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Blogs no ensino de química: análise de comentários publicados em disciplina de comunicação científica Undergraduate chemistry students and technology: an analysis of blog comments for a scientific communication course |
Mario Roberto Barro; Lea Veras; Salete Linhares Queiroz*
Instituto de Química de São Carlos, Universidade de São Paulo, Av. Trabalhador São Carlense, 400, CP 780, 13560-970 São Carlos - SP, Brasil Recebido em 28/05/2015 *e-mail: salete@iqsc.usp.br Blogs and other technology tools are commonly used in our society. Although we are familiar with the use of technology for social interaction, its application in the classroom environment is still not fully appreciated by the teaching community as a useful learning tool. This paper sheds light on this use by presenting the analysis of the comments posted on a blog used by undergraduate chemistry students for a scientific communication undergraduate course. On the course, students used the blog to ask questions and discuss assignments. All the comments were monitored by the professor and her teaching assistant, who also posted their comments. We analyzed the content of these comments using the model proposed by Henri and adapted by McKenzie and Murphy. The results show a predominance of administrative comments, followed by course content comments. The findings also indicated that this tool complements classroom discussions, supports the participation of students who would otherwise not take part, and allows a continuous learning process for all the students. We concluded that the use of blogs improved the classroom experience and supported the instructional classroom activities. INTRODUÇÃO Nos últimos anos, o uso das tecnologias de informação e comunicação (TIC) vem modificando as formas de ensinar e de aprender, colocando à disposição de alunos e professores metodologias de ensino que lhes garantem uma maior interatividade.1 Embora nesse contexto haja uma vasta quantidade de diferentes possibilidades de interação e metodologias, muitas das atividades didáticas propostas atualmente apenas encaminham para o espaço virtual as práticas regularmente usadas no ensino presencial, por vezes fundamentadas na transmissão de conteúdos, ainda centradas na figura do professor, cujo tipo de comunicação predominante é a comunicação unidirecional, do tipo um para todos.2 Assim, uma das preocupações relacionadas à inovação da forma de ensinar e aprender é fazer com que as atividades realizadas não se caracterizem apenas por transmissão de conhecimentos, mas também contemplem a possibilidade de partilha de conhecimentos e experiências, troca de ideias e opiniões. Um dos recursos da Internet que pode ampliar e modificar muitas das formas atuais de ensinar e de aprender é o blog, que além de ser um meio de comunicação também tem sido utilizado no âmbito do ensino por meio da criação de comunidades virtuais de aprendizagem.3 Blog significa registro eletrônico na Internet. Os blogs, em seu aspecto estrutural, se apresentam na forma de uma página Web atualizada frequentemente, composta por pequenos blocos de textos apresentados de forma cronológica inversa, em que o fato mais recente fica sempre no topo da página. Esses blocos de textos são chamados de posts e são classificados em categorias de acordo com o assunto. Já a possibilidade de discussão e troca de ideias se dá por meio de comentários que podem ser escritos abaixo de cada post, podendo ser lidos e respondidos por qualquer usuário.4 Artigos recentes de revisão5,6 que tratam do uso de blogs no ensino formal indicam que pesquisas educacionais sobre a temática tomam, usualmente, como fontes de dados entrevistas com os sujeitos usuários dos blogs, suas respostas a questionários de avaliação da ferramenta, assim como suas postagens. Os blogs se constituem, muitas vezes, em: instrumento de interação social entre os alunos e entre estes e os professores; espaço para expressão de emoções e sentimentos dos alunos; ferramenta de gerenciamento de tarefas e de avaliação por parte dos professores; local para registro de experiências pessoais de alunos e para elaboração de diários de aprendizagem. É também digno de nota o papel que vem sendo desempenhado por eles como espaço para reflexão dos alunos, o que favorece a avaliação sobre suas próprias aprendizagens. Os artigos5,6 destacam ainda a facilidade de uso dos blogs e apontam algumas das suas limitações, dentre as quais está o tempo de duração máximo de um semestre da sua aplicação em estudos reportados na literatura. Um tempo maior de aplicação poderia auxiliar na adaptação dos alunos ao uso da ferramenta e permitiria uma melhor avaliação sobre como o desempenho dos alunos está