|
Estudo da liberação controlada do herbicida ametrina em compósitos à base de PVA - carvão ativado Study of the controlled release of ametryn herbicide using PVA - activated carbon composites |
Ricardo Bortoletto-SantosI; Caue RibeiroII,*
IInstituto de Química de São Carlos, Universidade de São Paulo, Campus de São Carlos, Av. Trabalhador São-Carlense, 400, Arnold Schimidt, CP 780, 13566-590 São Carlos - SP, Brasil Recebido em 19/09/2013 *e-mail: caue.ribeiro@embrapa.br Herbicides have great importance in agricultural productivity for weed control, given their competition with crops. However, inadequate application of herbicides may lead to environmental problems, which can be minimized through controlled release of the active compounds. This may be achieved by protecting the herbicide in a structure with adequate porosity, where the diffusional behavior can determine release. Thus, in this study we evaluated a novel structure, a composite based on activated carbon bonded by polyvinyl alcohol (PVA) as pellets, to deliver a triazine herbicide. The product obtained was shown to be adequate for its purpose, since it was possible to process regular pellets, where the PVA percentage determined the properties. INTRODUÇÃO O crescimento da população mundial implica na busca cada vez mais de uma agricultura altamente produtiva, de modo que há proporcionalidade com o uso de defensivos agrícolas.1 Nesse contexto, é importante o desenvolvimento de tecnologias de controle dessas substâncias no ambiente, visando um aumento de sua eficiência, redução de custos na aplicação e minimização de impactos ambientais.2 Entre as alternativas possíveis, métodos de adsorção de defensivos em água são usuais para sua remoção. O processo de adsorção do carvão ativado tem sido utilizado como um eficaz método para remover pesticidas residuais e outros produtos químicos em tratamento de água de abastecimento e no tratamento de efluentes industriais, devido à alta porosidade do carvão ativado.3-5 Isto porque o carvão apresenta forma microcristalina, não grafítica, que sofre um processamento para aumentar a porosidade interna, se assemelhando a uma rede de túneis que se bifurcam em canais menores e, assim, sucessivamente.6,7 No tratamento de águas contaminadas com pesticidas, estudos como os de Dantas (2009) e Coelho (2012) demonstraram que o uso de carvão ativado é uma alternativa eficiente para remoção dos pesticidas Diuron, Hexazinona, e triazínicos, nos quais se inclui a ametrina.8 Este herbicida, cuja estrutura geral é demonstrada na Figura 1, é largamente utilizado no Brasil no controle de plantas daninhas na cultura da cana-de-açúcar.9,10 Considerando-se a presença de grupos facilmente ionizáveis ligados ao anel carbônico, em geral pesticidas triazínicos são mais solúveis em meios ácidos.11 Este fator é particularmente importante nas características de solos brasileiros, geralmente ácidos, facilitando assim a migração destes compostos (quando em excesso) para zonas de acúmulo, como lençóis freáticos.12 Seu controle é de grande importância visto que também apresenta elevada persistência no ambiente, podendo resistir por até seis meses no solo.13
Figura 1. (a) apresenta a estrutura geral das triazinas, onde ao variar os grupamentos R1, R2 e R3 determina-se o tipo de herbicida (exemplo, R1=Cl, R2=CH(CH3)2 e R3=CH2CH3 - Atrazina; R1=Cl, R2=R3=CH2CH3 - Simazina ). E (b) apresenta a estrutura química da ametrina
No entanto, apesar do carvão ativado ser conhecido nos processos de adsorção, não há grandes estudos na literatura sobre seu uso como meio de controle da liberação de defensivos. Visto que sua estrutura permite que uma grande quantidade de defensivo seja carregada por interação com a superfície, um sistema de liberação lenta de defensivos poderia ser projetado a partir da dessorção de um princípio ativo previamente carregado no carvão ativado, trocando lentamente com o meio por difusão e equilíbrio químico.14 Essa estratégia permite reduzir a quantidade aplicada de defensivo, visto que aumenta a janela de controle de liberação do material.15,16 Porém, é necessário estabelecer condições de processamento que permitam administrar o material final em formatos aceitáveis, como por exemplo, grânulos - visto que a disposição do carvão ativado em pó é pouco aceita pela dificuldade de aplicação nos sistemas agrícolas disponíveis. Assim, este trabalho descreve a produção de um compósito baseado em carvão ativado ligado por álcool polivinílico (PVA), previamente carregado com o herbicida ametrina. A composição com PVA permitiu que o material fosse processado por prensagem, obtendo-se grânulos densos que facilitam a administração do herbicida. Os resultados demonstram que o carvão ativado pode ser utilizado como uma alternativa para a liberação controlada destes materiais, sem prejuízo das propriedades do princípio ativo.
