JBCS



16:25, qui nov 21

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Artigo


Monitoramento de resíduos de agrotóxicos da classe dos organofosforados por CG-DFC em amostras de leite fluído e em pó
Monitoring of organophosphorus pesticide residues in fluid and powdered milk by gas chromatography with flame photometric detector

Lucia Helena Pinto Bastos*; Adherlene Vieira Gouvêa; Nina Daddário Ortiz; Maria Helena Wohlers Morelli Cardoso; Silvana do Couto Jacob ; Armi Wanderley da Nóbrega

Departamento de Química, Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde/Fundação Oswaldo Cruz, Avenida Brasil 4385, Manguinhos, 21045-900 Rio de Janeiro - RJ, Brasil

Recebido em 22/04/2014
Aceito em 02/10/2014
Publicado na web em 13/11/2014

Endereço para correspondência

*e-mail: lucia.bastos@incqs.fiocruz.br

RESUMO

Samples of whole fluid pasteurized, UHT and powdered milk were analyzed for the presence of organophosphorus pesticide residues (OPR) using the QuEChERS method with detection by GC-FPD and confirmation by UPLC-MS/MS. A total of 23% of fluid milk samples and 27% of powdered milk samples contained at least one organophosphorus residue. The OPR found in the samples showed these can reach the milk and remain even after pasteurization, sterilization and drying processes. Some domestic sanitary residues were also present in the powdered milk samples. These residues have no LMR in Brazilian food legislation and are therefore not taken into account in food intake evaluations. There was an unidentified chromatographic peak in 30% of all the liquid and powdered milk samples, indicating the presence of some other contaminant.

Palavras-chave: pesticides; milk; QuEChERS.

INTRODUÇÃO

Os Organofosforados (OPS), ao fosforilarem a enzima acetilcolinesterase (Achase) - responsável pela inativação do neurotrasmissor acetilcolina1 - bloqueiam, de forma reversível ou lentamente reversível, a sua atividade catalítica.

Em virtude desse fato, os OPS desencadeiam um quadro neurotóxico agudo em seres humanos e a toxicidade resultante dessas substâncias pode se manifestar na exposição crônica a longo prazo com o aparecimento de efeitos neuropsicológicos ou neuropsiquiátricos.2 Estudos demonstraram que crianças expostas aos OPS antes do nascimento apresentaram uma redução do quociente de inteligência (QI).3-5

Entre outros alimentos de origem animal, o leite encontra-se no topo da cadeia alimentar para crianças e recém-nascidos, sendo um marcador da contaminação ambiental.6 A utilização indiscriminada de agrotóxicos em alimentos, na medicina veterinária, no tratamento de ectoparasitos, bem como a contaminação do meio ambiente, especificamente da água e dos pastos, têm provocado um aumento na quantidade de resíduos de contaminantes no leite.

A contaminação alimentar tem sua origem nos tratamentos e produtos aplicados às plantas por meio de pulverizações ou indiretamente por meio de produtos residuais no solo como herbicidas (combate ervas daninhas), nematicidas (combate nematóides) e acaricidas (combate ácaros).7-9 Outra possível fonte de contaminação são os domissanitários utilizados nos currais e estabelecimentos de produção leiteira.

Considerando os efeitos tóxicos dos agrotóxicos, mesmo em níveis residuais, é de suma importância que a presença destes resíduos sejam monitorados nos alimentos de maior consumo infantil, como é o caso do leite.

Órgãos responsáveis pela saúde10-12 demonstram uma preocupação com a avaliação dessas substâncias no leite e programas de monitoramento são frequentemente realizados. Vários trabalhos13-17 demonstraram que resíduos de agrotóxicos podem chegar ao leite, principalmente levados pela alimentação animal (AA) bovina, pela contaminação ambiental, pelo tratamento de ectoparasitas e por acidentes ambientais.

Avaliações de resíduos de agrotóxicos em leite8 ainda são escassas no Brasil. Somente o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), por meio do Plano Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes em Leite18 (PNCRC/L), monitora com regularidade 12 (acefato, azinfós etilico e metílico, clorpirifós etil e metil, diazinona, metamidofós, mevinfós, parationa-etílica pirimifós-etílico e metílico, metidationa) dos 29 agrotóxicos (azametifós, bromofós, cadusafós, diclorvós, dimetoato, etefon, etoprofós, etiona, fenamifós, fenclorfós, fenitrotiona, fentiona, forato, fosalona, fosmete, fentoato, fostiazato, foxim, iodofenfós, malationa, nalede, parationa-metílica, profenofós, piridafentiona, protiofós, temefós, triazofós, terbufós, tebupirinfós) da classe dos OPS permitidos pela legislação brasileira.19

Alguns OPS - bromofós, diclorvós, etoprofós, fenamifós, forato, fosmete, terbufós, parationa-metílica entre outros - não são avaliados no programa PNCRC/L,18 apesar de possuírem alta toxicidade (classe I ou II) e de serem substâncias de uso permitido em AA, cereais (CE) e domissanitários.

