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7:02, dom nov 24

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Artigo


Efeito da ativação química nas propriedades de superfície de xisto retortado
Effect of chemical activation on surface properties of oil shale by-product

Marta Eliane DoumerI; Gilberto AbateI; Iara MesserschmidtI,*; Lívia Mari AssisII; Rosane MartinazzoIII; Carlos Augusto Posser SilveiraIII

IDepartamento de Química, Universidade Federal do Paraná, C.P. 19081, 81531-990 Curitiba - PR, Brasil
IIDepartamento Acadêmico de Química e Biologia, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, 80230-901 Curitiba - PR, Brasil
IIIEmbrapa Clima Temperado, BR 392, Km 78, 96010-971 Pelotas - RS, Brasil

Recebido em 02/10/2015
Aceito em 09/12/2015
Publicado na web em 28/03/2016

Endereço para correspondência

*e-mail: iaramesser@ufpr.br

RESUMO

A pyrolyzed oil shale by-product known as retorted shale was functionalized with HCl, HNO3, H2SO4, H3PO4, HNO3/H2SO4 (3:1), Fenton's reagent, (NH4)2S2O7, NaOH, and KMnO4 using either ultrasound (Route 1) or reflux (Route 2). The products obtained were evaluated in terms of cation exchange capacity (CEC). Structural characterization was performed using X-ray diffraction, X-ray fluorescence, and infrared spectroscopy to identify the functional groups present. The best results were achieved using Route 2 with solutions of either H3PO4 or HNO3/H2SO4 (3:1), giving CEC values of 315 and 316 mmolc kg-1, respectively. The pyrolyzed oil shale functionalized using Route 2 (reflux) with NaOH as the activating agent showed the highest sorption of methylene blue (35.6 mg g-1). The main mechanisms observed for oil shale by-product functionalization were oxidation, nitration, and CaO leaching.

Palavras-chave: cation exchange capacity; pyrolyzed shale; methylene blue; functional groups.

INTRODUÇAO

O folhelho pirobetuminoso é uma rocha sedimentar, comumente chamada de xisto, que contém cerca de 7% de seu volume total em óleo.1 A mais importante reserva brasileira de xisto, Formaçao Irati, estende-se desde a regiao Sul até a regiao centro-oeste, ocorrendo nos estados de Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Sao Paulo, Mato Grosso do Sul e Goiás,2 sendo a segunda maior reserva de xisto do mundo.1 A Petrobras, Empresa Brasileira de Petróleo, no ano de 1960 começou a desenvolver o processo Petrosix® para extrair óleo a partir do xisto. Concluído o desenvolvimento do Processo Petrosix, os esforços da usina voltaram-se, a partir de 1982, para a produçao. Os produtos obtidos nesse processo sao óleo combustível, nafta industrial, gás combustível, gás liquefeito e enxofre e os subprodutos sao a água de xisto, finos de xisto, calcário de xisto e xisto retortado.

O destino de subprodutos gerados em processos industriais tem sido motivo de muitas pesquisas, com o intuito de agregar valor a estes materiais.1,3-13 Nesse sentido, o xisto retortado (XR), subproduto produzido em maior quantidade pelo processo Petrosix, tem como uma das alternativas de destino o uso como insumo na agricultura.2 O XR é classificado como resíduo classe II A - nao perigoso e nao inerte,6 segundo a norma ABNT NBR 10004/2004, que classifica os resíduos sólidos quanto aos seus riscos potenciais ao meio ambiente e à saúde pública, para que possam ser gerenciados adequadamente. Os parâmetros que normalmente contribuem para a nao inerticidade do XR sao os teores de ferro, alumínio, manganês e sulfato, que sao elementos encontrados naturalmente em teores elevados em solos agrícolas.

