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Determinação de estanho em amostras ambientais por espectrometria de fluorescência atômica Determination of tin in environmental samples by atomic fluorescence spectrometry |
Daniel L. GarcezI; Amauri A. MenegárioI,*; José R. FerreiraII,III; Warren T. CornsIV; Carlos A. SuárezI; Ana M. C. M. RolisolaI; Lauren N. M. YabukiI
ICentro de Estudos Ambientais, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, 13506-900 Rio Claro - SP, Brasil Recebido em 07/11/2015 *e-mail: amenega@rc.unesp.br An analytical method to determine tin concentrations in natural samples, by coupling atomic fluorescence spectrometry, hydride generation and flow injection system was developed. The sample digestion procedure and the conditions of hydride generation were fully optimized. The best conditions for the generation of SnH4 were obtained with NaBH4 4% (m v-1) and HCl 0.6 mol L-1. The optimized flow rates were 1.2 mL min-1 for sample, 1.2 mL min-1 for HCl and 1.6 mL min-1 for NaBH4 solution. The sample volume was 500 µL. The best acid volume for digestion of solid samples was stablished to be 3 mL HNO3 + 1 mL HCl. The accuracy of the method was established by the analysis of certified reference materials and by comparative determinations, using inductively coupled optical emission spectrometry. The approach developed was shown to offer a robust method with excellent accuracy and precision for the determination of Sn in environmental samples. Finally, the method was applied to analyse the soil, sediment and water samples, collected in area under anthropogenic activities: processing area of cassiterite in Corumbataí/SP. The obtained data indicated that there was alteration in the natural quality of the environment as a result of the activities developed in that site. INTRODUÇÃO As ações antropogênicas podem promover o aporte de elementos e compostos metálicos ao ambiente, com a elevação de seus níveis naturais, destacando-se as atividades de mineração, industriais, agrícolas e a queima de combustíveis fósseis.1 Em muitos casos estes níveis podem alcançar concentrações com efeitos nocivos aos organismos.2 A entrada do estanho no ambiente ocorre por processos naturais como atividade vulcânica e erosão, e atividades humanas como extração e beneficiamento de cassiterita, fundição e refino, queima de carvão e óleo, incineração de resíduos, produção e uso de compostos de Sn, podendo atingir os compartimentos solo, água superficial e subterrânea.3 Para a determinação de metais em matrizes como solo e água, usualmente são utilizadas a espectrometria de massas com plasma indutivamente acoplado (ICP-MS), de emissão ótica com plasma indutivamente acoplado (ICP OES), de absorção atômica com geração de hidretos (HG-AAS) e de fluorescência atômica com geração de hidretos (HG-AFS). A ICP-MS é uma técnica analítica instrumental efetiva para determinação de Sn em nível de ultratraço, em vários tipos de amostras.4 Contudo, esta técnica apesar de ter outros atrativos, como capacidade de determinação multielementar, exige investimentos de capital e operacionais significativos, restringindo assim a abrangência de sua aplicação. A ICP OES, por sua vez, é uma técnica mais simples e de custo inferior que a ICP-MS, porém, geralmente, não oferece limite de detecção suficiente para determinação de Sn em amostras de águas.5 O uso do AAS para determinação de Sn, frequentemente requer seu acoplamento à geração de hidretos.6 No entanto, quando comparada com a HG-AFS, mostra-se menos sensível. Particularmente para elementos que formam hidretos, como o Sn, a HG-AFS é uma técnica poderosa para a análise quantitativa em água, materiais biológicos e amostras agrícolas, devido a sua alta sensibilidade, alta seletividade e baixos custos operacionais e de investimento capital.7 A técnica de geração de hidretos (HG) não só garante a separação eficaz de espécies metálicas da matriz complexa, em níveis de ultratraço, mas também possibilita a pré-concentração dos analitos, o que implica em uma maior sensibilidade.8 Ressalta-se ainda a importância do HG-AFS no acoplamento com a cromatografia líquida de alta performance (HPLC), para a determinação de espécies organometálicas de Sn. A técnica de injeção em fluxo (FI) possui como aspectos positivos o baixo custo, o pequeno volume de amostra requerido para a determinação, normalmente entre 20 e 100 µL, a redução dos resíduos