|
Desenvolvimento de experimento didático de eletrogravimetria de baixo custo utilizando princípios da Química Verde Development of low-cost teaching electrogravimetry experiments using the principles of green chemistry |
Guilherme Antonio FinazziI,*; Carlos Ney MartinsII; Milton Duffles CapelatoIII; Luiz Henrique FerreiraIII
IUniversidade Federal do Vale do São Francisco, Avenida Antonio Carlos Magalhães, 510 - Santo Antônio, 48902-300 Juazeiro - BA, Brasil Recebido em: 30/04/2015 *e-mail: guifinazzi@gmail.com In this paper, we describe the development of low-cost teaching experiments of electrogravimetry for undergraduate students using principles of green chemistry. Copper was electrochemically deposited on brass under an electrical current density of 50 mA cm−2 from acidic solutions containing nitrate anions. Color changes at the brass electrode and of the solution were observed, indicating that the reduction of copper ions had occurred. The deposition efficiency values were between 92.8% and 93.8%, and the electrochemical efficiency values were between 85.6% and 86.5%. There was no significant contribution from parallel reactions. These experimental conditions facilitated the didactic exploration of gravimetric and electrochemical concepts. Following the principles of green chemistry, the experiments produced no toxic substances, all the materials could be recycled, and the energy consumption was the lowest. For this reason, this experiment was considered to be very interesting for didactical purposes. INTRODUÇÃO Desde o período da Antiguidade, o Homem promove transformações químicas de seu interesse, nas quais as quantidades de matéria são importantes para a obtenção de bons resultados. Os registros históricos desta época revelam que o Homem já extraía ferro de minérios e fabricava vidro, cerveja e vinho. Na Idade Média, Descartes deu o primeiro passo para a melhoria: estabeleceu princípios para o Método Científico. No século XVIII, a contribuição de Lavoisier com o Princípio de Conservação de Massa e a contribuição de Proust com a Lei das Proporções Definidas trouxe uma nova perspectiva para o desenvolvimento do Método Científico, envolvendo as medições de massa. Porém, foi no final do século XX, com o advento das certificações ISO para o controle de qualidade de produtos e insumos e de gestão ambiental,1,2 que as medições na área de Química passaram a ter importância fundamental na atividade humana, sobretudo na indústria. Por conta disso, a quantificação em Química passou a ser um requisito fundamental no exercício de qualquer profissional na área de Química, quer seja químico, quer seja engenheiro da área de química, quer seja outro profissional da área.3,4 Neste contexto, torna-se imprescindível que o curso de formação do profissional da área de Química contemple o desenvolvimento de competências e habilidades em técnicas de Análise Química Quantitativa.5,6 Diversos métodos de Análise Química Quantitativa podem ser utilizados para se realizar análise em amostras tanto conhecidas quanto desconhecidas, como, por exemplo, titrimetria, cromatografia, espectroscopia.7-11 A gravimetria é uma técnica de Análise Química Quantitativa relativamente simples, pois requer a medida de massa do analito desejado, fornece resultados precisos e não requer equipamentos de alto custo. Porém, para a obtenção de bons resultados, a gravimetria requer alguns cuidados, dentre os principais: a amostra deve ter alto grau de pureza e o método de separação deve ser de alta eficiência.8-10 Esses problemas podem ser evitados quando a gravimetria é realizada por deposição eletroquímica, ou seja, quando se emprega a eletrogravimetria. Neste caso, é possível controlar as reações químicas, variando-se apenas a corrente elétrica ou o potencial elétrico da célula eletroquímica. Como as reações eletroquímicas são específicas para cada estado de oxidação de um elemento, dependendo da solução na qual as espécies químicas se encontram, é possível segregá-las com alto grau de eficiência, produzindo-se depósitos de alto grau de pureza.9,12,13 Mas, para utilizar a técnica eletrogravimétrica, é importante que o profissional da área de Química tenha desenvolvido competências e habilidades em relação à Gravimetria e à Eletroquímica. Experimentos de eletroquímica são muito úteis na construção dos conceitos de reações de oxidação e redução, principalmente quando fenômenos macroscópicos são facilmente visíveis. Ainda assim, a abstração que se requer da teoria em Química aliada aos conceitos de Eletrodinâmica torna o assunto em questão um capítulo à parte, o que evidencia a importância do desenvolvimento de experimentos em aula. Uma característica interessante dos experimentos de eletroquímica é a possibilidade que apresentam de integrar conceitos de Química Geral com outros abordados em disciplinas de Física Geral, ambas comuns nas matrizes curriculares de cursos de graduação