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Artigo


Determinação simultânea de metais e enxofre por ICP-OES em resíduos de destilação de petróleo
Simultaneous determination of metals and sulfur in crude oil distillation residues by ICP-OES

Gabriel T. DruzianI; Cristiano K. GiesbrechtI; Francisco C. RosaI; Regina C. L. GuimaraesII; Ricardo A. GuarnieriII; Paola A. MelloI; Érico M. M. Flores I,*

IDepartamento de Química, Universidade Federal de Santa Maria, 97105-900 Santa Maria - RS, Brasil
IICentro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello, Petróleo Brasileiro S. A. (PETROBRAS), 21941-915 Rio de Janeiro - RJ, Brasil

Recebido em 12/02/2016
Aceito em 11/04/2016
Publicado na web em 10/06/2016

Endereço para correspondência

*e-mail: ericommf@gmail.com

RESUMO

A method for digestion of crude oil distillation residues (atmospheric residue, AR and vacuum residue, VR) using microwave-induced combustion (MIC) was developed for simultaneous determination of metals (Ba, Co, Fe, Mg, Mn, Ni and V) and sulfur by inductively coupled plasma optical emission spectrometry (ICP-OES). Samples were wrapped in polyethylene films and combusted using 20 bar of oxygen. Nitric acid solutions were evaluated using 5 min of reflux after combustion. Accuracy was evaluated using certified reference material and comparison with the results obtained by microwave-assisted wet digestion (MAWD). No statistical difference was observed between the certified values and those obtained using MIC as well as between the values obtained using MAWD or MIC. In spite of both methods have been apparently suitable for crude oil digestion, MIC was preferable in view of the possibility of using 3 mol L-1 HNO3 as absorbing solution. Furthermore, it is important to notice that using MIC, C content in digests was lower than 10 mg L-1, preventing interferences in ICP-OES. In addition, the simultaneous digestion of eight samples was possible in less than 30 min and without using concentrated acids and/or longer heating times, making the proposed method well-suited for routine analysis.

Palavras-chave: crude oil fractions, crude oil distillation residues, microwave-assisted digestion, microwave-induced combustion, ICP-OES.

INTRODUÇAO

O resíduo de destilaçao atmosférico (RAT) e o resíduo de destilaçao a vácuo (RV) sao oriundos do processo de destilaçao do petróleo, possuindo ponto de ebuliçao de cerca de 340 e 540 ºC, respectivamente.1,2 Apesar de tais fraçoes serem, majoritariamente, constituídas por hidrocarbonetos, também estao presentes compostos contendo N, O e S, bem como metais,3,4 cuja concentraçao varia em funçao da origem do petróleo. Como consequência, tais elementos podem ser transferidos a outras fraçoes durante o processamento, causando a contaminaçao de produtos finais.5,6 O RAT, por exemplo, pode ser usado como matéria-prima para a produçao de combustíveis ou transferido para a unidade de destilaçao a vácuo.2,7,8 O resíduo desse processo (RV)1,8 é comumente utilizado na produçao de asfalto e coque de petróleo6, o qual pode ter sua qualidade prejudicada caso haja a presença de constituintes metálicos ou de S. Efeitos nocivos sobre os catalisadores utilizados em processos industriais, além da contribuiçao para a poluiçao ambiental, estao entre os problemas ocasionados pela presença de metais e S em RAT e RV.1,8,9 Dessa forma, considerando a possibilidade desses elementos serem incorporados nas fraçoes após o refino e poderem ser transferidos aos produtos finais, torna-se importante a determinaçao rotineira de metais e S no RAT e no RV.

