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Casos investigativos e a relação com o saber: trajetória e processo de aprendizagem de estudantes do ensino superior no Tocantins Investigative cases and the relationship with the know: the career and process of the learning of higher education students in Tocantins |
Welington FranciscoI,*; Anna M. Canavarro BeniteII
IColegiado de Ciências Exatas e Biotecnológicas, Universidade Federal do Tocantins, 77402-970 Gurupi - TO, Brasil Recebido em 09/09/2015 *e-mail: welington@uft.edu.br In light of the theory of relationship with know of Bernard Charlot, aiming to understand the unique stories of the subject through a positive lecture, i.e., understanding the reality and the way the subjects read and interpret the world, this article attempts identify how higher education students solve an investigative case and learn the scientific knowledge using this theory. For this, we used narrative as a discourse genre to collect the data of 34 students who participated in the small group activities. After content analysis, the results showed that all groups of students solve the case in a similar way and in three stages, prevailing relations with know with the world, with others and with yourself. However, even if the resolution is similar, chemical learning differs between different groups and differs between the scientific content present in the case. From these results it is possible to identify the effectiveness of learning depends on the epistemic and identity relationships with know of each subject (relationship with yourself) because to learn the student must enter into an intellectual activity (investigative case), stay on it and develop the relationships with known necessary to master the normativity (chemical language). INTRODUÇÃO Os casos investigativos (CI) são histórias para educar. Educam porque se utilizam de narrativas sobre indivíduos enfrentando decisões, concedendo aos estudantes uma análise crítica sobre o assunto e possibilitando trabalhar diversos conceitos científicos em diferentes contextos.1 É possível elaborar um CI de diferentes maneiras, seja através de uma discussão, palestras, métodos de pequenos grupos, dentre outras.2 O elemento comum entre todas essas abordagens é o uso de histórias. O método de pequenos grupos baseia-se na aprendizagem colaborativa ou cooperativa, promovendo uma diversidade de opiniões dos integrantes e melhorando a organização de ideias para a resolução.3 Os CI permitem que os professores sejam livres para serem criativos e sem regras de apresentação. No entanto, Heirred4 destaca que um bom caso é aquele que: conta uma história, desperta interesse, é atual, cria empatia, tem diálogo, é relevante ao leitor, tem a função de ensinar, provoca conflito, resolve um dilema, apresenta generalidades e é curto. Tais características não são regras que devem ser seguidas fielmente nas atividades. De maneira geral, os CI devem, sobretudo, incentivar a formulação de problema, a investigação, a persuasão e ensinar ciência de modo que os alunos adquiram um conhecimento aplicável e flexível do conteúdo científico.5 Nós, professores, devemos trabalhar a ciência em sala de aula da forma que a ciência foi/é construída. Trabalhar com dados incompletos, fazer levantamentos de hipóteses, coletar (mais) informações, refinar nossas hipóteses, fazer (mais) previsões, obter dados e assim por diante. Os CI mostram a "bagunça", fazem os estudantes colocarem as mãos na massa, como é a ciência real. Eles exigem ceticismo, flexibilidade e a capacidade de ver alternativas de abordagens.2 Em outras palavras, exigem uma heterogeneidade na aquisição do saber e, consequentemente, nas respectivas relações com esse saber. Charlot6-9 aponta que todo saber adquirido, indubitavelmente, mantém relações com o mundo, com outros seres e consigo mesmo. Deste modo:
Nesse sentido é que "realizar pesquisas sobre a relação com o saber é buscar compreender como o sujeito apreende o mundo e, com isso, como se constrói e transforma a si próprio".8
UM DIÁLOGO ENTRE AS RELAÇÕES COM O SABER E OS CI A sala de aula no Ensino Superior é permeada de relações com o saber e se constitui como um espaço/tempo privilegiado para ousar e desenvolver práticas educativas. Assim, planejar atividades que utilizam de CI permite estreitar a relação entre problema e objeto de conhecimento, assim como identificar as relações com o saber que estão envolvidas no processo. As relações com o mundo, com o outro e consigo mesmo nada mais são que a história percorrida por cada sujeito em um momento específico durante a relação com o saber. Essa heterogeneidade de relações é que faz o sujeito entrar na relação com o saber, pois são as maneiras dele se relacionar com o mundo, com os outros que lhe influenciam e consigo mesmo, que possibilita a mobilização na atividade intelectual. Essa é a chamada leitura positiva que Charlot6 aponta para entender porque um estudante está em fracasso escolar. O conceito de mobilização implica o sujeito pôr-se em movimento, ou seja, usar de si próprio como um recurso para realizar uma atividade, uma tarefa. É entrar em uma dinâmica interna para resolver uma situação, é por seus próprios recursos em movimento. Essa movimentação