gerados, maior frequência analítica, conversão físico-química do analito em espécies detectáveis e aumento da precisão quando comparado com análises em batelada.9 Tsuji e Kuga10 empregaram a fluorescência atômica com geração de hidretos não dispersiva (HG-AFSND) para determinação de Sn em amostras de liga de aço. Utilizaram NaBH4 1% (m v-1) e amostras acidificadas à 0,5 mol L-1 de HCl. Obtiveram um limite de detecção instrumental (LOD) de 1,2 µg L-1 Sn. Observaram que os estados de oxidação do Sn (II) e (IV) não afetaram a intensidade do sinal do analito. D'Ulivo et al.11 descreveram um procedimento para determinação simultânea de As, Se, Sn e Hg em água, empregando a HG-AFSND. Foram realizados testes com distintas concentrações de NaBH4 (1,2,3 e 4% m v-1), sendo o melhor sinal para Sn obtido com solução de NaBH4 4% (m v-1) e amostra acidificada à 0,6 mol L-1 de HCl. Nestas condições obtiveram um LOD de 0,1 µg L-1 Sn, porém não utilizaram o método desenvolvido para análise de amostras naturais. D'Ulivo12 reportou resultados de um estudo com HG-AFSND para determinação de Sn em águas naturais enriquecidas artificialmente com analito. Utilizou uma solução de NaBH4 a 1% (m v-1), variando a concentração de HNO3 entre 0,02 e 0,06 mol L-1. Os melhores resultados foram obtidos com HNO3 0,02 - 0,03 mol L-1. O LOD instrumental reportado foi de 13 ng L-1 Sn. Chen et al.13 empregaram a injeção em fluxo (FI) acoplada ao HG-AFSND para determinação de concentrações traço de Sn em amostras de material certificado de aço, com enfoque nos efeitos do uso da L-cisteína na geração do hidreto de Sn. Concentrações distintas de HCl foram avaliadas e, na ausência de L-cisteína, a concentração ótima foi de 0,2 mol L-1. O efeito crítico da acidez foi evidenciado, uma vez que variações na ordem de 0,1 mol L-1 de HCl ocasionaram um decréscimo de 20% no sinal do Sn. Entretanto, com o emprego de 0,5% (m v-1) de L-cisteína, houve um aumento de cerca de 30% no sinal do Sn, e uma maior tolerância da variação da acidez - 0,13 a 0,4 mol L-1 de HCl. Obtiveram um LOD de 2,6 µg L-1. Relatam que o emprego do FI propiciou a experimentação de diversas concentrações de ácido, o que permitiu reduzir a interferência por elementos de transição durante a determinação. Visando uma melhor performance analítica na geração de hidretos de alguns elementos, D'Ulivo et al.14 realizaram testes com AFSND, utilizando agentes mascarantes e filtros óticos. No caso do Sn, a melhor condição analítica de sinal/ruído (SNR) foi obtida sem o uso de filtro, permitindo atingir LOD cinco vezes inferior ao obtido com o uso de filtro. Os autores exploraram também aspectos da influência da acidez do meio. Verificaram que a utilização de L-cisteína promoveu resultados melhores para Sn do que a tiouréia, em termos de independência do sinal analítico a partir do ácido. Para geração do estanano utilizaram HNO3 0,05 mol L-1 e NaBH4 4% (m v-1). O LOD reportado foi de 2 ng L-1, embora o método não tenha sido testado para amostras naturais. Li et al.15 descreveram um novo método para a determinação simultânea de Sn, Pb e Cd, em amostras biológicas, utilizando fluorescência atômica em configuração multi-canal-não-dispersivo com geração de hidretos (HG-MC-AFSND). O método foi aplicado em materiais de referência certificados e consistiu em um sistema com duas bombas peristálticas, dois separadores gás-líquido e um detector de fluorescência atômica. Para a geração de SnH4 utilizaram duas soluções redutoras. Para solução redutora I, 3,5% (m v-1) KBH4 e 1,5% (m v-1) tiouréia foram preparados em 0,2% (m v-1) de KOH. Para solução redutora II, 1,5% (m v-1) KBH4 e 1% (m v-1) de KOH, e 0,4% (m v-1) de ferrocianeto de potássio, adotando-se para o trabalho HCl 2,5% (v v-1). Sob condições experimentais otimizadas obtiveram um limite de detecção instrumental para Sn de 58 ng L-1. Na presente pesquisa observou-se que além de serem reduzidos os estudos sobre determinação de Sn por HG-AFS na literatura, a sua maioria não envolve uma aplicação abrangente e, particularmente, a aplicação em amostras ambientais. Uma consequência desta realidade é que pouco pode-se discutir sobre a robustez desta técnica para aplicações em matrizes distintas. Pelo exposto, no presente trabalho foi desenvolvido um método analítico baseado no acoplamento das técnicas FI-HG-AFS, sendo o método aplicado para análise de Sn em matrizes ambientais, as quais incluem água, solo e sedimento.