associado ao seu uso. Neste trabalho temos como objetivo discutir o uso de blogs como ferramentas de apoio ao ensino presencial em disciplina de comunicação científica oferecida em um curso de Bacharelado em Química. Para tanto, os comentários postados nos blogs da disciplina foram entendidos como indicadores da participação dos alunos de acordo com os seguintes tipos de participação: administrativa, técnica, social e de conteúdo. Estes tipos de participação se baseiam no Modelo de Henri,7 adaptado por McKenzie e Murphy,8 descrito sucintamente a seguir. Entendemos a análise do uso dos blogs pelos sujeitos como sendo de primordial importância para que possamos especular sobre a sua eficácia como facilitador de interação no processo de ensino-aprendizagem e para que possamos também vislumbrar suas limitações. A análise dos comentários postados nos blogs favorece esta especulação, no sentido da ampliação dos espaços de ensino e aprendizagem, permitindo evidenciar a natureza das mensagens nas interações entre alunos e entre alunos e professor.
APLICAÇÃO DA PROPOSTA DE ENSINO Os blogs foram aplicados em duas turmas da disciplina de Comunicação e Expressão em Linguagem Científica II,4,9 ministrada no Curso de Bacharelado em Química do Instituto de Química de São Carlos, Universidade de São Paulo: Turma 1 (28 alunos) e Turma 2 (32 alunos). Além dos alunos, a professora e o estagiário também foram tomados como sujeitos da pesquisa. A referida disciplina possui carga horária de três créditos e não trata de conteúdos específicos de química, tendo entre os seus principais objetivos o desenvolvimento das habilidades de leitura e de comunicação dos alunos em linguagem científica,10 assim como o desenvolvimento da capacidade de busca nas diversas fontes de informação de interesse para os químicos. Durante o semestre letivo, os alunos trabalharam com artigos originais de pesquisa11,12 e com estudo de casos,13 sendo parte das suas atividades desenvolvidas nos blogs da disciplina. Assim, estes foram adaptados de forma a viabilizar a publicação das atividades extraclasse, de reflexões sobre o processo de ensino-aprendizagem e de comentários por parte da professora, do estagiário e dos alunos. Guias com instruções para realização das atividades e informações sobre os horários de monitoria também foram disponibilizadas. No primeiro dia de aula de ambas as turmas, a professora fez a apresentação do curso, na qual os alunos foram informados sobre o uso de blogs e sobre as estratégias de ensino que seriam utilizadas na disciplina. Ainda na primeira aula a professora formou, em cada turma, sete grupos de trabalho com três a cinco membros por grupo. Cada grupo recebeu o endereço e as senhas de acesso a um blog de grupo e o procedimento de postagem foi explicado. O blog constituiu-se em uma ferramenta integrada à disciplina, permitindo que fosse ampliada a abordagem dos conteúdos nela ministrados. O trabalho requisitado aos alunos com artigos originais de pesquisa, por exemplo, foi subsidiado por meio da inserção no blog de uma página denominada "Busca-Artigos". Esta página permitia o acesso a links de sites de busca e links de revistas eletrônicas de química e de áreas correlatas. Dessa forma, foi favorecida a ação de busca pelos artigos, sendo estes fundamentais no embasamento do conhecimento necessário para a realização de algumas atividades presenciais e online. Ademais, comentários que tratavam de características a eles referentes foram postados pelos alunos e esclarecidos pela professora no blog, evidenciando o valor da ferramenta ao possibilitar uma discussão mais ampla de questões pertinentes à disciplina. O trabalho requisitado aos alunos com os casos13 também foi apoiado por recursos disponibilizados no blog. De fato, este contava com uma aba denominada "Atividades (Casos)", na qual era possível a publicação de reflexões e comentários dos alunos sobre o andamento da resolução dos casos, assim como a busca por informações, instruções e suporte para a sua resolução. Tais possibilidades fomentaram a troca de conhecimentos entre os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem sobre assuntos vinculados aos casos.13 No presente trabalho, somente os comentários são analisados. Cabe destacar que enquanto as atividades relacionadas à resolução de casos e à leitura e interpretação de artigos originais de pesquisa tinham notas atribuídas, a publicação de comentários não se constituía em tarefa obrigatória da disciplina, sendo realizada de forma espontânea pelos alunos. A análise de dados baseada na produção espontânea de comentários também é reportada por Den e Yuen,14 que consideram a liberdade de expressão e o compartilhamento informal como fatores positivos dessa espontaneidade.