é conduzida pelo desejo de..., que constitui o motor da mobilização.6 Por isso que o papel do professor é essencial no processo de aprendizagem. É o professor que ajuda o estudante a convergir o motivo (de estudar) com o objetivo (de aprender) durante a atividade. Ninguém aprende se não entrar numa atividade intelectual, ou seja, quem não estuda, dificilmente aprenderá. Muitas vezes o que ocorre é que os estudantes estudam por motivos que não estão relacionados com o próprio saber e, portanto, não entram em nenhuma atividade. Nesse sentido, o professor deve assumir um papel de mobilizador nas atividades. Isso porque, "prestar atenção à mobilização dos alunos leva a interrogar-se sobre o motor interno do estudo, ou seja, sobre o que faz com que eles invistam no estudo".8 Os conhecimentos (saberes) dos quais os estudantes vão se apropriar durante a resolução do caso é resultado das relações com o próprio caso, assim como das relações com familiares ou amigos, com professores, com a experiência de vida, com auxílio de livros e revistas, internet etc. Essas formas que os estudantes possuem para adquirir conhecimentos são denominadas por Charlot6 de figuras do aprender. Sendo:
As figuras do aprender auxiliam os "sistemas de interpretação" dos estudantes durante a resolução do caso, que pode ser entendido como o conjunto de relações desenvolvido pelos estudantes para a apropriação de saber, ou seja, uma relação intrínseca com o sujeito. Já a relação com o sujeito leva a "rede de significados ou de conceitos", que envolve os conteúdos específicos presentes na situação, perpassando as relações com o mundo e com os outros. Está relacionado com as representações do saber do assunto em questão, da disciplina, da linguagem adequada etc.6 Isso significa que aprender "é uma ação que tem origem fora do sujeito, mas só pode ter êxito se encontrar um movimento interior do sujeito".7 Com isso, pode-se afirmar que o conceito de mobilização envolve relações com o próprio sujeito, enquanto a motivação busca relações com o mundo e com os outros. Uma vez que o ensino superior deva privilegiar o papel e a importância do estudante no processo da aprendizagem, assim como permitir que o estudante questione as situações no mundo, que sistematize problemas e que busque criativamente soluções, defendemos que o uso de CI pode proporcionar esses aspectos. Portanto, o objetivo desse trabalho, que é um recorte de uma tese de doutorado, é ensinar química (conceito de análises químicas) por meio de estabelecimentos de relações com o saber e relações CTS utilizando os CI como ferramenta da ação mediada.
METODOLOGIA A presente investigação se caracteriza como uma pesquisa participante (PP), pois nasce da inquietação do professor sobre a realidade concreta em sala de aula, tentando modificá-la a partir de fatos, dados e da percepção que deles esteja tendo a população envolvida.10 A atividade foi planejada e inserida no plano de curso da disciplina de Fundamentos de Química Analítica (ministrada no terceiro período para os cursos de Química Ambiental (QA) e Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia (EBB) da Universidade Federal do Tocantins (UFT) - Campus de Gurupi). Ao todo, participaram trinta e quatro estudantes matriculados na disciplina, sendo oito estudantes do curso de QA e vinte e seis do curso de EBB. Foi elaborado o caso intitulado "Preocupação com a composição da "velha cachacinha de final de tarde"" (Figura 1), que narra um diálogo entre dois amigos sobre a composição de cachaças e a preocupação com duas espécies químicas que não podem estar presentes em quantidades acima do permitido.
A atividade foi conduzida no primeiro semestre de 2013, totalizando quatro aulas de cinquenta minutos em sala. O CI foi apresentado à turma, após toda a discussão em sala aula sobre diversos conceitos relacionados com as análises químicas, os equilíbrios de reações de neutralização, precipitação, complexação e oxidorredução, as titulações e a análise gravimétrica. Os estudantes tiveram um mês para resolver o caso em horário fora das aulas, sendo que nas últimas aulas foi feita a apresentação das resoluções e a socialização dos conhecimentos adquiridos pelos doze grupos (2 aulas de 50 minutos). Nas duas primeiras aulas, após a entrega do caso foi feita a leitura do mesmo em voz alta e, posteriormente, uma breve discussão para entendimento do caso e esclarecimentos de algumas dúvidas sobre o formato da resolução, possibilidade de consulta de materiais, de professores e de outros grupos, o uso de conhecimentos além dos trabalhados em sala de aula e data para entrega do trabalho. Como a proposta era trabalhar o CI com o método de pequenos grupos, por permitir uma aprendizagem colaborativa, com maior interação, diálogo, confronto de ideias e opiniões entre os integrantes, os estudantes foram divididos em doze grupos de três integrantes. Os grupos foram identificados por G1, G2, G3... até G12. Os grupos G2, G5 e G12 eram grupos mesclados com estudantes de QA e EEB e os grupos G1 e G3 eram compostos apenas de estudantes de QA. A ideia foi proporcionar uma situação diferente da que foi trabalhada em sala de aula, em que os estudantes conseguissem aplicar alguns conhecimentos desenvolvidos. Desta forma, é