PARTE EXPERIMENTAL Área de estudo e amostragem A área de estudo, onde foram coletadas as amostras, trata-se de uma indústria de beneficiamento de cassiterita desativada, localizada no município de Corumbataí/SP. Foram coletadas 11 amostras de solo em locais dentro dos limites do empreendimento e 01 amostra em área a montante da indústria. No charco existente no interior do empreendimento foram coletadas 01 amostra de sedimento e 02 amostras de água. No córrego situado a jusante do empreendimento foram tomadas 02 amostras de sedimento e 04 amostras de água (vide Figura 1). Para determinação das frações dissolvidas, as amotras foram filtradas em campo com filtro de 0,45 µm (modelo Minisart®, marca Sartoirus Stedim Biotech Ltd, Goettingen, DE) e preservadas em HCl 2% (v v-1).
Figura 1. Localizaçao dos pontos de amostragem de solo, sedimento e água, na área da antiga indústria de beneficiamento de cassiterita
Instrumentação Para o desenvolvimento do método foi utilizado um espectrômetro de fluorescência atômica modelo PSA 10.055 Millenniun Excalibur (marca PS Analytical, London, UK). Faz-se importante mencionar que o espectrômetro não é disponível comercialmente para determinação de Sn. Este equipamento foi fornecido pela empresa PSA para o CEA/UNESP, contendo uma lâmpada de Sn de cátodo oco de alta intensidade (BDHCL) e um filtro específico para Sn. Os demais equipamentos utilizados foram: ICP OES (modelo iCAP 6000 Series ICP Emission Spectrometer, marca Thermo Fisher Scientific, Walthan, USA); Sistema de digestão por micro-ondas (modelo Speedwave®four, marca Berghof, Eningen, DE); Sistema de digestão em linha por radiação ultravioleta (modelo PSA 10.570 UV Cracker, marca PS Analytical, London, UK); Sistema purificador de água (Milli-Q, marca Millipore, Belford, USA) e sistema deionizador (RiOs 5, marca MilliPore, Belford, USA); Destilador de ácido sub-boiling (modelo BSB-939-IR, marca Berghof, Eningen, DE); Outros equipamentos de uso rotineiro em laboratórios de química analítica. Materiais e reagentes Todos os reagentes usados durante os experimentos foram de grau e pureza analítica. Todas as soluções foram preparadas com água ultrapura com resistividade de 18,2 MΩ cm-1. Os ácidos utilizados foram previamente destilados abaixo do ponto de ebulição. Os materiais de laboratório e vidrarias foram previamente descontaminados em imersão em HNO3 20% (v v-1) (Merck, Darmstadt, DE), por 4 horas em capela de exaustão. Foram então lavados 7 vezes com água deionizada e 3 vezes com água ultrapura. Após a lavagem, os materiais foram secos em capela de fluxo laminar, no interior de sala insuflada (sala limpa), por 36 horas. As soluções de borohidreto de sódio foram preparadas imediatamente antes das análises, a partir de NaBH4 98% (m m-1) (Sigma-Aldrich, St. Louis, USA), dissolvido em água ultrapura até atingir 2% (m v-1), contando com 0,1 mol L-1 de NaOH (Merck) como preservante. As soluções-padrão utilizadas para a otimização do método analítico foram preparadas a partir de Sn metálico (Sigma-Aldrich). Foram dissolvidos 100,0 mg de Sn metálico em 16 mL de solução de HCl 6 mol L-1 e H2O2 9% (v v-1) (Merck). O excesso de H2O2 foi retirado por aquecimento e ebulição, e então avolumado para 100 mL com água ultrapura. Através de diluições, foram preparadas soluções-padrão de trabalho contendo 0 a 100 µg L-1 Sn, preservadas em HCl 2% (v v-1) (Merck). A concentração da solução-padrão estoque de Sn(IV) foi checada através de uma curva analítica construída a partir de uma solução padrão estoque multielementar contendo 100 mg L-1 de Sn (Specsol®, Quimilab, Jacareí, BR), fornecidas com relatório de rastreabilidade ao National Institute of Standards and Technology (NIST, Gaithersburg, USA). As soluções-padrão de trabalho foram preparadas por diluição da solução-padrão estoque com água ultrapura e preservadas em HCl 2% (v v-1), em concentrações entre 0 e 100 µg L-1 Sn. Para avaliar a exatidão do método foi empegado o material de referência certificado MRC SRM 1944 - Waterway Sediment (NIST), e o material de referência MR GBW 07411 - Chinese Soil (Harbin, China). Preparo das amostras Solo e Sedimento As digestões de solo e sedimento, realizadas em micro-ondas, foram processadas conforme programação descrita abaixo (Tabela 1):
Antes da digestão, as amostras de solo foram homogeneizadas manualmente e então peneiradas em malha de 1 mm, para remoção do material grosseiro como cascalhos, fragmentos de folhas e raízes. O mesmo procedimento foi aplicado às amostras de sedimento, porém, preteritamente estas amostras foram secas em estufa a 60 ºC, por cerca de 3 horas. Considerando que a acidez do meio reativo é um fator crítico para geração da forma volátil de Sn (SnH4), e que fatores de diluição muito elevados podem prejudicar o processo analítico, foram realizados testes de digestão com proporções variadas dos ácidos nítrico e clorídrico, para verificar qual o menor volume de ácidos requerido para digestão das amostras de solo e sedimento. Nesses ensaios fixou-se o volume de HCl em 1 mL. A eficiência das digestões, nas diferentes combinações empregadas, foi avaliada através do uso de materiais de referência. Utilizou-se uma massa de 0,15 g de amostra. Os volumes de ácidos concentrados utilizados para as digestões foram: 8 mL de HNO3 com 1 mL de HCl, 5 mL de HNO3 com 1 mL de HCl e, por fim, 4 mL de HNO3 com 1 mL de HCl. O emprego do HCl no processo de digestão se verifica para garantir a dissolução do Sn, uma vez que elevadas concentrações de HNO3 podem promover a formação de dióxidos insolúveis deste metal. Os extratos digeridos foram diluídos, completando-se os volumes finais com HCl para obtenção de uma acidez final de 2% (v/v). Seguiu-se então a armazenagem das soluções em geladeira até o momento das determinações. Água Para a determinação das concentrações totais de Sn nas amostras de água foi desenvolvido um método simplificado de extração, com o uso da radiação ultravioleta (UV). A amostra de água foi digerida no equipamento PSA 10.570 UV Cracker, baseando-se no procedimento previamente descrito por Sodré et al.16 Não foram utilizados peróxidos e persulfatos, para evitar possíveis contaminações e interferências na geração de estanano. Cada amostra foi introduzida no equipamento, através de tubo de Teflon® de 0,8 mm de diâmetro e 5 metros de comprimento, envolto na lâmpada ultravioleta. O volume total de amostra por digestão foi de 2,5 mL e o tempo de exposição à radiação UV foi de 10 minutos. Após o tratamento fotoquímico, as amostras foram transferidas para tubos Falcon® de 15 mL e armazenadas em geladeira, até serem analisadas. As amostras de água para determinação das frações dissolvidas foram analisadas diretamente por AFS. Desenvolvimento do método analítico Os ensaios experimentais de otimização do método analítico foram iniciados com as variações das concentrações de NaBH4 entre 1-6% (m v-1), posteriormente as variações de HCl entre 0,3-4,0 mol L-1 e, por fim, as vazões das amostras e reagentes entre 0,7 mL min-1, 2,6 mL min-1 e 4 mL min-1. De posse dos resultados destas etapas, foi avaliado o volume de amostra injetada no sistema de fluxo, contando com os volumes de 250, 500 e 1000 µL. Na Figura 2, é exibido o diagrama do sistema de fluxos projetado para o acoplamento HG ao AFS. O estudo foi realizado avaliando a sensibilidade da curva analítica obtida em cada uma das condições citadas.
