoberta dos alcalóides cinchonina e quinina, extraídos da casca da Cinchona.41 Nos anos seguintes, numa investigação pormenorizada destes alcalóides, E. O. Henry, afirmava-os como os grandes princípios ativos e responsáveis principais pela eficácia com que a quina de que se conseguia extrai-los era usada na cura de estados febris e maláricos.42 Seria, porém, ainda alguns anos mais tarde que os trabalhos de investigação de J. Berzelius (1779-1848), J. B. Dumas (1800-1884), J. von Liebig (1803-1873) e outros permitiriam estabelecer as fórmulas químicas corretas de um grande número de alcalóides, e a partir delas, estabelecer o papel dos seus grupos funcionais na formação de compostos com propriedades clínicas tais que permitiam utilizá-los com grande eficácia na cura de diversas doenças, nomeadamente, o poder antifebril dos dois alcalóides descobertos por Pelletier e Caventou, a cinchonina e a quinina.
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