MODELO DE HENRI COMO REFERENCIAL DE ANÁLISE DOS COMENTÁRIOS Henri7 desenvolveu um modelo para análise de conteúdos de comunicações mediadas por computador. O autor sugere cinco dimensões para classificar mensagens eletrônicas: a taxa de participação (quantidade de mensagens); o tipo de interação (resposta direta ou comentário indireto); as pistas sociais (por exemplo, "Este é o meu aniversário, o que é um grande dia"); as competências cognitivas e habilidades metacognitivas. McKenzie e Murphy8 adaptaram o Modelo de Henri7 de modo a incluir informações adicionais em algumas dimensões. Segundo os autores, são quatro as categorias relacionadas aos tipos de participação passíveis de classificação nos conteúdos de comunicação mediada por computador: administrativa (A); técnica (T); social (S) e de conteúdo (C). A Tabela 1 apresenta a definição e os indicadores relacionados às categorias.
Para a análise dos comentários postados nos blogs, utilizamos a classificação das mensagens de comentários nas categorias dos tipos de participação apresentados na Tabela 1. Dessa forma, analisamos a natureza das mensagens publicadas nos comentários dos blogs, na perspectiva de verificarmos se estavam ou não relacionadas ao conteúdo da disciplina ou se eram mensagens de cunho social, técnico ou administrativo. Como forma de exemplificar a classificação das mensagens de comentários realizada neste trabalho, a Tabela 2 apresenta a classificação para algumas mensagens de comentários publicadas no blog do grupo 1 da Turma 1 pelos alunos individualmente (AI) e alunos coletivamente (AC), pela professora (P) e pelo estagiário (E). Cabe destacar que em algumas mensagens de comentários existiam sentenças que se enquadraram em tipos de participação diferentes e, portanto, alguns comentários foram classificados em mais de um tipo de participação.
RESULTADOS E DISCUSSÃO A Figura 1 apresenta o gráfico da quantidade de mensagens de comentários publicadas por blogs nas Turmas 1 e 2. Cabe destacar que foram publicados 202 comentários, sendo 88 comentários realizados nos blogs da Turma 1 e 114 nos blogs da Turma 2.