da área de Ciências Exatas. As propostas de abordagem do tema Eletroquímica que mais têm sido divulgadas para o Ensino Médio envolvem as reações de corrosão, notadamente de ferro exposto ao ar, ou seja, com gás oxigênio na presença de água, com exploração do conceito de reações de oxidação-redução sem o emprego de célula eletroquímica.14-20 Também existem propostas de construção de células eletroquímicas com materiais de baixo custo. No caso de pilhas, existem propostas de: confecção de pilhas de Daniel, (Cu/Zn), visando reproduzir o experimento que deu origem ao conceito de pilha;21 determinação de potenciais de eletrodo utilizando-se polpa de frutas como eletrólito da pilha;22 confecção de pilhas de Cu/Mg, utilizando-se como eletrólitos soluções facilmente obtidas a partir de materiais do cotidiano dos alunos.23 Se por um lado os alunos são mais familiarizados com dispositivos de armazenamento de energia - as pilhas - por outro lado, fenômenos eletrolíticos não são do cotidiano da imensa maioria. Além disso, o ensino de eletroquímica tem sido realizado a partir da modelagem matemática dos processos envolvendo conceitos de oxidação e redução, fato que é motivo de preocupação de diversos educadores e pesquisadores em relação à formação profissional. Sob este ponto de vista, a eletrólise é um assunto que requer maior atenção no campo da Eletroquímica. Neste contexto, os conceitos envolvidos neste campo de estudo podem ser mais coerentemente abordados por meio de atividades experimentais. Assim, experimentos de eletrólise que evidenciam a eletrodeposição de um metal pela passagem forçada de corrente elétrica, e cuja massa é exatamente calculada pela Lei de Faraday - da forma como o assunto é abordado no Ensino Médio - são importantes do ponto de vista didático, pois permitem aos alunos participarem de seu processo de aprendizagem, já que deixam de ser passivos ao agirem sobre o objeto de estudo.14-28 Na literatura encontram-se algumas propostas no caso de células eletrolíticas: há arranjos experimentais muito simples para eletrodeposição de cobre,25 oxidação de iodeto a iodo,26 tratamento de efluentes,27 eletrólise da água (para determinação dos volumes gerados de oxigênio e hidrogênio).28 Em todos os casos citados, podem-se observar mudanças em nível macroscópico, que se relacionam à teoria Eletroquímica conhecida. Porém, um experimento no qual a quantidade total de matéria apenas da espécie em solução que sofre redução possa ser determinada com precisão, por meio da medida da massa real eletrodepositada, mostra-se atraente do ponto de vista didático, não só quanto ao desenvolvimento das habilidades e competências no tocante ao entendimento do assunto, quanto também para o desenvolvimento do conceito de eletrogravimetria inserido no Ensino Superior. O objetivo deste trabalho foi desenvolver um experimento didático pelo qual o aluno possa analisar uma amostra desconhecida por meio da eletrodeposição total de metal da amostra dissolvido em solução e por meio da medida da massa desse metal eletrodepositada. O emprego da eletrogravimetria não conduz a resultados satisfatórios na grande maioria dos casos, nos quais a eficiência eletroquímica é bem menor que 100%. Isto se deve a diversos fatores, como por exemplo o aumento da resistividade da solução com o passar do tempo, o valor alto de potencial de deposição da maioria dos metais, o mecanismo de reação, reações paralelas29-32 que não são de interesse na construção de conceitos, entre outros, uma vez que inserem variáveis à teoria que a tornam mais complexa. Desta forma, a eletrogravimetria é uma técnica pouco empregada mesmo no meio acadêmico. Metais nobres são menos resistentes à eletrodeposição, possibilitando melhores resultados eletrogravimétricos, porém, além de exigirem materiais e reagentes de alto custo, necessitam de condições específicas para obtenção de alta eficiência de eletrodeposição, como por exemplo eletrodos de platina e prata, aquecimento e aditivos tóxicos ou perigosos.33 Uma exceção é o cobre: os fenômenos eletrolíticos observados em universo macroscópico - ou seja, relativos à eletrodeposição - associados a essa espécie química são particularmente interessantes porque são facilmente visíveis: não somente a coloração do eletrodepósito é característica, facilmente diferençável em relação a um eletrodo de material diferente, como também a coloração da solução na presença de íons cobre(II) é específica deste elemento. Também, estudos anteriores demonstram que é possível realizar a eletrogravimetria de cobre com remoção de 99% em massa.34 Sob esse ponto de vista, a exploração da eletrogravimetria em soluções contendo íons cobre(II) é atraente para fins didáticos, desde que o experimento esteja em condições otimizadas. Uma das condições para otimização é a necessidade de se acidificar a solução de cobre(II), uma vez que pode haver precipitação de seus óxidos em meio