Assim, o objetivo desse trabalho foi avaliar resíduos de OPS - parte deles ainda não contemplados em trabalhos nacionais - em amostras de leite fluído e em pó prontos para consumo. Foi utilizado o método de extração QuEChERS20 com detecção por cromatografia gasosa por fotometria em chama (CG-DFC).

 

PARTE EXPERIMENTAL

Padrões e reagentes

A maioria dos padrões de agrotóxicos da classe dos organofosforados possuíam grau de pureza superior a 95% (Dr. Ehrenstorfer - Augsburg, Alemanha), exceto os agrotóxicos tiometona (48%), profenofós (92%), mevinfós (91%), etoprofós e terbufós (93%), etrinfos (60%), fosfamidona (92,5%), formotiona (92%), fenamifós (92,5%) e triazofós (78%).

Foram utilizados: a) acetonitrila, isooctano e acetato de etila - solventes orgânicos de alta pureza e grau cromatográfico (Merck e Tedia); b) MgSO4 PA (Merck); c) sorvente BONDESIL-PSA 40 µm (Varian); d) C18 35-75 µ (Alltech); e) Al2O3, 90, neutro 70-230 # ASTM (Merck), previamente muflado a 550 ºC por 3 horas antes do uso e f) Na(C2H3O2) anidro (Spectrum), seco a 220 ºC por 3 horas antes do uso.

A validação do método e todas as condições experimentais para a realização do monitoramento das amostras em leite estão descritos em trabalho anterior.21 Neste foram determinados os parâmetros de validação: seletividade, efeito da resposta cromatográfica acentuda e induzida pela matriz, estudo da linearidade da faixa de trabalho, recuperação e repetitividade, limites de deteção e quantificação do método (LDM) e (LQM).

Foram analisadas amostras de leite UHT (ultra high temperature) e em pó quanto à presença de resíduos de agrotóxicos da classe dos OPS utilizando o método QuEChERS.20,21 Cinquenta e três substâncias da classe dos OPS foram analisadas - 49 agrotóxicos e 4 produtos de degradação - e divididas em duas misturas distintas, S1 e S2, em função do tempo de retenção (tR (min)) de cada substância, de modo que não ocorresse sobreposição de picos no cromatograma, tornando possível a identificação inequívoca dos picos cromatográficos referentes a cada agrotóxico.21

A S1 foi composta dos agrotóxicos e de dois produtos de degradação, ordenados em ordem crescente de tR (min): nalede, metamidofós, acefato, demetom-S-metílico, ometoato, tiometona, diazinona, dissulfotom, isazofós, clorpirifós-metil, parationa-metílica, pirimifós-metílico, paraoxon etílico, fenitrotiona, parationa-etílica, bromofós-metílico, bromofós-etílico, protiofós, profenofós, dissulfotom-S-sulfurona, etiona, metidationa, carbofenotiona, fosalona, pirazofós e azinfós-etílico. O paraoxon-etílico e a dissulfotom-S-sulfurona são produtos de degradação da parationa-etílica e dissulfotom, respectivamente.

A S2 foi composta dos seguintes agrotóxicos e de dois produtos de degradação, também ordenados em ordem crescente de tR (min): diclorvós, mevinfós, etoprofós, forato, terbufós, tebupirinfós, monocrotofós, etrinfós, dimetoato, paraoxon-metílico, fosfamidona, formotiona, malaoxon, clorpirifós, malationa, pirimifós-etílico, fentiona, clorfenvinfós, tetraclorvinfós, iodofenfós, fenamifós, vamidotiona, triazofós, piridafentiona, fosmete e, azinfós-metílico. O paraoxon-metílico e o malaoxon são produtos de degradação da parationa-metílica e malationa, respectivamente.

