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15:25, qui nov 21

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Nota Técnica


Classificação de águas minerais baseada em imagens digitais obtidas por smartphones
Classification of mineral waters based on digital images acquired by smartphones

Gerson F. Silva Neto; Alexandre Fonseca*; Jez W. B. Braga

Instituto de Química, Universidade de Brasília, 70910-900, Brasília - DF, Brasil

Recebido em 27/01/2016
Aceito em 03/03/2016
Publicado na web em 25/05/2016

Endereço para correspondência

*e-mail: afonseca@unb.br

RESUMO

This work describes a new procedure for classification of mineral waters based on digital images acquired by smartphones. Commercial waters from eight mineral springs plus distilled water and tap water were combined with eriochrome T black or murexide and transferred to a cuvette, which was positioned into a light controlled chamber. RGB (Red, Blue and Green) measurements of cuvette images were acquired in real time, using a free smartphone app, and employed as variables for the exploratory analysis. 2D data dispersion along component B for murexide (x axis) and component R for eriochrome T black (y axis) provides the clear visualization of clusters using the raw variables. Hierarchical cluster analysis (HCA) applied to this data confirmed the efficient discrimination of samples providing the characterization of nine clusters for the ten classes of water investigated. The classification of samples based on a k-nearest neighbors (k-NN) modelled to the efficiency rate of 100% for 8 classes and of 94.4% and 50% for the remaining classes, respectively, indicating the adequate performance of the proposed strategy. Considering the facilities to acquire the data, such as low cost instrumentation and reagents, and the rapidity of the procedures, this alternative may be applied for verification of commercial water adulteration.

Palavras-chave: smartphone; mineral waters; colorimetry; exploratory analysis.

INTRODUÇAO

O uso de imagens digitais como ferramenta para análises químicas tem sido amplamente explorado nos últimos anos.1 Empregando-se imagens obtidas por câmeras fotográficas, scanners, webcams ou telefones celulares, conhecidos como smartphones, é possível realizar determinaçoes qualitativas e quantitativas com desempenho adequado, sem a necessidade de instrumentos como espectrofluorímetros ou espectrofotômetros.2-4 De fato, a literatura relata que, utilizando informaçoes simples das imagens, como os valores de cores usualmente baseadas no sistema RGB (do inglês Red, Blue e Green) consegue-se obter resultados analíticos similares àqueles adquiridos com instrumentaçao já bem estabelecida, caracterizando esta estratégia em uma alternativa de menor custo para a realizaçao de determinadas medidas instrumentais.

Ao se considerar as aplicaçoes analíticas que podem ser conduzidas por meio de imagens digitais, merece destaque aquelas que envolvem a identificaçao de substâncias ou a discriminaçao/classificaçao de amostras baseadas em medidas colorimétricas.5 Neste sentido, arranjos com sensores contendo diferentes reagentes colorimétricos imobilizados sobre filmes poliméricos ou de papel têm sido aplicados com sucesso na resoluçao de muitos desafios analíticos, como a discriminaçao de explosivos ou de aminas e a identificaçao de substâncias de interesse variado como compostos orgânicos voláteis, produtos químicos tóxicos ou aromatizantes do café.6-11 Na maioria destas aplicaçoes, imagens do arranjo de sensores, obtidas após a interaçao deste com o sistema em estudo, proporcionam uma espécie de impressao digital da amostra, o que permite classificá-los, muitas vezes, como narizes ou línguas eletrônicas.5

