JBCS



14:11, ter dez 3

Acesso Aberto/TP




Educação


Licenciandos em química e argumentação científica: tendências nas ações discursivas em sala de aula
Pre-service chemistry teachers and scientific argumentation: trends in discursive actions in classroom

Ariane Baffa Lourenço; Jerino Queiroz Ferreira; Salete Linhares Queiroz*

Instituto de Química de São Carlos, Universidade de São Paulo, CP 780, 13560-970 São Carlos - SP, Brasil

Recebido em 28/08/2015
Aceito em 10/11/2015
Publicado na web em 22/02/2016

Endereço para correspondência

*e-mail: salete@iqsc.usp.br

RESUMO

School science teaching has traditionally been focused on the content of science. However, recent debates about science education emphasize the importance of the nature of science and the process of argument. In order to change the emphasis in teaching science to incorporate argumentation, teachers need to adopt more dialogic approaches that involve students in discussion, and to consider how they themselves interact with students to foster argumentation skills. In this paper we examine the pre-service chemistry teachers' ability to incorporate and use argumentation in their teaching. The chemistry lessons conducted by four pre-service teachers were audiotaped and transcribed in full and the transcript sections were coded using a framework for argumentation processes. An analysis of the audiotaped lessons transcripts suggested that three factors that promoted argumentation in pre-service teachers' classrooms emerged from the data. These factors included: the role of pre-service teachers in encouraging students to share their ideas and comments, providing evidence that support students ideas, and implementing instructional strategies that give students an opportunity to articulate and support an explanation in an argument.

Palavras-chave: argumentation; chemistry; pre-service teacher education.

INTRODUÇAO

Um dos objetivos do ensino de ciências é possibilitar o envolvimento dos alunos em raciocínio crítico sobre descobertas científicas e questoes sociocientíficas, tendo as evidências científica e social como base. Tal habilidade colabora para que elaborem modelos como aproximaçoes, tentativas de discussao, explicaçao e interpretaçao de fenômenos.1,2 Aspectos dessa natureza podem ser favorecidos em contextos escolares nos quais os alunos possam se engajar em açoes argumentativas.

O ensino de ciências com foco na argumentaçao possibilita ainda o aprendizado sobre a natureza da ciência, pois proporciona a oportunidade de aproximaçao da cultura científica.3 A importância do aprimoramento da habilidade de argumentaçao dos alunos é também destacada em documentos oficiais que orientam as políticas curriculares nacionais4 e apoiada por diversas pesquisas.5-8 Estas sugerem fortemente a relevante contribuiçao que a promoçao da argumentaçao pode trazer para a compreensao de conteúdos científicos, para o desenvolvimento de competências investigativas e de tomada de decisao dos alunos frente a assuntos de cunho sociocientífico.

Nessa perspectiva, o professor desempenha um papel fundamental na promoçao da argumentaçao. Kosko, Rougee e Herbst9 apontam que um dos fatores que deve ser considerado pelo professor na tentativa de atingir tal propósito é a formulaçao das perguntas que apresenta aos alunos no contexto das atividades didáticas. De acordo com os autores, quando o professor solicita a descriçao de estratégias de soluçao dos problemas e explicaçao das respostas, seja por meio da argumentaçao escrita ou oral, proporciona engajamento mais efetivo dos alunos nas aulas e um maior ganho no desempenho da área de conhecimento.

No entanto, embora recomendada, a argumentaçao científica ainda nao é amplamente difundida nas salas de aulas.5-8,10 De acordo com Archila,11 para que ela se torne frequente no ambiente escolar, além da sua incorporaçao no currículo, é necessário que os professores estejam capacitados para ensinar de forma flexível, rompendo com as comuns rotinas institucionais. Para isso, é fundamental que ainda na sua formaçao inicial participem de estratégias de ensino que propiciem o desenvolvimento de habilidades argumentativas.

McDonald,12 assim como Sampson e Blanchard,13 também apontam a importância de associar questoes inerentes à argumentaçao ao processo de formaçao inicial de professores. Garcia, Dominguez Castineiras e Garcia14 corroboram tal posicionamento e destacam a necessidade de os cursos de formaçao de professores potencializarem a aprendizagem da argumentaçao dos licenciandos e o entendimento dos futuros professores sobre sua implicaçao no contexto de sala de aula.

Nessa perspectiva, no presente trabalho temos como objetivo analisar regências de licenciandas em química, após participarem de uma dinâmica de formaçao vinculada à disciplina de Prática do Ensino de Química (PEQ), a qual tinha como objetivo oferecer-lhes subsídios na promoçao de atividades argumentativas em seu processo de prática docente. Para tanto, utilizamos o quadro analítico proposto por Simon, Erduran e Osborne,7 que permite a análise das açoes do professor e está apresentado sucintamente no tópico Referencial Teórico. Portanto, frisamos que nao temos como propósito especular sobre os resultados de tais açoes junto aos alunos, cujas manifestaçoes durante a promoçao das atividades nao estao em questao.

Buscamos, dessa forma, trazer contribuiçoes no que tange ao favorecimento de reflexoes sobre a elaboraçao e implementaçao de aulas de química, em uma perspectiva argumentativa, assim como amenizar a lacuna existente no que diz respeito a referenciais que abordem as práticas docentes argumentativas de licenciandos, em especial em momento de estágio curricular supervisionado.15

 

REFERENCIAL TEORICO

Simon, Erduran e Osborne7 realizaram investigaçoes sobre a ocorrência da argumentaçao em aulas de ciências e coletaram dados, durante o período de um ano, junto a um grupo de 12 professores que participaram de curso de formaçao continuada, no qual desenvolveram materiais e estratégias de apoio à promoçao da argumentaçao. A pesquisa procurou, entre outros objetivos, identificar formas a partir das quais os professores inserem a argumentaçao na sua prática pedagógica. Assim, os autores analisaram gravaçoes em vídeo das aulas dos professores e identificaram açoes que resultaram em processos/contextos argumentativos em ambientes de ensino. Estas açoes foram agrupadas em oito categorias, descritas a seguir:

Falar e ouvir: encorajamento dado pelo professor de forma a permitir que os alunos escutem uns aos outros e questionem as afirmaçoes dos colegas;