Para garantia da confiabilidade dos resultados, foram usados diferentes controladores de qualidade analítica: o QA1 - parationa metílica usado como controlador do equipamento e o QA2 - clorpirifós-metil e quinalfós usado como controlador do processo analítico (CPA). Como consequência ao uso do QA2, as amostras não puderam ser avaliadas quanto à presença da substância clorpirifós-metil.21

Corroborando na garantia de qualidade, um terceiro controle analítico - QA 53 - foi inserido em cada sequência de injeção das amostras. Essas continham todos os agrotóxicos em avaliação por tempo de retenção e como critério de aceitação individual foi utilizada a taxa de recuperação22 de 60 a 140%.

Amostras analisadas

O maior número de amostras foi adquirido em diferentes estabelecimentos da cidade do Rio de Janeiro e o restante coletado nos estados do Nordeste e Mato Grosso, correspondendo a coleta a 5 regiões brasileiras (CO, NE, NO, S, SE) e Argentina.

As amostras de leite fluído pasteurizado estavam acondicionadas em embalagens plásticas e as de leite UHT em embalagem cartonada revestida tetra Pack®, já as amostras de leite em pó estavam em embalagens poliéster metalizado/polietileno e em lata metálica e ambas as amostras se encontravam na forma integral.

Leite fluido integral UHT e pasteurizado

Foram analisadas 222 amostras de leite fluído com datas de fabricação compreendidas entre 01/07/2009 a 27/08/2011. O maior número de amostras coletado ao longo do período (88) foi processado em cooperativas do Estado do Rio de Janeiro e as demais em diferentes estados brasileiros. As amostras coletadas ao longo do período (2009 a 2011) variaram quanto à data de fabricação e estados coletados. A Tabela 1 especifica o quantitativo de amostras de leite UHT e pasteurizado coletadas, por mês, ano de fabricação e percentual mensal de coleta e o número de amostras coletadas por estado da Federação Brasileira, expresso em parênteses.

 

 

Leite em pó integral

Foram analisadas 107 amostras de leite em pó integral e duas de leite desnatado, acondicionadas em embalagens flexíveis de poliéster metalizado/polietileno ou lata metálica. As amostras coletadas foram fabricadas em diferentes áreas de produção brasileira e duas na Argentina. O maior número de amostras de leite em pó coletado foi produzido no estado de MG (47), correspondendo a cerca de 47% das amostras coletadas. As amostras foram fabricadas no período de 11/04/2009 a 23/09/2011. A Tabela 2 especifica o quantitativo de amostras de leite em pó coletadas, por mês, ano de fabricação e percentual mensal de coleta e o número de amostras coletadas por estado da Federação Brasileira, expresso em parênteses.

 

 

Extração das amostras

As amostras de leite fluído foram pesadas (m = 15 g) e extraidas por método QuEChERS conforme procedimento anteriormente descrito.21 A amostra foi homogeneizada por cinco minutos em liquidificador de copo de vidro, pesada e colocada em frasco de 50 mL para uso em centrífuga. Em seguida, foi adicionado 1 mL do QA1 (clorpirifós-metil) e homogeneizado. Após 25 min, foi iniciada a extração com a adição de 15 mL de acetonitrila (1% ácido acético) e agitação em vortex. Foram realizadas duas etapas de limpeza da amostra com extração em fase sólida dispersiva (SPE-D): na primeira, foi adicionado MgSO4 + 1,5 g Na(C2H3O2) e na segunda foi feita a limpeza da amostra utilizando a combinação de sorbentes (50 mg PSA + 50 mg alumina + 150 mg MgSO4). As amostras de leite em pó foram diluídas em água deionizada, conforme recomendações de consumo na rotulagem e analisadas com o mesmo procedimento utilizado para o leite fluído.

Condições cromatográficas

Equipamento: cromatógrafo a gás HP 7890 (Agilent), equipado com detector por fotometria em chama (CG-DFC) em modo fósforo (P); sistema de injeção automático e estação de trabalho - ChemStation. Temperatura do injetor e detector de 230 ºC e 250 ºC, respectivamente. Coluna 50% fenil-metil siloxano (DB-17MS) com 30 m de comprimento; 0,25 mm de diâmetro interno e 0,25 µm de espessura de filme. Programação de temperatura do forno de 100 ºC (0 min), 25 ºC min-1 a 170 ºC (1 min), 1 ºC min-1 a 180 ºC (1 min), 1 ºC min-1 até 230 ºC (0 min), 5 ºC min-1 até 260 ºC (5 min), 20 ºC min-1 até 280 ºC (10 min). Fluxo de gás carreador (Hélio) = 1,5 mL min-1, fluxo da purga do septo = 3,0 mL min-1, fluxo total = 61,5 mL min-1, fluxo do gás auxiliar (Nitrogênio) = 60 mL min-1, modo de injeção sem divisão de fluxo = 1,0 min, volume injetado = 1,0 µL.