Mais recentemente, o xisto retortado tem sido citado como potencial sorvente de espécies de interesse ambiental, com destaque para íons metálicos.1,7 Os principais grupos funcionais presentes no XR que promovem a capacidade de troca de cátions (CTC) sao o silanol (Si-O-), aluminol (Al-OH-), hidroxila (OH) e carboxílicos (-COOH), grupos oriundos da matéria orgânica.1 O oxigênio destes grupos é considerado uma base forte de Lewis por causa da presença de um par de elétrons livres, que podem formar um complexo coordenado com espécies químicas elétron-deficiente, como espécies metálicas ou metalóides.1 A funcionalizaçao deste subproduto pode aumentar sua capacidade sortiva, podendo ser usado como material de baixo custo no tratamento de águas residuais.8-12 Por outro lado, o XR tratado com oxidantes poderia ser usado como condicionador de solos, devido a sua superfície funcionalizada pela oxidaçao parcial da matéria orgânica, tendo a capacidade de favorecer a fertilidade do solo, atuando como agente quelante de nutrientes para as plantas e adsorvendo água através de ligaçoes de hidrogênio.14,15 Adicionalmente, agentes oxidantes como ácido nítrico promovem a abertura de mais macro e microporos dentro das partículas do XR propiciando maior área superficial específica.10 Diante disto, o XR funcionalizado poderia ser considerado um condicionador de solos, desde que atendesse os requisitos exigidos pela Instruçao Normativa (IN) 35/2006, que define condicionadores de solo como produtos que promovem a melhoria das propriedades físicas, físico-químicas ou atividade biológica do solo, podendo recuperar solos degradados ou nutricionalmente desequilibrados. Além disso, para que o material se enquadre como condicionador de solos deve apresentar, no mínimo, 200 mmolc kg-1 de capacidade de troca catiônica (CTC).16 Cabe ressaltar que existem poucos estudos que tratam da modificaçao da superfície do XR brasileiro, mesmo o Brasil sendo o país detentor da principal tecnologia de extraçao do óleo de xisto.

Este trabalho apresenta um estudo sobre os processos de ativaçao química do xisto retortado, oriundo da PETROBRAS/SIX, com vistas à obtençao de um produto com características de condicionador de solo e/ou para fins ambientais para retençao de íons metálicos. Os objetivos específicos foram: (1) comparar ultrassom e refluxo como técnicas empregadas na funcionalizaçao do XR, (2) selecionar os melhores agentes oxidantes dentre H3PO4, HNO3, H2SO4, H2SO4/HNO3, Fenton, NaOH, KMnO4, HCl e (NH4)2S2O8, (3) estudar o mecanismo de ativaçao utilizando as técnicas de difraçao de raios-X, composiçao química por fluorescência de raios-X e espectroscopia de infravermelho e (4) comparar o método padrao para determinaçao da capacidade de troca de cátions por acetato de amônio (Método 9081) com o método de sorçao de azul de metileno em soluçao aquosa na estimativa da CTC do xisto retortado funcionalizado.

 

PARTE EXPERIMENTAL

Amostras e reagentes

As amostras de XR utilizadas foram cedidas pela Petrobras/SIX (Superintendência de Industrializaçao do Xisto). Este material foi triturado e peneirado até um tamanho de partícula menor do que 2 mm, sendo em seguida armazenado em sacos plásticos.

Todos os ácidos e demais reagentes empregados no presente estudo foram de grau analítico. As soluçoes foram preparadas utilizando água ultrapura, obtida pelo sistema de osmose reversa da marca Quimis, modelo 0842U220.

Caracterizaçao das amostras

Morfologia -Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV)

A amostra de XR in natura (nao funcionalizado) foi fixada no suporte metálico e metalizada com ouro. As imagens foram feitas no microscópio eletrônico de varredura JEOL, modelo JSM - 6360LV Scanning Electron Microscope (300 mil logiX).

Cristalinidade - Difratometria de Raios X (DRX)

As amostras no estado sólido foram colocadas em porta amostras com 25 mm de diâmetro e analisadas em difratômetro Shimadzu, modelo XRD-6000, utilizando radiaçao CuKα (λ = 1,5418 Å) com parâmetros de 40 kV e 40 mA. Os ângulos de varredura foram variados de 10 a 80º (2θ), com velocidade de 2º/min.