possível verificar como esses conhecimentos são aplicados e de que forma, provocando uma participação direta no próprio processo de aprendizado e reflexão dos conhecimentos químicos aprendidos. Os dados foram obtidos por meio de elaboração de narrativas. Nestas narrativas os estudantes descreviam o caminho utilizado para resolver o caso e explicavam as soluções propostas com base nos conceitos científicos. A escolha da narrativa consiste nas próprias características desse gênero de discurso, por ser um texto organizacional expresso na forma de uma história estruturada nas experiências de temporalidade e ações pessoais de cada ser humano.11 Para a identificação dos caminhos percorridos para a resolução do caso (descrição) foi feita uma adaptação do instrumento de ensino balanço de saber, utilizado por Charlot.7 Este instrumento consiste "em uma produção de texto na qual o aluno avalia os processos e os produtos de sua aprendizagem"7 através de uma pergunta pré-estabelecida do tipo "Desde que nasci, aprendi muitas coisas; em casa, no bairro, na escola, em muitos lugares. O que me ficou de mais importante? E agora, o que eu espero?". A adaptação foi feita para a seguinte pergunta: Qual foi o caminho/percurso que você utilizou para a resolução do caso? O que você pesquisou, quem lhe ajudou, quais foram suas dificuldades, como montou a resolução? O que você julga de mais importante durante toda a atividade? A resposta dessas perguntas constitui em descrição das etapas percorridas, que permite identificar a trajetória da resolução. Compreender as narrativas é intentar desvelar os caminhos percorridos pelos estudantes, para compreender a história por trás da resolução, os processos que contribuíram para a estruturação da resolução, a fim de dar subsídios para a avaliação da aprendizagem. Em relação às explicações das soluções propostas, o intuito foi analisar e avaliar o desenvolvimento da aprendizagem dos conceitos químicos por meio dos saberes adquiridos. Por se tratar de um gênero de discurso que utiliza da palavra escrita, as narrativas fazem com que os estudantes reflitam sobre o próprio discurso, tornando a escrita mais ampla e expandindo as suas modalidades.12 Para a análise das descrições, empregou-se o referencial da análise de conteúdo proposta por Bardin,13 pois permite expressar as significações presentes no material escrito dos estudantes e a distribuição desses conteúdos. Já a análise das soluções propostas (resolução do caso) foi baseada na avaliação da aprendizagem dos estudantes frente aos conhecimentos científicos envolvidos no CI sob o referencial da relação com o saber.6-9 Para essa avaliação elaborou-se quatro critérios que permeiam a aprendizagem química, sendo eles:
Estes critérios estabelecidos buscam aproximar a compreensão da natureza química, ou seja, que a química é uma ciência que pode ser compreendida em três níveis: o macroscópico - trata-se das propriedades visíveis e tangíveis; o microscópico - interpretação dos fenômenos em termos de distribuição e rearranjos de átomos, íons e moléculas; o simbólico - a descrição por meios de representações gráficas e matemáticas, além das equações químicas que unem os demais níveis.14 À luz da teoria da relação com o saber de Charlot,6-9 o nível macroscópico (descrição, uso dos termos científicos e simbologia corretos) se aproxima da questão da normatividade da química. Essa normatividade é entendida como as condições exigidas para atingir um objetivo, ou seja, para aprender química é necessário dominar a sua linguagem específica que foi/é construída e aceita por uma determinada atividade humana e suas relações sociais.
RESULTADOS E DISCUSSÃO Unidades de análise e processo de categorização da resolução do caso A primeira categoria que emergiu das narrativas foi o levantamento de informações, que consiste na busca de informações prévias para orientar a resolução do caso. Para essa identificação, consideraram-se as palavras pesquisa, busca e informação (grifadas), que expressam a ideia do tema da categoria tal como o extrato abaixo:
A segunda categoria é identificada como a socialização das informações e dúvidas. Esta categoria toma como base o uso de palavras como discussão, reunião e conversa, envolvendo as primeiras discussões sobre os levantamentos das informações prévias, o que fazer com essas informações e qual o caminho a ser seguido em diante. O extrato 2 ilustra a identificação dessa categoria:
A terceira categoria é a reflexão e construção dos saberes, que se centra nas discussões finais que antecedem o início da escrita da resolução do caso. Essas discussões visavam organizar as ideias e explicar os conceitos científicos envolvidos. As palavras resolução e escrita guiam a construção da categoria, conforme o extrato 3 abaixo:
Cada categoria está relacionada a ações praticadas pelos grupos. A Figura 2 mostra a identificação do caminho utilizado pelos grupos para a resolução dos casos. As caixas fechadas com letras maiúsculas e em negrito são as três categorias identificadas a partir da análise de conteúdo, que se relacionam por meio das flechas grossas e que compõem a estratégia para a resolução. As flechas finas representam as ações realizadas pelos grupos em cada categoria até a resolução do caso.