neutro ou alcalino.35 Deste modo, os íons cobre(II) ficam livres em solução para serem mais facilmente reduzidos, conforme mostra a equação 1: Há estudos na literatura com eletrodeposição de cobre em pH = 1,0, como o trabalho publicado por Jeffery et al.,10 mas este possui o inconveniente de apresentar elevada taxa de formação de gás oxigênio sobre o anodo, o que aumenta consideravelmente a acidez sobre este eletrodo, inviabilizando a utilização de um material que não seja resistente, mesmo que inerte. Portanto, é preciso que o meio seja ácido, mas com pH superior a 1,0. Aliado a isso, o íon nitrato em solução funciona como despolarizante catódico, impedindo a deposição maciça de cobre, o que conduziria a depósitos não aderentes, de baixa qualidade.7,9,11,12,29,30,32,36 Então, a adição deste eletrólito à solução de deposição é de suma importância no experimento. Também, a adição de um eletrólito de suporte deve ser levada em conta, visto que em condições de eletrólise à exaustão é preciso haver espécies condutoras de eletricidade para que as condições de densidade de corrente elétrica e da solução em contato com os eletrodos sejam ainda menos drásticas. Estudos da literatura indicam que a eletrogravimetria de cobre é útil em várias aplicações.34,37-40 Stout37 elaborou um procedimento de montagem de um retificador para gerar corrente elétrica contínua, a qual é utilizada na eletrodeposição de cobre sobre platina a partir de uma solução contendo 0,25% de sulfato de cobre(II). Foi observado que a eficiência de deposição máxima obtida no experimento foi de aproximadamente 24% para tempo de eletrodeposição de 240 minutos. Com o intuito de determinar experimentalmente o número de Avogadro, Seiglie38 utilizou um arranjo experimental para eletrodeposição de cobre a partir de uma solução contendo íons cobre(II), tendo como anodo e catodo ambos os eletrodos de cobre (eletrorrefino). O catodo foi previamente tratado com uma solução diluída de um ácido orgânico, para promover defeitos sobre a superfície do metal, facilitando a aderência do depósito. Neste experimento, foi depositada massa de 0,157 g de cobre sob corrente elétrica de 0,400 A em tempo de 1200 s. Osella e Ravera39 realizaram experimento de eletrodeposição de cobre a partir de uma solução de sulfato de cobre(II) em solução aquosa contendo ácido sulfúrico, utilizando como catodo uma folha de cobre e como anodo uma folha de latão. Observou-se que, para a deposição da massa total de cobre do sistema, o tempo requerido de eletrólise foi de 4 horas. Para determinação da quantidade de cobre e de zinco em solução, foram realizadas leituras de Espectroscopia de Absorção Atômica antes e depois do experimento. A massa de cobre e de zinco total depositada foi determinada calculando-se a diferença de massa entre os eletrodos, corrigida em função da concentração que a solução apresentou ao final da eletrodeposição. Oliveira et al.34 desenvolveram um método sistema de injeção em fluxo, no qual ocorre eletrodeposição simultaneamente catódica e anódica de íons cobre(II) e íons chumbo, respectivamente, para minimizar interferências na determinação da concentração de cádmio em solução aquosa e em alimentos por espectrofotometria UV-VIS via reação com verde de malaquita e iodeto. A eletrodeposição de cobre foi realizada sobre platina com 10 mL de uma solução contendo 100 mg L-1 Cu2+, 0,1% (v/v) H2SO4 e 0,1 mol L-1 NaCl (ou NaNO3) ou de uma solução contendo 100 mg L-1 Cu2+, 0,1% (v/v) H2SO4 e 10% (v/v) HNO3. A eletrólise ocorreu em tempo de 300 s com corrente aplicada de 1,0 A. Foram obtidas leituras de concentração de cobre(II) por espectroscopia de absorção atômica. Os resultados mostraram que a eficiência da recuperação de cobre foi de aproximadamente 99,8%. Olm e Stock40 elaboraram um sistema de microeletrogravimetria para cobre sobre eletrodo rotatório de platina. A solução de eletrodeposição foi obtida pela digestão de lâmina de cobre ou de latão em meio de ácido clorídrico e ácido nítrico, tratada com cloreto de amônio, cloreto de hidrazina, ureia e gelatina, e foi adicionado água, perfazendo ao final um volume total de 3 mL. A eletrodeposição de cobre ocorreu em potencial fixado de -0,36 V e a eletrodeposição simultânea de cobre e chumbo ocorreu em potencial fixado de -0,65 V, ambos atingidos gradualmente. Os resultados indicam que a remoção de cobre é realizada com 90 minutos de deposição e é da ordem de 99,5% de eficiência, enquanto que a remoção simultânea de cobre e chumbo é realizada de 100 a 120 minutos de deposição e é da ordem de 97,4% de eficiência. Pelo exposto acima, infere-se que a eletrogravimetria de cobre tem sido empregada sob muitos aspectos. Porém, os métodos utilizados evidenciam a depleção total de íons cobre(II) em solução somente quando empregados em microescala, o que dificulta a visualização do aspecto da solução. Além do mais, métodos que dependem de platina como material