Composiçao Elementar - Fluorescência de Raios X (FRX)

As amostras foram prensadas como pastilhas (pérola ou pó prensado) e usadas para registrar os espectros de FRX. Parte do pó, de cada amostra, foi usada para a determinaçao da perda ao fogo. Antes da determinaçao da perda ao fogo as amostras em pó foram secas a 100 ºC por 8 horas. No experimento de perda ao fogo, cerca de 1,0 g de amostra seca foi pesado (M1 = massa do cadinho mais amostra) em cadinho de porcelana (Mc = massa do cadinho vazio) e foi aquecido a 1000 ºC por três horas. Após resfriado à temperatura ambiente o cadinho com a amostra calcinada foi pesado (M2 = massa do cadinho mais amostra calcinada). A perda ao fogo, percentual, foi calculada a partir da relaçao 100 x [(M1-M2)/(M1-Mc)]. O equipamento usado foi da marca Phillips, modelo PW240.

Análise Estrutural - Infravermelho por Refletância Difusa com Transformada de Fourier (DRIFT)

Os espectros foram obtidos no espectrofotômetro de infravermelho BIORAD FTS 3500 52 GX modelo EXCALIBUR com acessório de refletância difusa. Duzentas e cinquenta e seis varreduras foram coletadas com resoluçao de 4,0 cm-1, na regiao de 7000 - 400 cm-1, usando como referência KBr pulverizado e seco.

Ponto de Carga Zero (PCZ)

Para a determinaçao do PCZ nas amostras de XR, a metodologia foi adaptada de Regalbuto e Robles.17 O procedimento consistiu-se em adicionar 1,0 g do XR em 25 mL de soluçao aquosa sob 5 diferentes condiçoes de pH inicial (3, 5, 7, 9 e 11) e medir o pH após 24 h de tempo contato, sob agitaçao. Fazendo-se o gráfico de pH final versus pH inicial, o PCZ corresponde à faixa na qual o pH final se mantém constante independentemente do pH inicial, a superfície exerce açao tamponante.

Capacidade de troca catiônica (CTC)

Para essas determinaçoes foi utilizado o Método 9081 baseado em Chapman.18 Uma amostra de 4,000 g de XR foi misturada com um excesso de soluçao de acetato de sódio 1,0 mol L-1 e agitada por 5 min. Tal procedimento foi repetido por mais três vezes, resultando em uma troca dos cátions de sódio (Na+) presentes na soluçao com os existentes na matriz (XR). Em seguida, a amostra foi lavada por três vezes com álcool etílico sob agitaçao durante 5 min. Uma soluçao de acetato de amônio (1,0 mol L -1) foi entao adicionada, a amostra foi agitada por 5 min e a lavagem repetida por mais duas vezes, o íon NH4+ substitui o Na+ sorvido anteriormente na matriz. A concentraçao de sódio liberada foi determinada por fotometria de chama, utilizando um equipamento da marca Digimed, modelo NK-2000.

Sorçao do corante Azul de Metileno (AM)

A sorçao de azul de metileno foi realizada seguindo condiçoes adaptadas do procedimento CEFIC: European Council of Chemical Manufacturers' Federations.19 A fórmula química do corante é C16H18CN3S.3H2O, massa molar: 373,91 g mol-1, max = 665 nm. A soluçao do reagente AM foi preparada na concentraçao de 1200 mg L-1, pela dissoluçao em soluçao de ácido acético 0,50% (m/v). Os experimentos foram conduzidos por agitaçao de 0,05 g de XR ou xisto retortado funcionalizado (XRF) com 50,0 mL de soluçao do corante na concentraçao de 1200 mg L-1 em erlenmeyers de 250 mL, em incubadora a 25 °C. As amostras foram mantidas sob agitaçao por 30 min a 150 rpm e o corante foi separado do adsorvente por filtraçao. A concentraçao do corante foi estimada espectrofotometricamente por monitoramento da absorbância em λmax 665 nm usando um espectrofotômetro da marca Shimadzu UV-2401 PC, modelo 240-52454-01. O percentual de remoçao de AM e captaçao na fase sólida em equilíbrio, X/m (mg/g), foi calculado usando as seguintes relaçoes:

A quantidade do corante adsorvido por grama de sólido,

em que Co (mg L -1) é a concentraçao inicial de AM, Ce (mg L-1) é a concentraçao de equilíbrio do corante, V é o volume da soluçao (L), e m (g) é a massa do adsorvente.

