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Investigação da atividade eletroquímica de liga Al-Cu-Li após processo de soldagem por fricção e mistura Investigation of the electrochemical activity of an Al-Cu-Li alloy after friction stir welding process |
Rejane Maria P. da SilvaI; Mariana X. MilagreI; João Victor de S. AraujoI,*; Oscar Mauricio P. RamirezII; Caruline de Souza C. MachadoI; Renato A. AntunesIII; Isolda CostaI
I. Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares - IPEN/CNEN, Universidade de São Paulo, 05508-000 São Paulo - SP, Brasil Recebido em: 09/07/2022 *e-mail: joao-neutron@hotmail.com In this work, the local electrochemical activity of the zones coupled by Friction Stir Welding (FSW) of an Al-Cu-Li alloy was studied and the results were correlated to the microstructural characteristics of each zone. Electrochemical studies were carried out in the zones affected by welding using cyclic voltammetry (CV) and scanning electrochemical techniques (namely, SECM - Scanning Electrochemical Microscopy and LEIS - Local electrochemical impedance spectroscopy). The results showed that the welding joint (WJ) is predominantly cathodic relatively to the heat affected zones (HAZ). The HAZ was always anodic and showed the highest electrochemical activities among the tested ones. The high electrochemical activity of the HAZ was associated with the effect of galvanic coupling between the cathodic region (WJ) and the anodic region (HAZ). In addition, the advancing side (AS) presented increased electrochemical activity compared to the retreating one (RS). INTRODUÇÃO O alumínio é um dos metais estruturais mais abundantes na crosta terrestre, o que favorece sua aplicação em grande escala. Além disso, o mesmo apresenta uma interessante propriedade, que é o seu baixo peso específico: 2,70 g cm-1.1-3 Devido às suas características específicas este material possui grande versatilidade, com destaque para aplicações na indústria automobilística e aeronáutica, onde propriedades como a baixa densidade são altamente atraentes, uma vez que materiais com essa propriedade permitem a construção de estruturas mais leves. Isto é uma característica particularmente desejada na indústria aeroespacial devido à necessidade de redução do consumo de combustível.2 No entanto, o alumínio puro, apresenta desempenho insuficiente no que diz respeito às propriedades mecânicas, problema este que é solucionado pela adição de outros elementos químicos, resultando na obtenção das ligas de alumínio.2,3 Os elementos de liga geralmente adicionados são: cobre, magnésio, zinco, manganês e silício. Tais elementos são importantes para conferir propriedades mecânicas, mas também são os que influenciam mais significativamente as propriedades sob o ponto de vista da susceptibilidade à corrosão. No entanto, o processamento das ligas de alumínio gera a precipitação de partículas intermetálicas (IMs), com dimensões típicas entre 2 µm e 30 µm.2 Além de outras partículas com dimensões submicrométricas.4,5 Tais IMs exibem comportamento eletroquímico diferente da matriz, gerando pilhas de ação local e, consequentemente, problemas de corrosão localizada. A formação de micropilhas galvânicas entre a matriz da liga e as partículas de segunda fase é agravada pela baixa qualidade da película passiva formada sobre a matriz nas proximidades destas partículas. É também de particular importância a precipitação de partículas submicrométricas nos contornos de grão, criando zonas de depleção em elementos de liga nas vizinhanças dos contornos de grãos. Sabe-se que a corrosão localizada associada à presença de IMs e partículas nanométricas de segunda fase é o ponto de partida para diversos tipos de corrosão que atingem as ligas de alumínio. Por este motivo, é possível encontrar diversos estudos focados no papel dos IMs e partículas nanométricas na corrosão desta classe de material.6-10 Na literatura são encontrados diversos trabalhos relacionados aos estudos de corrosão de ligas Al-Li.11-17 No entanto, nestes estudos, quando necessário, o comportamento eletroquímico das ligas Al-Li foi estudado utilizando técnicas eletroquímicas clássicas, associada à análise dos resultados de uma grande área amostrada. Estes estudos eletroquímicos globais são geralmente realizados com eletrodos macroscópicos, o que não permite diferenciar a reatividade associada aos defeitos microestruturais daquela exibida pela matriz, pelo menos nos estágios iniciais da corrosão. Além disso, em se tratando do alumínio (um metal passivo), os resultados em geral representam uma combinação da resposta tanto das regiões submetidas à corrosão localizada como da região passiva ao redor18 o que, muitas vezes, impede a separação das contribuições específicas de cada processo por meio de análises globais. A corrosão localizada é responsável por uma distribuição não uniforme da densidade de corrente na superfície do metal, bem como de espécies ionicas, como íons metálicos, H+ e O2. Para essas formas localizadas de corrosão, técnicas locais de varredura fornecem informações espaciais e temporais mais precisas.19 Outro fato é que, normalmente, a construção de estruturas de grande porte requer a utilização de processos de junção de diferentes partes. Uma das tecnologias mais frequentemente utilizadas para esta finalidade é a soldagem. No entanto, no processo de soldagem, as altas temperaturas atingidas provocam