Figura 2. Representaçao do percurso/caminho utilizado pelos grupos (G1 a G12) durante a resoluçao do caso
Todos os doze grupos usam como o primeiro passo para a resolução o levantamento de informações. As principais fontes de informações são livros de análise química, artigos científicos relacionados ao assunto (destaca-se a revista Química Nova) e sites específicos como da ANVISA (www.anvisa.gov.br) e INMETRO (www.inmetro.gov.br). Os principais livros consultados foram: Princípios de Análise Instrumental dos autores Jones F. Holler, Douglas A. Skoog e Stanley R. Crouch; Fundamentos de Química Analítica de Douglas A. Skoog, Donald M. West, Jones F. Holler e Stanley R. Crouch; e Fundamentos de Cromatografia escrita por Carol H. Collins, Gilberto L. Braga e Pierina S. Bonato. As principais informações pesquisadas nos livros, artigos e sites versam sobre os métodos e técnicas mais adequadas para análise, os efeitos nocivos do metanol e dos íons cobre e o processo de fabricação de cachaças artesanais, como representado no extrato abaixo:
O grupo G2 também optou em buscar informações fora da academia, com uma visita a uma fazenda de fabricação de cachaça artesanal, para entender mais sobre o processo. Já os grupos G3 e G10 fizeram contato com uma estudante de período mais avançado do curso de EBB para auxiliar nas ideias e um estudante do curso de farmácia para compreender melhor os efeitos que o metanol provoca no organismo, respectivamente, como exemplificado no extrato 5:
No que tange a categoria levantamento de informações, a principal relação com o saber usada pelos grupos é a relação com mundo. Esse mundo é o próprio universo de ensino dos estudantes, ou seja, a universidade, o curso de graduação, as disciplinas obrigatórias a se cursar, a biblioteca para pesquisar e estudar e os meios de comunicação e informação disponíveis. Os estudantes devem se apropriar da universidade como um todo para aprender e não apenas ter acesso a ela. Assim, o aprender é visto como um modo de apropriação do mundo, o qual fornece os subsídios necessários para a compreensão das dimensões epistêmicas e identitárias de cada indivíduo.6 O extrato 6 traz algumas estratégias mobilizadas para formas de apropriação:
Esse extrato ilustra a condição básica disponível para a aprendizagem dos estudantes, pois o "mundo no qual as pessoas nascem está organizado, sob uma forma humana e social"6 e a universidade e os caminhos para a aprendizagem fazem parte desse mundo social. Já os grupos G2, G3 e G10 que buscaram informações diretamente com um fabricante de cachaça artesanal e com estudantes de outros cursos (Extrato 5), a relação com o saber que se caracteriza é a relação com o outro. Esse outro é aquele que orienta, que indica e que ajuda aprender algum assunto. Isso significa que "aprender é entrar na comunidade virtual (e às vezes presente) daqueles que aprenderam o que eu aprendo ou que eu quero aprender".7 Em relação à segunda categoria (socialização das informações e dúvidas), todos os grupos ressaltam a importância da socialização das informações extraídas e das dúvidas geradas durante as pesquisas. Nesta categoria prevalecem três relações com o saber: a) a relação com o outro - por meio de discussões e reflexões entre o próprio grupo e entre os grupos, em sala de aula e com professores b) a relação com o mundo - que são as novas buscas de informação; c) e a relação consigo mesmo - que é autorreflexão sobre as ideias iniciais e a forma de usar o conhecimento para escrever a resolução. O extrato 7 apresenta alguns exemplos dos discursos:
Os resultados dos discursos de G1, G6 e G8 mostram que há uma diferença entre a organização da resolução em cada grupo. Em G1, outro grupo dá uma orientação/sugestão para a resolução do caso, indicando um artigo científico para leitura. Por sua vez, em G6 e G8, os grupos realizam um debate com outro grupo, o qual proporciona uma troca de informações para se chegar a uma conclusão. No caso do G1, esse outro é aquele que "existe como humanidade nas obras produzidas pelo ser humano ao longo da história",7 porque há uma indicação de um artigo científico para auxiliar na resolução do caso. Nos demais discursos, o outro é caracterizado como aquele que ajuda o sujeito a aprender determinado assunto, que lhe explica um conceito, que lhe auxilia com atividades, que lhe avalia durante um semestre, ou seja, "é o outro como mediador do processo".7 Desta forma, a relação com os outros (em sala de aula - professor e demais alunos; grupos e entre grupos; e na sala do professor) com o outro (estudantes) é que vai ajudando a organizar as informações adquiridas para iniciar a relação do próprio sujeito e permitirá o desenvolvimento do saber durante a resolução do caso. Em linhas gerais, são os elementos que mobilizam os grupos no processo de aprendizagem e que se constituem na co-construção do sujeito e de seu mundo.6 A relação com o mundo se concentra na busca do artigo científico sugerido (G1) e nas informações adquiridas por meio das pesquisas sobre as análises (G6 e G8). As fontes de informação e os objetos-saberes (artigo científico, livro, materiais da internet etc.) são formas preexistentes no mundo acadêmico dos estudantes. É esse mundo que os estudantes vivem e que praticam suas atividades escolares, de modo que a "relação com o mundo constitui-se na co-construção (seletiva) do sujeito e de seu mundo".7 Por fim, essa co-construção é intimamente ligada à relação consigo mesmo, pois a dimensão social contribui para dar forma particular ao sujeito.6 É o que ocorre nas contribuições pessoais de cada integrante em G6 durante a discussão em grupo e na influência nas novas resoluções e conclusões em G1 e G8, quando apontam a modificação das ideias iniciais pesquisadas. Particularmente as ações praticadas nesta categoria (socialização das informações e dúvidas) são diferentes. Por exemplo, sete grupos (G4, G5, G6, G7, G10 e G12) preferem socializar as ideias levantadas e as dúvidas entre o próprio grupo, enquanto os grupos G1, G8 e G11 utilizam de conversas com outros grupos. No extrato 8, G5 destaca a organização do grupo durante o trabalho, mencionando as argumentações de cada integrante de acordo com pesquisas simultâneas para contribuir com a informação, enquanto que para G11 importa a socialização com outros grupos para entender como a resolução deve ser feita. Os trechos sublinhados nesse extrato retratam essas diferenças:
As diferenças durante a resolução do CI demonstram que o processo de aprender é uma construção de si que só é possível pela intervenção do outro, ao mesmo tempo que é indissociável ao sentido e ao valor que cada sujeito atribui a ele mesmo durante a aprendizagem.7 Ademais, as escolhas por uma ou outra determinada ação revelam a preferência de cada grupo, que faz correspondência com a identidade social e epistêmica dos sujeitos.6 São durante essas ações de debate e discussão ("...Os assuntos foram debatidos sempre por tópicos..." e "...Onde foi discutida a situação..."), interações entre o grupo e com outros grupos ("Trabalhamos somente entre nós..." e "Houve troca de informações com outros grupos...") e intervenções na resolução ("...Maior entendimento quanto ao que deveria ser feito") que as dúvidas que surgiram nas pesquisas se tornam direcionamentos e começam a dar sentido às informações socializadas. Esse processo faz parte da mobilização, porque "mobilizar-se é reunir suas forças para fazer uso de si próprio como recurso"6, ou seja, "é a dinâmica interna do aluno que, evidentemente, se articula com o problema do desejo"8 e que floresce a relação consigo mesmo e a identidade do seu saber vai sendo construída. Tais resultados corroboram com os resultados apresentados por Lopes et al.,15 uma vez que os autores relatam a importância da participação do professor nesse tipo de atividade para direcionar a novas investigações e futuras socializações. Acredita-se realmente que o professor tenha um papel essencial nessa etapa, mas defende-se que ele não é o único que influencia essa mobilização dos estudantes, como observado acima. Além disso, os resultados demonstram que há também a socialização das informações com pessoas fora dos grupos, especialmente com professores de outras disciplinas, praticado pelos grupos G8 e G9 e apresentado no extrato 9:
Aqui os dois grupos são mobilizados por um professor de outra disciplina. Essa mobilização surge a partir da relação de saber estabelecida entre posições sociais diferentes quando se põe a questão do saber,6 isto é, entre o professor que já possui o conhecimento e o estudante que está se apropriando. A terceira categoria (reflexão e construção dos saberes) também é identificada em todos os grupos como a etapa final para a resolução do caso. Este é o momento que os estudantes começam a escrever a resolução do caso, refletindo sobre as melhores formas de explicação e apresentação. Das narrativas dos grupos, as ações utilizadas para essa categoria perpassam por novas discussões entre o próprio grupo, entre os grupos e fora dos grupos, ressaltando novamente a importância das relações com o saber, sobretudo a relação com o outro (quando auxiliam na reflexão) e a relação consigo mesmo. Os grupos destacam que utilizaram o que aprenderam durante o semestre, buscando formular um texto com uma linguagem mais acessível para pessoas leigas e enfatizando a importância da divulgação para a sociedade. O extrato 10 apresenta essas ideias (trechos grifados):
Esses resultados mostram que para a apropriação dos saberes químicos pelos estudantes, a partir do caminho percorrido até a resolução do caso, a principal relação com o saber que existe é a relação consigo mesmo, que envolve o processo de aprender um determinado conhecimento quando o sujeito atribui sentido e valor ao conhecimento enquanto aprende.7 Essa relação consigo mesmo sobrevém da utilização dos conhecimentos apropriados pelos estudantes durante a disciplina para resolver uma situação proporcionada pela história do caso (no trecho de G4 "...Conseguimos utilizar o que aprendemos durante o período sobre análises químicas qualitativas e quantitativas e sua importância") e em se preocupar em formular um texto de fácil compreensão, já que esses conhecimentos deveriam ser divulgados (no trecho de G6 "...Perguntando a elas de quais formas os processos relatados eram mais bem compreendidos"), pois "não há relação com o saber senão a de um sujeito... que advém quando o sujeito experimentou o prazer de aprender e saber".6 Nem todos os grupos apontaram nas narrativas a preocupação de escrever um texto para um leitor não inserido no meio científico ("...Então decidimos por explicar da forma mais simples possível, para uma pessoa desentendida do assunto...", discurso de G4). Esse resultado aponta que a relação consigo mesmo está atrelada a questão do desejo de saber intrínseco a cada indivíduo, imerso em relações com o outro e com o mundo. Cada sujeito (o grupo) tem sua própria história e usa das relações com o mundo e com outro para se transformar e apropriar-se de saberes. Os resultados dessa categoria se assemelham também com os descritos por Lopes et al.,15 quando os autores especificaram a "fase re-equacionando o problema", pois era o momento de trazer os resultados para discutir com todos e organizá-los para apresentar a conclusão. Essa conclusão é o momento de expressar os saberes que foram adquiridos durante a atividade e evidenciar os saberes que ainda precisam ser melhorados, mediante a avaliação do professor. Ademais, a categoria reflexão e construção dos saberes é o momento de transformar as informações em saberes, pois a informação só "se torna saber quando contribui para o esclarecimento do sujeito sobre o sentido do mundo, da vida, de suas relações com os outros e consigo mesmo".8 Esse sentido pode ser visto na forma que os grupos optam em resolver o caso, explorando as maneiras de se realizar as análises químicas e a importância desses resultados para a sociedade. O extrato 11 traz apontamentos como: dar sequência à história do caso durante a resolução (G2), direcionar a resolução através de uma análise específica e retratar a relevância da divulgação desses conhecimentos para a sociedade (G5); e mostrar para a sociedade que existem profissionais qualificados para fazer essas análises (G12); na hora de escrever o texto por cada grupo (trechos sublinhados):
Esses resultados indicam uma relação com o saber que é ao mesmo tempo uma relação consigo mesmo, pois envolve a maneira que os grupos optaram em escrever a resolução, reportando as principais características que o texto terá de acordo com o problema proposto. Avaliando o processo de aprendizagem: a relação com o Eu epistêmico A Tabela 1 mostra as redes de conceitos, que são os conhecimentos químicos e todas as relações científicas (relações com outros conhecimentos) necessárias para a apropriação inseridos no caso aplicado, assim como os critérios de avaliação do processo de aprendizagem. A sigla NA, presente na tabela, significa não se aplica ao critério estabelecido e os números indicam a quantidade de grupos que desenvolveram corretamente as respectivas relações de saber.