Conhecer o significado do argumento: tentativas feitas pelos professores em ajudar os alunos a tomarem conhecimento sobre os componentes de um argumento. Esse processo envolve definir o que é um argumento e/ou apresentar exemplos de argumentos bem elaborados, tendo em vista a compreensao sobre o seu significado;

Posicionar-se na construçao dos argumentos: encorajamento dado pelo professor de reconhecimento de diferentes pontos de vista como sendo primordial para que a argumentaçao prossiga;

Justificar com evidências: tentativas realizadas pelo professor em favorecer a apresentaçao de justificativas pelos alunos, de preferência pautadas em evidências, para as suas conclusoes;

Construir argumentos: encorajamento dado aos alunos para a elaboraçao de argumentos nas mais variadas formas (escrita, oral, após uma discussao em grupos etc);

Avaliar argumentos: encorajamento dado aos alunos para que façam julgamentos sobre os argumentos que construíram;

Contra-argumentar/debater: incentivo dado aos alunos à contestaçao de ideias dos colegas;

Refletir sobre o processo da argumentaçao: valorizaçao por parte do professor da reflexao dos alunos sobre seus próprios argumentos.

Cada uma das categorias se encontra relacionada a declaraçoes/afirmaçoes/solicitaçoes realizadas pelo professor para desencadeamento dos processos argumentativos e estao apresentadas no Quadro 1.

 

 

As categorias apresentadas no Quadro 1 foram utilizadas na análise das regências das licenciandas em química, tendo em vista a identificaçao das açoes discursivas por elas desencadeadas potencialmente promotoras da argumentaçao. É digno de nota que as categorias nao emergem dos dados deste trabalho, mas sim foram propostas por Simon, Erduran e Osborne,7 conforme mencionado anteriormente.

 

PERCURSO METODOLOGICO

Os dados analisados nesta pesquisa foram coletados nas açoes de prática docente de licenciandas do curso de Licenciatura em Ciências Exatas (Habilitaçao em Química), da Universidade de Sao Paulo, matriculados na disciplina Prática de Ensino de Química (PEQ). A disciplina em questao, de caráter anual, de oito créditos possui como objetivo principal preparar o licenciando para o exercício do magistério em química para o ensino médio.

A coleta de dados compreendeu todo um ano letivo, quando a disciplina contava com sete alunos matriculados. No início do ano, estes foram informados sobre a pesquisa e convidados a participar como sujeitos. Neste momento, foram informados que nas atividades de estágio curricular supervisonado deveriam desenvolver regências que propiciassem a ocorrência da argumentaçao no ensino médio.

No primeiro semestre os licenciandos participaram de uma dinâmica de formaçao em que foram desenvolvidas açoes na perspectiva de proporcionar-lhes conhecimento teórico sobre a argumentaçao científica em sala de aula. As açoes constavam de oficina de leitura com discussao de artigos sobre a temática; aulas expositivas dialogadas, proferidas pelo docente da disciplina de PEQ; realizaçao de um jogo argumentativo16,17 em que se trabalhou com a elaboraçao de argumentos e sua análise com base no Modelo de Toulmin;18 análise de episódios de ensino desde uma perspectiva argumentativa; e elaboraçao por parte dos licenciandos de uma lista de critérios favoráveis ao desencadeamento da argumentaçao em ambientes de ensino.

No segundo semestre os licenciandos planejaram, implementaram e avaliaram suas regências de química. Inicialmente, elaboraram individualmente um projeto de regência no qual apresentaram os conteúdos a serem abordados e as estratégias a serem utilizadas para a promoçao da argumentaçao em suas aulas. Em seguida, os licenciandos apresentaram os projetos na disciplina de PEQ e participaram de um processo de peer-review19 no qual cada um deles avaliou o projeto de regência de um colega, na perspectiva de apontar a potencialidade do projeto analisado ao atendimento dos critérios construídos, anteriormente, favoráveis à ocorrência de argumentaçao em sala de aula. Concluída a etapa de peer-review, cada licenciando fez a reapresentaçao do seu projeto final de regência tendo em vista o atendimento das observaçoes advindas do referido processo e, em etapa subsequente, implementaram suas regências a alunos do ensino médio do estado de Sao Paulo.

Neste trabalho analisamos regências de quatro licenciandas, com o intuito de identificar a ocorrência de açoes discursivas favoráveis ao desencadeamento de processos argumentativos. Optamos por analisar a regência das licenciandas, pois todas elas eram compostas pelo mesmo número de aulas ministradas. As temáticas abordadas nas regências estavam vinculadas a tópicos da área de química, os quais foram indicados pelos docentes responsáveis pelas disciplinas do ensino médio, e estao listados no Quadro 2, onde constam também o nome fictício das licenciandas, quantidade de aula ministradas, estratégias de ensino empregadas, série escolar de aplicaçao e o tipo de instituiçao em que as regências foram realizadas.

 

 

Todas as licenciandas ministraram aulas que estavam pautadas, pelo menos em parte, em uma perspectiva expositiva dialogada, sendo que Ana e Naiara utilizaram como recursos a lousa e o giz, enquanto Maria e Cíntia empregaram o computador e o projetor de slides. Ana e Cíntia também colocaram em funcionamento em suas aulas o método cooperativo de aprendizagem jigsaw, que havia sido discutido no âmbito da disciplina de PEQ. O método exige o cumprimento de três etapas: na primeira etapa os alunos sao alocados em grupos de base heterogêneos. O material em estudo é dividido em pequenas partes e cada membro do grupo é designado a estudar apenas uma delas; na segunda etapa os alunos de grupos de bases diferentes que foram designados a estudar a mesma parte do material didático, estudam e discutem seus materiais juntos, formando grupos de especialistas; na terceira etapa cada aluno retorna ao seu grupo de base e compartilha o aprendizado adquirido sobre sua parte com os outros membros do seu grupo, de maneira que fiquem reunidos os conhecimentos indispensáveis para a compreensao do material em estudo.20-22 Cíntia aplicou o método para tratar dos tipos de radiaçao e Ana para discutir os diferentes tipos de ligas metálicas.