mudanças na microestrutura do material, modificando suas propriedades, o que acaba por provocar variações no desempenho anticorrosivo das diferentes regiões, levando ao desenvolvimento de células galvânicas, tanto entre as diferentes regiões da liga soldada, como no interior de uma mesma região. Em função do exposto, para ter acesso às reatividades eletroquímicas locais, e, deste modo, tornar possível identificar os processos de iniciação da corrosão sobre ligas de alumínio, torna-se necessário utilizar técnicas com elevado poder de resolução espacial, que permitam acompanhar a evolução da resposta eletroquímica do sistema in-situ. Nos últimos anos ocorreu grande evolução das técnicas de avaliação de processos superficiais com elevado poder de resolução espacial, como o microscópio eletroquímico de varredura (SECM - Scanning Electrochemical Microscopy),20 as técnicas de varredura por eletrodo de referência (SRET - Scanning Reference Electrode Technique)21 ou eletrodo vibratório (SVET - Scanning Vibrating Electrode Technique)20 e a espectroscopia de impedância eletroquímica localizada (LEIS - Local Electrochemical Impedance Spectroscopy).22 Todas elas têm ajudado a elucidar o papel de heterogeneidades no comportamento de corrosão dos materiais. Neste cenário, as técnicas de varredura eletroquímicas locais como SVET, LEIS e SECM constituem-se como boas alternativas no estudo de processos de corrosão metálica. É importante ressaltar que na literatura, a maioria dos trabalhos que investigam a corrosão de ligas de alumínio soldadas é baseada em observações microestruturais e utilização de técnicas eletroquímicas globais, enquanto as técnicas eletroquímicas locais, apesar de utlizadas, ainda não são aplamente difundidas. Nos trabalhos publicados por Bousquet et al.23 e por Jariyaboon et al.,24 microcélulas foram utilizadas para medidas locais, mas a configuração da metodologia adotada, não permite avaliar o efeito galvânico entre diferentes regiões, o que pode ser possível com o emprego de técnicas eletroquímicas localizadas. Técnicas microeletroquímicas empregando principalmente sondas amperométricas foram usadas com sucesso na investigação de diferentes zonas soldadas de ligas de alumínio soldadas pelo processo de fricção e mistura (FSW- friction stir welding).25-30 Nestes estudos, estas técnicas mostraram-se muito úteis para avaliar a resposta eletroquímica local nas diferentes zonas resultantes do processo de soldagem. Moreto et al.31 estudaram o comportamento da corrosão localizada da liga AA2198-T851 e estabeleceram uma comparação com os resultados obtidos para a liga AA2524-T3 em solução de NaCl 0,6 mol L-1 aerada, utilizando a técnica de varredura SVET. Os autores concluíram que a liga AA2198-T851 apresentou maior resistência ao pitting quando comparada com a AA2524-T3. Já, Sidane et al.30 estudaram uma liga dissimilar soldada (AA2050-T8 e AA7449-T79) utilizando as técnicas eletroquímicas locais: SECM e LEIS. Empregando a SECM os autores mostraram que a cinética eletroquímica muda na camada passiva entre os dois materiais nas diferentes regiões da solda. Esta variação foi atribuída à existência de um par galvânico entre as ligas 2050 e 7449. Os experimentos de SECM foram acompanhados por LEIS, que confirmou a existência de uma alta atividade eletroquímica local na região de acoplamento entre a liga AA2050 e a AA7449. O estudo da corrosão local de uma liga de alumínio empregando as técnicas de SVET e LEIS em um mesmo trabalho, também é reportado.32 Além disso, diferenças eletroquímicas locais resultantes do processo de soldagem foram também reportadas em estudos utilizando a técnica SECM para investigação de ligas de Al-Cu-Li soldadas por FSW.27,28,33,34 Recentemente, Milagre et al.28 mostraram que a técnica de SECM em modo de competição redox é sensível as diferenças entre o comportamento eletroquímico dos lados de avanço (LA) e retrocesso (LR) da liga AA2098-T351. A atividade eletroquímica relacionada ao LR foi superior comparada ao LA quando as zonas de soldagem foram galvanicamente acopladas. Entretanto, as propriedades das ligas de Al também são sensíveis a differentes parametros de soldagem, como reportado por Jariyaboonet et al.24 Neste contexto, este trabalho tem por objetivo estudar a atividade eletroquímica local de zonas acopladas da liga AA2098-T351 geradas após processo FSW utilizando diferentes parâmetros de soldagem em relação aqueles já reportados na literatura.28 Para tanto, a caracterização da microestrutura e química da superfície foram correlacionadas à atividade eletroquímica das diferentes regiões investigadas. Os estudos eletroquímicos foram realizados nas zonas acopladas correspondentes à junta soldada (JS) e à zona termicamente afetada (ZTA) de ambos os lados da liga FSW, utilizando a técnica de voltametria cíclica em conjunto com uma micro-célula e técnicas eletroquímicas localizadas de LEIS e SECM. Os resultados indicaram que a técnica de SECM foi sensível à variação dos parâmetros de soldagem utilizados. Além disso, diferentes comportamentos eletroquímicos entre o LA e LR também foram observados utilizando a técnica de LEIS. Desse modo, o uso destas técnicas de varredura microeletroquímica para estudar atividade eletroquímica local de diferentes regiões formadas pelo processo FSW contribui para o campo de conhecimento relacionado ao comportamento de corrosão de ligas Al-Cu-Li após soldagem.