Figura 2. Diagrama de fluxo projetado para as determinaçoes de Sn em amostras de água, solo e sedimento. O volume definido de amostra é introduzido em um fluxo carregador (C), o qual a transporta até confluir com o reagente 1 (HCl), interagindo com este através da bobina de reaçao RC1. A seguir, a zona de amostra conflui com o agente redutor (NaBH4), iniciando-se o processo de reduçao do Sn, o qual persiste ao longo da bobina de reaçao RC2, atingindo a câmara de separaçao (SC), onde um fluxo de argônio direciona o SnH4 formado ao longo do processo, para o detector AFS
RESULTADOS E DISCUSSÃO Efeito da concentração do borohidreto de sódio Antes da avaliação do efeito da concentração de NaBH4, foi realizado um teste preliminar das concentrações de NaOH, o qual foi usado como preservante das soluções de NaBH4. Foram testadas as concentrações de 0,05 e 0,1 mol L-1 de NaOH. Quando o NaBH4 esteve preservado em 0,05 mol L-1 de NaOH, notou-se efeitos de drift (flutuação do sinal da fluorescência) devido à rápida decomposição do NaBH4. Foi então definida a concentração de 0,1 mol L-1 de NaOH, a qual garantiu a estabilidade necessária ao agente redutor durante o processo analítico. Para avaliar o efeito da concentração de NaBH4, foram testadas as concentrações de 1 - 2 - 4 - 6% deste reagente. Para o processo analítico foi definida a concentração de HCl 1 mol L-1 e mantidas as vazões das amostras e reagentes em 4 mL min-1. A concentração de 1% de NaBH4 não permitiu a formação da chama de atomização do equipamento. Os resultados indicaram uma maior sensibilidade para NaBH4 4%, como pode ser visualizado na Tabela 2. Nestas condições também se obteve a melhor relação linear (R² = 0,9965). Na condição otimizada obteve-se uma relação molar de [BH-4] / [H+] > 1, conforme sugerido por Dedina e Tsalev.17 Entretanto, pode-se observar que elevadas concentrações de NaBH4 prejudicam o processo de geração de SnH4, mesmo com o aumento da relação molar.
Efeito da concentração de ácido clorídrico Os testes com HCl foram realizados com variações das concentrações de 0,3 até 4 mol L-1, conforme detalhado na Tabela 3. Para o processo analítico foi empregado NaBH4 4%, e mantidas as vazões das amostras e reagentes em 4 mL min-1. Pelos resultados obtidos, observa-se que a maior sensibilidade foi obtida com HCl 0,6 mol L-1, conforme Tabela 3, bem como a melhor relação linear (R² = 0,9971). Na condição otimizada, foi mantida a relação molar [BH-4] / [H+] > 1. Novamente nota-se que o aumento excessivo da relação molar prejudica o processo de geração de estanano.