Rotas de funcionalizaçao

Rota 1 (R1) - Funcionalizaçao empregando ultrassom

A metodologia de oxidaçao do XR utilizando os reagentes descritos abaixo e tratamento em banho de ultrassom, foi baseada no trabalho de Osório et al.20 Foram usados 25,0 g de XR em 100 mL das soluçoes relacionadas a seguir: de ácido clorídrico, ácido nítrico, ácido sulfúrico, sulfonítrica (1:3), ácido fosfórico e hidróxido de sódio todas na concentraçao de 5 mol L-1 e soluçoes de reagente Fenton H2O2 1,0 g L-1 + Fe 2+ 0,01 g L-1 - pH =4), tiossulfato de amônio a 5,0% m/v e permanganato de potássio a 0,010% m/v. As misturas de XR com cada um dos reagentes foram homogeneizadas em agitador magnético e sonicadas em equipamento Thornton Unique, modelo 1450 USC, Ultrasonic Cleaner, potência de 50 W, frequência 25 kHz, por 2 h em temperatura ambiente. Finalmente as suspensoes foram filtradas sob vácuo, lavadas com água destilada e secas em estufa a 100 °C por 24 h.

Rota 2 (R2) - Funcionalizaçao empregando refluxo

Em baloes de fundo redondo com condensadores de refluxo acoplados foram inseridas amostras de 25,0 g de XR e 100 mL das soluçoes relacionadas anteriormente. O tratamento das amostras de XR foi de 3 h, na faixa de 80-90 °C. Posteriormente as suspensoes foram filtradas sob vácuo, lavadas com água destilada e secas em estufa a 100 °C por 24 h.

 

RESULTADOS E DISCUSSAO

Previamente à funcionalizaçao, o XR foi analisado por MEV para verificaçao de sua morfologia (Figura 1 a e b). Foi observado que o XR in natura é um material heterogêneo, poroso e com partículas com placas lamelares características dos argilominerais, provavelmente ilita e sericita, conforme já observado em estudos anteriores.1 As regioes porosas sao favoráveis ao fenômeno de sorçao.1 Além disso, formas cúbicas e aglomerados sao observadas (Figura 1a), as quais têm sido identificadas como cristais de pirita (FeS2).1

 


Figura 1. Microscopia eletrônica de varredura do xisto retortado (a) Resoluçao 1000 X e (b) resoluçao 5000 X

 

A CTC dos materiais funcionalizados e do XR in natura foi analisada a fim de se verificar a eficiência das rotas de funcionalizaçao R1(ultrassom) e R2 (refluxo), bem como dos diferentes agentes oxidantes utilizados (H3PO4, HNO3, H2SO4, H2SO4/HNO3, Fenton, NaOH, KMnO4, HCl, (NH4)2S2O8) (Figura 2).

 


Figura 2. Capacidade de troca de cátions (CTC) para amostras funcionalizadas em ultrassom e em refluxo e para o xisto retortado (XR) in Natura (linha tracejada: CTC mínima a ser considerada para condicionadores de solo de acordo com a IN 35/2006)

 

A maioria dos tratamentos (rotas e oxidantes) foram capazes de elevar a CTC do XR, com exceçao do tratamento com HCl, como agente ativante, via R1. Comparando-se as rotas de funcionalizaçao, a R1, independentemente do tipo de oxidante, foi eficiente na elevaçao da CTC do XR a valores superiores a 200 mmolc kg-1, mínimo para ser classificado como condicionador de solo, segundo a IN 35/2006. Por outro lado, pela R2 somente cinco dos dez oxidantes foram capazes de elevar a CTC do material a valores acima do mínimo especificado (H3PO4, HNO3, H2SO4, H2SO4/HNO3, NaOH). Para ambas a rotas, os oxidantes mais eficientes na funcionalizaçao foram H3PO4, H2SO4/HNO3, HNO3 e NaOH. Entretanto, somente o hidróxido de sódio e HNO3 apresentaram CTC para a R1 superior a R2. O tratamento R2 - NaOH apresentou teores de Na2O 2,6 vezes superior ao XR in natura (Tabela 1), o que pode indicar efeito competiçao por sítios de sorçao entre íons Na+ oriundos da composiçao do XR funcionalizado e íons Na+ adicionados no ensaio de CTC.

 

 

Os valores mais elevados de CTC foram encontrados com a utilizaçao da mistura sulfonítrica (316 mmolc kg -1) e do ácido fosfórico (315 mmolc kg -1) com a ativaçao por refluxo. Do mesmo modo, esses dois oxidantes foram os mais efetivos na funcionalizaçao via ultrassom.