PARTE EXPERIMENTAL Materiais Amostras da liga AA2098-T351 (3,4 wt% Cu, 1 wt% Li, 0,3 wt% Mg, 0,3 wt% Ag, 0,4 wt% Zr, 0,04 %wt Fe, 0,05 wt% Si, 0,02 wt% Zn, 0,003 wt% Mn) soldadas pelo processo de fricção e mistura (FSW) foram usadas neste trabalho. O processo de soldagem por fricção e mistura (FSW) foi realizado utilizando uma velocidade de rotação de 1000 rpm em sentido anti-horário e uma velocidade transversal de 150 mm min-1. Foi utilizada uma ferramenta com ombro de 10 mm de diâmetro e pino ajustável de 5 mm de comprimento. As superfícies de amostras da liga foram preparadas conforme procedimentos metalográficos que consistiram de polimento mecânico com lixas de carbeto de silício (SiC) em diferentes gramaturas (#500, #800, #1200, #2500, #4000), e em seguida por polimento com suspensão de diamante de 3 µm e 1 µm. Todos os ensaios foram realizados sobre a superfície superior da amostra soldada. Caracterização de superfície Inicialmente, imagens de microscopia óptica foram obtidas utilizando uma câmera LEICA DMLM acoplada a microscópio óptico, com o intuito de se revelar a microestrutura das amostras após ataque, utilizando uma solução contendo 25% de HNO3 e 3% de HF em água deionizada. Micrografias ópticas das amostras foram também obtidas após ensaios de imersão realizados em solução 0,005 mol L-1 de NaCl, com o intuito de monitorar a evolução do processo de corrosão. Para tanto, os testes foram realizados em meio naturalmente aerado a temperatura ambiente (22 ± 2) ºC, sendo as amostras removidas da solução após diferentes tempos de exposição, e em seguida enxaguadas com água deionizada e secadas para posteriores observações por microscopia. A utilização de uma solução mais diluída pode aumentar a resistividade do eletrólito permitindo o isolamento dos processos associados a partículas micrométricas e corrosão localizada severa, como consequência, as áreas corroídas são mais bem resolvidas nos mapas de ensaios eletroquímicos locais, uma vez que as linhas de corrente estão concentradas nestas regiões. Este efeito da concentração de íons no comportamento eletroquímico de ligas Al-Cu-Li foi discutido por Machado et al.35 Portanto, os ensaios de imersão e eletroquímicos neste trabalho foram conduzidos em solução 0,005 mol L-1 de NaCl, permitindo uma melhor correlação entre os resultados obtidos. Um microscópio eletrônico de varredura MEV (SEM, ZEISS EVO 15, White Plains, NY, EUA) equipado com microanalisador de energia dispersiva de raios X (EDS, Oxford Instruments X-MAX system, High Wycombe, Reino Unido) foi empregado para a análise composicional de partículas micrométricas presentes na liga polida AA2098-T351 (tanto para o metal base quanto para as regiões soldadas da liga). A composição química das amostras foi estudada por meio da espectroscopia de fotoelétrons excitados por raios-X (X-ray photoelectron spectroscopy - XPS) empregando um espectrômetro ThermoFisher Scientific, modelo K-alpha+, sendo o feixe gerado por uma fonte monocromática de radiação Al K-α, com o diâmetro do feixe de 400 µm e a pressão da câmara de análise em cerca de 10-7 Pa. Espectros XPS de ampla varredura foram registrados nas diferentes zonas de soldagem da liga AA2098-T351, tanto antes quanto após processo de corrosão por 72 h. O teste de visualização em gel de ágar-ágar foi usado para investigar a susceptibilidade à corrosão localizada das diferentes regiões da liga soldada por meio de alterações localizadas no pH do gel. Para isso, o gel foi preparado utilizando uma mistura de 3 g de ágar-ágar, 7 mL de indicador universal e 100 mL de uma solução 0,6 mol L-1 de NaCl. A solução foi então aquecida a 100 oC. Posteriormente, o gel foi vertido sobre as superfícies investigadas. Desse modo, alterações na coloração do gel, em função das alterações de pH local, foram observadas e monitoradas em função do tempo e, desse modo, usadas na identificação das regiões anódicas e catódicas presentes na superfície das amostras estudadas. Caracterização eletroquímica Neste estudo, todos os ensaios eletroquímicos foram realizados em solução 0,005 mol L-1 de NaCl, aerada naturalmente à temperatura ambiente (22 ± 2) ºC. Curvas de voltametria cíclica foram obtidas especificamente nas diferentes regiões (JS/ZTA) da liga soldada AA2098-T351, usando uma célula eletroquímica que limitava aproximadamente 0,20 cm2 da superfície. Os testes foram realizados usando um potenciostato Solartron 1287 em uma configuração convencional de 3 eletrodos, com um fio de platina como eletrodo auxiliar, Ag/AgCl /KCl(sat) como eletrodo de referência, e amostras da liga AA2098-T351 soldada, como eletrodo de trabalho. As varreduras foram registradas após 15 minutos de exposição à solução teste, na faixa de potencial entre -1,2 V e 0,0 V e com uma taxa de varredura de 10 mV s-1. Os efeitos da soldagem por fricção e mistura na susceptibilidade à corrosão da liga AA2098-T351 foram também avaliados por meio de técnicas eletroquímicas locais (SECM e LEIS). Inicialmente, a técnica SECM foi empregada usando um microscópio eletroquímico Sensolytics - GmbH Bochum. Os testes foram realizados em potencial de circuito aberto (sem polarização da amostra) utilizando um arranjo experimental constituído por um ultra-microeletrodo de Pt de 25 µm como eletrodo de trabalho, Ag/AgCl/KCl(sat) como eletrodo de referência e um fio de platina como contra-eletrodo. Para obtenção dos mapas de SECM, inicialmente, a distância da ponta de Pt em relação à superfície a ser caracterizada foi ajustada. Para tanto, curvas de aproximação (no eixo Z) foram obtidas e a partir destas a distância mais adequada (20 µm) para obter a resposta eletroquímica em relação ao substrato (amostra) foi então selecionada. Esta distância (ponta-substrato) foi então mantida fixa durante o mapeamento SECM da amostra. Desse modo, sucessivas varreduras da ponta de Pt no plano XY foram registradas por meio da medida de corrente registrada na ponta em função da sua localização na superfície. Os experimentos foram realizados utilizando o modo SECM de competição redox. Neste modo de operação, o SECM é usado sem qualquer mediador, portanto utilizou-se uma solução de 0,005 mol L-1 de NaCl e, o conteúdo de oxigênio molecular pôde ser monitorado a partir de sua eletroredução na ponta36 em -0,70 V Ag/AgCl. Neste potencial, a redução de oxigênio ocorre sob controle por difusão, tal como: Uma vez que nenhuma outra espécie pode ser reduzida neste potencial, este procedimento irá fornecer informações sobre a depleção de oxigênio perto da superfície, especificamente nos locais onde a redução de oxigênio ocorrer, tal como ilustrado na Figura 1.