PARTE EXPERIMENTAL Foram obtidos compósitos previamente carregados com herbicida, a fim de observar a quantidade máxima adsorvida pelo carvão ativado. Assim, para a formação dos compósitos a serem empregados nos testes de liberação, fez-se, primeiramente, a adsorção de 250 mL de uma solução de 10.000 µg g-1 (10.000 ppm) de ametrina (Sipcam UPL, 500 g L-1) em um béquer contendo 250 mg de carvão ativado (Synth), deixando esse sistema em agitação branda por 24 h. Após a adsorção atingir o equilíbrio, filtrou-se o material e fez-se a leitura do sobrenadante em espectrofotômetro UV-VIS, para obter a concentração adsorvida. Em seguida, secou-se o carvão ativado com ametrina adsorvida em estufa a 30 ºC e prepararam-se pastilhas utilizando PVA (J.T.Baker, 87,0-89,0% parcialmente hidrolisado) em diferentes concentrações. Para avaliar a influência da liberação em relação à força de compactação, prepararam-se pastilhas com as seguintes forças de prensagens: 2,9 MPa; 4,2 MPa e 5,8 MPa (sendo a porcentagem de PVA mantida constante em 5% em massa). Com intuito de estudar a taxa de liberação do pesticida em relação à porcentagem de PVA empregado, prepararam-se pastilhas contendo 2%, 5% e 10% de PVA (em relação à massa de carvão ativado/ametrina), sendo mantida constante a força de prensagem em 5,8 MPa. Os materiais obtidos foram caracterizados por microscopia eletrônica de varredura, para verificação da homogeneidade dos compósitos obtidos e de aspectos morfológicos. Os ensaios de liberação foram conduzidos em béquer de 250 mL. Imerso nesse béquer estava um béquer menor contendo a pastilha do compósito sob estudo, sendo o sistema mantido sob agitação constante e temperatura ambiente, como representado na Figura 2. Os experimentos foram conduzidos em água, solução de ácido cítrico (0,1 mol L-1), ácido clorídrico (0,5 mol L-1) e solução de água/metanol 50% v/v. Os resultados foram analisados por meio de Espectrometria UV-Vis, entre 400-200 nm (Shimadzu UV-1601 PC).
Figura 2. Modelo do aparato experimental utilizado para os testes de liberaçao das pastilhas de compósitos
Por fim, fez-se a utilização da termogravimetria (TG) para estudar o comportamento do carvão ativado puro e do nanocompósito, na faixa de 0 a 1000 ºC, em uma razão de aquecimento de 10 ºC min-1, sob atmosfera de nitrogênio (TA Instruments - TGA-Q500).
RESULTADOS E DISCUSSÃO A Figura 3 apresenta imagens de microscopia eletrônica de varredura (JSM-6510 - JEOL) do carvão ativado utilizado como base para a formação do compósito de liberação. Observa-se que esse material apresenta partículas finas, que se aglomeram formando poros, além de possuir superfície rugosa. Essa característica, esperada para o material, é desejável para aumentar a quantidade do herbicida a ser carregado na amostra. No entanto, a alta rugosidade pode comprometer a dessorção do princípio ativo. Esse resultado é confirmado pela medida de área superficial, obtida por fisissorção de N2 seguindo a metodologia BET.17 Assim, obteve-se um valor de área de 720,88 m2 g-1, resultado muito elevado quando comparado a outros materiais (permitindo alta área de interação com o defensivo agrícola).
Figura 3. Imagens de microscopia eletrônica de varredura do carvao ativado utilizado nos experimentos
Para determinação da quantidade máxima de herbicida a ser carregada no compósito por adsorção, determinou-se a concentração do sobrenadante na solução de ametrina utilizada para adsorção no carvão ativado, através de espectroscopia UV-visível na faixa de 400 a 200 nm, e subtraiu-se esse valor da concentração inicial de ametrina da solução. Os resultados são apresentados na Tabela 1. Deve-se ressaltar que a presença de adjuvantes na ametrina comercial pode influenciar na adsorção do herbicida pelo carvão ativado, e, portanto, para obter uma relação entre o herbicida e o material, pesou-se a massa utilizada de carvão e determinou-se tal relação, também apresentada na Tabela 1.