A eficiência da funcionalizaçao com H3PO4 no incremento da CTC, atribuído ao importante papel que o ácido fosfórico tem na catálise da desidrataçao e na proteçao da matéria orgânica contra oxidaçao, como constatado por Ichcho et al.21 em estudos de ativaçao do XR com H3PO4, com temperaturas de 250 °C e 450 °C. Por outro lado, a açao da mistura sulfonítrica no incremento da CTC do XR foi anteriormente elucidada por Shawabkeh.,11 Com a adiçao de ácido sulfúrico ao XR, nenhum efeito foi observado na mistura, já a adiçao gradual de ácido nítrico à mistura resulta num aumento rápido da temperatura da soluçao a 150 °C, alcançada dentro de um minuto, como resultado de uma reaçao exotérmica. Com o aquecimento da soluçao, monóxido de carbono, dióxido de carbono, enxofre e óxido nitroso sao liberados na forma de gás a partir da soluçao. Após a ativaçao com estes ácidos, várias reaçoes de sulfonaçao e nitrificaçao ocorrem na superfície das amostras de XR produzindo um xisto retortado ativado com superfície de grupos funcionais,11 e este efeito pode favorecer a sorçao de espécies catiônicas como metais traços e/ou nutrientes no solo.

Para comprovar as suposiçoes acima e verificar a formaçao de grupos funcionais na superfície do XR pelos oxidantes testados, procedeu-se a análise de DRIFT (Figura 3). A partir dos espectros de DRIFT sao encontrados indicativos de reaçoes de nitraçao para os tratamentos com HNO3 5,0 mol L-1 e H2SO4/HNO3 3:1 (5,0 mol L -1) tanto para a R1 como para R2 (Figura 3a e 3c). Essa comprovaçao se deu pelo aparecimento de uma banda de absorçao intensa em 1530 cm-1 e uma banda menor em 1340 cm-1, (comparado ao XR sem tratamento), as quais sao bandas características do grupo N-O de funçoes NO2.22 Bandas muito pequenas foram verificadas em aproximadamente 1720 cm-1 nos espectros de amostras tratadas com ácido fosfórico, mistura sulfonítrica e ácido nítrico para ambas as rotas devido a poucas estruturas orgânicas oxigenadas e deve ser um indicativo de quinonas.23 Possivelmente os grupos funcionais formados na superfície do XR via oxidaçao por H3PO4, HNO3 e H2SO4/HNO3 foram importantes centros ativos para a troca de cátions, provocando assim uma acentuada elevaçao da CTC por estes oxidantes.

 


Figura 3. Espectros de Infravermelho por Refletância Difusa com Transformada de Fourier (DRIFT), para tratamentos em ultrassom tratados com: ácidos (a) e demais oxidantes (b), e para funcionalizaçoes em refluxo com: ácidos (c) e demais oxidantes (d)

 

Observa-se ainda que, todas as amostras apresentam bandas bem definidas na regiao de 1620 cm-1, relativas a C=O de carboxilatos e/ou amida primária, OH de água, C=C de compostos aromáticos ou alifáticos insaturados, ou ainda ligaçao C=N.24 A presença de minerais de argila e quartzo nas amostras é evidenciada pelo estiramento de ligaçoes Si-O e Si-O-Si em torno de 1090 e 1030 cm-1,1,25 vibraçoes assimétricas de Si-O sao observadas a aproximadamente 1532 cm-1.26 No tratamento com NaOH, tanto com a rota 1 (Figura 3b) quanto com a rota 2 (Figura 3d), essa banda referente às vibraçoes assimétricas de Si-O foi intensificada. O oxigênio de grupos silanóis (Si-O-) é considerado base forte de Lewis por causa da presença de um par de elétrons livres, que podem formar um complexo coordenado com espécies químicas elétron deficiente, como íons metálicos.1 Tais resultados também sugerem uma concordância com as determinaçoes de CTC em que os tratamentos com hidróxido de sódio promoveram aumento da CTC do XR in natura.