Ana, Cíntia e Naiara desenvolveram e implementaram em suas regências estratégias lúdicas, aqui entendidas como brincadeiras que permitem ao aluno manifestar sua natureza e contribuem, de forma prazerosa, na construçao do conhecimento. Ana, cujo tema de regência foi ligas metálicas, levou para a sala de aula vários objetos e solicitou aos alunos que escolhessem aqueles que se caracterizavam como sendo metais e que justificassem a sua escolha. Já Cíntia, cujo tema de regência foi radioatividade, dividiu os alunos em grupos e entregou a cada grupo uma figura com um objeto tratado/atingido pela radiotividade, em seguida promoveu com os alunos uma discussao a respeito dos efeitos benéficos e maléficos decorrentes da radioatividade. Estas estratégias diferem de uma aula expositiva dialogada uma vez que os alunos assumiam, por meio de brincadeiras, um papel consideravelmente ativo no processo de ensino-aprendizagem. Naiara, que abordou os temas lei de Hess e energia de ligaçao, distribuiu os alunos de modo que cada grupo recebeu um conjunto de equaçoes parciais com seus respectivos valores de variaçao de entalpia, assim como a representaçao da equaçao global que havia sido destinada a outro grupo. Após escreverem as equaçoes globais originárias das equaçoes parciais recebidas, cada grupo explicou a equaçao global resultante a todos os colegas. Em seguida, o grupo que havia recebido a equaçao global correta referente àquela exibida em sala, indicava se a resposta apresentada pelo grupo expositor estava apropriada. No caso disso nao ocorrer, promovia-se uma discussao até o alcance da resposta cientificamente aceita.

Atividades experimentais foram realizadas por Ana e Maria. Ana levou os alunos ao laboratório da escola, onde realizaram dois experimentos, o primeiro sobre condutibilidade térmica e o segundo sobre a caracterizaçao de metais e ligas metálicas. Já Maria realizou com os alunos, na própria sala de aula, um experimento sobre o bafômetro, para tanto lançou mao do Kit da Experimentoteca do Centro de Divulgaçao Científica e Cultural da Universidade de Sao Paulo (CDCC/USP).23

Com o intuito de analisar as açoes discursivas das licenciandas, as aulas foram gravadas em áudio e vídeo e transcritas para capturarmos as contribuiçoes orais e suas interaçoes com os alunos do ensino médio. As transcriçoes foram feitas na íntegra e em um formato em que identificamos os seguintes itens, assim sequenciados: Turno (expressa a mudança do falante), Participante, Fala, Comunicaçao nao verbal e Açoes pró-argumentaçao.

A título de exemplo dessa organizaçao e de como a análise foi realizada apresentamos o Quadro 3, que ilustra trechos de parte da regência da licencianda Cíntia, bem como as suas respectivas classificaçoes. Cada fala da licencianda foi associada à ocorrência de uma certa açao e, posteriormente, aquelas classificadas como açoes pró-argumentaçao foram contabilizadas. Essa classificaçao se baseou no trabalho individual de dois dos autores deste artigo, que após esta etapa promoveram uma discussao conjunta até a obtençao de um consenso quanto às categorias pertinentes a cada fala. As análises das regências de todas as licenciandas seguem este mesmo formato. Em relaçao ao item Comunicaçao nao verbal, o mesmo nao foi identificado na exemplificaçao apresentada.

 

 

Com relaçao ao exemplo do turno 82, é importante esclarecer que as evidências fornecidas pela licencianda sobre o símbolo trifóli serviram de base para subsidiar o entendimento dos alunos na atuaçao durante o desenvolvimento de estratégia lúdica, na qual tinham que discutir, a partir de figuras que representavam objetos tratados/atingidos pela radiotividade, os efeitos benéficos e maléficos dela decorrentes.

 

RESULTADOS E DISCUSSAO

As aulas foram analisadas de acordo com as categorias propostas por Simon, Erduran e Osborne.7 Das oito categorias sugeridas identificamos quatro, a saber: Falar e ouvir, Posicionar-se na construçao dos argumentos, Justificar com evidências e Construir argumentos (Quadro 4). Exemplificamos e discutimos a seguir as açoes discursivas pró-argumentaçao identificadas nas regências das licenciandas.

 

 

Falar e ouvir

Nas regências em pauta identificamos os dois tipos de açoes vinculadas a esta categoria, a saber: incentiva a discussao entre os alunos e incentiva os alunos a escutarem as opinioes dos colegas.

Incentiva a discussao entre os alunos

Com relaçao à solicitaçao que incentiva a discussao entre os alunos, três licenciandas a promoveram em sala de aula e a mesma ocorreu em dois contextos: no contexto de aulas expositivas dialogadas e no contexto de aulas baseadas em estratégias de ensino que exigem uma postura ativa por parte dos alunos.

Conforme mencionado anteriormente, embora todas as licenciadas tenham lançado mao de aulas expositivas dialogadas, tal solicitaçao ocorreu apenas durante uma aula expositiva dialogada de Maria e foi identificada uma única vez, transcrita dos turnos 69-71, em sequência. Nesta açao a licencianda, ao tratar da temática álcool, incentiva os alunos a discutirem sobre a Lei 11.705/2008, também conhecida como "Lei Seca", que dispoe sobre as restriçoes ao uso e à propaganda de bebidas alcoólicas no território brasileiro.

MARIA: E o que vocês acham dessa medida? Vocês acham que está correto? É exagerada? Quero ouvir um pouquinho de vocês agora. Já falei demais hoje, agora é a hora de vocês falarem.

ALUNO: Eu acho que está certo.

MARIA: Oh lá, bom, já temos uma opiniao aqui. Agora eu quero que vocês argumentem. (Turnos 69-71, primeira aula. Grifo nosso)

No segundo contexto, o incentivo à discussao entre os alunos ocorreu em aulas pautadas no método cooperativo jigsaw, em atividades experimentais e em jogos. A ocorrência de solicitaçao dessa natureza nas referidas estratégias foi de: 14 vezes para o método jigsaw ocorridas nas aulas de Cíntia; quatro vezes durante atividades experimentais, sendo uma vez na aula de Ana e três vezes nas açoes de Maria; três vezes em estratégias lúdicas ocorridas nas açoes de Cíntia. Na transcriçao do turno 26 da segunda aula de Cíntia, durante o desenvolvimento da estratégia jigsaw, há o incentivo aos alunos para discutirem sobre os diferentes tipos de radiaçao.