A determinaçao de metais em fraçoes de petróleo pode ser feita empregando técnicas de espectrometria atômica, tais como a espectrometria de absorçao atômica com chama (FAAS),10 a espectrometria de absorçao atômica com forno de grafite (GFAAS),11 a espectrometria de emissao óptica com plasma indutivamente acoplado (ICP-OES)12,13 e a espectrometria de massa com plasma indutivamente acoplado (ICP-MS).6,14 No caso da ICP-OES, esta técnica tem sido adotada em vista de sua capacidade multielementar de análise e limites de detecçao relativamente baixos. Entretanto, para as análises por ICP-OES é necessário na grande maioria dos casos, que a amostra esteja na forma líquida ou solubilizada em um solvente adequado. No caso de amostras sólidas, uma etapa de decomposiçao é mandatória. Nesse contexto, torna-se importante o desenvolvimento de métodos de preparo de amostras que sejam capazes de converter os resíduos de destilaçao do petróleo em uma soluçao aquosa adequada para ser introduzida no espectrômetro. Contudo, esta etapa representa um desafio, uma vez que ambos os materiais, RAT e RV, sao muito difíceis de serem decompostos por sistemas convencionais por via úmida, mesmo aqueles operando sob alta temperatura e pressao e com o uso de ácidos concentrados.5,13

Apesar destas limitaçoes, a digestao por via úmida assistida por radiaçao micro-ondas (MAWD)15 em sistema fechado tem sido utilizada para a decomposiçao de RAT e RV. Entretanto, dependendo da eficiência de decomposiçao, os digeridos obtidos podem apresentar interferências espectrais nas técnicas com fontes de plasma, principalmente aquelas relacionadas a elevados teores de carbono residual e elevada acidez dos digeridos.16

Para amostras de composiçao majoritariamente orgânica, tal como no caso do RAT e do RV, o método de decomposiçao por combustao é uma alternativa que tem sido empregada.17 A decomposiçao de RAT e RV por combustao em forno tipo mufla (decomposiçao por via seca) baseia-se na queima da fraçao orgânica das amostras e posterior dissoluçao das cinzas em ácidos inorgânicos.17 Entretanto, embora simples, a decomposiçao por via seca requer elevado tempo de decomposiçao, há maior risco de contaminaçao por tratar-se de um sistema aberto, além da possibilidade de perdas de alguns elementos por volatilizaçao.17,18

Atualmente, a combustao iniciada por radiaçao micro-ondas (MIC) tem sido empregada para a digestao de amostras, com vantagens em relaçao à combustao em forno tipo mufla. O método da MIC permite a combustao em frascos fechados pressurizados com oxigênio, minimizando perdas e contaminaçao e em menor tempo que a combustao em forno mufla. Após o processo de combustao, os produtos gasosos sao absorvidos em uma soluçao adequada, a qual é posteriormente submetida à determinaçao por técnicas espectrométricas e cromatográficas. Outro importante aspecto da MIC é a possibilidade do uso de soluçoes diluídas para a absorçao dos analitos, minimizando interferências na etapa de determinaçao resultando na diminuiçao dos valores dos brancos. Por suas características peculiares, baseada no princípio da decomposiçao por combustao, aliada às vantagens do uso de sistemas fechados de decomposiçao, a MIC pode ser considerada uma opçao promissora.6,12 Entretanto, seu uso nao foi, ainda, demonstrado para a decomposiçao de RAT e RV para posterior determinaçao simultânea de metais e S por ICP-OES.

Dessa forma, o objetivo deste trabalho foi avaliar a adequabilidade da MIC para posterior determinaçao simultânea de metais e de S nas fraçoes de destilaçao de petróleo (RAT e RV) por ICP-OES. Os seguintes parâmetros foram avaliados: o modo de adaptaçao da amostra no frasco para queima e a concentraçao da soluçao absorvedora. A avaliaçao da exatidao foi feita com material de referência certificado (CRM) de óleo combustível residual e por comparaçao com os resultados obtidos empregando a MAWD e determinaçao por ICP-OES.

 

PARTE EXPERIMENTAL

Instrumentaçao

Para a MIC e a MAWD foi utilizado um forno de micro-ondas Multiwave 3000® (Microwave Sample Preparation System, Anton Paar, Austria). O sistema foi equipado com 8 frascos de quartzo de alta pressao, com um volume interno de 80 mL (máximo de temperatura e pressao de 280 ºC e 80 bar, respectivamente). No caso da MIC, foi utilizado um suporte de quartzo desenvolvido no Laboratório de Hialotecnia da UFSM, o qual foi inserido no interior do frasco de quartzo original do equipamento.12