Outra hipótese que explicaria o aumento da CTC, no XR tratado, seria a abertura da estrutura do XR por ativaçao com ácido nítrico e mistura sulfonítrica, conforme o trabalho de Shawabkeh et al.10 Dessa forma, o ácido nítrico reage com CaO e gipsita, que fazem parte da composiçao química do XR, produzindo o nitrato de cálcio solúvel.11 Durante o tratamento com ácido nítrico, que implica na lavagem do nitrato de cálcio, o sólido é deixado com uma estrutura aberta de óxidos de alumínio, silício e óxidos de ferro.10 Essas suposiçoes foram comprovadas através da comparaçao dos difratogramas (Figura 4) e da composiçao química (Tabela 1) das amostras de XR com as amostras funcionalizadas e da análise da composiçao química. Verificou-se que somente a amostra de XR in natura apresentou a gipsita (Gy) (CaSO4.2H2O) em comparaçao às amostras ativadas com NaOH, H2SO4/HNO3 3:1, HNO3 e H3PO4. Dessa forma, nao só ocorre a remoçao da gipsita pela mistura sulfonítrica e ácido nítrico, bem como pelo H3PO4 e NaOH, o que nao tinha sido previamente observado por outro trabalho na literatura relacionado ao XR. Observa-se, ainda, que as reflexoes características de quartzo (Q), ilita (I), hematita (He), pirita (P) e Albita (A) permanecem para todas amostras, mesmo após a exposiçao aos oxidantes.

 


Figura 4. Difratograma de Raios X para xisto retortado funcionalizado via ultrassom (a) e via refluxo (b). Símbolos: (I) Ilita; (Q) Quartzo; (He) Hematita; (P) Pirita; G (gipsita) e (A) Albita

 

Nas amostras funcionalizadas via R1 e R2, foi constatado um decréscimo de aproximadamente 75% no teor de CaO do XR (2,6%) em comparaçao ao XR tratado com ácidos fosfóricos, nítricos e mistura sulfonítrica (0,4 - 0,8 % CaO). Entretanto, a amostra de XR tratada com hidróxido de sódio, nao teve o mesmo efeito, apresentando teores de CaO de 2,4% com o tratamento em refluxo e 1,3% para o tratamento em ultrassom. Além disso, nas amostras de XR tratadas com ácido sulfúrico (dados de FRX nao mostrados), o CaO livre reage com os sulfatos para produzir sulfato de cálcio. Isto aumenta o percentual de gesso e pode consequentemente bloquear os microporos disponíveis no XR original.10 Este efeito pode ter sido responsável pela pouca resposta da CTC para amostras tratadas somente com H2SO4, neste trabalho.

A partir da análise da composiçao química foi observado, ainda, que ocorre uma expressiva diminuiçao do teor de Fe2O3 somente para os resultados em meio ácido, provavelmente pela dissoluçao e arraste de íons Fe3+. Por outro lado, os tratamentos causaram de 7 a 25% de aumento nos teores de SiO2 (HNO3>H2SO4/HNO3 3:1> H3PO4 > NaOH), para as rotas 1 e 2. Adicionalmente, houve um ligeiro acréscimo no teor de Al2O3 para as amostras funcionalizadas. Dessa forma, maior quantidade de grupamentos aluminóis e silanóis poderiam ser expostos na superfície do XRF. Esses grupamentos sao importantes pela capacidade de se ligarem às espécies metálicas com formaçao de complexos superficiais estáveis.27

A medida da sorçao de azul de metileno (AM) a partir da soluçao aquosa sobre o XR e XRF é proposta, neste trabalho, para a estimativa da CTC. A sorçao de AM é considerada um método rápido e alternativo ao método padrao 9081 com cátions trocáveis NH4-Na, o qual envolve uma série de passos durante a determinaçao da CTC.28 Essa relaçao pode ser feita considerando-se que a sorçao do corante na superfície das argilas ocorre por troca de cátions na borda de aluminossilicatos, e por atraçao por forças de van der Waals ou quimissorçao com SiOH e AlOH das bordas de aluminossilicatos.28

A sorçao de AM sobre a superfície do sorvente é primariamente influenciada pelo pH da soluçao. Se o pH da soluçao está abaixo do pH no ponto de carga zero, o PCZ, a densidade de cargas negativas na superfície do XR aumenta, o que favorece a sorçao de corantes básicos catiônicos, como o AM. Neste trabalho, o XR sorveu 11,81 mg g-1 de AM. Esse valor se apresenta próximo aos valores observados por Stachiw7 para o XR (14,08 mg g -1), porém abaixo do observado para carvoes ativados (120 mg g -1). Considerando-se que o PCZ do XR foi de 5,8, o baixo pH observado para a soluçao contendo o XR e a soluçao de azul de metileno (pH=3,5) teria comprometido a retençao do corante pela repulsao das cargas.