O tempo total de corrida foi de 80 min e a integração feita pelo parâmetro da área dos picos.

Confirmação dos agrotóxicos identificados no leite fluído e em pó

Parte dos analitos identificados foram confirmados utilizando um cromatógrafo líquido de ultra-alta eficiência modelo ACQUITY UPLCTM acoplado ao espectrômetro de massas tipo triplo quadrupolo por eletronebulização (UHPLC-ESI-MS/MS) modelo Quatro Premier XE operando em modo MRM com ionização por eletrospray no modo íon positivo e estação de trabalho MassLynxTM. Os resíduos dos analitos acefato, clorpirifós, fentiona, fosmete, metamidofós, pirazofós e terbufós foram confirmados em amostras de leite UHT e em pó por cromatografia líquida de alta eficiência acoplada à espectrometria de massas sequencial (LC-MS/MS) com procedimento previamente descrito em trabalho anterior.7

Os OPS foram confirmados utilizando o íon precursor e dois íons de transição, os íons avaliados, expressos entre parenteses respectivamente foram: acefato (m/z 184; 143 e 95), clorpirifós (m/z 349; 197 e 96), fentiona (m/z 279; 168 e 104), fosmete (m/z 318; 160 e 133), metamidofós (m/z 142; 125 e 94), pirazofós (m/z 374; 222 e 194) e terbufós (m/z 289; 103 e 70). Entretanto, os organofosforados identificados no ano de 2009 não puderam ser confirmados, pois no período de implementação do método de avaliação, pelo LC-MS/MS, as amostras já haviam deteriorado.

As condições cromatográficas utilizadas no equipamento ACQUITY UPLCTM para a identificação das amostras encontram-se descritas na Tabela 3.

 

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na avaliação do CPA cerca de 90% das amostras de leite fluído e 97% de leite em pó estiveram dentro da faixa de recuperação recomendada (60 a 140%).22 Duas amostras de leite fluído - em embalagem plástica produzido no Estado do Rio de Janeiro em 2009 e leite fluído UHT, produzido no Estado do Rio Grande do Sul, em 2010 - apresentaram recuperações superiores a 140%, havendo, portanto, a possibilidade da presença do clorpirifós metílico nestas amostras.

Entre as amostras de leite em pó, três amostras apresentaram recuperações superiores a 140%, sendo duas produzidas em MG (anos 2009 e 2010) e uma no RS (ano 2010).

A confirmação da presença de um analito é possível com a combinação de duas ou mais análises, idealmente com o uso de métodos ortogonais - utilizam propriedades físico-químicas diferentes de separação e/ou identificação, como exemplo cromatografia líquida e gasosa - sendo que pelo menos um deles satisfaça os critérios de identificação.21,22

Leite fluído

Do total de 222 amostras de leite fluído analisadas nos 3 anos de monitoramento, 23% (50 amostras) apresentaram pelo menos um resíduo de agrotóxico. Todos os resultados obtidos foram inferiores aos valores de LQM, estando próximos aos valores do LDM.21

O grau de contaminação por resíduos de organofosforados variou nas amostras analisadas durante o período de monitoramento: em 2009 foi 56%; em 2010 foi 32% e em 2011 foi 9%.

Essa diferença pode ser devida ao fato de que a base amostral foi diferente a cada ano no que concerne aos estados de origem e mês de coleta.

O agrotóxico presente em maior número de amostras foi o acefato, encontrado com maior frequência em amostras coletadas no ano de 2009 e menor presença no ano de 2010, não tendo sido identificado no ano de 2011.

Algumas amostras de leite fluído continham mais de um resíduo. Nos cromatogramas de grande número de amostras analisadas foram evidenciados picos não identificados em relação aos agrotóxicos testados (S1 e S2). Este não foi observado no leite branco orgânico usado na validação do método e no controle de qualidade.

Um pico cromatográfico com tR (min) = 2 ± 0,5 foi encontrado em 28% do total de amostras de leite fluído (63/222 amostras) das amostras analisadas. A identidade desse resíduo não pode ser conhecida neste trabalho. Isto pode ser devido à presença de produtos de degradação de algum agrotóxico ou de alguma substância que contenha átomos de fósforo na sua molécula.