Figura 1. Esquema representativo mostrando as regiões catódicas e anódicas das diferentes regiões (JS/ZTA) da liga FSW AA2098-T351 em corrosão
Nesse modo de operação, tanto a ponta (polarizada em -0,70 V), como a superfície (em corrosão), competem pelo oxigênio dissolvido em solução. Dessa maneira, considerando, por exemplo, que as regiões catódicas de uma superfície em corrosão poderão consumir mais efetivamente o oxigênio próximo à superfície, a ponta, portanto, irá detectar menores quantidades de oxigênio nessas regiões e, consequentemente, correntes de redução menores são observadas nessas zonas. Por sua vez, a técnica LEIS foi utilizada para monitorar a admitância das diferentes regiões (JS/ZTA) da liga FSW AA2098-T351. Valores de admitância foram registrados pela varredura da sonda LEIS nas direções XY em relação à superfície, utilizando o equipamento AMETEK (VersaSCAN, EUA). A sonda LEIS utilizada é constituída por um anel de platina e um micro-disco de platina com um diâmetro de aproximadamente 100 µm. Como eletrodo de referência também foi utilizado o eletrodo de Ag/AgCl/KCl(sat). Dessa forma, a sonda LEIS foi posicionada a uma altura de aproximadamente 100 µm em relação à superfície, a qual foi ajustada com o auxílio de um sistema de TV com câmera de vídeo. Por fim, os testes foram realizados a uma frequência fixa de 10 Hz e amplitude de 10 mV.
RESULTADOS E DISCUSSÃO Caracterização da superfície da liga FSW AA2098-T351 As características microestruturais das diferentes zonas da liga FSW AA2098-T351 podem ser observadas a partir da inspeção da micrografia óptica da seção transversal mostrada na Figura 2.
Figura 2. Micrografia óptica da seção transversal da liga AA2098-T351 soldada por FSW mostrando as zonas afetadas pela soldagem, no lado de retrocesso (LR) e no lado de avanço (LA)
A Figura 2 mostra diferentes características microestruturais ao longo da soldagem como resultado do processo FSW. Os aspectos microestruturais foram discutidos em trabalhos anteriores e demostram que a variação dos parâmetros de soldagem utilizados modifica as propriedades mecânicas da liga AA2098-T351, o que está associado com a variação na densidade de fases endurecedoras nanométricas presentes neste material.34,37 De modo geral, são formadas diferentes zonas devido à deformação sofrida pelo material e aos diferentes ciclos térmicos que ocorrem durante o processo. Em ligas FSW soldadas, como a AA2098-T351, a zona de mistura (ZM) é caracterizada pela intensa deformação plástica e pelo forte aquecimento que causam recristalização dinâmica.37 Esta zona também apresenta dissolução de fases e formatos de grãos equiaxiais. Na zona termo-mecanicamente afetada (ZTMA), as altas temperaturas atingidas e o efeito do movimento da ferramenta provocam a deformação dos grãos.37 A dissolução das fases endurecedoras também ocorre nesta zona.37,38 Por outro lado, não são observadas modificações na forma do grão na zona afetada pelo calor (ZTA). No entanto, as temperaturas atingidas nesta zona são responsáveis pela dissolução e engrossamento das fases.37 Foi demonstrado que as temperaturas atingidas na junta de soldagem (ZTMA e ZM) de uma liga AA2098-T351 soldada por FSW foram maiores (300-600 °C) em comparação com a ZTA (< 380 °C). Na JS, as altas temperaturas atingidas causam a dissolução das partículas T1 (Al2CuLi) e a precipitação de partículas ricas em cobre como a fase Ω e as zonas GP.37 Estas são as fases predominantes em têmperas super envelhecidas de ligas Al-Cu-Li.39,40 A presença de partículas ricas em cobre nas diferentes zonas de soldagem das ligas Al-Cu-Li, bem como a dissolução da fase T1, tem sido relatada na litaratura.41,42 Imagens de MEV-EDS da liga estudada neste trabalho mostram que esta apresenta partículas micrométricas, Figura 3. Além dos mapas de EDS do metal base, mostrados na Figura 3, também foram obtidos mapas EDS das diferentes zonas da liga FSW, Figura 4(a) e 4(b). Os mapas elementares mostram que as partículas micrométricas são compostas principalmente por Al, Cu e Fe, em todos os casos (Figuras 3 e 4).
Figura 3. Imagens de MEV-EDS das partículas micrométricas observadas na superfície da liga AA2098-T351 (metal base)
Figura 4. Imagens de MEV-EDS das partículas micrométricas observadas nas regiões de acoplamento JS/ZTA, seja no LR (a) ou no LA (b), da liga FSW AA2098-T351
Caracterização química superficial da liga AA2098-T351 soldada por FSW A caracterização química superficial das zonas JS/ZTA(LR) e JS/ZTA(LA) da liga FSW AA2098-T351 polida e após processo de corrosão foi realizada utilizando a técnica XPS, tal como apresentado na Figura 5. Estas análises realizadas nas zonas da liga soldada permitiram comparar a composição química das diferentes regiões. A Figura 5 mostra os espectros XPS obtidos no modo linescan de ampla varredura registrados nas diferentes zonas de soldagem, tanto antes, quanto após processo de corrosão. Assim, a Figura 5(a) mostra os espectros registrados para a condição polida, enquanto a Figura 5(b) representa os espectros obtidos para estas zonas após corrosão (corroídas). Nas regiões analisadas da liga polida, elementos como O, Al e Cu foram observados.