CINTIA: E você é do grupo gama que nao é esse, você se reúne com as meninas pra ler o texto e discute com elas, tá bom? (Turno 26, segunda aula. Grifo nosso)

A solicitaçao de incentiva a discussao entre os alunos foi muito mais frequente durante o desenvolvimento de atividades que requerem uma açao mais ativa por parte dos alunos. No entanto, há de se destacar a viabilidade de ocorrência de interaçoes discursivas argumentativas em aulas expositivas dialogadas, usualmente catalisada por solicitaçoes do professor que resultam na participaçao efetiva dos alunos em ambientes de ensino. Ou seja, é importante que as aulas nao sejam ministradas de maneira que somente ocorra por parte do professor uma argumentaçao unilateral. Usualmente, em tais contextos se observa o arraigamento de situaçoes que conduzem a um ensino de ciências orientado fortemente para a abordagem de conceitos científicos desvinculado do entendimento da ciência enquanto construçao social.14

Incentiva os alunos a escutarem as opinioes dos colegas

Com relaçao à solicitaçao que incentiva os alunos a escutarem as opinioes dos colegas, esta também se configurou em dois contextos, no primeiro as licenciandas destacaram falas dos alunos de maneira a integrá-las na construçao do conhecimento dos conceitos e no segundo solicitaram aos alunos que prestassem mais atençao no que o colega fazia ou falava. Solicitaçoes referentes ao primeiro contexto ocorreram nas açoes discursivas de três licenciandas. Dentre as 14 solicitaçoes dessa natureza realizadas por Maria, 12 tinham como objetivo destacar falas dos alunos (oito durante as aulas expositivas dialogadas e quatro durante a atividade experimental). Naiara realizou o mesmo tipo de solicitaçao em 15 (duas nas aulas expositivas dialogadas e 13 durante a aplicaçao do jogo) das 22 solicitaçoes. Cíntia executou a mesma açao em 12 das 15 solicitaçoes (quatro durante suas aulas expositivas dialogadas, cinco na aplicaçao do jigsaw e três durante a aplicaçao de estratégia lúdica).

Como exemplo de solicitaçao incentiva os alunos a escutarem as opinioes dos colegas no primeiro contexto apresentamos a transcriçao do turno 41 do discurso da Naiara, no qual a licencianda, durante a aplicaçao de estratégia lúdica, destaca a resposta de um dos grupos de alunos sobre o balanceamento de equaçoes e pede que os demais grupos argumentem se a resposta está certa ou errada.

NAIARA: A resposta, na verdade óh, o grupo deles, eles colocaram que ela foi uma reaçao exotérmica (se referindo ao balanceamento de equaçoes que um grupo deveria fazer e o outro corrigir), até aí está certo. Só que o valor, ele variou. Por que que variou? (Turno 41, quarta aula, Grifo nosso)

Solicitaçoes referentes ao segundo contexto tiveram uma menor ocorrência, sendo identificadas nas açoes discursivas de Maria em duas (ambas durante a atividade experimental) dentre as suas 14 açoes pertencentes à categoria incentiva os alunos a escutarem as opinioes dos colegas. Dentre as 22 açoes de Naiara nessa categoria, sete (todas durante a aplicaçao de estratégia lúdica) se referiram a solicitaçoes para que os alunos prestassem mais atençao no que o colega fazia ou falava. Nas açoes discursivas de Cíntia, três dentre 15 solicitaçoes (duas durante aplicaçao do jigsaw e uma durante a aplicaçao de estratégia lúdica) também foram dessa natureza.

Como exemplo de solicitaçao incentiva os alunos a escutarem as opinioes dos colegas no segundo contexto apresentamos a transcriçao do turno 226 do discurso da Naiara.

NAIARA: Gente presta atençao no que ele está fazendo. (Turno 226, primeira e segunda aulas, Grifo nosso)

Observamos que em diferentes contextos as licenciandas buscaram valorizar as colocaçoes dos alunos durante as aulas, favorecendo um maior envolvimento na construçao do conhecimento. Tal ocorrência foi mais frequente durante as estratégias que exigiam dos alunos uma participaçao mais efetiva, como na aplicaçao do jigsaw. Em especial, quanto a solicitar a atençao e o respeito dos alunos, sua maior ocorrência foi nas aulas da Naiara, pois sua regência foi ministrada para uma turma que apresentava problemas de indisciplina.

Posicionar-se na construçao dos argumentos

Nas regências em pauta identificamos para esta categoria duas das três solicitaçoes propostas por Simon, Erduran e Osborne,7 sendo: encoraja a apresentaçao das ideias dos alunos e incentiva os alunos a se posicionarem na apresentaçao das suas ideias.

Encoraja a apresentaçao das ideias dos alunos.

A solicitaçao encoraja a apresentaçao das ideias dos alunos, esteve presente nas açoes discursivas de todas as licenciandas (Quadro 4) e ocorreu em dois diferentes contextos. No primeiro, com ocorrência, geralmente, nos minutos inicias de cada aula expositiva dialogada, quando as licenciandas, para introduzir um tema, buscavam identificar o conhecimento prévio dos alunos sobre o assunto. Solicitaçoes dessa natureza estiveram presentes em sete das 51 açoes discursivas de Ana, em cinco das 54 açoes discursivas de Cíntia, em cinco de 112 açoes de Maria e em três de 96 açoes de Naiara. Como exemplo de solicitaçao encoraja a apresentaçao das ideias dos alunos no primeiro contexto apresentamos a transcriçao do turno 2 da açao de Ana, no qual os alunos sao questionados sobre o conhecimento prévio que possuem sobre metais.

ANA: Metais, tranquilo né, todo mundo já ouviu falar de metal alguma vez na vida, e o que seria entao os metais? Quem pode me descrever um metal? (Turno 2, primeira aula)

No segundo contexto as licenciandas fizeram a solicitaçao encoraja a apresentaçao das ideias dos alunos buscando sua maior participaçao no processo de construçao do conhecimento. Solicitaçoes nesse âmbito foram identificadas nas açoes discursivas: de Ana em 44 (27 durante as aulas expositivas dialogadas, oito na aplicaçao de estratégia lúdica e nove na atividade experimental) das 51 açoes para a categoria em questao; de Cíntia em 49 (13 aulas expositivas dialogadas, cinco na aplicaçao de estratégia lúdica e 31 na aplicaçao do jigsaw) das 54 açoes; de Maria em 107 (59 nas aulas expositivas dialogadas e 48 na atividade experimental) das 112 açoes; de Naiara em 93 (66 nas aulas expositivas dialogadas e 27 na aplicaçao de estratégia lúdica) das 96 açoes.