Em relação à compreensão das análises químicas e sua importância, quatro grupos (G1, G3, G9 e G12) não citam essa rede de conceitos, apesar dessa rede estar explícita no problema do caso. Enquanto isso, os demais grupos se apropriam adequadamente do conceito de análise química, referindo-se a identificação, caracterização e quantificação de substâncias presentes em produtos/amostras. Tais resultados mostram a diferença em relevância que cada grupo tem durante a resolução em relação a essa rede de conceitos. O extrato 12 apresenta alguns exemplos:
No extrato 12 cada grupo atribui corretamente o significado de análise química, mostrando que dominaram tal rede de conceitos. A diversidade de explicações do saber de análise química mostra a capacidade de interpretação que cada grupo tem frente à apropriação da normatividade química exigida, ou seja, o uso adequado da linguagem científica e as relações causais que o conceito estabelece.8 A segunda rede de conceitos (Diferenciação entre análises qualitativas e análises quantitativas) é um aprofundamento da primeira, pois é preciso entender o significado de análises químicas para poder diferenciar os tipos de análises possíveis de se realizar. Observa-se que onze grupos alcançam corretamente os critérios de descrição e uso dos termos científicos, mas que apenas sete atribuem significados corretamente (explicação). E um dos grupos não apresentou a diferenciação das análises durante a resolução. O extrato 13 apresenta alguns exemplos dos grupos que apropriam corretamente dessa rede, explicando que as análises qualitativas são aquelas que proporcionam a identificação das substâncias ou espécies químicas presentes em amostras e que as análises quantitativas são aquelas que permitem determinar a concentração ou a quantidade de uma substância específica presente na amostra (G8, G10 e G11). Já o extrato 14 exibe os discursos dos grupos que ainda não dominaram esse saber, como por exemplo, considerar que uma análise quantitativa é expressa por números (G6 e G7) ou que é feita apenas com auxílio de técnicas específicas (cromatografia gasosa e espectroscopia de absorção molecular, G1 e G3):
De acordo com o extrato 13, observam-se novamente as diferentes maneiras de interpretação da normatividade dessa rede de significados pelos grupos, demonstrando a posse dos significados de análises qualitativas e quantitativas. No entanto, os grupos G1, G3, G6 e G7 ainda apresentam alguns equívocos. Por exemplo, no discurso de G1 e G3 há uma ligação direta entre as análises qualitativas e quantitativas serem feitas somente com técnicas específicas. Se assim fosse, os dois exemplos se confrontariam porque G1 especifica as análises com a técnica de espectroscopia de absorção atômica, enquanto o G3 com a técnica de cromatografia gasosa. Na verdade, os dois tipos de análises podem ser feitos em praticamente todas as técnicas instrumentais, sendo o método conduzido de forma semelhante. O exemplo de G7, no extrato 14, indica que as análises quantitativas se referem a expressar os resultados em números ou de forma numérica. No entanto, o que seria esse número? O que ele representaria? Nestes exemplos o saber não atinge a normatividade exigida da atividade, pois na linguagem científica (química) um número não tem significado se não tiver uma unidade que possa caracterizá-lo. Além disso, toda análise quantitativa busca determinar a concentração de uma espécie conhecida, independente da unidade de concentração que será apresentada. Charlot8 aponta que "para adquirir o saber, é preciso, portanto, entrar em uma atividade intelectual, o que supõe o desejo, e apropriar-se das normas que essa atividade implica". Se não há essa apropriação, o estudante apenas tem mais uma informação e não um saber, pois essa informação ainda não tem o sentido que permite que esse sujeito tenha um domínio químico do conhecimento para o mundo e sua vida.8 Nas duas últimas redes de conceitos (Fundamentos da técnica de análise escolhida para o metanol e para os íons cobre), apenas quatro grupos que escolheram adequadamente os métodos de análise atribuem significados corretos na explicação dos fundamentos das técnicas escolhidas. O extrato 15 apresenta a explicação dos fundamentos das técnicas escolhidas para a análise dos íons cuprosos. Os grupos G2 e G7 selecionam a espectroscopia de absorção atômica para essa análise, apontando o fenômeno de absorção como o princípio da análise e a consequente transição eletrônica. Enquanto isso, o grupo G6 opta em escolher a técnica clássica de titulação para a análise, destacando os procedimentos a serem seguidos, o tipo de titulação (de complexação com EDTA) e como é feito para determinar a concentração do analito.