Embora este tipo de estratégia forneça um conjunto de dados amplo, pois considera as informaçoes do sistema RGB para cada reagente colorimétrico imobilizado, e torne o procedimento de medidas simples, necessitando apenas da interaçao da amostra com o arranjo de sensores, há sempre a necessidade do desenvolvimento dos dispositivos, o que pode ser considerado um limitador para alguns grupos de pesquisa. Além disso, quando as respostas para apenas um reagente colorimétrico ou para um pequeno número deles (no máximo três) é suficiente para a resoluçao do problema o desenvolvimento dos sensores pode ser desnecessário. De fato, muitos trabalhos demonstram que a adiçao dos reagentes colorimétricos diretamente à amostra, com posterior realizaçao das medidas por imagens podem fornecer resultados qualitativos ou quantitativos satisfatórios, permitindo avaliar preliminarmente o potencial de determinados reagentes para o futuro desenvolvimento de sensores imobilizados. Oliveira et al. aplicaram a análise de componentes principais à diversos descritores de cores de imagens digitais, entre eles o sistema RGB, para a classificaçao de solos contaminados com diferentes teores de cromo.12 Os autores relataram que o método proposto é bastante simples e permite verificar se os solos apresentam teores de cromo superiores ou inferiores ao estabelecido por legislaçoes de diferentes países. Damasceno e colaboradores utilizaram a análise multivariada de imagens para estimar o pH de amostras de água potável a partir da mistura das amostras com o reagente azul de bromotimol e aplicaçao das informaçoes do sistema RGB em modelo de calibraçao por mínimos quadrados parciais.13 Lima et al. introduziram a combinaçao de imagens digitais, obtidas por uma webcam, com um mini-sistema fluxo-batelada. O sistema foi aplicado para a determinaçao de ácido tânico em chá-verde, sendo obtidos resultados que demonstraram um desempenho analítico satisfatório, além de permitir uma reduçao significativa no consumo de reagentes e amostras, assim como a diminuiçao na geraçao de resíduos.14

Segundo o Departamento Nacional de Produçao Mineral o Brasil apresenta-se como o quarto mercado consumidor de água engarrafada do mundo com um consumo per capita da ordem de 90 litros/ano, o que corresponde a cerca de 17 bilhoes de litros comercializados todo ano.15 Por se tratar de um produto para consumo humano, as águas minerais devem ser submetidas à caracterizaçao química para aferiçao de sua composiçao mineral, o que permite diferenciá-las da água potável da rede pública assim como das chamadas águas mineralizadas. Para este propósito, técnicas analíticas como a potenciometria, espectrofotometria, espectrometria atômica e a volumetria sao quase sempre utilizadas para a determinaçao dos diferentes constituintes, o que requer pessoal treinado e um tempo considerável para obtençao dos resultados.16,17 Neste sentido, o desenvolvimento de métodos de reconhecimento de padrao baseado em medidas qualitativas ou semi-quantitativas por imagens digitais podem surgir como uma alternativa para a classificaçao de águas minerais de forma mais simples e rápida, constituindo-se em uma ferramenta que permita a verificaçao preliminar de possíveis adulteraçoes sem a necessidade das análises quantitativas mais laboriosas. Em um trabalho desenvolvido por Fonseca et al. foi demonstrado que a combinaçao das águas minerais com complexantes metálicos e medidas fotométricas realizadas com um instrumento lab-made à base de diodos emissores de luz (LED) é capaz de proporcionar a discriminaçao adequada de diferentes águas minerais. No referido trabalho, as medidas realizadas com dois agentes quelantes e seleçao de apenas quatro comprimentos de onda foram suficientes para a classificaçao correta das amostras. Isto mostra que o procedimento nao exige um grande número de variáveis, de modo que a aplicaçao de medidas colorimétricas realizadas diretamente sobre a amostra complexada com o sistema RGB a partir de um smartphone pode proporcionar resultados semelhantes, facilitando e tornando ainda menos oneroso o procedimento de medidas.

Considerando estes aspectos, o presente manuscrito descreve um método rápido, simples e de baixo custo para a classificaçao de águas minerais comerciais baseada na reaçao dos íons metálicos constituintes com reagentes colorimétricos, aquisiçao de parâmetros RGB de imagens das soluçoes resultantes com um smartphone e aplicaçao do método de reconhecimento de padroes pela regra do vizinho mais próximo (k-NN) aos dados gerados. O desempenho apresentado demonstra a possibilidade de uso da estratégia proposta para facilitar a classificaçao de águas minerais além de contribuir para o futuro desenvolvimento de arranjos de sensores colorimétricos específicos para a discriminaçao/classificaçao de águas minerais.