Foi constatado, ainda, que os resultados encontrados pela sorçao de AM em XRF empregando tanto refluxo como ultrassom diferem dos resultados encontrados pela análise de CTC pelo método de acetato de amônio, sendo que os tratamentos com mistura sulfonítrica e ácido fosfórico, com melhores valores de CTC, nao tiveram grandes contribuiçoes na sorçao do corante AM. Nesse sentido, Woolard et al.29 observaram resultados semelhantes na modificaçao de cinzas de carvao para formaçao de zeólitas, em que a capacidade de sorçao de AM na cinza modificada foi significativamente mais baixa do que a CTC, sugerindo que um mecanismo de troca no interior dos canais da zeólita é altamente improvável. Por outro lado, o tratamento com NaOH em refluxo (Rota 2) apresentou os melhores valores de sorçao de AM (35,6 mg g -1) pelo XRF (Figura 5). Este resultado pode estar ligando a dependência da sorçao de AM ao tipo de cátion na superfície da argila, onde a sorçao de AM na amostra somente é completa quando os cátions trocáveis estao sob a forma de Li+ ou Na+.30 Dessa forma, a alta concentraçao de Na+ presente na amostra R2-NaOH (Tabela 1), possivelmente sob a forma trocável, proporcionou condiçoes favoráveis para a retençao de AM.

 


Figura 5. Retençao de azul de metileno por grama de XR e XRF tratados em ultrassom e em refluxo e para o XR in natura. Linha tracejada indica valor de retençao de azul de metileno para o XR sem tratamento

 

CONCLUSAO

Os melhores tratamentos para a funcionalizaçao do XR foram a combinaçao da técnica de refluxo com os oxidantes mistura sulfonítrica e ácido fosfórico, com valores de CTC chegando a 316 mmolc kg-1. O uso do ultrassom na funcionalizaçao do XR alcançou valores de CTC acima de 200 mmolc kg-1 para todos os oxidantes testados, podendo ser uma alternativa ao uso do refluxo, como técnica rápida e eficiente na ativaçao do XR. Os reagentes HNO3, NaOH e especialmente H3PO4 e HNO3/H2SO4 3:1, foram os melhores oxidantes na elevaçao da CTC por ambas as rotas de funcionalizaçao. Os principais mecanismos observados para a ativaçao foram oxidaçao, nitraçao e abertura de poros por lixiviaçao de CaO. Pelo método de AM o XR funcionalizado com NaOH como agente ativante na Rota 2 (refluxo) foi o tratamento que apresentou a maior sorçao de azul de metileno (35,6 mg g -1).

O incremento nos valores de CTC após a funcionalizaçao do XR indica que o material apresenta potencial de uso como condicionador de solo. Além disso, a caracterizaçao por FTIR indicou uma periferia de grupos funcionais oxigenados ativos na superfície do XR funcionalizado com H3PO4, HNO3 e H2SO4/HNO3. Esses grupos funcionais podem servir como sítios de troca para nutrientes na aplicaçao do XRF como condicionador de solos, proporcionando liberaçao lenta dos nutrientes sorvidos com melhor aproveitamento da adubaçao, evitando-se perdas por lixiviaçao. Tais aspectos sugerem a possível aplicaçao do XR na agricultura visando maior retençao de nutrientes, fator importante na fertilidade do solo, ou mesmo para fins ambientais, no tratamento de efluentes aquosos contaminados com íons metálicos.

 

AGRADECIMENTOS

Ao Projeto Xisto Agrícola (cooperaçao técnica Petrobras/Embrapa Clima Temperado/FAPEG) pelo suporte financeiro, ao LAMIR e ao Centro de Microscopia Eletrônica - UFPR pelas análises realizadas.

 

REFERENCIAS

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