Figura 1. Gráfico da quantidade de mensagens de comentários publicadas por blog de grupo de alunos (representados pelas abreviações BG1 a BG7) das Turmas 1 e 2
Observamos, por meio da comparação entre a quantidade de mensagens de comentários publicadas nas duas turmas, que a média de mensagens de comentários publicadas por blog da Turma 1 foi de 12,6 mensagens, enquanto que a média da Turma 2 foi de 16,3 mensagens e que a quantidade de mensagens de comentários publicadas por blog na Turma 1 variou mais do que a quantidade de mensagens de comentários publicadas por blog na Turma 2. Sendo que nos blogs da Turma 1 a quantidade de comentários publicadas variou de 19 a 5 mensagens por grupo, enquanto que nos blogs da Turma 2 a variação foi menor, de 19 a 13 comentários por grupo. A maior variação ocorrida na Turma 1 foi devida à extinção de um dos grupos formados no início do semestre letivo (grupo 7). Se desconsiderarmos esse grupo na análise, a variação é de 19 a 10 comentários, muito próxima da variação ocorrida na Turma 2, e a média de mensagens publicadas é de 13,8 mensagens, ainda abaixo da média ocorrida na Turma 2. Por meio das observações relatadas anteriormente, percebemos que as médias das quantidades de comentários publicados nos blogs nas duas turmas ficaram próximas. Acreditamos que esta proximidade se deu devido ao fato da metodologia de ensino adotada em ambas ter sido similar. Porém, analisar os conteúdos dos comentários pode indicar os tipos de participações presentes nesses comentários e a existência, ou não, de similaridade em ambas. Nesse sentido, a Figura 2 apresenta a quantidade de tipos de participação identificadas nos comentários publicados nos blogs da Turma 1 (a) e Turma 2 (b). A análise dos dados apresentados na Figura 2 (a) e (b) revela que, nos blogs de ambas as turmas, o tipo de participação administrativa foi o mais recorrente. Na Turma 1, do total de 148 tipos de participação identificados, 61 são administrativas, 22 técnicas, 31 sociais e 34 de conteúdo. Na Turma 2, do total de 172 tipos de participação identificados, 81 são administrativas, 23 técnicas, 30 sociais e 38 de conteúdo.
Figura 2. (a) Gráfico da quantidade dos tipos de participação encontrados nas mensagens de comentários publicadas por blog de grupo de alunos (representados pelas abreviações BG1 a BG7) da Turma 1. (b) Gráfico da quantidade dos tipos de participação encontradas nas mensagens de comentários publicadas por blog de grupo de alunos (representados pelas abreviações BG1 a BG7) da Turma 2.
As participações do tipo administrativa encontradas em algumas sentenças contidas nas mensagens de comentários tratavam: do prazo para publicação das mensagens (de trabalhos e reflexões) nos blogs; da escolha dos artigos científicos; das próximas etapas dos trabalhos da disciplina; do cronograma da disciplina. Seguem abaixo alguns trechos de comentários caracterizados como participações do tipo administrativa:
As participações do tipo técnica encontradas em algumas sentenças contidas nas mensagens de comentários publicadas nos blogs das duas turmas tratavam: de problemas de acesso ao blog; de problemas na publicação; de perda da senha de acesso aos blogs; de problemas na inserção de tabelas e imagens nas publicações; de problemas de visualização de textos e/ou vídeos inseridos como links externos; do modo de uso da ferramenta de blogs; das soluções ou alternativas aos problemas reportados em outras mensagens. Do total de 1107 mensagens publicadas em todos os blogs, 202 foram comentários, nos quais foram identificadas apenas 45 participações do tipo técnica, que além de terem sido utilizadas para reportar problemas e transmitir a solução dos mesmos, também evidenciaram o modo de uso da ferramenta de blog pelos alunos, professora e estagiário. Muitos dos problemas reportados por meio das mensagens de comentários se relacionavam à visualização de links, principalmente dos links que levavam aos artigos científicos indicados pelos alunos, haja vista que muitos desses links se referiam a artigos de acesso restrito e que poderiam ser acessados apenas pelos computadores que