 

PARTE EXPERIMENTAL

Aparatos

Medidas de pH das soluçoes empregadas foram realizadas com um pHmetro HANNA pH 21. Cubetas de poliestireno com caminho óptico de 10 mm e capacidade de 4,5 mL foram utilizadas em todos os experimentos. Um suporte para cubeta (Figura 1) foi construído em poli-metilmetacrilato (PMMA) e revestido com espuma vinílica acetinada (E.V.A.) de cor branca nas regioes de contato com as faces laterais e traseira da cubeta, deixando a face frontal aberta para a aquisiçao das imagens.

 


Figura 1.Fotografias da caixa de madeira utilizada como ambiente de luz controlada para a realizaçao das medidas. Visao geral (A) com indicaçoes do arranjo de LED (1), suporte para cubeta (2) e janela de observaçao (3), detalhe do arranjo de iluminaçao com três LED (B) e posicionamento do celular à frente da caixa (C)

 

Todas as medidas foram realizadas em um ambiente de luz controlada em uma caixa de madeira (Figura 1 A) com dimensoes de 22 cm x 22 cm x 16 cm (largura x comprimento x altura), a qual foi utilizada para acomodar o suporte para cubeta e um arranjo com três diodos emissores de luz branca (LED), conforme mostrado na Figura 1 B. Um orifício com diâmetro de 1,0 cm foi confeccionado na parte frontal da caixa e utilizado como janela de observaçao para as medidas. Com este arranjo, o celular era posicionado manualmente a 8,0 cm da face frontal da cubeta na parte externa da caixa (Figura 1C). Vale destacar que existem trabalhos na literatura mostrando a possibilidade de correçao do sinal RGB para diferentes condiçoes de exposiçao à luz, o que pode eliminar a necessidade de ambientes de luz controlada como o utilizado aqui.18 Contudo, tendo em vista que o controle de exposiçao à luz pode ser facilmente obtido pelo sistema proposto, optou-se por nao empregar esse tipo de correçao de sinal.

As leituras das componentes RGB de uma pequena área da imagem (aproximadamente 0,25 cm2) foram efetuadas em tempo real a partir do aplicativo para smartphones color-picker (Real time) e de um celular equipado com câmera fotográfica com resoluçao de 5.0 Mp.19

Reagentes e Soluçoes

Todas as soluçoes foram preparadas com água purificada por osmose reversa e com reagentes apresentando, ao menos, 99% de pureza. Uma soluçao tampao amônia/cloreto de amônio 0,3 mol L-1 e pH 10 foi preparada dissolvendo 8,025 g de NH4Cl(Synth) em 450 mL de água, ajustando-se o pH com uma soluçao de hidróxido de sódio (5,0 mol L-1) e completando-se o volume à 500 mL com água. Uma soluçao de murexida (MUR) 0,3 mmol L-1 foi preparada dissolvendo-se 0,022 gramas do indicador (Merck) em 25 mL de etanol com posterior diluiçao a 250,00 mL com água. Uma soluçao de negro de eriocromo T (EBT) 0,2 mmol L-1 foi preparada dissolvendo 0,01 g do indicador (Synth) em 100 mL de uma soluçao 0,16% (m V-1) de tetraborato de sódio decahidratado (Synth), a qual foi preparada em metanol. Ambas as soluçoes de indicadores foram preparadas no mesmo dia em que foram utilizadas e armazenadas em frascos de vidro âmbar.

Aguas minerais comerciais provenientes de oito fontes distintas foram adquiridas no mercado local de Brasília e analisadas sem nenhum pré-tratamento. Nos referidos estudos, foram utilizadas cinco amostras de cada fonte, as quais pertenciam a lotes diferentes. Além destas águas, foram utilizadas também amostras de água destilada e de torneira como amostras de controle, sendo todas as águas avaliadas listadas na Tabela 1.

 

 

Para as medidas, 15,00 mL da amostra foram transferidos para um balao volumétrico de 25,00 mL, seguido da adiçao de 5,00 mL de soluçao tampao e 3,00 mL de soluçao de MUR ou 75 µL de soluçao de EBT, completando-se o volume remanescente com água purificada.