Figura 5. Espectros survey de ampla varredura obtidos nas zonas de acoplamento JS/ZTA (LR) e JS/ZTA (LA) da liga AA2098-T351 soldada por FSW; (a) polida e (b) após processo de corrosão
Picos de oxigênio bem perceptíveis foram obtidos nas diferentes regiões analisadas, o que é esperado devido à formação de óxidos formados naturalmente na superfície. Picos de Al2p foram observados para zonas polidas de ambos os lados da liga soldada, e estão diretamente relacionados à camada de hidróxido/óxido formada naturalmente na superfície da liga.43,44 Após corrosão, Figura 5(b), os sinais Al2p foram ligeiramente menores em comparação à condição polida, o que é esperado devido à oxidação do alumínio durante o processo de corrosão destas superfícies. Além disso, os picos de Al2p, após corrosão, foram ligeiramente maiores para ZTA (LR) comparada a ZTA (LA), indicando que atividade de corrosão foi mais intensa nesta última. Pelos espectros de XPS da Figura 5, também é observado que nas diferentes regiões da liga soldada, ocorreu enriquecimento em óxidos de Cu. Energias de ligação em torno de 972 eV e 978 eV foram observadas nas diferentes zonas investigadas (polidas e corroídas) e indicam a presença de partículas intermetálicas ricas em Cu,45 redeposição de Cu46,47 e óxido de Cu.48 Os Espectros de XPS de alta resolução apresentados na Figura 6 corroboram estes resultados, mostrando diferenças quanto à composição química da superfície para ambos os lados da liga FSW. Picos de Al2p de maior intensidade obtidos na ZTA (LR) sugerem um óxido de Al (formado naturalmente) mais preservado (Figura 6(a)). Além disso, o maior sinal de Cu2p observado para a ZTA (LA) após a corrosão, indica uma maior atividade na ZTA (LA) (Figura 6(b)), uma vez que a redeposição de Cu é favorecida próximo às regiões anódicas da liga corroída.
Figura 6. Espectros de XPS de alta resolução de Al2p, Cu2p e O1s obtidos nas zonas de acoplamento (a)-(c) JS/ZTA (LR) e (d)-(f) JS/ZTA (LA) da liga FSW AA2098-T35 polida e após processo de corrosão
Visualização da atividade de corrosão A Figura 7 mostra micrografias ópticas das zonas JS e ZTA da liga AA2098-T351 após vários períodos de imersão até 24 h em solução 0,005 mol L-1 de NaCl, naturalmente aerada. Diferentes características de corrosão foram observadas nas interfaces das zonas JS e ZTA investigadas. O desenvolvimento de sítios de corrosão localizada severa (CLS) foi identificado nas regiões das ZTAs, enquanto que, no JS foram observadas trincheiras e cavidades. Durante o processo de soldagem, a fase T1 é dissolvida na JS, e muitas das partículas micrométricas ricas em Cu, que foram formadas durante a fundição das ligas de Al, permanecem nesta região, embora possam ter sido quebradas e arrastadas devido aos movimentos da ferramenta, favorecendo o acúmulo de partículas ricas em Cu em dadas regiões, a nucleação de corrosão localizada em torno destas partículas, catódicas em relação à matriz e, consequentemente, o desenvolvimento da corrosão por trincheiras em que a região vizinha às partículas é preferencialmente atacada. O ataque ao redor das partículas micrométricas é caracterizado como superficial, enquanto que nos sítios de corrosão localizada severa (CLS) o ataque de corrosão penetra profundamente na liga.49 Foi observado o desenvolvimento de sítios CLS nas regiões da ZTA, e a deposição de produtos de corrosão nesses sítios, o que aumentou com o tempo de exposição. Maiores volumes de produtos de corrosão foram observados nas regiões da ZTA em comparação com a JS. Além disso, a deposição dos produtos de corrosão no LA ocorreu em maior quantidade em relação ao LR, sendo este efeito mais notório para maiores períodos de imersão.
Figura 7. Imagens ópticas das zonas JS/ZTA da liga FSW AA2098-T351 após diferentes tempos de imersão em solução 0,005 mol L-1 de NaCl por até 24 h. Os círculos brancos pontilhados indicam os sítios de corrosão localizada desenvolvidas nas regiões ZTA da liga
Essas observações devem estar relacionadas à maior diferença de potencial eletroquímico no LA. Portanto, a maior atividade de corrosão desenvolvida na ZTA (LA) em comparação a ZTA (LR), pode ser atribuída à maior quantidade de partículas quebradas e arrastadas nesse lado da liga soldada.9 As imagens de MEV apresentadas na Figura 8, confirmam esses resultados, mostrando que de fato no LA a intensidade da CLS é mais significativa comparada às outras zonas de soldagem da liga.
Figura 8. Imagens de MEV das zonas JS/ZTA de ambos os lados (LA e LR) da liga FSW AA2098-T351 após processo de corrosão em solução 0,005 mol L-1 de NaCl
O desenvolvimento de processos de corrosão galvânica entre as zonas acopladas da liga soldada pode ser inicialmente visualizado usando o teste de ágar-ágar. Este simples teste pode ser aplicado para visualizar as regiões catódicas e anódicas em diferentes áreas das superfícies expostas ao gel de ágar-ágar a partir das mudanças de pH que ocorrem em sua superfície, pois estão diretamente associadas com a modificação da cor do gel, devido ao uso de um indicador universal de pH.28,50 Nesse teste, com o indicador utilizado, a cor verde está relacionada ao pH mais alto (alcalino), enquanto que as cores vermelho/laranja estão associadas ao pH mais baixo (ácido). As Figuras 9-11 correspondem às imagens de superfícies das zonas de soldagem acopladas JS/ZTA (LR) e JS/ZTA (LA) para diferentes tempos de exposição ao teste de ágar-ágar. Pode-se observar que quando a zona ZTA (tanto do LR quanto do LA) é acoplada ao JS, um aumento do pH, indicado pela escala de cor verde, ocorreu na superfície da JS. Portanto, reações catódicas estão predominando nesta zona. Por outro lado, houve diminuição localizada do pH nas regiões da ZTA, indicada pelas escalas de cor vermelha, que foi mais intensa nos sítios de corrosão localizada. Esses sítios estão associados à ocorrência de CLS, sendo observada uma forte atividade anódica nestes respectivos locais, quando acoplados ao JS, conforme mostrado nas Figuras 10(a) e 11(c). Finalmente, nenhum sítio de CLS foi observado nas zonas JS durante o teste (ver Figuras 10(b) e 11(b)).