de eletrodo e dependem de técnicas espectrofotométricas são mais dispendiosos, inclusive devido às necessidades apresentadas, tanto em relação à técnica em si como em relação aos cálculos de massa que dependem da concentração final da solução. No escopo deste trabalho buscou-se um arranjo experimental o mais simples possível, contendo apenas solução de eletrodeposição e dois eletrodos de baixo custo - latão e grafite - para facilitar a exploração dos conceitos envolvidos. Além do fato de latão ser facilmente obtido comercialmente, pode-se obter um bastão de grafite a partir de uma pilha seca descartada (sem carga). Também, buscou-se elaborar o procedimento de modo a obedecer a princípios da Química Verde, ou seja, de modo que não fossem formados produtos tóxicos, que fossem minimizados resíduos (economia de átomos), que houvesse a maior economia de energia possível, que fosse evitada a formação de derivados e que os materiais empregados sejam reutilizáveis.41 Diante do exposto e considerando a necessidade de se desenvolver experimentos que tratam de importantes conceitos para a formação de químicos, engenheiros e demais profissionais que irão lidar com processos e produtos tecnológicos e/ou questões ambientais, como o tratamento de efluentes domésticos e industriais, foi elaborado um experimento de análise eletrogravimétrica de baixo custo com recuperação total do analito, visando sua aplicação em disciplinas de Eletroquímica, Química Analítica Quantitativa ou mesmo de Química Geral para cursos de graduação. A presente proposta parte do pressuposto de que além do desenvolvimento de habilidades procedimentais, a experimentação permite também aos graduandos a melhor compreensão dos processos modernos de produção e aplicação de conhecimentos e, consequentemente, das possibilidades de se enfrentar desafios impostos por aspectos econômicos e ambientais atuais.
PARTE EXPERIMENTAL Foram desenvolvidos dois experimentos: o primeiro, mais simplificado, no qual a eletrodeposição ocorre a partir de um sal de cobre dissolvido em solução, (este experimento pode ser empregado para o Ensino Médio); e o segundo, desenvolvido no intuito de que se realizasse a eletrodeposição seletiva de cobre, obtendo-se eletrodepósitos de alta pureza, visando determinar seu teor em uma amostra de latão (cavacos) digerida com ácido concentrado (este experimento é direcionado para o Ensino Superior). Em ambos os experimentos foram empregados latão e grafite como materiais dos eletrodos e todos os ensaios foram realizados em triplicata à temperatura ambiente (25 ºC). Para o primeiro experimento foi preparada uma solução contendo a massa de 0,8250 g de sulfato de cobre(II) penta-hidratado (CuSO4.5H2O) (marca Dinâmica) em água destilada. Em seguida, o pH da solução foi alterado ao valor de 4,0 com 2-3 gotas de solução HNO3 6,0 mol L-1. O segundo experimento envolveu o preparo de uma solução a partir da digestão de aproximadamente 0,30 g de latão (cavacos) com 20,0 mL de solução de HNO3 1,0 mol L-1, a 200 ºC. Após completar a dissolução, elevou-se o pH a 4,0 com 2-3 gotas de solução NaOH 6,0 mol L-1. Todos os reagentes utilizados neste trabalho foram de grau analítico (P.A.). As soluções utilizadas no ajuste do pH foram preparadas a partir de solução estoque de ácido nítrico 63% (marca Synth) e de hidróxido de sódio (marca Vetec) em água destilada. Todo o latão utilizado (cavacos e eletrodo) foi obtido de sucata da Oficina Mecânica do Departamento de Engenharia de Materiais da Universidade Federal de São Carlos, e os bastões de grafite foram retirados de pilhas secas comuns descarregadas (tamanho grande), lavados com solução de ácido nítrico 1,0 mol L-1 e em seguida com água destilada. Uma análise posterior do latão empregado neste trabalho (cavacos e eletrodo) descrito em literatura42 indicou que a amostra apresenta teor de cobre de 70%. Em cada solução foi adicionado sulfato de potássio (marca Merck) como eletrólito de suporte (massa aproximada de 1,5 g) e o volume de água destilada necessário para cobrir os eletrodos e satisfazer as condições de densidade de corrente. A eletrodeposição de cobre foi realizada sobre um eletrodo de latão em forma de U, o qual foi lavado com detergente, lixado, desengraxado com acetona P.A., seco com papel toalha e sua massa foi medida antes da realização do experimento. Como anodo, no primeiro caso, foi utilizado um bastão de grafite; no segundo caso foi utilizado um bastão de grafite recoberto com dióxido de chumbo, o qual foi preparado de acordo com o procedimento descrito em literatura.43 A eletrólise ocorreu sob agitação em densidade de corrente de 50 mA cm-2 ajustada com fonte de tensão Minipa modelo MPL-1303M durante 3 horas. Procurou-se estabelecer a corrente elétrica constante para que os diferentes processos de deposição de cobre ocorressem simultaneamente, com otimização da utilização da carga elétrica. Ao final do prazo, o catodo