Procedimentos

A fim de obter um controle mais apurado do tempo de reaçao entre os reagentes colorimétricos (EBT ou MUR) com os íons metálicos presentes nas amostras, realizaram-se as leituras dos sinais RGB um minuto após a adiçao do indicador e ajuste do volume do balao. Posteriormente, as soluçoes foram transferidas para a cubeta, a qual foi acoplada ao suporte no interior da caixa com luz controlada. Concluída esta etapa, a câmera do celular foi posicionada na janela de leitura e a aquisiçao dos sinais foi realizada a partir do aplicativo, sendo os dados anotados para posterior avaliaçao.Vale destacar que foram realizadas medidas em triplicata para as cinco amostras de águas minerais de cada fonte, totalizando um conjunto de 15 medidas instrumentais por fonte.

Análise quimiométrica

Para verificar a capacidade de discriminar entre as diferentes águas minerais estudadas através dos dados colorimétricos, uma análise exploratória inicial dos dados foi realizada empregando análise hierárquica de agrupamentos (HCA, do inglês Hierarchical Cluster Analysis), executada com base na distância euclidiana e por algoritmo de ligaçao completa. A análise de componentes principais (PCA, do inglês Principal Component Analysis) também foi empregada utilizando as variáveis RGB obtidas com os dois reagentes colorimétricos para vizualizar a separaçao dos grupos e determinar quais as variáveis mais importantes para a separaçao observada. Por fim, as amostras foram divididas em dois conjuntos de dados independentes na proporçao de 2/3 para o desenvolvimento e 1/3 para a validaçao de um método de classificaçao baseado na regra do vizinho mais próximo (k-NN, do inglês k-Nearest Neighbor).20 Todos os cálculos foram executados empregando o programa Matlab (versao 2011b) e PLS-Toolbox (versao 7.03).

 

RESULTADOS E DISCUSSAO

Os reagentes colorimétricos MUR e EBT sao utilizados como indicadores para íons metálicos em titulaçoes complexométricas e produzem soluçoes com cores ligeiramente diferentes a depender da concentraçao e da identidade dos íons no meio.21 Baseado nestas diferenças foi demonstrado que a análise exploratória de águas minerais pode ser realizada com sucesso a partir de medidas fotométricas em sistemas de análise em fluxo e do tratamento quimiométrico dos dados obtidos. 22 Considerando que no presente trabalho a análise em fluxo nao foi utilizada, foi preciso avaliar a influência do controle de tempo de reaçao na repetibilidade/dispersao dos dados obtidos.

Estudos preliminares com o reagente murexida mostraram que a leitura do sinal RGB deve ser realizada com o controle do tempo de reaçao entre os íons metálicos da amostra e o reagente colorimétrico. De fato, conforme apresentado na Figura 2, que mostra a projeçao dos dados em funçao das variáveis RGB, os resultados em triplicata obtidos para três amostras de uma mesma água, sem o controle do tempo reacional, ou seja, com cada triplicata sendo medida com tempos diferentes após a mistura com os reagentes (30 s, 1 min. e 2 min.), tendem a apresentar uma maior dispersao do que aqueles obtidos quando todas as leituras sao realizadas exatamente um minuto após a adiçao dos reagentes colorimétricos. Deste modo, todos os estudos posteriores foram realizados com o controle de tempo entre a adiçao do reagente colorimétrico e a leitura dos sinais RGB com o objetivo de minimizar a dispersao dos dados nao relacionada à composiçao das amostras e a qual poderia limitar a análise exploratória das águas estudadas.

 


Figura 2. Dispersao dos dados obtidos sem o controle de tempo reacional (medidas das triplicatas realizadas a 30s, 1 min. e 2 min. após a mistura dos reagentes) e com o controle do tempo reacional (triplicatas medidas exatamente 1 minuto após a adiçao dos reagentes e homogeneizaçao da soluçao) para três amostras de água de torneira em relaçao às componentes RGB das imagens obtidas com o reagente murexida

 

Conforme apresentado na Figura 3(A), a distribuiçao dos dados obtidos a partir das medidas com EBT permitiram a discriminaçao em quatro grupos de amostras referentes a diferentes águas (3, 4, 9 e 10) sendo que as demais amostras (1, 2, 5, 6, 7 e 8) nao formaram agrupamentos individuais. Vale destacar que as águas 9 e 10 referem-se à água destilada e água de torneira, respectivamente, para as quais já era esperada uma boa discriminaçao dada a diferença de concentraçao de íons metálicos nestas águas em relaçao as águas minerais.