estavam na rede da universidade. Este fato evidenciou uma limitação no uso do blog associado a estratégias de ensino que exijam a visualização e estudo de artigos científicos, devido à impossibilidade de acesso a algumas revistas pelos computadores domésticos dos sujeitos. Outro problema muito citado foi o esquecimento das senhas de acesso pelos alunos, o que fez com que eles, na maioria das vezes, utilizassem as senhas dos grupos e/ou de colegas para efetuar as suas publicações individuais. Este fato ocorreu devido à escolha que fizemos de cadastrarmos os alunos, ao invés deles próprios realizarem as suas inscrições na plataforma de blogs. Com esta medida, não utilizamos o tempo da disciplina no acompanhamento da inscrição de cada aluno, o que poderia demorar alguns dias até que todos se inscrevessem e estivessem aptos a publicar mensagens. Além disso, evitamos também que o aluno fosse o detentor absoluto de sua senha, o que impediria a recuperação por nós da senha de alguns alunos que tivessem se cadastrado de forma inadequada, devido à utilização que fizemos de uma plataforma externa, da qual não possuíamos acesso aos bancos de dados das inscrições. Mesmo com o problema de esquecimento de senhas por alguns alunos, esta medida que tomamos permitiu que, por possuírem uma senha fixa, pudéssemos recuperá-la a qualquer momento. Se a plataforma de blogs utilizada fosse do domínio do Instituto, não precisaríamos ter tomado esse tipo de precaução, pois teríamos outras maneiras de recuperar as senhas dos alunos, uma vez que seria possível o acesso aos dados das inscrições, que estariam em nosso servidor. Problemas mais estreitamente relacionados com as ferramentas de blog, apesar de aparecerem em menor quantidade, também foram citados: problemas de acesso aos blogs; e problemas na inserção de imagens e tabelas. Os problemas de acesso, em geral, não foram problemas generalizados e os problemas na inserção de imagens e tabelas foram resolvidos por meio da utilização de editores, como o Word do Microsoft Office, e posterior publicação das atividades em anexo de documentos .doc ou .pdf. No trabalho de Ozkan,15 por exemplo, problemas técnicos foram reportadas pelos estudantes como um fator negativo. No entanto, esse mesmo trabalho sugere a colaboração entre professores da matéria que usa blog e departamentos que tenham salas de computadores como forma de contornar tais percalços. Seguem abaixo alguns trechos de comentários caracterizados como participações do tipo técnicas:
As sentenças que foram classificadas como participações sociais revelam o relacionamento entre os alunos, entre a professora e os alunos, e entre o estagiário e os alunos. A maioria delas diz respeito à relação entre a professora e os alunos, na qual percebemos a professora na condição de gestora de aprendizagem, muitas vezes sugerindo ao aluno como resolver as atividades e motivando a busca pelo conhecimento. Por exemplo, Wopereis16 em seu trabalho confirma que blogs são úteis para promover reflexão sobre tópicos críticos, embora considere que para reflexão profunda dos tópicos seja necessário a instrução explicita do professor. Cabe destacar que o uso de blogs é comum como ferramenta social, mas o uso para discussão de conteúdos é ainda pouco usual para usuários de internet, fato esse observado por Deng.14 Observamos também o aluno com mais liberdade de expressão de suas opiniões, sem medo de ser reprimido, levantando questões do seu interesse. Constamos também o uso, entre alunos, de uma linguagem descompromissada com as regras gramaticais, de uma linguagem próxima a da utilizada no meio da Internet. Essa liberdade de expressão e linguagem facilita o aprendizado por permitir que estudantes com estilos diferentes de aquisição de conhecimento e interação tenham novas possibilidades e meios de aprender, encorajando a participação de estudantes que estariam desconfortáveis em outros ambientes e provendo uma ferramenta interativa onde os estudantes podem debater e discutir problemas. Nessa perspectiva, Wang17 destaca que o uso apropriado de blogs encoraja a participação dos que estariam desconfortáveis