Efeito das vazões dos reagentes e amostra Valendo-se das potencialidades do Programa de Gerenciamento Millenium do espectrômetro Excalibur, as vazões do sistema de injeção em fluxo foram alteradas proporcionalmente, sendo empregadas propulsões a 50 e 100% de rotações, mantendo-se assim a relação molar estabelecida previamente entre [BH-4] / [H+]. Na Tabela 4, são exibidas as vazões individuais dos reagentes e amostra. A vazão total de 0,7 mL min-1 (incluindo amostra e reagentes) não permitiu nem mesmo a formação da chama de atomização. Para estes ensaios foram utilizados NaBH4 4% e HCl 0,6 mol L-1, sendo estes os parâmetros previamente otimizados. Os resultados indicam que a maior sensibilidade foi obtida com a máxima vazão possível para amostra e reagentes (Vazão II, vide Tabela 4).
Efeito do volume de amostra injetado A Figura 3 ilustra os sinais transientes obtidos no sistema analítico otimizado, para volumes de 250, 500 e 1000 µL de uma solução padrão de 10 µg L-1 Sn. Pela análise da Figura 3, observa-se que a melhor condição analítica foi obtida para o volume de 500 µL. Este foi o menor volume de amostra em que a dispersão inerente do sistema de fluxo minimiza a diluição da amostra melhorando a sensibilidade analítica. Acima de 500 µL, as desvantagens relativas a efeito de memória e velocidade analítica são facilmente perceptíveis (vide Figura 3). O uso de tal volume permite ainda anular o efeito memória a partir de 60 segundos, tornando a análise rápida, com uma frequência analítica de 60 amostras h-1.
Figura 3. Sinais analíticos, obtidos no sistema de fluxo otimizado, com a introduçao de 250, 500 e 1000 µL de soluçao padrao de 10 µg L-1 Sn. Os testes foram realizados com NaBH4 4% preservado em NaOH 0,1 mol L-1, HCl 0,6 mol L-1 e vazoes das amostras e reagentes em 4 mL min-1
Figuras de mérito A precisão do método foi avaliada pelo desvio padrão relativo de 09 medidas sucessivas de uma solução de 10 µg L-1 Sn, apresentando um valor de 0,85%. Sob as condições otimizadas descritas anteriormente, foi obtido um LOD instrumental de 90 pg em 500 µL de amostra (180 ng L-1), para o equipamento AFSND Milleniun Excalibur, equipado com lâmpada BDHCL. Como comparação, Chen et al.13 reportaram um LOD de 2,6 µg L-1 Sn, utilizando um AFSND com lâmpada de cátodo oco (HCL). D'Ulivo et al.14 relataram ter alcançado um LOD de 2 ng L-1 Sn, empregando um AFSND com lâmpada de descarga sem eletrodo (EDL). Ressalta-se, no entanto, que em ambos os casos, os métodos não foram utilizados para a análise de amostras ambientais. Outro aspecto a ser destacado é que as lâmpadas do tipo EDL emitem radiação mais intensa, quando comparadas às HCL, implicando em uma maior sensibilidade.18 Análise de solo e sedimento Digestão por micro-ondas Na Tabela 5, são relacionados os resultados obtidos para os diferentes procedimentos de digestão dos materiais de referência (solo e sedimento). Os resultados obtidos apontam recuperações de 88% ± 16% para digestão de solo empregando um volume total de solução digestora de 9 mL, e recuperação de 100 ± 6% para digestão de solo quando o volume total de solução digestora foi de 4 mL, evidenciando exatidão suficiente para os dois procedimentos. Para sedimento, os resultados indicaram recuperações de 84 ± 3% para digestão com 9 mL, 77 ± 3% para 6 mL e de 93 ± 2% para 4 mL de solução digestora, também evidenciando exatidão suficiente para os dois procedimentos.
Não foi observada uma relação clara entre aumento do volume da solução extratora e a diminuição da eficiência da extração. Por exemplo, para solo não houve diferença significativa (nível de 95%) no processo de extração, quando o volume de ácidos foi reduzido de 9 para 4 ml. Para sedimento, as extrações mais eficientes foram obtidas com concentrações extremas de ácidos (4 e 9 ml). Aplicação do método - solo e sedimento Para avaliar a exatidão do método, as amostras S-01, S-02, S-06, S-10, S-11 e SED-01 foram analisadas pelo método proposto e posteriormente por ICP OES. Analisando a Tabela 6, nota-se que as concentrações de Sn obtidas nas amostras de solo, pelos dois métodos, são similares.