foi lavado, seco em contato com papel toalha e sua massa foi medida diversas vezes até sua massa atingir um valor constante. Verificou-se que este procedimento foi suficiente para a determinação da massa do eletrodo, pois adotando-se outro procedimento, no qual a secagem do material foi realizada em estufa a 100 ºC e dessecador, a diferença de massa ocorreu no último algarismo significativo da medida de massa realizada em balança analítica, com erro de 0,05%. Para realizar os cálculos, determinou-se a quantidade de cobre a partir da diferença entre as massas inicial e final do eletrodo. No caso do segundo procedimento, determinou-se a porcentagem de cobre no latão calculando-se a razão entre a massa de cobre obtida na eletrodeposição e a massa inicial de latão. A célula eletroquímica do experimento pode ser visualizada na Figura 1.
Figura 1. Célula eletroquímica do experimento de eletrodeposiçao de cobre, na qual o eletrodo de latao em forma de U (catodo) e o bastao de grafite (anodo) encontram-se parcialmente mergulhados em soluçao de sulfato de cobre (II), antes de ocorrer a eletrodeposiçao metálica
RESULTADOS E DISCUSSÃO A seguir são apresentados os resultados dos experimentos de eletrólise das soluções contendo íons cobre(II) sobre o eletrodo de latão. Quando a eletrólise é realizada com agitação, não se observa significativa formação de gás hidrogênio sobre o catodo. Em ambos os casos há produção de íons hidroxônio sobre o anodo devido à reação de oxidação da água, formando gás oxigênio. Resultados obtidos do experimento de eletrodeposição de cobre com solução contendo sulfato de cobre(II) penta-hidratado A Tabela 1 mostra os resultados obtidos dos 3 ensaios do primeiro procedimento.
Pode-se observar que o cobre deposita massivamente, distinguindo-se em coloração do material do catodo; mesmo assim os depósitos metálicos não se apresentaram de coloração negra, mas sim avermelhada, indicando que o valor da densidade de corrente elétrica estava adequado. Pode-se observar também que os filmes foram aderentes - o que não se observa quando a solução não contém íons nitrato dissolvidos - sem perdas de material metálico para a solução. O rendimento de deposição calculado foi de 93,1%, indicando que a concentração de íons cobre(II) em solução diminuiu drasticamente. Este valor é menor do que o obtido na eletrodeposição de soluções contendo volume total de 10 mL ou menor (99,8%) por duas razões: provavelmente determinadas espécies químicas relacionadas a impurezas do reagente tenham sofrido redução eletroquímica, e porque, no caso do presente trabalho, o volume de solução mínimo utilizado foi de 40 mL, condição esta em que a difusão é o fenômeno preponderante de transporte de massa no sistema e limita a quantidade de íons cobre(II) na superfície do eletrodo.7,9,12,29-32,44 A razão de se utilizar volume de 40 mL ou mais é a facilidade de visualização que é proporcionada; ao final do experimento, pode-se observar sem dificuldades a perda da coloração azul da solução, que se torna transparente. Essa alteração visual devida à depleção de íons cobre(II) no meio aquoso é de grande importância do ponto de vista didático, pois está relacionada à redução de íons cobre sobre a superfície de latão, cujos conceitos são o foco didático do presente trabalho, ou seja, o objeto de desenvolvimento de competências e habilidades do profissional da área de Química que se pretendeu atingir. É possível calcular a eficiência eletroquímica, ou seja, a quantidade de carga elétrica consumida exclusivamente para depositar cobre. Sabendo que a carga elétrica total consumida em cada ensaio foi de 2700 C, a carga elétrica Q consumida apenas na deposição de cobre pode ser expressa como sendo em que 192970 é o dobro da constante de Faraday, de acordo com a equação (1); n é o número de mols de cobre depositados. A eficiência eletroquímica é calculada dividindo-se Q por 2700 C. Pode-se observar pela Tabela 1 que a eficiência eletroquímica do experimento foi de 86,2%, indicando que uma parcela da carga elétrica consumida não foi devida à eletrodeposição de íons cobre(II) conforme a equação (1), mas de reação(ões) paralela(s) a este processo. Provavelmente esta parcela se refira à redução de íons nitrato sobre o catodo, que embora despolarize o eletrodo, permite com que os depósitos obtidos sejam aderentes; e à redução de íons hidroxônio para formação de gás hidrogênio. Também pode ocorrer a redução de íons cobre(II) a íons cobre(I), que permanecem em solução ou são reoxidados no anodo, diminuindo a eficiência eletroquímica. Apesar disso, considera-se este valor de eficiência eletroquímica adequado, pois indica que a carga elétrica foi em grande parte consumida para a eletrodeposição de cobre. Resultados obtidos do experimento de eletrodeposição de cobre a partir de solução de digestão de latão A Tabela 2 mostra os resultados obtidos dos 3 ensaios do segundo procedimento.