Como exemplo de solicitaçao encoraja a apresentaçao das ideias dos alunos no segundo contexto apresentamos a transcriçao do turno 106 da açao de Naiara. Durante a aula expositiva dialogada a licencianda incentiva a apresentaçao das ideias dos alunos.

NAIARA: Oh, vamos pensar assim óh quanto vocês acham que um litro de álcool, etanol, esse que você coloca no carro, ele libera de energia? Libera de calor? (dá tempo aos alunos). (Turno 106, quarta aula)

Observamos que, com relaçao à solicitaçao, encoraja a apresentaçao das ideias dos alunos, existe uma tendência das licenciandas em introduzirem os temas de suas regências a partir de questionamentos aos alunos sobre seus conhecimentos prévios a respeito do assunto.

Além disso, solicitaçoes feitas no sentido de identificar o conhecimento dos alunos para integrá-lo na construçao de conhecimento foram realizadas em aulas expositivas dialogadas, durante a aplicaçao de estratégias lúdicas, em atividades experimentais e no método jigsaw, sendo sua maior ocorrência durante as aulas expositivas dialogadas.

Incentiva os alunos a se posicionarem na apresentaçao das suas ideias

Com relaçao à solicitaçao incentiva os alunos a se posicionarem na apresentaçao das suas ideias, a mesma só foi identificada uma vez durante a atividade experimental na aula de Maria. Tal solicitaçao se diferencia da anterior (encorajar a apresentaçao das ideias dos alunos) pois, de acordo com Simon, Erduran e Osborne,7 nao se trata apenas de apresentaçao de ideias. Uma vez que as ideias sao apresentadas, o professor incentiva os alunos a tomarem uma posiçao, seja como indivíduos ou como um grupo. Tal açao pode ser observada na transcriçao do turno 88 em que a licencianda solicita aos alunos que apresentem uma posiçao em relaçao à apresentaçao das ideias sobre a verificaçao por parte deles de uma reaçao química que exala o cheiro caracterísitico de vinagre.

MARIA: Entao, olha só. Seguinte, vocês tiveram um tempinho aí pra discutir e agora cada grupo vai escolher um para representar o grupo e contar o que aconteceu, porque vocês vao ter que argumentar pra mim e defender a sua ideia. Vocês lembram aquela argumentaçao que a gente fez no último dia? Vocês vao ter que fazer isso agora. Por que que acontece isso? A gente viu que tem cheiro de vinagre e agora vocês vao explicar o porque e tentar defender aí a hipótese de vocês, ok? (Turno 88 - terceira e quarta aula)

Observamos que a solicitaçao incentiva os alunos a se posicionarem na apresentaçao das suas ideias teve uma ocorrência muito baixa. Tal fato pode ser consequência das características da solicitaçao em questao, em que além de promover a apresentaçao das ideias dos alunos é necessário possibilitar que os mesmos as justifiquem. No entanto, observamos que todas as licenciandas, durante suas aulas, valorizaram a identificaçao e trabalharam com o conhecimento prévio dos alunos. O que, de acordo com Astleitner, Brunken e Leutner,24 é um aspecto que favorece o desenvolvimento de um ambiente argumentativo, já que pode motivar os alunos ao efetivo engajamento no processo de ensino-aprendizagem.

Justificar com evidências

Nas regências em pauta identificamos para esta categoria três das cinco solicitaçoes propostas por Simon, Erduran e Osborne,7 sendo: fornece evidências que subsidiem as ideias dos alunos, solicita justificativas para as conclusoes dos alunos e estimula a apresentaçao de novas justificativas em adiçao às apresentadas inicialmente.

Fornece evidências que subsidiem as ideias dos alunos

A solicitaçao fornece evidências que subsidiem as ideias dos alunos, ocorreu em dois diferentes contextos. No primeiro, as licenciandas, diante de questionamentos dos alunos, forneceram evidências para que estes pudessem construir o conhecimento.

Solicitaçoes dessa natureza estiveram presentes em 51 das 92 açoes discursivas de Ana (18 nas aulas expositivas dialogadas, seis na aplicaçao de estratégica lúdica, 20 na atividade experimental e sete no método jigsaw), em 53 das 95 açoes discursivas de Cíntia (duas nas aulas expositivas dialogadas, 15 na aplicaçao de estratégica lúdica e 36 no método jigsaw), em 18 de 92 açoes de Maria (13 nas aulas expositivas dialogadas e cinco na atividade experimental) e em 26 de 61 açoes de Naiara (todas durante a aplicaçao de estratégica lúdica). Exemplificamos a solicitaçao citada neste primeiro contexto com a transcriçao dos turnos 152-153 da terceira aula da licencianda Cíntia, em que a mesma fornece evidências na busca de responder um questionamento do aluno sobre o câncer.

ALUNO: Professora, o câncer é uma célula mal desenvolvida?

CINTIA: De certa forma sim, o câncer nada mais é o que a gente costuma falar que quando uma célula sofre uma alteraçao e ela se multiplica de uma forma desordenada. Quando uma célula sofre alteraçao no material genético, por exemplo, ela vai se multiplicar de uma forma desordenada, tá? E muitas vezes ela se multiplica além da atividade normal pra ela, entao isso gera o câncer que a gente fala. (Turnos 152-153 - terceira aula)

No segundo contexto as licenciandas forneceram evidências para a introduçao ou explicaçao de conceitos vinculados à temática em pauta. Este contexto se diferencia do anterior, pois a açao discursiva das licenciandas nao estava relacionada diretamente a uma açao do aluno, faziam parte de suas explicaçoes em relaçao ao conteúdo.