 


Figura 3. Dispersao dos dados obtidos para as medidas em triplicata das amostras de águas avaliadas utilizando-se os indicadores EBT (A) e MUR (B)

 

Utilizando a projeçao dos dados com relaçao aos valores de R, G e B obtidos apenas com o reagente MUR foi possível observar uma melhor discriminaçao das águas avaliadas. A Figura 3(B) mostra que, neste caso, ocorre a separaçao individual das amostras1, 2, 4, 8 e 10, sendo a amostra10 referente à água de torneira. Além destes agrupamentos de amostras, observou-se também grupos formados pela combinaçao das amostras pertencentes aos grupos3 e 9 e dos grupos 5, 6 e 7. A justificativa para o agrupamento destas amostras pode ser obtida das concentraçoes de íons cálcio fornecida nos rótulos e apresentadas na Tabela 2 e pelo fato do reagente MUR apresentar maior seletividade aos íons cálcio do que aos íons magnésio.21 Como pode ser observado, a água 3 apresenta a menor concentraçao de cálcio, o que pode ter resultado no agrupamento desta água com a água destilada (praticamente isenta de cálcio). Da mesma forma, para as águas 5, 6 e 7, apresentado no detalhe da Figura 3 (B) observa-se uma grande semelhança nas concentraçoes de íons cálcio o que certamente acarretou em valores semelhantes para as componentes RGB destas amostras.

 

 

Outra constataçao importante destes estudos iniciais é que, embora as amostras 3 e 9 nao tenham formado grupos individuais, ao se utilizar o indicador MUR, grupos bem definidos destas amostras foram observados para as medidas com EBT, possivelmente pelo fato do EBT responder a outros íons presentes nas amostras de água 3. Desta observaçao propôs-se a combinaçao das variáveis obtidas com os dois reagentes a fim de se otimizar a discriminaçao das águas. Para avaliar a contribuiçao de cada variável para a variância total dos dados, determinou-se a variância das medidas realizadas com cada uma das componentes R, G e B com ambos os reagentes, sendo os resultados apresentados na Tabela 3. Como pode ser observado, os maiores coeficientes de variaçao foram determinados para as variáveis B da MUR e R do EBT, as quais foram utilizadas para compor o gráfico de dispersao mostrado na Figura 4. Neste gráfico, observa-se a formaçao de oito agrupamentos, sendo sete deles correspondentes às amostras individuais 1, 2, 3, 4, 8, 9 e 10 e um grupo composto pelas amostras 5, 6 e 7, o que mostra que apenas estas duas variáveis sao capazes de produzir uma separaçao mais eficiente das águas estudadas em relaçao ao uso das variáveis RGB obtidas com cada reagente cromogênico de forma individual (Figura 3). É importante destacar que a dispersao dos dados em três dimensoes utilizando as variáveis G e B para MUR e R para EBT ou R e G para EBT e B para MUR nao proporcionaram separaçoes visualmente mais eficientes do que aquela conseguida com apenas duas variáveis (B para MUR e R para EBT). A Análise PCA também foi empregada utilizando todas as seis variáveis e dados centrados na média ou auto-escalados, sendo obtidos resultados muito similares aos apresentados na Figura 4 utilizando as duas primeiras componentes principais, que explicaram, ao menos, 95,50% da variância total dos dados. Com este estudo (Figura 1S) foi possível discriminar satisfatoriamente 9 classes de amostras, sendo que as amostras 6 e 7 formaram um único agrupamento, de forma muito semelhante ao demonstrado na Figura 4. A análise PCA também confirmou que as variáveis B para MUR e R para EBT contribuem de forma significativa para discriminaçao, uma vez que estas variáveis apresentaram os maiores pesos (loadings) para o cálculo das duas primeiras componentes principais nos estudos com PCA (Figura 1S).

 

 

 


Figura 4. Dispersao dos dados obtidos para as medidas em triplicata das amostras de águas avaliadas utilizando-se os dados para a componente R com EBT e para a componente B com MUR

 

Considerando estes resultados, pode-se afirmar que a estratégia proposta permitiu a análise exploratória dos dados sem a necessidade de uma ferramenta quimiométrica como a PCA, o que pode facilitar a interpretaçao dos resultados por usuários pouco ou nao familiarizados com quimiometria.