Pode-se observar, como no caso anterior, que o cobre deposita massivamente nas condições experimentais, os depósitos apresentaram coloração avermelhada e são aderentes, sem perda de material para a solução. Pode-se inferir que a presença de íon nitrato em solução contribuiu para a obtenção de depósitos de qualidade desejada, visto que atua como despolarizante catódico. O rendimento de deposição calculado foi de 93,5%, indicando drástica diminuição da concentração de íons cobre(II). Como discutido no caso anterior, apesar de haver trabalhos na literatura cujos valores de rendimento de deposição são maiores (99,8%), provavelmente determinadas espécies químicas em solução tenham sofrido redução eletroquímica além dos íons cobre (II), por exemplo, íons de ferro, chumbo, estanho, arsênio, fósforo gerados na digestão do latão e/ou impurezas da amostra, diminuindo o rendimento de deposição. Além disso, o volume de 10 mL de solução não conduz a visualização facilitada da alteração da coloração da solução, comparado com o volume de 40 mL ou maior. Considera-se que não há codeposição de zinco, visto que o cobre deposita preferencialmente. Comparando-se o potencial padrão de redução do cobre (+0,34 V), com o do zinco (-0,76 V), seria esperado que apenas o cobre depositasse, pois a condição de diferença mínima entre potenciais padrão de 0,25 V é obedecida,10 embora o potencial elétrico do sistema mantenha-se constante no valor de 2,0 V, maior que ambos os potenciais padrão de redução. Como o sistema não se modifica em valores de corrente nem de potencial elétrico, pode-se inferir que ocorre apenas eletrodeposição de cobre, caso contrário a deposição massiva de zinco poderia iniciar. Além disso, comparando-se os dois procedimentos, os valores de rendimento de deposição são muito próximos, indicando que, caso haja codeposição de algum outro metal, ela é desprezível comparada à taxa de deposição de cobre. Desta forma, a quantidade de cobre na amostra de latão pode ser determinada diretamente pela diferença dos valores das massas inicial e final do catodo. Ainda assim, é possível depositar todos os íons metálicos em solução, bastando prolongar o tempo de eletrólise e monitorando-se o potencial e a corrente elétrica. Desse modo, a análise integral da amostra inicial de latão pode ser determinada por meio da medição das massas do catodo obtidas em cada etapa da eletrodeposição. A eficiência eletroquímica foi calculada como no caso anterior, resultando no valor de 85,9%. Este valor indica que uma parcela da carga elétrica consumida se deve a possíveis reações paralelas ao processo de eletrodeposição de cobre segundo a equação 1. Provavelmente esta parcela se refira à redução de íons nitrato sobre o catodo e/ou à redução de íons hidroxônio para formação de gás hidrogênio e/ou à redução de íons cobre(II) a íons cobre(I). Como discutido anteriormente, considera-se este valor de eficiência eletroquímica adequado, pois indica que a carga elétrica foi em grande parte consumida apenas para a eletrodeposição de cobre. Experiências de aula na Universidade Federal de São Carlos demonstraram o sucesso do experimento, evidenciado por comentários feitos pelos estudantes de Graduação em Química. Eles reconheceram o fenômeno de eletrodeposição de cobre, relacionando-o à alteração da superfície do catodo e à alteração da coloração da solução. Também, realizaram os cálculos referentes ao experimento, cujos resultados encontram-se na Tabela 2, indicando que o experimento foi muito importante no desenvolvimento das competências e habilidades relacionadas ao tema. Esses dados evidenciam a contribuição que este trabalho oferece a cursos de formação de profissionais da área de Química no tocante ao desenvolvimento de competências e habilidades relacionadas à área em questão, como por exemplo, relacionar conceitos de Química, Física e ferramentas matemáticas5 e/ou aplicar conhecimentos matemáticos, científicos, tecnológicos e instrumentais à engenharia.6 Quando o experimento foi realizado utilizando-se grafite sem nenhum recobrimento como anodo (primeiro procedimento), foi observado o desprendimento de grãos do material do eletrodo, dificultando a visualização da coloração da solução. Desta forma, a utilização do eletrodo de grafite recoberto com dióxido de chumbo como anodo mostrou-se mais atraente, visto que, neste caso, não há desprendimento de nenhum material do anodo, o que facilita a observação da solução. Por fim, em todas as etapas procedimentais buscou-se atender a princípios da Química Verde:
Deve-se considerar que, embora soluções de íons cobre(II) serem consideradas tóxicas, e seja necessária adição de ácido para obter valor de pH adequado às condições experimentais, as propriedades desse metal são interessantes do ponto de vista didático, como já mencionado anteriormente.