Solicitaçoes dessa natureza estiveram presentes em 41 das 92 açoes discursivas de Ana (15 nas aulas expositivas dialogadas, 15 na aplicaçao de estratégica lúdica, oito na atividade experimental e três no método jigsaw), em 42 das 95 açoes discursivas de Cíntia (19 nas aulas expositivas dialogadas, duas na aplicaçao de estratégica lúdica e 21 no método jigsaw), em 74 de 92 açoes de Maria (60 nas aulas expositivas dialogadas e 14 na atividade experimental) e em 35 de 61 açoes de Naiara (13 nas aulas expositivas dialogadas e 22 na aplicaçao de estratégica lúdica).

Tal açao pode ser observada na transcriçao do turno 29 da primeira aula da licencianda Cíntia, na qual ela explica aspectos concernentes à radiaçao do Sol.

CINTIA: O Sol, ele emite radiaçao tanto infravermelho quanto ultravioleta porque a gente tem um espectro, que a gente costuma falar que é o espectro eletromagnético que considera entao a radiaçao infravermelha, ultravioleta, a visível, compreende ai as ondas de rádio e cada uma dessa tem uma diferenciaçao por conta da frequência, tá? Entao a radiaçao corresponde a todo o espectro eletromagnético que a gente falou aqui em cima. Entao a radiaçao que provém do Sol, por exemplo, que o povo fala: ai toma cuidado com os raios UV, que é ultravioleta, vem do Sol, é um tipo de radiaçao, o infravermelho, que justamente é responsável por é, queimar, esquentar né a pele. Se você fica exposto ao Sol você fica com queimaduras justamente por causa desse tipo de radiaçao. (Turno 29 - primeira aula)

Nas regências analisadas a declaraçao fornece evidências que subsidiem as ideias dos alunos é predominante nas aulas expositivas dialogadas, seguida da aplicaçao de estratégia lúdica, da dinâmica jigsaw e das atividades experimentais. O que sugere que as quatro estratégias utilizadas potencializaram o fornecimento de evidências durante as aulas.

Solicita justificativas para as conclusoes dos alunos

Na açao solicita justificativas para as conclusoes dos alunos, as licenciandas após a apresentaçao de uma conclusao por parte dos alunos, solicitavam a respectiva justificativa. Solicitaçoes dessa natureza estiveram presentes em 10 açoes discursivas de Ana (nove na aplicaçao de estratégica lúdica e uma na atividade experimental), em 11 açoes discursivas de Cíntia (cinco nas aulas expositivas dialogadas e seis no método jigsaw), em 15 açoes de Maria (nove nas aulas expositivas dialogadas e seis na atividade experimental) e em 16 açoes de Naiara (nove nas aulas expositivas dialogadas e oito na aplicaçao de estratégica lúdica). Exemplificamos esta declaraçao com a transcriçao do turno de 60-62 da licencianda Ana.

ANA: Tá hummm um granito e você acha que é metal ou nao?

ALUNO: Nao.

ANA: Nao, mas porque você acha que nao é um metal entao?

O que você acha que falta para ser um metal ai?

(Turnos 60-62 - primeira e segunda aula)

A solicitaçao em questao foi favorecida em todas as estratégias de ensino utilizadas, porém com mais frequência nas aulas expositivas dialogadas e nas estratégias lúdicas. Estas últimas requeriam dos alunos que levantassem hipóteses, o que possibilitou mais efetivamente a solicitaçao de justificativas aos alunos por parte das licenciandas. Tais constataçoes corroboram as sugestoes de pesquisadores da área de educaçao em ciências14,25,26 que acreditam ser a promoçao da argumentaçao facilitada em situaçoes nas quais se possibilita a discussao entre todos os sujeitos envolvidos no processo de ensino, alunos e professores, de modo a que os alunos tenham espaço para justificar suas consideraçoes.

Estimula a apresentaçao de novas justificativas em adiçao às apresentadas inicialmente

A solicitaçao estimula a apresentaçao de novas justificativas em adiçao às apresentadas inicialmente só foi identificada uma vez na aula de Ana, durante a aplicaçao de estratégica lúdica. Tal açao pode ser observada na transcriçao do turno de 50-53, no qual se verifica que, após uma aluna apresentar uma primeira justificativa para a escolha do material como sendo um metal, a licencianda lhe solicita novas justificativas para a observaçao.

ANA: Amanda, você pegou um negócio x aí. Você acha que ele é um metal? Por que?

ALUNA: Porque ele nao é maleável, porque é duro e porque é atraído por ima.

ANA: Quando você fala que ele é duro, posso falar por que ele é resistente? Ou é diferente?

ALUNO: Ah eu queria dizer que nao é maleável, nao é maleável na temperatura ambiente (Turno 50-53 - primeira e segunda aula)

A solicitaçao em questao somente foi identificada uma vez, o que pode ser decorrente do seu nível de complexidade, já que as licenciandas precisavam estimular os alunos a apresentarem novas jutificativas às fornecidas anteriormente.

Construir argumentos

Nas regências em pauta identificamos o único tipo de açao vinculada a esta solicitaçao, a saber: elabora estratégias de ensino-aprendizagem (ex: debates, resoluçao de problemas sociocientíficos etc) que permitam a solicitaçao aos alunos da construçao de argumentos na forma escrita e oral. As estratégias dessa natureza identificadas foram: método cooperativo de aprendizagem jigsaw, estratégia lúdica e atividade experimental.

Método cooperativo de aprendizagem jigsaw

A estratégia em questao foi utilizada por Ana e Cíntia, tendo sido feitas mençoes a ela em nove das 53 açoes de Ana (uma durante a apresentaçao da atividade para os alunos, sete durante o desenvolvimento da atividade em que se explicou sobre o funcionamento da estratégia e uma no momento de feedback da atividade, em que se realizou o resgate dos procedimentos/conteúdos trabalhados. Cíntia fez mençao a esta estratégia em 20 das 30 açoes realizadas para esta solicitaçao (uma no momento da apresentaçao da atividade, 18 no desenvolvimento da atividade e uma no momento de feedback da atividade). Exemplificamos a mençao a esta estratégia com a transcriçao do turno 51 da quarta aula de Cíntia.

CINTIA: É uma dinâmica que a gente chama de jigsaw, isso, tá? É uma estratégia de ensino que, eu acho que é legal pra estudar esse tema, até porque, se vocês olharem, nao tem muita coisa escrita no texto que entreguei. Tem bastante figura, tá? O texto é curto, entao, é mais pra ilustrar, pra vocês terem uma noçao de como que é. Eu acho que, provavelmente, nao vai dar tempo de terminar hoje na verdade, só assim, eu gostaria que vocês já começassem a ler, tá? Para depois vocês irem para o grupo de especialistas, e estudarem o mesmo tema que o seu amigo tá vendo (Turno 51 - Primeira aula).