A Figura 1 ilustra um cromatograma da amostra de leite fluído oriunda do estado Estado de Minas Gerais. Nele podemos observar os picos correspondentes ao resíduo não identificado (tR (min) = 2 ± 0,5) e aos clorpirifós-metil e quinalfós (QA2 e QA3), adicionados como controle.

 


Figura 1. Representação gráfica do cromatograma, obtido por CG-DFC, de amostra de leite fluído UHT produzido no Estado de Minas Gerais

 

Leite em pó

Nos três anos de monitoramento, foram analisadas 109 amostras de leite em pó. Constatou-se que 30 amostras (27%) apresentaram o mesmo pico não identificado tR (min) = 2 ± 0,5 que ocorreu nos cromatogramas do leite fluído.

Agrotóxicos identificados nas amostras analisadas

Tanto nas amostras de leite fluído quanto nas de leite em pó foram encontrados resíduos de acefato, clorpirifós, etiona, fentiona, fosmete, malaoxon, pirazofós. Vários outros foram encontrados somente nas amostras de leite em pó: bromofós-metílico e etíllico, carbofenotiona, dissulfotom, azametifós, parationa-metílica, pirazofós, profenofós, terbufós e tiometona.

A Tabela 4 ilustra as amostras de leite fluído em pó analisadas: quantidade, identidade, presença e percentual de resíduos.

 

 

Resíduos de acefato foram encontrados em um maior número de amostras de leite fluido nos anos de 2009 e 2010 e em 18 amostras de leite em pó dentre as 135 amostras analisadas. Esses resíduos foram encontrados em cerca de 90% das amostras analisadas de leite pasteurizado, produzidos no período de outubro e novembro de 2009 e março de 2010.

A presença de acefato, mesmo em níveis residuais, bem abaixo do LQM, deve ser avaliada quanto à segurança, uma vez que o leite é muito consumido, principalmente pelo público infantil, e que há suspeitas de que exposição crônica ao agrotóxico possa resultar em efeitos adversos à saúde.23

Legislação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)2 estabeleceu procedimentos administrativos para a reavaliação do acefato entre outros agrotóxicos. Durante o processo de reavaliação foi elaborada pela ANVISA e colaboradores uma nota técnica23 sobre o produto, sugerindo mudanças da ingestão diária aceitável (IDA) (atual 0,03) para 0,0008 mg kg-1 do peso corporal dia-1 (pc/dia) e a proibição do uso do produto em culturas como soja e algodão (importantes na AA).17 Essa reavaliação foi concluída e os novos parâmetros para o IA foram 0,0012 mg kg-1 pc/dia. Seria desejável que fosse realizada uma avaliação da ingesta pelo público infantil, dos resíduos do acefato presentes no leite, considerando a nova IDA (0,0012 mg kg-1 pc/dia) para verificar se a presença desses resíduos poderiam impactar a IDA da substância7 e, consequentemente, causar danos à saúde.

A presença do clorpirifós em níveis residuais tem seu uso justificado devido ao uso em diferentes tipos de CE comumente utilizados na AA, como: algodão, cevada, milho, pastagem, sorgo, soja e trigo com limite máximo de resíduo (LMR)18 variando de 0,01 a 2 mg kg-1, além de ser permitido também para 25 medicamentos veterinários.24 Outros organofosforados encontrados nas amostras avaliadas também possuem o uso permitido para a AA, como domissanitários e medicamentos veterinários: fentiona, fosmete, pirazofós e malaoxon.

O malaoxon é o produto de degradação da malationa. Essa tem seu uso permitido em produtos armazenados, pastagens19 (LMR de 3 a 135 mg kg-1), citrus (LMR de 3,0 mg kg-1) e também como domissanitário. A malationa foi identificada em ração animal7 com base cítrica na concentração de 0,02 mg kg-1.

Carbofenotiona foi identificada em três amostras de leite em pó, mas esses valores não puderam ser confirmados por uma segunda técnica analítica. Como o produto não tem o seu uso permitido pela legislação nacional, é imprescindível a confirmação da presença nas amostras identificadas.

Terbufós foi identificado em duas amostras de leite em pó (ano 2009 e 2011) e tem o seu uso permitido para a cultura do café, cana-de-açúcar, algodão e milho19 (LMR = 0,05 mg kg-1), sendo seus subprodutos utilizados na AA. Apesar da presença do terbufós em níveis residuais e em poucas amostras analisadas (2 em 222), a avaliação da presença e monitoramento em amostras de leite merece atenção especial por possuir um valor de IDA extremamente baixo (0,0002 mg kg-1 pc/dia).