em discussões face a face e, portanto, permite que estes aprendam melhor o conteúdo, enquanto Wassel e Crouch18 enfatizam que o encorajamento do diálogo por meio dessa ferramenta leva a um maior entendimento crítico dos tópicos abordados. Govindasamy19 conclui que há uma expansão do conhecimento e das habilidades comunicativas. Kuzu20 também enfatiza em seus trabalhos os aspectos positivos dessa maior liberdade de expressão e interação, com a menor presença de limitações e amarras. Na relação entre estagiário e alunos verificamos o apoio do estagiário aos alunos. Coube ao estagiário, esporadicamente, o controle e moderação de alguns tipos de palavras utilizadas em algumas mensagens dos alunos para evitar que os mesmos usassem a ferramenta para expressar sentimentos e reclamações rudes. Dickey21 também observou a externalização de ansiedade e estresse em mensagens em ambientes de ensino por meio de blog. Ozkan15 enfatiza que o aprendizado por parte dos alunos em controlar os sentimentos de ofensa pode ser obtido quando o professor enfatiza o objetivo educacional da ferramenta, os critérios de feedback e a importância de ser ético nos comentários. Cabe destacar a existência de saudações no começo e término da maioria das mensagens de comentários, tais como: Olá!, Até Breve!, Até Amanhã!, Até mais!, Obrigado!. Participações que possuíam apenas este tipo de evidência de relacionamento entre as pessoas não foram classificadas como participações do tipo social. A classificação das mensagens nessa categoria exigiu uma elaboração posterior à saudação que implicasse na evidência de busca de estreitamento de laços entre os sujeitos. Acreditamos que as sentenças classificadas como participações sociais mostraram que o uso do blog na disciplina conduziu a mudanças no paradigma convencional do ensino, que segundo Moran, Masetto e Behrens,22 distanciam professores e alunos. As participações do tipo social encontradas em algumas sentenças contidas nas mensagens de comentários tratavam de participações que envolveram questões sobre: o relacionamento entre a professora e os alunos; o relacionamento entre os alunos; o relacionamento entre o estagiário e os alunos. Seguem alguns trechos de comentários caracterizados como participações de tipo social:
As participações do tipo de conteúdo encontradas em algumas sentenças contidas nas mensagens de comentários tratavam: do feedback da professora sobre as atividades realizadas pelos alunos; das dúvidas dos alunos; das respostas às dúvidas dos alunos; das respostas dos alunos ao feedback da professora. Seguem abaixo alguns trechos de comentários caracterizados como participações de tipo conteúdo: [...] tudo está OK com a sua tarefa, exceto o artigo que você enviou como sendo de divulgação. Na verdade, não é. Concorda comigo? Em caso de dúvida, me procure ou consulte a definição de artigo de divulgação no livro indicado na aula. (Professora, no Blog 5 da Turma 1) Todos os artigos indicados por você estão OK (são mesmo artigos originais de pesquisa) e apresentam temas muito relevantes para a sociedade. No entanto, com exceção do que trata da "Suscetibilidade de populações...", os demais são muito curtos. Você não quer reconsiderar a sua escolha? Talvez seja difícil desenvolver uma apresentação de 20 minutos em cima de um artigo tão curtinho como o Técnicas de vacinação...". Eu, se fosse você, ficaria como o "Suscetibilidade ..." como prioridade número 1. Pense nisso e comente o meu comentário... (Professora, no Blog 5 da Turma 2)
A Figura 3 apresenta a quantidade de tipos de participação por autor, contidos nos comentários publicados nos blogs da Turma 1 (a) e Turma 2 (b). Em geral, observamos que a professora utilizou-se das mensagens de comentários para dar os pareceres sobre as atividades dos alunos e o estagiário utilizou-se dessas mensagens de comentários para relembrar os alunos dos prazos de publicações das atividades, ambas classificadas, respectivamente, como participações de conteúdo e administrativas, o que explica a grande quantidade desses tipos de participação nos blogs dos grupos de alunos de ambas as turmas.