CONCLUSÃO Foram desenvolvidos experimentos de eletrogravimetria com o emprego de materiais de baixo custo e obedecendo a princípios de Química Verde, como minimização de resíduos, reaproveitamento de materiais e mínimo consumo de energia. Os experimentos se mostraram promissores, visto que permitem a construção dos conceitos teóricos de Eletroquímica, principalmente eletrólise e lei de Faraday. Os experimentos apresentaram resultados satisfatórios, com valores de rendimento de deposição entre 92,8% e 93,8% e de eficiência eletroquímica entre 85,6% e 86,5%. Embora o rendimento de deposição não atinja 99,8%, os experimentos são de fácil visualização e apresentam eficiência eletroquímica acima de 80% - o que é desejável, inclusive do ponto de vista didático, pois indica que provavelmente não há codeposição de material juntamente com o cobre.
AGRADECIMENTOS Agradecimentos ao Departamento de Química da UFSCar por oferecer a infraestrutura necessária para a realização dos ensaios, e aos professores de Química Analítica que contribuíram de alguma forma para este trabalho.
REFERÊNCIAS 1. http://www.iso.org/iso/qmp_2012.pdf, acessada em Setembro de 2015. 2. http://www.iso.org/iso/theiso14000family_2009.pdf, acessada em Setembro de 2015. 3. http://www.cfq.org.br/rn/RN36.htm, acessada em Setembro de 2015. 4. http://www.cfq.org.br/rn/RN198.htm, acessada em Setembro de 2015. 5. BRASIL. Resolução CNE/CES 08/2002. Estabelece as Diretrizes Curriculares para os cursos de Bacharelado e Licenciatura em Química. D.O.U., Brasília, 26 de março de 2002. Seção 01, p. 12. 6. BRASIL. Resolução CNE/CES 11/2002. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de Graduação em Engenharia. D.O.U., Brasília, 09 de abril de 2002. Seção 01, p. 32. 7. Skoog, D. A.; Holler, F. J.; Nieman, T. A.; Princípios de análise instrumental, 5ª ed., Bookman: Porto Alegre, 2002. 8. Christian, G. D.; Analytical Chemistry, 6ª ed., Wiley: Hoboken, 2004. 9. Gonçalves, M. L. S. S.; Métodos instrumentais para análise de soluções: análise quantitativa, 4ª. ed., Fundação Calouste Gulbenkian: Lisboa, 2001. 10. Vogel - Análise Química Quantitativa, Jeffery, G. H.; Bassett, J.; Mendham, J.; Denney, R. C., eds.; 6ª ed., LTC: Rio de Janeiro, 2002. 11. Harris, D. C.; Análise Química Quantitativa, 7ª ed., LTC: Rio de Janeiro, 2008. 12. Brenner, A.; Electrodeposition of Alloys - Principles and Practice, Vol. 1, Academic Press: Nova Iorque, 1963. 13. Ibañez, A.; Fatas, E.; Peñalver, J.; Manzanares, A.; Book of Abstracts of the 54th Annual Meeting of the International Society of Electrochemistry. São Pedro, Brasil, 2003. 14. Fragal, V. H.; Maeda, S. M.; da Palma, E. P.; Buzatto, M. B. P.; Rodrigues, M. A.; Silva, E. L.; Química Nova na Escola 2011, 33, 216. 15. Wartha, E. J.; Reis, M. S.; da Silveira, M. P.; Guzzi Filho, N. J.; de Jesus, R. M.; Química Nova na Escola 2007, 26, 17. 16. Matos, L. A. C.; Takata, N. H.; Banczek, E. P.; Química Nova na Escola 2013, 35, 237. 17. Merçon, F.; Guimarães, P. I. C.; Mainier, F. B.; Química Nova na Escola 2011, 33, 57. 18. Souza, E. T.; Souza, C. A.; Mainier, F. B.; Guimarães, P. I. C.; Merçon, F.; Química Nova na Escola 2007, 26, 44. 