Outros IA, tais como: etiona, dissulfotona, parationa-metílica e profenofós foram observados em somente uma amostra, dentre as 357 amostras avaliadas, considerando leite fluído e pó (2009 a 2011), fato esse que pode representar menor risco de ingesta.

A etiona tem seu uso permitido para abacaxi, citros e tomate19 (LMR de 2,0 mg kg-1), produtos cujo subproduto são utilizados na AA.25 Em trabalho de monitoramento anterior7 foi identificada a presença da etiona em amostras de AA de ração para bovino leiteiro, farelo de soja e grãos de soja, nos quais seu uso não é permitido.7 A substância também tem seu uso permitido em medicamentos veterinários com uso indicado a bovino leiteiro para três produtos ectoparasitários formulados.24

Resíduos dos IAs azametifós (1 em 84) e bromofós etílico e metílico foram encontrados em amostras de leite em pó (6 em 84), sugerindo o uso desses produtos em instalações de processamento de leite. Não há na legislação brasileira o estabelecimento de LMR em alimentos para produtos domissanitários. A presença de resíduos no leite como: acefato, fosmete, etiona e parationa-metílica foram confirmadas por LC-MS/MS em amostras de leite em pó, mas não foi possível a confirmação em todas as amostras analisadas de leite fluído pasteurizado, especialmente aquelas acondicionadas em embalagens plásticas.

Comparando as amostras de leite fluído e leite em pó quanto à presença de resíduos de agrotóxicos foi possível observar que as amostras de leite fluído apresentaram um maior número de resíduos de organofosforados quando comparada às amostras de leite em pó nos anos de 2009 e 2010, sendo os percentuais de resíduos obtidos, no primeiro ano, de 32 e 14%, respectivamente, para o leite fluido e em pó e 32 e 9,5% no segundo ano. Entretanto, no ano de 2011 foi identificado um maior número de amostras de leite em pó com resíduos (8 amostras, 35%) quando comparado com o número de amostras de leite fluído, fato esse que pode estar relacionado à diferença de data de produção do leite das amostras coletadas (Tabelas 2 e 4) e no pequeno espaço amostral das amostras de leite em pó comparadas ao leite fluído (8 e 13).

Todos os resíduos de organofosforados analisados se encontravam abaixo do limite de quantificação do método validado e dentro do LMR para os IAs: acefato, clorpirifós.

Os agrotóxicos dissulfotom, etiona, fosmete, parationa-metílica, pirazofós e terbufós não possuem LMR especificado para produtos de origem animal no Brasil, entretanto, esses limites são contemplados em países da Comunidade Européia26 (EU), EUA27 e pelo Codex Alimentarius28 (Codex).

Os OPS maloxon (identificado em leite em pó, 2011) e parationa metílica não puderam ser confirmados.

Os LMRs especificados no Brasil, EU, Codex e EUA dos IA encontrados nas amostras de leite avaliadas e os LQM do método previamente validado encontram-se descritos na Tabela 5.

 

 

No Brasil, os LMRs especificados são para o leite cru e processado.11

 

CONCLUSÃO

Resíduos de organofosforados foram detectados em amostras de leite fluido, mesmo após os processos de pasteurização, esterilização e secagem. Resíduos de produtos domissanitários, utilizados na cadeia de produção do leite, foram encontrados em amostras de leite em pó. Como não há na legislação brasileira LMR para estes resíduos em alimentos, torna-se importante a confirmação dessas substâncias e se necessário realização de estudos de avaliação de ingesta nas matrizes animal.

Foi verificado um pico cromatográfico não identificado em cerca de 30% das amostras de leite fluído e em pó sendo sua identificação importante e desejável.

A identificação dos diferentes resíduos dos OPS obtidos no leite mostra a importância em expandir o número de agrotóxicos avaliados no programa de monitoramento tornando-o mais abrangente, permitindo avaliar toda a classe dos OPS e seus metabólitos permitidos pela legislação brasileira.

Considerando também os valores residuais obtidos neste trabalho e a presença, inclusive, de mais de um resíduo em uma mesma amostra, é fundamental uma avaliação da ingesta dos agrotóxicos pertencentes à classe dos organofosforados no leite, considerando a soma dos seus resíduos e metabólitos, o consumo e o peso infantil nacional.

 

REFERÊNCIAS

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