Foi realizado um teste t pareado utilizando os resultados para as amostras S-01, S-02, S-06 e SED-01. O conjunto de dados não foi significativamente diferente (p=0,68), para um nível de confiança de 95%. Desta forma, o método desenvolvido no AFS demonstra exatidão, e pode ser considerado eficaz para determinação de Sn em amostras de solos e sedimentos. Esta tabela também permite avaliar o quanto mais sensível a AFS é em relação à ICP-OES. Isto torna-se mais evidente nas amostras S-10 e S-11, onde o LD do ICP-OES foi insuficiente para determinar as concentrações de Sn em solo. Com relação ao aspecto ambiental, nota-se que em algumas regiões do empreendimento (S-04, S-05, S-07, S-09, S-10, S-11 e S-12) as concentrações obtidas se assemelham ao descrito na literatura. Segundo Alloway,19 estudos ao redor do mundo indicaram concentrações de Sn em solo de até 100 mg kg-1 e em sedimento de até 239 mg kg-1, em casos em que estes compartimentos possuem elevado teor de matéria orgânica. Por outro lado, os pontos S-01, S-02, S-03, S-06 e S-08, apresentam concentrações incomuns de Sn em solo, em especial o ponto S-01 (3.902 mg kg-1). Estes pontos estão localizados diretamente sobre a área de disposição de cassiterita e resíduos, ou a jusante imediata desta área. Desta forma, os resultados indicam que as atividades desenvolvidas pela indústria de beneficiamento de cassiterita alteraram a qualidade do ambiente. Os resultados obtidos no sedimento do charco corroboram com tal proposição. Apesar da alteração ambiental evidente, se comparados as concentrações obtidas, aos valores apresentados pela United States Environment Protection Agency (USEPA),20 para solo em cenário residencial (RSL 4.700 mg kg-1 - THQ 0,1), as concentrações de Sn em solo não superam os valores tolerados, não representado risco à saúde humana para um cenário de exposição generalizado. Análise de água superficial Tratamento Fotoquímico de Água por Radiação UV Apesar de se tratar de uma análise visual das amostras, ilustradas na Figura 4, nota-se uma nítida diferença de coloração da amostra tratada por radiação UV, quando comparada com a amostra não submetida ao tratamento. Isto sugere que o tratamento por UV foi eficaz na degradação da matéria orgânica, o que promove a liberação dos íons metálicos associados a esta. Comparativamente Sodré et al.15 relataram uma redução de até 99% de ácido húmico em amostras de água, após tratamento por radiação UV, gerada em um reator ativado por micro-ondas. Neste caso, o tratamento consistiu em ciclos de irradiação de UV de 3 minutos de duração, em forno de micro-ondas, intercalados por 5 minutos de banho de gelo ao reator, a fim de evitar a ebulição da amostra. O tempo total de exposição da amostra à radiação UV foi de 15 minutos. Realizou teste com H2O2 como oxidante e, como resultado relevante, foi observado apenas um menor tempo necessário de exposição ao UV (3 minutos).
Figura 4. Amostra de água superficial (AS-01), antes e depois do tratamento por radiaçao UV
Aplicação do método - água superficial A exatidão do método desenvolvido por AFS foi avaliada através de comparação com o ICP OES, uma vez que não foi possível obter material certificado de referência para amostra de água. Os resultados são apresentados a seguir, na Tabela 7.