A partir da análise da adsorção da ametrina comercial, nota-se que a concentração máxima adsorvida pelo carvão ativado é em torno de 8,76 g de ametrina por g de carvão ativado, sendo esse valor reflexo da elevada área superficial, que aumenta a área de contato favorecendo tal processo. A fim de determinar a interação da ametrina com o carvão ativado, os materiais foram submetidos à análise termogravimétrica, como visto na Figura 4a. Nota-se que a ametrina pura tem seu principal processo de perda de massa a 224 ºC, provavelmente relacionado à degradação do composto e observada pela curva derivada da perda de massa (Figura 4b). O carvão ativado oxida a 534 ºC, sendo também este seu principal processo, responsável por cerca de 90% de perda de massa. No entanto, nota-se que, na adsorção da ametrina no carvão ativado, houve ganho na estabilidade em ambos os processos de perda de massa, sendo as temperaturas de degradação da ametrina e do carvão ativado deslocados para 361 e 600 ºC, respectivamente. Esta variação indica a forte adsorção do composto no carvão ativado, e justifica os altos valores de adsorção anteriormente vistos.
Figura 4. a) Análise térmica (TG) dos materiais puros e do compósito; b) Curva da derivada da análise térmica (DTG) dos materiais puros e do compósito
Para obter o compósito de liberação controlada, utilizou-se PVA como aglomerante para o processo de prensagem, visto que esse polímero é conhecido por sua capacidade de hidratação e intumescimento. Portanto, pretendeu-se que o PVA fosse uma barreira à rápida liberação do herbicida, controlando a penetração da água, e consequentemente, a velocidade de liberação. Após homogeneização em diferentes teores de PVA, o material foi prensado para obter-se o dispositivo de liberação propriamente dito. A Figura 5 mostra os valores de liberação do herbicida em água para diferentes pressões de compactação utilizadas na composição com 5% em massa de PVA. Os resultados mostram que as variações na pressão de compactação não seguem um padrão definido para a taxa de liberação. É possível que, com baixas pressões de compactação, haja segregação do PVA, tornando o material pouco homogêneo. No entanto, deve-se notar que a quantidade liberada varia pouco com o tempo para todos os casos. Considerando-se a baixa solubilidade da ametrina em água, pode-se relacionar esta quantidade à ametrina fracamente ligada ou alocada em poros da estrutura do compósito. É importante notar que as pastilhas obtidas com pressão da ordem de 5,8 MPa resultaram em pastilhas mais resistentes e de mais fácil manuseio, definindo-se desta forma esta condição de trabalho.
Figura 5. Estudo da liberaçao em relaçao à força de prensagem - curva da liberaçao total (a) e da liberaçao inicial (b)
Os experimentos de liberação foram novamente conduzidos em água, em solução de ácido cítrico (0,1 mol L-1), a fim de mimetizar os ácidos orgânicos do solo, e em ácido clorídrico (0,5 mol L-1), de modo a promover uma condição drástica, como representado na Figura 6.
Figura 6. Estudo da liberaçao em água, ácido cítrico e ácido clorídrico variando-se a quantidade de PVA
Comparando-se os resultados, observou-se que a acidificação do meio acelerou a liberação do herbicida e aumentou a quantidade total em solução, como esperado. Também, a liberação em solução de ácido forte foi significativamente rápida em comparação aos demais experimentos. No entanto, observou-se que a liberação em condições intermediárias de PVA adicionado ao material (5%) foi máxima, sendo que em 10% de polímero houve, para ambos os ácidos, redução na cinética de liberação e no teor total liberado. Possivelmente, considerando-se que o PVA é um polímero hidrolisável em condições ácidas, em menores teores a sua presença pode alterar o equilíbrio da solução através de uma reação de esterificação frente ao ácido. Isso é mais facilmente observado na solução de ácido cítrico, onde a diferença na cinética de liberação é mais visível. De fato, Shi et al. (2008), observaram esta reação em filmes de amido compósitos com PVA, sendo inclusive este mecanismo utilizado como forma de obter ligações cruzadas na estrutura do PVA.18 Assim, é compreensível que, nas maiores concentrações de polímero, o material tenha ligeira redução da sua liberação pela formação de ligações cruzadas, sendo que nas menores quantidades a alteração do equilíbrio seria mais significativa. Para garantir a completa solubilização da ametrina no experimento de liberação e, consequentemente, avaliar corretamente o comportamento dos compósitos, utilizou-se solução de água/metanol 50% v/v, devido à solubilidade da ametrina em metanol ser maior que em água (aproximadamente 510 g L-1). Observa-se na Figura 7 que a variação do teor de PVA tem, nesse caso, correlação direta com o perfil de liberação, principalmente nas primeiras horas. Nota-se que a quantidade total liberada é inferior de acordo com o aumento do PVA na composição, o que indica que o polímero impede a saída imediata do herbicida. De fato, nota-se também que nas primeiras horas de ensaio o aumento do PVA reduziu a liberação inicial, no entanto sem modificar sensivelmente a taxa de liberação - o que indica que o comportamento de dessorção do carvão ativado é mais influente para estes compósitos que o efeito do PVA. Deve-se também notar que, para todos os compósitos, a liberação do princípio ativo foi acima de 80% do valor total carregado, e o comportamento somente estabilizou acima de 100 h em todos os casos, caracterizando um comportamento de liberação controlada.