Estratégia lúdica

A estratégia lúdica foi empregada por três licenciandas, tendo sido feitas mençoes a ela em quatro das 53 açoes de Ana (uma na apresentaçao da atividade, duas durante o desenvolvimento da atividade e uma no momento de feedback), em 10 das 30 açoes de Cíntia (uma no momento de apresentaçao, oito no desenvolvimento da atividade e uma no momento de feedback) e em todas as açoes de Naiara, 12 no total, para esta solicitaçao (três durante a apresentaçao da estratégia, duas durante o seu desenvolvimento e sete no momento de feedback). Exemplificamos a mençao a esta estratégia com a transcriçao do turno 81 da aula de Ana na qual ela explica como a atividade será desenvolvida.

ANA: Galerinha, eu queria ouvir a voz de vocês, nao queria dar essa aula sozinha, eu queria a presença de vocês. Bem, entao vamos fazer o seguinte, eu vou entao dar uma ajudinha, tá? Pra começar esta aula, vou colocar aqui em cima, diversos materiais, e ai vocês vao me ajudar, escolhendo um metal e vocês vao ter que justificar pra mim por que que é um metal, tudo bem? Só que pra isso, eu preciso que vocês se locomovam um pouquinho até aqui. Pode ser? Oh eu vou distribuir entao os materiais que estao aqui em cima da mesa, vocês vao olhando sao coisas que nao sao tao estranhas assim ao nosso dia-a-dia. (Turno 14 - Primeira aula).

Atividade experimental

Das quatro licenciandas, duas usaram atividades experimentais em suas regências, Ana e Maria. A primeira fez mençao a este tipo de estratégia em 40 de 53 de suas açoes relacionadas a esta solicitaçao (duas na apresentaçao da atividade, 35 no seu desenvolvimento e três no momento de feedback). A Maria fez mençao a esta estratégia em todas as suas açoes referentes a esta solicitaçao (uma na apresentaçao da atividade, cinco no desenvolvimento da atividade e uma no momento de feedback). Exemplificamos a referida solicitaçao com a transcriçao do turno 166 da aula de Ana, na qual fornece informaçoes sobre a atividade experimental.

ANA: Galerinha agora que a gente já entendeu o que sao as ligas metálicas é o seguinte eu tenho como proposta para vocês que a gente produza uma liga metálica, pode ser? E para isso eu preciso que a gente se locomova até o laboratório de química (Turno 166 - Terceira e quarta aula)

Observamos que as licenciandas nao se limitaram ao uso de apenas uma estratégia em suas regências, e também buscaram trabalhar com estratégias que sao potencializadoras da promoçao da argumentaçao em sala de aula, como a atividade experimental, as estratégias lúdicas e o método cooperativo de aprendizagem jigsaw. De fato, a atividade experimental foi referenciada no trabalho de Suart, Marcondes e Lamas27 que, ao analisarem aulas nesta perspectiva identificaram que os alunos, dentre outros aspectos, desenvolveram sua capacidade de argumentaçao oral e escrita. A argumentaçao também foi favorecida no trabalho de Oliveira e Soares,28 no qual o professor agiu como mediador do processo de construçao de argumentos dos alunos ao participarem de um juri químico, considerado como uma estratégia lúdica. No trabalho de Fatareli et al.,20 os autores utilizaram em sala de aula o método cooperativo de aprendizagem jigsaw e, como um dos resultados, obtiveram uma participaçao argumentativa dos alunos durante a atividade.

 

CONSIDERAÇOES FINAIS

No presente trabalho apresentamos as açoes pró-argumentaçao de licenciandas em química durante o momento de prática docente. Antes da realizaçao das regências estas participaram de uma dinâmica de formaçao, a qual se configurou como uma abordagem explícita para ensinar-lhes aspectos da argumentaçao. Na ocasiao, o professor formador conduziu as atividades de modo a promover a aproximaçao das mesmas com referenciais teóricos que fornecem suporte a uma prática pedagógica em uma abordagem argumentativa. Dessa forma, pretendia-se fornecer subsídios para que elas pudessem lançar mao dos conhecimentos adquiridos na dinâmica, no momento de suas regências.

Ao analisarmos as regências, identificamos declaraçoes/açoes/solicitaçoes em seus discursos, as quais se configuraram como açoes pró-argumentaçao, sendo: falar e ouvir, posicionar-se na construçao dos argumentos, justificar com evidências e construir argumentos. Podemos inferir que, provavelmente, as demais declaraçoes/açoes solicitaçoes, conhecer o significado do argumento, avaliar argumentos, contra-argumentar/debater, refletir sobre o processo da argumentaçao, sugeridas por Simon, Erduran e Osborne,7 nao foram identificadas pois requerem açoes de natureza mais complexa por parte do professor, como definir o que é o argumento e incentivar que os alunos reflitam sobre aspectos que fundamentam sua construçao de forma consistente. Além disso, a ocorrência de algumas das categorias, como contra-argumentar/debater, é favorecida, principalmente, no contexto da realizaçao de atividades didáticas que trazem em seu bojo a discussao de questoes de natureza sociocientífica, o que nao foi o caso na maioria das regências conduzidas pelas licenciandas. Ainda nessa mesma perspectiva, consideramos que outras categorias poderiam ter sido identificadas, caso um conjunto de dados mais volumoso de aulas tivesse sido analisado, como ocorre, por exemplo, no trabalho de Simon, Erduran e Osborne,7 no qual os autores analisaram dados oriundos de aulas de 12 professores, coletados ao longo de um ano.

As estratégias utilizadas pelas licenciandas para o desenvolvimento de uma prática argumentativa em suas regências envolveram atividade experimental, estratégia lúdica e o método cooperativo de aprendizagem jigsaw. A natureza dessas estratégias colabora para o desenvolvimento de um ambiente propício à argumentaçao, uma vez que favorece a participaçao dos alunos em atividades didáticas que requisitam seus conhecimentos e têm o potencial de mantê-los motivados a aprender.