Quando comparados os LODs, nota-se que a AFS alcançou um limite de detecção 8 vezes inferior ao obtido na ICP-OES. Por sua vez, as concentrações obtidas usando os dois métodos mostram-se semelhantes para determinação dos teores totais e dissolvidos, evidenciando a exatidão do método proposto. Para os teores totais (AS-01T ao AS-03T), foi realizado um teste t pareado, mostrando que o conjunto de dados não é significativamente diferente (p=0,47), para um nível de confiança de 95%. Quando comparadas as frações totais e dissolvidas, os resultados demonstram que o Sn ocorre preferencialmente na forma particulada, ou seja, o metal está adsorvido à superfície de partículas sólidas suspensas, como o material coloidal e matéria orgânica. No tocante a questão ambiental, observa-se que nenhuma das amostras apresentou concentração de Sn acima do valor de referência ambiental adotado (RSL 1.200 µg L-1). Os pontos AS-02 e AS-03 estão localizados no córrego a jusante da empresa e, desta forma, é uma água em contínua renovação. Por sua vez, o ponto AS-01 trata-se da água do charco localizado no interior do empreendimento e apresentou concentração de Sn cerca de 4 vezes maior que os outros pontos. O charco é um ambiente lêntico, com abundante matéria orgânica, no qual ocorre naturalmente o acúmulo de sedimentos. O Sn contido no sedimento do charco pode ser remobilizado para a água, por diversos fatores químicos e físicos, como ressuspensão das formas precipitadas do metal complexado ou adsorvido.
CONCLUSÕES As melhores condições para geração de SnH4 foram obtidas com solução de NaBH4 4% (m v-1) e HCl 0,6 mol L-1. As vazões otimizadas, foram de 1,2 mL min-1 de amostra, 1,2 mL min-1 de HCl e 1,6 mL min-1 para NaBH4. Nestas condições, foi obtida uma relação molar [BH4-] / [H+] de 1,62 para a geração do hidreto de Sn, confirmando resultados reportados anteriormente. O volume de amostra necessário para a determinação é de 500 µL. Nestas condições, o efeito de dispersão da amostra é minimizado, o consumo de reagentes reduzido e a velocidade analítica de 60 amostras h-1. O LOD obtido no AFS, para amostras de água, foi cerca de 7 vezes inferior aos obtidos no ICP OES para as mesmas amostras, sendo está característica imprescindível para a análise de Sn em água. Para as digestões de solo e sedimento através do uso de micro-ondas, sugere-se o emprego de uma solução digestora constituída de 3 mL HNO3 + 1 mL HCl, evitando assim diluições elevadas e reduzindo o consumo de reagentes. A comparação dos resultados obtidos pela análise das amostras do material de referência, denota que o método desenvolvido mostrou exatidão, com recuperações acima de 88%. A digestão desenvolvida para amostras de água mostrou-se efetiva e adequada para geração do hidreto de Sn, pois pouco afeta acidez final da solução da amostra. As concentrações obtidas nos equipamentos AFS e ICP OES mostraram-se semelhantes para as amostras totais e dissolvidas, evidenciando a exatidão do método proposto. Quando comparado com métodos tradicionais empregados em técnicas como ICP-MS, ICP OES e AAS, o método proposto se mostra menos custoso, tanto em termos de capital como operacional. A alta seletividade e sensibilidade do método desenvolvido são outros atrativos quando comparados às outras técnicas analíticas. O método também mostrou robustez, uma vez que foi aplicado com sucesso em distintas matrizes ambientais (solo, sedimento e água superficial). Pelas características analíticas apresentadas, verifica-se potencial satisfatório ao acoplamento da AFS com a cromatografia líquida de alta pressão (HPLC), para análises de especiação química do Sn em águas, solos e sedimentos, com ênfase à determinação de compostos organoestanosos. Com relação ao aspecto ambiental, nota-se que em algumas regiões da área de estudo apresentam concentrações incomuns de Sn em solo. Estas regiões estão posicionadas sobre a área de disposição de cassiterita e resíduos, ou a jusante imediata desta área. Os resultados indicam que as atividades desenvolvidas pela indústria na área alteraram a qualidade do ambiente. Nas amostras de água, as maiores concentrações de Sn foram obtidas no charco, quando comparadas às águas do córrego, mas em concentrações que não evidenciam alterações ambientais significativas.
AGRADECIMENTOS À PS Analytical pelo fornecimento do equipamento AFS. À FAPESP (projeto Nº 2012/092015/03397-4), CNPq (projeto Nº 307097/2013-7) e CAPES pelo apoio financeiro.
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