Figura 7. Estudo da liberaçao em relaçao à porcentagem de PVA - curva da liberaçao total (a) e da liberaçao inicial (b)
CONCLUSÃO Os ensaios revelaram que a utilização do PVA altera o comportamento de liberação do carvão ativado, de modo que o aumento do PVA reduz a liberação inicial, devido à barreira difusional para saída do herbicida. No entanto, a alta capacidade de hidratação e o intumescimento do polímero fazem com que esta barreira se dissolva ou se torne permeável, facilitando o processo de troca. Também, pode-se verificar que a pressão de compactação não segue um padrão definido para a taxa de liberação, sendo possível a ocorrência de segregação do PVA, tornando o material pouco homogêneo, além de que a quantidade liberada varia pouco com o tempo. Já nos ensaios empregando o meio ácido observou-se que a acidificação acelera a liberação, além de aumentar a quantidade total em solução. E, também, quanto maior a acidificação do meio (liberação em solução de ácido forte) mais rápida é a liberação.
AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à Embrapa - Rede Agronano, ao CNPq, à FAPESP e à FINEP pelo apoio concedido.
REFERÊNCIAS 1. Rabello, W. S.; Monnerat, P. H.; Campanharo, M.; Espindula, M. C.; Ribeiro, G.; Rev. Bras. Herb. 2012, 11, 204. 2. Giacomazzi, S.; Cochet, N.; Chemosphere 2004, 56, 1021. 3. Hernández, M.; Morgante, V.; Villalobos, P.; Miralles, P.; González, M.; Seeger, M.; Electron. J. Biotechnol. 2008, 11, 1. 4. Dantas, A. Di B.; Paschoalato, C. F. P. R.; Ballejo, R. R.; Bernardo, L.; Eng. Sanit. Ambient. 2009, 14, 373. 5. Letterman, R. D.; Water quality and treatment: a handbook of community water supplies, 5th ed., McGraw-Hill: New York, 1999. 6. http://www.meiofiltrante.com.br/materias_ver.asp?action=detalhe&id=502& revista=n39, acessada em Julho 2013. 7. http://www.ct.ufes.br/ppgea/files/Disserta%C3%A7%C3%A3o_Lorena_Frass on_ Loureiro.pdf, acessada em Julho 2013. 8. Coelho, E. R. C.; Vazzoler, H.; Leal, W. P.; Eng. Sanit. Ambient. 2012, 17, 421. 9. Coelho, E. R. C.; Bernardo, L. D.; Eng. Sanit. Ambient. 2012, 17, 269. 10. Prata, F.; Lavorenti, A.; Borges, J.; Tornisielo, V. L.; Pesq. Agropec. Bras. 2001, 36, 975. 11. Mangrich, A. S.; Tessaro, L.C.; Anjos, A. D.; Wypych, F.; Soares, J. F.; Environ. Geol. 2001, 40, 1030. 12. Manzatto, C. V.; Junior Freitas, E.; Peres, J. R. R.; Uso Agrícola dos Solos Brasileiros, 1st ed., Embrapa Solos: Rio de Janeiro, 2002. 13. Costa, M. A; Monteiro, R. T. R; Tornisielo, V. L.; Rev. Bras. Cienc. Solo 2000, 24, 43. 14. Torres, J. D.; Dissertação de Mestrado, Universidade de Brasília, Brasil, 2007. 15. Torres, J. D.; Prado, A. G. S.; Resumos da 30ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química, Águas de Lindóia, Brasil, 2007. 16. Souza, J. A.; Tese de Doutorado, Universidade de Campinas, Brasil, 1999. 17. Northrop, P. S.; Flagan, R. C.; Gavalas, G. R.; J. Am. Chem. Soc. 1987, 3, 300. 18. Shi, R.; Bi, J.; Zhang, Z.; Chen, D.; Zhou, X.; Zhang, L.; Tian, W.; Carbohydr. Polym. 2008, 74, 763. |
On-line version ISSN 1678-7064 Printed version ISSN 0100-4042
Qu�mica Nova
Publica��es da Sociedade Brasileira de Qu�mica
Caixa Postal: 26037
05513-970 S�o Paulo - SP
Tel/Fax: +55.11.3032.2299/+55.11.3814.3602
Free access