Embora sejam necessários estudos de outra ordem que nos permitam estabelecer relaçoes entre a efetividade das atividades realizadas na dinâmica de formaçao e as açoes desencadeadas durante as regências, os resultados aqui apresentados já nos permitem apontar algumas das facilidades e dificuldades vivenciadas pelas licenciandas na promoçao de aulas de cunho argumentativo, o que pode vir a subsidiar açoes de formadores que se debruçam sobre questoes vinculadas ao delineamento de programas de formaçao inicial de professores.

Consideramos ainda relevante o fato das regências aqui apresentadas terem sido alvo de discussao em sala de aula da disciplina de PEQ: as licenciandas foram requisitadas a identificar, em vídeos das suas próprias regências, episódios favoráveis ao desencadeamento da argumentaçao. Para tanto, se basearam na lista de critérios mencionada no tópico Percurso Metodológico e, dessa forma, refletiram sobre os episódios, compartilhando suas experiências com os demais colegas. Ou seja, foi desenvolvido um trabalho no sentido de fortalecer a indissociabilidade teoria e prática, referente à argumentaçao em sala de aula, durante a formaçao inicial. Ademais, sendo o professor formador um dos autores do presente artigo, este participou ativamente da construçao do conhecimento advindo das atividades realizadas.

Por fim, frisamos a necessidade dos licenciandos vivenciarem experiências e práticas de ensino de conceitos coerentes com o que se espera que realizem futuramente, como é o caso da abordagem argumentativa no contexto escolar. Reforçamos, ainda, a importância das disciplinas vinculadas ao estágio curricular supervisionado serem exploradas como um espaço para o desenvolvimento de conhecimentos que baseie o ensino em uma perspectiva argumentativa.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à FAPESP (Processo 2013/21525-4) e ao CNPq (Processo: 446189/2014-6) pelo auxílio financeiro.

 

REFERENCIAS

1. Kim, M.; Anthony, R.; Blades, D.; Research in Science Education 2014, 44, 903. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s11165-014-9407-0

2. Jun-Young Oh, J-Y.; International Journal of Science and Mathematics Education 2014, 12, 353. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s10763-013-9403-2

3. Khishfe, R.; International Journal of Science Education 2014, 36, 974. DOI: http://dx.doi.org/10.1080/09500693.2013.832004

4. http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/blegais.pdf, acessada em junho 2015.

5. Jiménez-Aleixandre, M. P.; 10 Ideas Clave - Competencias en Argumentación y Uso de Pruebas, Graó: Barcelona, 2010.

6. Dawson, V. M.; Venville, G.; Research in Science Education 2010, 40, 133. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s11165-008-9104-y

7. Simon, S.; Erduran, S.; Osborne. J.; International Journal of Science Education 2006, 28, 235. DOI: http://dx.doi.org/10.1080/09500690500336957

8. Aufschnaiter, C. V.; Erduran, S.; Osborne J.; J. Res. Sci. Teach. 2008, 45, 101. DOI: http://dx.doi.org/10.1002/tea.20213

9. Kosko, K. W.; Rougee, A.; Herbst, P.; Mathematics Education Research Journal 2014, 26, 459. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s13394-013-0116-1

10. Sá, L. P.; Queiroz, S. L.; Revista Educación Química en Línea 2009, 2, 104.

11. Archila, P. A.; Revista Eureka sobre Enseñanza y Divulgación de las Ciencias 2012, 9, 361.

12. McDonald, C.; J. Res. Sci. Teach. 2010, 47, 1137. DOI: http://dx.doi.org/10.1002/tea.20377

13. Sampson, V.; Blanchard, M. R.; J. Res. Sci. Teach. 2012, 49, 1122. DOI: http://dx.doi.org/10.1002/tea.21037

14. García de Cajen, S.; Domínguez Castineiras, J. M.; García, R. F. E.; Enseñanza de las Ciencias 2002, 20, 217.

15. Vieira, R. D.; Nascimento, S. S.; Ciênc. Educ. 2009, 15, 443.

16. Sá, L. P.; Kassehboemer, A. C.; Queiroz, S. L.; Revista Ensaio 2014, 16, 140.

17. Petit, A.; Soto, E.; Journal of Adolescent & Adult Literacy 2002. 45, 674.

18. Toulmin, S.; Os Usos do Argumento, Traduçao Reinaldo Guarany. Martins Fontes: Sao Paulo, 2001.

19. Oliveira, J. R. S.; Porto, A. L. M.; Queiroz, S. L.; Revista Educación Química en Línea 2014, 25, 35. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S0187-893X(14)70521-X

20. Fatareli, E. F.; Ferreira, L. N. A.; Ferreira, J. Q.; Química Nova na Escola 2010, 32, 161 .

21. Massi, L.; Cerrutti, B. M.; Queiroz, S. L.; Quim. Nova 2013, 36, 897. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-40422013000600028

22. Teodoro, D. L.; Cabral, P. F. O.; Queiroz, S. L. Alexandria 2015, 8, 21.

23. http://www.cdcc.usp.br/experimentoteca, acessada em fevereiro de 2016.

24. Astleitner, H.; Brunken, R.; Leutner, D.; Journal of Instructional Psychology 2003, 30, 3.

25. Erduran, S.; Ardac, D.; Yakmaci-Guzel, B.; Eurasia Journal of Mathematics, Science and Technology Education 2006, 2, 1.

26. Jiménez-Aleixandre, M. P.; Rodríguez, A. B.; Sci. Educ. 2000, 84, 757. DOI: http://dx.doi.org/10.1002/1098-237X(200011)84:6<757::AID-SCE5>3.0.CO;2-F

27. Suart, R. C.; Marcondes, M. E. R; e Lamas, M. F. P.; Química Nova na Escola 2010, 32, 200.

28. Oliveira, A. S.; Soares, M. H. F. B.; Química Nova na Escola 2005, 21, 18. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-40422005000700005

On-line version ISSN 1678-7064 Printed version ISSN 0100-4042
Qu�mica Nova
Publica��es da Sociedade Brasileira de Qu�mica
Caixa Postal: 26037 05513-970 S�o Paulo - SP
Tel/Fax: +55.11.3032.2299/+55.11.3814.3602
Free access

GN1