Observando-se o gráfico na Figura 4 e os dados na Tabela 2 é possível associar a variável B do reagente MUR à concentraçao de íons cálcio nas amostras de água. Nota-se que para maiores valores desta componente estao as águas com menores concentraçoes de íons cálcio, como a água mineral 3 e a água 9 (destilada), enquanto no outro extremo (menores valores na abscissa) encontram-se as amostras mais concentradas em cálcio. De fato, amostras que apresentam praticamente o mesmo teor de cálcio, como as amostras 6 e 7, tendem a exibir coordenadas em "x" muito semelhantes. Além disso, a literatura relata que o reagente MUR é um indicador mais seletivo a íons cálcio do que a íons magnésio, reforçando a relaçao desta variável com o teor de cálcio.21

Com relaçao a variável R do EBT (ordenada do gráfico de dispersao), observa-se que a mesma proporciona a separaçao de grupos de amostras que contém baixas concentraçoes de íons cálcio e magnésio (3,9 e 10) em relaçao àqueles grupos onde a concentraçao destes íons é relativamente maior (demais grupos). Uma hipótese plausível para tal constataçao, é que, devido ao reagente EBT ser um bom indicador tanto para íons cálcio quanto para íons magnésio, os sinais obtidos nesta componente para as amostras mais concentradas estao muito próximas do nível de saturaçao (valor máximo igual a 255), o que possivelmente nao favoreceu a discriminaçao das amostras com relaçao a este eixo.21

A avaliaçao exploratória foi também realizada por meio da análise de agrupamentos hierárquicos (HCA) utilizando-se as duas variáveis que apresentaram maior variância (B para MUR e R para EBT) sem nenhum pré-tratamento dos dados.20 O dendrograma apresentado na Figura 5 mostra a formaçao de nove agrupamentos, sendo oito destes correspondentes a amostras individuais e um agrupamento formado pelas amostras 6 e 7. Como pode ser observado, os dados referentes às amostras da classe 5 foram agrupados em uma classe diferente da classe constituída pelos dados das classes 6 e 7, o que nao poderia ser afirmado com segurança ao se observar apenas a dispersao apresentada na Figura 4. Neste ponto, é importante ressaltar que os resultados obtidos através da HCA indicam a discriminaçao adequada das águas estudadas, o que foi conseguido a partir de uma instrumentaçao alternativa de baixo custo e de um procedimento bastante simples.

 


Figura 5. Dendrograma obtido com as variáveis R para o EBT e B para MUR

 

Com o objetivo de verificar a qualidade das duas variáveis selecionadas na construçao de um modelo para a classificaçao das águas estudadas, propôs-se o uso do método k-NN utilizando três amostras de cada fonte para a construçao do modelo e duas amostras para a sua validaçao.20 Vale destacar que as amostras utilizadas para a construçao ou validaçao foram selecionadas de forma aleatória, por sorteio, sendo as replicatas autênticas das medidas para estas amostras (9 replicatas para calibraçao e 6 replicatas para validaçao) consideradas como amostras diferentes e independentes no estudo realizado. Adicionalmente, nenhum pré-processamento dos dados foi empregado para a construçao do modelo e o número de vizinhos para verificaçao das distâncias foi otimizado a cinco, empregando-se para isto a estratégia de validaçao cruzada.20 De maneira geral, o método k-NN prevê se uma determinada amostra pertence a uma classe específica através da distância desta amostra em relaçao a outras amostras (vizinhos mais próximos à amostra em questao) em um espaço n-dimensional definido, por exemplo, pelas variáveis experimentais consideradas na análise. Para o caso estudado, as distancias de certa amostra em relaçao aos seus cinco vizinhos mais próximos sao determinadas com relaçao ao espaço bidimensional formado pelas variáveis B MUR (eixo x) e R EBT (eixo y). As distâncias determinadas para os cinco vizinhos mais próximos sao entao elencadas em ordem crescente e cada vizinho mais próximo fornece um voto para certa classe de amostras baseado nestas distancias. No presente estudo, quando três ou mais vizinhos mais próximos atribuem o mesmo voto (classe) para a amostra esta é entao classificada como pertencente àquela classe. Caso ocorra um empate entre duas classes (dois votos para duas classes distintas e um voto para uma terceira classe), é utilizado como critério de desempate soma das distâncias dos vizinhos nessas duas classes, sendo que a classe que apresentar a menor soma será a classe atribuída à amostra em questao.20