Figura 9. Imagens de superfície das zonas JS/ZTA (LR) galvanicamente acopladas para diferentes tempos de exposição ao teste de ágar-ágar (a) e após concluído o teste (b)
Figura 10. Imagens ópticas das zonas JS/ZTA do LR obtidas após o teste de visualização em gel ágar. O círculo branco pontilhado indica a região de CLS desenvolvida na ZTA
Figura 11. Imagens de superfície das zonas JS/ZTA (LA) galvanicamente acopladas para diferentes tempos de exposição ao teste de ágar-ágar (a) e após concluído o teste (b) e (c)
Embora os efeitos do acoplamento galvânico em ligas de alumínio soldadas por FSW tenham sido caracterizados usando o teste de gel de ágar,26,28,51 existe controvérsia na literatura sobre a aplicabilidade deste teste devido ao impedimento à livre circulação de íons no ambiente de gel. Portanto, a fim de investigar melhor as regiões catódicas e anódicas nas diferentes zonas soldadas em função do macroacoplamento galvânico, técnicas microeletroquímicas localizadas foram empregadas, conforme descrito a seguir. Caracterização da atividade eletroquímica local das zonas soldadas da liga AA2098-T351 A caracterização eletroquímica das diferentes zonas soldadas da liga FSW AA2098-T351 foi realizada para se obter informações relacionadas à atividade eletroquímica local das diferentes regiões desenvolvidas após processo de soldagem, em função das características microestruturais e composição específica, bem como correlacionando aos efeitos do macro acoplamento galvânico observado entre as diferentes regiões que foram evidenciadas usando o teste de visualização de gel ágar descrito anteriormente. Neste contexto, é evidente que a atividade eletroquímica local tende a ser mais bem caracterizada quando técnicas eletroquímicas com elevado poder de resolução espacial são empregadas, ao invés de métodos eletroquímicos convencionais que apenas fornecem respostas eletroquímicas médias associadas à totalidade da superfície analisada. As técnicas eletroquímicas locais podem fornecer respostas em termos de contribuições específicas em uma amostra analisada, como, por exemplo, da atividade específica de um determinado pite desenvolvido numa superfície em corrosão. Neste âmbito, estudos microeletroquímicos locais foram realizados com o intuito de caracterizar as zonas de interface JS/ZTA em ambos os lados (LA e LR) da liga soldada por FSW. Para tanto, estas regiões foram separadas para análises posteriores, conforme esquematizado na Figura 12.
Figura 12. Esquema representativo da obtenção das amostras a partir das zonas JS/ZTA acopladas de ambos os lados (LA e LR) da liga AA2098-T351 soldada por FSW
Voltametrias cíclicas localizadas Um procedimento alternativo ao uso de métodos que empregam sondas de varreduras para obter respostas eletroquímicas localizadas espacialmente, consiste na miniaturização da amostra, expondo efetivamente ao eletrólito apenas uma pequena área da superfície que pode ser delimitada por uma microcélula. Dessa forma, a resposta eletroquímica da região isolada pode ser obtida e, assim, cada uma das diferentes regiões da liga soldada pode ser investigada separadamente. A Figura 13 mostra os voltamogramas cíclicos (VC) das regiões ZTA e JS da liga AA2098-T351 soldada por FSW obtidos por meio de uma microcélula eletroquímica. Conforme descrito acima, esta configuração permitiu avaliar a atividade eletroquímica local das zonas específicas expostas a solução 0,005 mol L-1 de NaCl, sem qualquer acoplamento galvânico entre as diferentes zonas da liga soldada. Especificamente, na Figura 13, a curva vermelha mostra a resposta obtida para a ZTA (LA) enquanto a curva preta, a resposta correspondente à ZTA (LR), ambas comparadas com a resposta da JS (curva azul). Vale ressaltar que, as voltametrias cíclicas obtidas na JS para duas amostras separadas referentes ao LR e LA, conforme esboçado na Figura 12, indicaram substancialmente a mesma resposta eletroquímica quando delimitadas pela microcélula. As regiões de correntes mais altas (indicados por setas) observadas no voltamograma estão associadas à dissolução do filme passivo e, correspondem, portanto, às correntes de oxidação. Desse modo, é possível notar comportamentos eletroquímicos diferentes para as diferentes regiões analisadas.