Figura 3. (a) Quantidade de tipos de participação em relação à autoria, nos blogs da Turma 1. (b) Quantidade de tipos de participação em relação à autoria, nos blogs da Turma 2
Observamos que os alunos, em geral, se utilizaram de sentenças de comentários classificadas como participações administrativas para avisar sobre a publicação de trabalhos fora do prazo, para tirar dúvidas sobre o cronograma da disciplina e eventualmente justificar a não publicação de algum trabalho. A professora, em geral, utilizou-se dessas sentenças para avisar sobre os artigos já escolhidos por outros grupos e também para avisar aos alunos das ações que deveriam tomar para dar sequência aos trabalhos da disciplina. O estagiário o fez para avisar aos alunos os prazos de publicações dos trabalhos e das reflexões nos blogs e o recebimento dos mesmos, assim como para esclarecer dúvidas sobre o cronograma da disciplina. Observamos que os alunos, em geral, se utilizaram de sentenças de comentários caracterizados por participação técnica para reportar problemas de acesso ao blog, problemas na publicação, problemas na inserção de tabelas e imagens nas publicações e problemas de visualização de textos e/ou vídeos inseridos como links externos. A professora, em geral, utilizou-se dessas sentenças para reportar problemas na visualização de textos e/ou vídeos inseridos como links externos e o estagiário para solucionar os problemas reportados em outras mensagens. A professora foi quem mais utilizou sentenças caracterizadas como participação do tipo de conteúdo que, em geral, foram utilizadas para dar o feedback aos alunos sobre as atividades publicadas anteriormente. Os alunos pouco utilizaram dessas sentenças e, quando o fizeram, reportaram suas dúvidas e responderam ao feedback da professora. O estagiário utilizou esse tipo de sentença apenas para responder a algumas dúvidas dos alunos. O fato dos alunos quase não terem publicado mensagens com participações de conteúdo sugere que, conforme constatou Wopereis,16 isso se deve ao fato de os alunos se encontrarem e preferirem esclarecer suas dúvidas de modo presencial. Logo, os alunos somente procuram esclarecimento por meio das tecnologias de comunicação utilizadas nos cursos quando não dispõe de outros meios. Ainda assim constatamos ser o blog uma ferramenta complementar à reflexão sobre o conteúdo ministrado em sala de aula, e de comunicação direta com a professora.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste trabalho analisamos comentários em blogs no ensino superior de química. Como o blog foi uma ferramenta complementar às atividades em sala de aula, os alunos usaram a seção de comentários para realizar principalmente perguntas administrativas como datas de entrega de trabalhos e para comunicar possíveis dúvidas relativas ao seu funcionamento, cabendo à professora a tarefa de guiar e realizar as postagens vinculadas ao conteúdo da disciplina. Como já também destacado por Wopereis,16 isso nos mostra que na relação professor-aluno, o educador se mantém na função de gestora e motivadora da aprendizagem e de questionamentos inerentes ao conteúdo em foco. Foi possível observar diversos usos importantes da ferramenta no auxílio à discussão de informações referentes aos conteúdos ministrados em sala de aula. Além disso, o uso do blog proporcionou um aumento da interação dos alunos em um ambiente que os favoreceu a levantar questões de seus interesses, sem medo de serem reprimidos. Esse fato foi indicado pelo uso de linguagem coloquial no ambiente virtual, em especial entre alunos. O blog também propiciou um meio de fazer com que os alunos refletissem mais e com maior frequência sobre o conteúdo da disciplina, levando a um aprendizado contínuo ao longo da sua aplicação. A ferramenta permitiu ainda que a educadora avaliasse o progresso feito pelos estudantes durante o semestre, antes mesmo da realização de provas formais. Portanto, o blog forneceu à professora mais elementos para avaliar deficiências que precisassem ser corrigidas no aprendizado do conteúdo de modo a permitir que esta fizesse as intervenções que julgava necessárias. Em virtude do que foi mencionado, concluímos que o ambiente virtual do blog é uma ferramenta social de ensino e aprendizagem que possibilita espaço para partilha de conhecimentos e experiências, ler e escrever, troca de ideias, informações e opiniões. Ainda que tenhamos explorado o blog no contexto do ensino de química, essa ferramenta pode ser utilizada para potencializar o ensino das mais diversas disciplinas.
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On-line version ISSN 1678-7064 Printed version ISSN 0100-4042
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