A literatura mostra que uma forma adequada de avaliaçao do modelo de calibraçao obtido por k-NN consiste em determinar a taxa de eficiência (TE) deste modelo para cada uma das classes avaliadas. Para isso, determinou-se o percentual de falsos positivos (FP) e falsos negativos (FN) para cada classe, sendo TE estimada a partir da equaçao 1.23

Com base nesta equaçao, o modelo de calibraçao desenvolvido apresentou taxas de eficiência abaixo de 100% apenas para as fontes6 (86,4%) e 7 (76,6%), o que era previsto se considerada a análise exploratória desenvolvida anteriormente. Além disso, as eficiências acima de 75% para estas classes e o fato de todas as outras oito classes apresentarem 100% de eficiência demonstraram uma modelagem adequada para a calibraçao.

A Tabela 4 lista os resultados obtidos para a validaçao do método k-NN. Novamente, foram observadas taxas de eficiência de 100% para oito das dez classes estudadas, sendo que a classe 7, uma das classes com eficiência menor, apresentou um índice de 94,4% para este quesito, o qual pode ser considerado elevado. Deste modo, pode-se afirmar que o método apresentou um desempenho adequado para a classificaçao das águas minerais avaliadas, uma vez que apenas a classe de amostras 6 apresentou uma baixa taxa de eficiência (50%). Deve-se salientar ainda que as amostras nao classificadas corretamente na classe 6, foram classificadas como amostras da classe 7 e que estas classes apresentam concentraçoes dos íons metálicos majoritários (Tabela 2) bastante semelhantes, o que dificultou a distinçao destas amostras pelo modelo. Considerando este aspecto, é possível esperar que a inclusao de novos reagentes colorimétricos seletivos a outros íons metálicos (minoritários) pode melhorar a classificaçao inclusive para estas classes (6 e 7). Entretanto, deve-se ter em mente que, a depender da concentraçao destes elementos na amostra, a resposta colorimétrica obtida pode nao resultar na otimizaçao dos resultados, o que deve ser avaliado em trabalhos futuros.

 

 

CONCLUSAO

Os resultados obtidos permitem concluir que a classificaçao de águas minerais pode ser realizada de forma simples e eficiente empregando-se medidas colorimétricas obtidas a partir de um aplicativo para smartphone sem a necessidade de determinaçoes quantitativas mais laboriosas.16,17 A estratégia proposta neste trabalho poderá ser utilizada no futuro como ferramenta para a verificaçao preliminar de possíveis adulteraçoes de águas minerais comerciais utilizando um modelo de classificaçao desenvolvido em um aplicativo para smartphones, facilitando ainda mais a sua aplicaçao. Adicionalmente, o presente trabalho poderá servir de base para o desenvolvimento de sensores colorimétricos específicos para a classificaçao de águas minerais.

 

MATERIAL SUPLEMENTAR

Os resultados obtidos com a análise de componentes principais aplicada aos dados centrados na média sao apresentados na Figura 1S. O gráfico de scores (Figura 1S (A)) indica a separaçao das amostras de forma similar ao obtido pela dispersao dos dados com relaçao às variáveis originais R-EBT e B-MUR. Com o gráfico de pesos (Figura 1S (B)) é possível notar que as variáveis R-EBT e B-MUR contribuem significativamente para o cálculo das duas primeiras componentes principais, o que corrobora para a seleçao destas variáveis no estudo realizado. O leitor pode acessar livremente o conteúdo deste material no website (http://quimicanova.sbq.org.br/).

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Instituto Nacional de Ciências e Tecnologias Analíticas Avançadas (INCTAA) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq - processo 573894/2008-6). O estudante Gerson F. Silva Neto agradece ao CNPq/PIBIC-UnB pela bolsa concedida.

 

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