Figura 13. Voltamogramas cíclicos das regiões ZTA e JS da liga AA2098-T351 soldada por FSW obtidos por meio de uma microcélula eletroquímica
A partir da inspeção da Figura 13, pode-se observar que JS apresenta valores de correntes de oxidação mais baixos em comparação com as zonas de ZTA para ambos os lados da liga soldada. Sendo que a ZTA (LA) apresentou correntes de oxidação mais altas comparadas a ZTA (LR), indicando que a dissolução do filme passivo foi mais efetiva nessa região. No entanto, apenas com base nos VC obtidos com o uso da microcélula, não foi possível identificar diferenças significativas entre os potenciais de pite (Epit), relacionados à quebra do filme passivo na ZTA (LA) e ZTA (LR). Por sua vez, os valores de correntes ligeiramente mais baixas observados na curva obtida na JS, indicam que esta região é mais resistente à corrosão do que a ZTA de ambos os lados da liga (LR e LA). As correntes de oxidação mais altas e diretamente associadas com a dissolução mais rápida do filme correspondem, portanto, à curva medida na ZTA (LA). No entanto, tanto a ZTA (LA) como a ZTA (LR) mostraram-se eletroquimicamente mais ativas que a JS. Considerando que a microcélula delimita apenas uma região específica da liga, expondo-a ao eletrólito, as outras regiões da liga não serão expostas a solução. Sendo assim, os efeitos do acoplamento galvânico não estarão operando efetivamente nessa configuração e, assim, a atividade eletroquímica obtida corresponde somente a cada região específica da liga soldada. Deste modo, para melhor compreender a atividade eletroquímica resultante da interação destas diferentes regiões, estudos foram realizados utilizando técnicas microeletroquímicas de varredura localizada nas respectivas zonas acopladas, tal como esquematizado na Figura 12. Os resultados obtidos nessa investigação são apresentados e discutidos a seguir. Microscopia eletroquímica de varredura (SECM) Os testes de microscopia eletroquímica de varredura (SECM) foram realizados nas interfaces JS/ZTA (LR) e JS/ZTA (LA) da liga AA2098-T351 soldada por FSW, imersas em solução 0,005 mol L-1 de NaCl. Para isso, a sonda de Pt foi utilizada empregando o modo SECM de competição redox. Neste modo, ocorre uma competição redox para a eletro-redução do oxigênio dissolvido na solução, entre as regiões catódicas desenvolvidas na amostra em corrosão e na sonda de varredura.36 Como o oxigênio é consumido tanto pela sonda (polarizada no potencial para prover a eletro-redução da espécie) quanto pela superfície investigada, consequentemente, uma competição por essa espécie química é estabelecida no sistema.36 Dessa forma, a reação de redução de oxigênio pode ser monitorada pelo SECM sob condições controladas por difusão, de acordo com a reação (1), quando definido o potencial da sonda em -0,70 V Ag/AgCl. Na Figura 14, os mapas SECM mostram as distribuições de corrente associadas à redução de oxigênio (ou seja, ao consumo de oxigênio) entre as regiões acopladas JS e ZTA, LR e LA. Os mapas SECM correspondem às respostas eletroquímicas relacionadas à eletro-redução de oxigênio detectadas nas regiões acopladas, JS/ZTA tal como esquematizado na Figura 12. As escalas de cores superiores e inferiores na Figura 14, correspondem às diferentes intensidades de corrente associadas com o consumo de oxigênio ao longo da amostra, ou seja, as cores em vermelho representam as regiões com maior consumo de oxigênio pela superfície, enquanto a escala de cores azul/amarelo/verde/lilás indica as áreas com menor depleção de oxigênio na solução e, portanto, maior disponibilidade de oxigênio disponível na ponta (sonda). A Figura 14 permite observar que os menores valores de corrente de redução de oxigênio são observados quando a sonda está posicionada acima da JS, portanto, mais oxigênio foi consumido nessa região devido a sua maior atividade catódica quando acoplada com a ZTA e, consequentemente, a redução de oxigênio ocorre mais efetivamente na superfície JS (mais catódica). Isto está de acordo com o que foi observado nos resultados do teste de ágar-ágar mostrados nas Figuras 9-11, em que a JS apresentou pH mais alcalino e, portanto, mostrou-se mais catódica comparada as regiões ZTA. O mapa SECM representado na Figura 14(a) mostra que as maiores correntes de redução de oxigênio foram medidas quando a sonda estava medindo acima da ZTA (LR), em comparação com a JS. Uma vez que esta região (ZTA) apresenta comportamento anódico comparada a JS, tal como foi observado pela faixa de pH mais baixa identificada nesta região durante o teste de ágar-ágar, Figura 9, esse comportamento é esperado. A diferença observada entre essas regiões para eletro-redução de oxigênio ocorre, além das diferentes microestruturas, devido ao acoplamento entre elas. Os mapas SECM das zonas acopladas ZTA/JS (LA) foram medidos da mesma forma descrita acima, e estão representados na Figura 14(b). Pode-se observar que a ZTA (LA) apresenta áreas com maior consumo de oxigênio pela superfície, em relação à ZTA (LR) (Figura 14(a)). Uma vez que as altas temperaturas atingidas neste lado da soldagem favorecem maior dissolução da fase T1,37 os elementos mais ativos da fase T1 (Al e Li) são dissolvidos preferencialmente e, consequentemente, o Cu torna-se enriquecido nesta região e opera como cátodos eficientes para redução de oxigênio. No entanto, apesar desse comportamento localizado, em geral, ao se considerar o macroacoplamento galvânico completo entre as regiões ZTA e JS de ambos os lados da soldagem (LA e LR), a JS atuará preferencialmente como cátodo, apresentando maior consumo de oxigênio pela sua superfície, e a ZTA, em ambos os lados, atuará como um ânodo, proporcionando maior disponibilidade de oxigênio a ser detectado pela sonda.