19. Palma, M. H. C.; Tiera, V. A. O.; Química Nova na Escola 2003, 18, 52. 20. Sanjuan, M. E. C.; Santos, C. V.; Maia, J. O.; Silva, A. F. A.; Wartha, E. J.; Química Nova na Escola 2009, 31, 190. 21. Hioka, N.; Maionchi, F.; Rubio, D. A. R.; Goto, P. A.; Ferreira, O. P.; J. Chem. Educ. 1998, 8, 36. 22. Marconato, J. C.; Bidóia, E. D.; Química Nova na Escola 2003, 17, 46. 23. Hioka, N.; Santin Filho, O.; de Menezes, A. J.; Yonehara, F. S.; Bergamaski, K.; Pereira, R. V.; Química Nova na Escola 2000, 11, 40. 24. Carvalho, A. M. P.; Santos, E. I.; Azevedo, M. C. P. S.; Date, M. P. S.; Fujii, S. R. S.; Nascimento, V. B.; Termodinâmica: Um ensino por investigação, 1ª ed. FEUSP: São Paulo, 1999. v. 1. 25. Parker, R. H.; J. Chem. Educ. 2011, 88, 1428. DOI: http://dx.doi.org/10.1021/ed101202t 26. Sartori, E. R.; dos Santos, V. B.; Trench, A. B.; Fatibello-Filho, O.; Química Nova na Escola 2013, 35, 107. 27. Ibanez, J. G.; Química Nova na Escola 2002, 15, 45. 28. Eggen, P. O.; Kvittingen, L.; Lvkknes, A.; Wittje, R.; Science and Education 2012, 21, 179. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/s11191-010-9316-1 29. Lowenheim, F. A.; Modern Electroplating, 3ª ed., John Wiley & Sons: Nova Iorque, 1974. 30. Pletcher, D.; Industrial Electroplating, Chapman & Hall: Nova Iorque, 1982. 31. Bard, A. J.; Faulkner, L. R.; Electrochemical Methods - Fundamentals and Applications, John Wiley & Sons: Nova Iorque , 1980. 32. Greef, R.; Peat, R.; Peter, L. M.; Pletcher, D.; Robinson, J.; Instrumental Methods in Electrochemistry, John Wiley & Sons: Nova Iorque, 1985. 33. Beamish, F. E.; Anal. Chim. Acta 1969, 44, 253. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/S0003-2670(01)95800-3 34. Oliveira, A. P.; Freschi, G. P. G.; Dakuzaku, C. S.; Moraes, M.; Crespi, M. S.; Gomes Neto, J. A.; Quim. Nova 2001, 24, 743. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-40422001000600006 35. Pourbaix, M.; Atlas d´Équilibries Electrochimiques, Gauthier Villar: Paris, 1963. 36. Oniciu, L.; Muresan, L.; J. Appl. Electrochem. 1991, 21, 565. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/BF01024843 37. Stout, L. E.; J. Chem. Educ. 1927, 4, 378. DOI: http://dx.doi.org/10.1021/ed004p378 38. Seiglie, C. A.; J. Chem. Educ. 2003, 80, 668. DOI: http://dx.doi.org/10.1021/ed080p668 39. Osella, D.; Ravera, M.; Soave, C.; Scorza, S.; J. Chem. Educ. 2002, 79, 343. DOI: http://dx.doi.org/10.1021/ed079p343 40. Olm, D. D.; Stock, J. T.; Mikrochimica Acta 1977, 68, 575. DOI: http://dx.doi.org/10.1007/BF01196244 41. Anastas, P. T.; Warner, J.; Green Chemistry: Theory and Practice, Oxford University Press: Oxford, 1998. 42. Welcher, F. J.; The Analytical Uses of Ethylenediaminetetracetic Acid, D. van Nostrand Company: Nova Jersey, 1958. 43. Capelato, M. D.; Cassiano, N. M.; Quim. Nova 1998, 21, 493. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-40421998000400022 44. Atkins, P. W.; Physical Chemistry, 5ª ed., Oxford University Press: Oxford, 1994. |
On-line version ISSN 1678-7064 Printed version ISSN 0100-4042
Qu�mica Nova
Publica��es da Sociedade Brasileira de Qu�mica
Caixa Postal: 26037
05513-970 S�o Paulo - SP
Tel/Fax: +55.11.3032.2299/+55.11.3814.3602
Free access