No discurso de G6, observa-se um predomínio da descrição da técnica ("... Nessa titulação o EDTA é colocado em um instrumento de medida, a bureta, e é gotejada dentro de uma vidraria denominado erlenmeyer, no qual está a solução com amostra de cachaça..."). Nota-se também na escrita algumas atribuições corretas de significados químicos da técnica de titulação, como o uso do volume gasto de titulante para realizar os cálculos de concentração que caracterizam uma análise quantitativa ("...Após o final da reação é observado o volume que foi gasto do EDTA, que será utilizado nos cálculos para obtenção da concentração"). Considerando que a aprendizagem da química passa necessariamente pela integração dos aspectos fenomenológicos (evidências concretas) aos modelos teóricos explicativos (teórico-conceitual) pela mediação da linguagem (representações), apenas a descrição da técnica não caracteriza uma total aprendizagem dos estudantes, pois ainda não há uma atribuição de sentido químico nem a transição entre os três níveis (macroscópico, microscópico e simbólico). No entanto, a capacidade de escolha de uma técnica adequada para a análise mostra o desenvolvimento da habilidade cognitiva de tomar decisões corretas, além de ressaltar a aprendizagem química durante a atividade. O que precisa ser feito a partir disso é mobilizar para mais relações com o saber que estabeleçam um sentido químico mais amplo para essa rede de conceitos. Isso significa que o sujeito ainda está em uma transição entre o mundo da química, como um objeto de pensamento, e o seu próprio mundo. Charlot9 caracteriza esse processo como distanciação-objetivação, isto é, o processo em que o sujeito sai do seu mundo para pôr-se no mundo da química. Isso se concretiza quando o sujeito compreende a química nos três níveis e os nossos resultados apontam que os estudantes já estão se aproximando. Ainda no extrato 15, o excerto de G2 "...onde é baseado que os átomos livres em estado estável podem absorver luz a um determinado comprimento de onda, que é específico para cada elemento" ainda prevalece uma descrição de como é o princípio da técnica, mesmo retratando como ocorre o fenômeno de absorção da radiação eletromagnética pela matéria e a especificidade da absorção. Em contrapartida, o grupo G7 atribui significados corretos ao explicar que a cada absorção de energia pela matéria provoca o fenômeno de transição eletrônica ("... os elétrons dos átomos de cada elemento só podem sofrer certas transições, onde o elétron absorve um pacote de energia e salta para um orbital de maior energia. Passando para um estado excitado..."), fundamento básico para o entendimento da técnica. Nesses dois exemplos, o que se observa também é o uso da nominalização dos processos químicos, estabelecendo as relações entre as causas e os efeitos. Essa é a chamada representação do saber químico, em que a linguagem científica utilizada pelo sujeito expressa seu ato de pensamento sobre um conteúdo intelectual estudado, ou seja, é o seu sistema de interpretação.6 Os exemplos do extrato 16 apresentam alguns fundamentos das técnicas escolhidas para a análise do metanol. Aqui, os grupos (G1, G7, G8 e G9) apontam a cromatografia gasosa como a técnica para analisar o analito na amostra de cachaça. Apenas o grupo G1 explica corretamente que o processo de separação entre a substância de interesse (álcool metílico) e as demais na coluna cromatográfica ocorre pelas interações intermoleculares por adsorção com a fase estacionária e que um dos parâmetros que influenciam a separação é a temperatura. Em contrapartida, o trecho de G7 e G8 resumem de forma descritiva algumas etapas da realização de uma análise por cromatografia gasosa, sem aprofundar em como ocorre a separação, mas indicando como se pode interpretar os resultados obtidos em termos de quantificação:
G8: [...] Dentro desse tubo a amostra é rapidamente vaporizada [...] O vapor é então "empurrado" por um gás de arraste, até atingir um pequeno tubo (a coluna). No fim deste tubo há uma chama, que irá detectar a passagem da molécula, fato que será observado em um computador, que lê a informação e transforma em um gráfico de picos [...] A área dos picos é diretamente proporcional à massa do composto. No final do processo é calculada a área total dos picos de metanol e com o auxílio de um gráfico, com equação de primeiro grau, consegue-se determinar a concentração de álcool metílico. Pensar apenas em descrição dos fenômenos e processos químicos não é suficiente para aprender química, pois é necessário estabelecer as relações científicas que essa descrição pode levar, compreendendo o que os termos e os símbolos representam para o mundo, para si mesmo e para a química. "Aprender é um movimento interior que não pode existir sem o exterior - reciprocamente, é uma ação que tem origem fora do sujeito, mas só pode ter êxito se encontrar (ou produzir) um movimento interior do sujeito".7 Nesse sentido, apesar da descrição ser necessária para o entendimento da técnica de cromatografia gasosa e fazer parte da normatividade dos saberes químicos, ela não representa o saber por completo porque: não inclui todo o conteúdo desse saber, ou seja, não envolve esse saber em toda sua rede de significados