Figura 14. Mapas SECM das distribuições de correntes de redução de oxigênio obtidas nas regiões acopladas JS/ZTA do LR (a) e LA (b) da liga AA2098-T351soldada por FSW
Espectroscopia de impedância eletroquímica localizada (LEIS) Mapas de LEIS também foram obtidos com o intuito de se caracterizar eletroquimicamente as diferentes regiões da liga AA2098-T351 em função de suas admitâncias localizadas, Figura 15. Os resultados de LEIS apresentados na Figura 15 mostram maiores valores de admitância para a ZTA em relação à JS. Considerando que a admitância corresponde ao inverso da impedância, quanto menor o valor de admitância maior é a resistência à corrosão da superfície. Portanto, os mapas de LEIS indicam que as regiões correspondentes a ZTA, tanto do lado de avanço como do retrocesso, apresentaram maior atividade eletroquímica e, consequentemente, menor resistência à corrosão em relação às regiões da JS. As diferenças observadas em termos de atividade eletroquímica destas regiões distintas da liga soldada em corrosão se devem a diferença em termos dos comportamentos anódicos e catódicos que essas regiões apresentam quando acopladas, favorecendo o acoplamento galvânico efetivo entre elas, o qual contribui para que a oxidação do Al metálico seja mais efetiva nas regiões ZTA da liga, uma vez que na JS, rica em partículas catódicas, o filme tende a ser prevalecido, conforme mencionado anteriormente. Desse modo, estes resultados mostram a importância de se caracterizar, tanto quimicamente quanto eletroquimicamente, as diferentes regiões da liga em estudo. Como descrito anteriormente, a atividade eletroquímica e características da corrosão observadas na ZTA diferem daquelas relacionadas à junta soldada. Neste âmbito, a técnica de LEIS foi suficientemente sensível para distinguir nitidamente as diferenças observadas nestas respectivas regiões.
Figura 15. Mapas de LEIS das distribuições de admitâncias obtidas nas regiões acopladas JS/ZTA do LR (a) e LA (b) da liga AA2098-T351 soldada por FSW
Sendo assim, foi possível identificar a tendência de menor atividade eletroquímica e maior resistência à corrosão da JS em relação às regiões da ZTA, cujos valores de admitâncias obtidos foram mais baixos nesta região da liga soldada. Este comportamento pode ser associado à redução da densidade de fase T1 nessa zona, a recristalização com a consequente diminuição do tamanho de grão e a maior homogeneidade da microestrutra, o que contribui para o desenvolvimento de um ataque menos severo nesta região. Por outro lado, os maiores valores de admitância (regiões em cor vermelha) observados nos mapas de LEIS para a ZTA, para ambos os lados da liga soldada, estão relacionados à suscetibilidade à corrosão localizada, severa nestas zonas, tal como pode ser observado na Figura 8. Portanto, considerando que as medidas de LEIS são baseadas em atividades eletroquímicas localizadas, esta técnica foi útil para avaliar o comportamento eletroquímico de cada zona destas superfícies em corrosão. Em resumo, a partir dos resultados apresentados, pode-se inferir que a acidificação local foi observada acima das ZTA, principalmente associada aos locais relacionados aos sítios CLS, enquanto a alcalinização ocorreu acima da JS acoplada a estas. Em soluções aeradas em pH neutro ou alcalino, a redução do oxigênio é o principal processo catódico, de acordo com a reação (1). Como observado, a redução de oxigênio leva a alcalinização local nas regiões catódicas. Por outro lado, nos sítios anódicos, as principais reações estão relacionadas à dissolução do metal, tal como: Conforme mostrado pelos voltamogramas na Figura 13, as maiores correntes anódicas foram observadas nas regiões da ZTA. No processo de corrosão, a oxidação do Al a Al3+ de acordo com a reação (2) ocorre nas regiões anódicas. Além disso, íons hidrogênio são liberados devido à hidrólise estimulada pelos íons metálicos causando uma diminuição significativa do pH dentro do pite, e acidificação local nas regiões adjacentes às de CLS, tal como observado pelo teste de ágar-ágar (Figuras 9-11). O processo de corrosão nesses locais é autocatalítico favorecendo a produção contínua de H+ em excesso na solução. Por outro lado, em relação à JS, observou-se que esta região não é suscetível ao desenvolvimento de CLS e o ataque nesta zona está associado principalmente à presença de partículas micrométricas. Essas partículas são catódicas e uniformemente distribuídas na JS. Assim, além da dissolução da fase T1, a presença das partículas catódicas nesta zona, contribuem efetivamente para a maior atividade catódica observada nesta região. Como resultado, valores de pH mais elevados são observados nesta zona (ver Figuras 9 e 11). Por outro lado, as regiões ZTA (seja do lado LA ou LR) acopladas com JS, apresentaram maiores atividades eletroquímicas, com pHs mais baixos e, consequentemente, maiores correntes de oxidação e maiores valores de admitâncias quando comparadas as regiões da JS, estando, portanto, diretamente relacionadas à alta atividade catódica predominante nesta última região.
CONCLUSÃO Os resultados obtidos neste trabalho mostraram que a alta atividade eletroquímica e, consequentemente, a maior suscetibilidade à corrosão observada nas ZTAs ocorreram devido ao intenso acoplamento galvânico estabelecido entre a região catódica (JS) e a região anódica (ZTA) da liga soldada. Além disso, as técnicas locais de SECM e LEIS foram sensíveis à variação dos parâmetros de soldagem proposto neste estudo em relação a outros trabalhos já publicados. Observou-se que a atividade de corrosão correspondente ao LA foi ligeiramente maior em relação ao LR, tal como observado pelos resultados de XPS e pelas imagens das superfícies obtidas após o teste de imersão, corroborando os resultados eletroquímicos, nos quais o LA foi eletroquimicamente mais ativo em relação ao LR. Este resultado demonstra como as técnicas microeletroquímicas são úteis na caracterização eletroquímica e resistência à corrosão de materiais com variações microestruturais em escala nanométricas.
AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP (Processos: 2018/06880-6, 2019/18388-1 e 2013/13235-6) pelo apoio financeiro a esta pesquisa. Agradecimentos também à Central Multiusuário (CEM) da Universidade Federal do ABC (UFABC), à Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (PMT/USP), ao Departamento de Físico-Química e ao Serviço Geral de Apoio à Pesquisa (SEGAI) da Universidade de La Laguna (ULL) pelo suporte experimental a esta pesquisa.
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