e não reflete sobre o sentido químico atribuído à descrição, ressaltando as causas e efeitos.6 Porém, descrever se refere a identificar e reconhecer os processos, o que denota o início do processo de apropriação conceitual. Ainda no extrato 16, os grupos G7 e G8 optam em descrever como é feita a análise quantitativa do metanol por cromatografia gasosa. O primeiro aponta equivocadamente que o próprio detector já fornece o valor da concentração do metanol na cachaça ("... assim a máquina nós dá o valor da quantidade de álcool metílico que a amostra de cachaça possui", enquanto o G8 apresenta uma maneira de se determinar essa concentração, utilizando o método gráfico a partir das áreas dos picos no cromatograma para correlacionar ao valor da concentração ("A área dos picos é diretamente proporcional à massa do composto... e com o auxílio de um gráfico, com equação de primeiro grau, consegue-se determinar a concentração de álcool metílico"). O detector em cromatografia gasosa não determinará a concentração das substâncias presentes em uma amostra de forma direta. É preciso, por exemplo, empregar o método do padrão interno ou externo para fazer a análise quantitativa e depois interpretar os resultados para obter a concentração da substância de interesse, como aponta G8 no seu discurso. Nota-se nessa comparação que a conexão entre os sujeitos envolvidos (G7 e G8) com o saber (análise quantitativa em cromatografia gasosa) e vice-versa não foi a mesma. O grupo G8 apropriou-se do saber, transformando esse saber em seu próprio saber, dando significado químico, interiorizando-o.9 Por ora, G7 está no nível da informação (exterioridade) e ainda não estabeleceu uma dialética entre interioridade e exterioridade com esse saber. Para Charlot7 "o que faz a ligação entre a interioridade e a exterioridade, entre a questão do sentido e da eficácia, é a atividade dos sujeitos no e sobre o mundo - um mundo que ele partilha com outros sujeitos". É importante ressaltar que todos os estudantes que participaram dessa atividade ainda não tinham estudado técnicas instrumentais de análise, e, portanto, foram além dos conhecimentos adquiridos durante a resolução. Esses resultados mostram que os estudantes conseguiram aplicar, em outra atividade, o que aprenderam durante as discussões em sala de aula, porém, em algumas redes de significados e que grande parte conseguiu atribuir corretamente todos os saberes (químicos) e usar dos modelos teóricos para representar esses saberes. Isso evidencia que a aprendizagem química está em evolução, precisando agora retomar algumas relações com o saber químico e as representações em futuras discussões em sala de aula, para o domínio e a posse desses conhecimentos.
CONCLUSÃO Observa-se a presença de várias relações com o saber durante a atividade e que as principais mobilizações dos estudantes são o desafio em resolver o caso e a busca por conhecimentos além da disciplina. Contudo, em cada categoria se observa que as relações com o saber são influenciadas em função das ações praticadas pelos estudantes. Na categoria levantamento de informações prevalecem as relações com o mundo, principalmente no uso de recursos de informações disponíveis no ambiente escolar universitário, como artigos científicos e livros didáticos. Já na categoria socialização de informações e dúvidas, os estudantes utilizam mais das relações com o outro (estudantes e professor de outra disciplina) para auxiliar no esclarecimento de conceitos, novas buscas de informação e organização das ideias iniciais. Somente na última categoria - reflexão e construção dos saberes - nota-se uma indissociabilidade das relações com o saber, pois os grupos utilizam de novas informações e de novas discussões e interações (relações com o mundo e com os outros) para escrever a resolução apresentando os conhecimentos adquiridos (que caracteriza a relação consigo mesmo). Portanto, os caminhos seguidos pelos estudantes para a resolução perpassam por muitas relações com o saber, demonstrando que para aprender o estudante tem que se apropriar de conhecimentos já existentes no mundo e em outras pessoas. Ao mesmo tempo, cada estudante tem a sua singularidade, fazendo com que a apropriação dos saberes e a mobilização para esses saberes se tornem uma relação de identidade com o saber. Na relação com o saber do próprio sujeito é que se observa que alguns grupos conseguem expressar de forma adequada os conceitos químicos, enquanto que outros ainda apresentam dificuldades. Vale destacar que essa dificuldade pode estar relacionada com os conhecimentos científicos que ainda não tinham sido trabalhados na disciplina e em outras disciplinas. Uma vez que os caminhos percorridos pelos estudantes são semelhantes, o que diferencia o nível de aprendizagem é a relação consigo mesmo, pois para aprender o estudante deve entrar na atividade, permanecer nela e desenvolver as relações com o saber necessárias para dominar a normatividade (linguagem). Assim, faz-se necessário não só o professor prestar atenção à mobilização dos estudantes, mas também investir em atividades de ensino que apresentam sentido para os estudantes e que aliem o motivo ao objetivo de estudar.
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