A determinaçao de Ba, Co, Fe, Mg, Mn, Ni, V e S foi feita por espectrometria de emissao óptica com plasma indutivamente acoplado (ICP-OES, modelo Ciros CCD, Spectro Analytical Instruments, Alemanha) equipado com uma câmara de nebulizaçao de duplo passo (tipo Scott) e um nebulizador de fluxo cruzado (cross flow). Este equipamento foi também utilizado para a determinaçao do teor de carbono nas soluçoes após a decomposiçao das amostras. Para a determinaçao por ICP-OES, foi utilizado argônio com 99,996% de pureza (White Martins - Praxair, Brasil), para a geraçao do plasma, gás de nebulizaçao e como gás auxiliar. O comprimento de onda selecionado para cada elemento, bem como as demais condiçoes de uso, estao mostrados na Tabela 1.

 

 

Reagentes e padroes

A água utilizada foi previamente destilada, deionizada em uma coluna de troca iônica e, posteriormente, purificada em um sistema Milli-Q® (Millipore, Bedford, EUA), apresentando resistividade de 18,2 MΩ cm. O ácido nítrico concentrado (68%, Vetec, Brasil), foi purificado em sistema de destilaçao abaixo do ponto de ebuliçao (modelo duoPUR 2.01E, Millestone, Sorisole, Itália). As soluçoes de calibraçao para a determinaçao dos metais na faixa de 10 a 100 µg L-1 foram preparadas a partir da diluiçao de uma soluçao estoque multielementar 10 mg L-1 (SCP33MS PlasmaCAL ICP-AES & ICP-MS Standard, SCP Science, Canadá) em soluçao de HNO3 5%. Para a curva de calibraçao para a determinaçao de S, foram preparadas soluçoes na faixa de 250 a 10000 µg L-1 a partir da diluiçao de uma soluçao estoque a 1000 mg L-1 (Spex CertiPrep, Metuchen, EUA), em água. Para a determinaçao de carbono nos digeridos, soluçoes de referência na faixa de 5 a 500 mg L-1 foram preparadas a partir da dissoluçao de ácido cítrico (Vetec, Brasil) em água. Foi feita a adiçao de ítrio (1 mg L-1) como padrao interno, nas soluçoes de referência e nas amostras.

Uma soluçao de NH4NO3 (6 mol L−1) foi usada como iniciador de combustao para o procedimento da MIC e foi preparada pela dissoluçao do respectivo sal (Merck, Alemanha) em água. Discos de papel filtro com baixo teor de cinzas (Black Ribbon Ashless, Schleicher and Schuell, Alemanha, 15 mm de diâmetro, pesando aproximadamente 15,3 ± 0,3 mg) foram, também, usados como auxiliares de combustao. O papel filtro foi previamente descontaminado com HNO3 10% (v/v) por 40 min em um banho de ultrassom e, posteriormente, lavado com água. Após, o papel foi seco em uma capela de fluxo laminar classe 100 (CSLH-12, Veco, Brasil). As amostras foram envolvidas em cápsulas de policarbonato (Unipec Inc., Universal Plastics & Engineering Company, EUA) ou em filmes de polietileno (PE), previamente descontaminados seguindo o mesmo procedimento de limpeza utilizado para o papel filtro. Para a pressurizaçao dos frascos, foi utilizado oxigênio com pureza de 99,6% (White Martins - Praxair, Brasil).

Tendo em vista que CRMs para RAT e RV nao sao disponíveis comercialmente, um CRM de óleo combustível residual (NIST 1634c, trace elements in residual fuel oil) foi utilizado para avaliaçao da exatidao de ambos os procedimentos de decomposiçao. As amostras de RAT e RV foram homogeneizadas, aquecendo-as em temperatura de, aproximadamente, 140 °C por 20 min, antes dos procedimentos da MIC e da MAWD. De maneira semelhante, o CRM utilizado foi aquecido por 20 min em temperatura de, aproximadamente, 80 ºC. Adicionalmente, a exatidao foi avaliada por comparaçao dos resultados por MIC com aqueles obtidos por MAWD. Os materiais utilizados para o preparo e armazenamento das soluçoes foram imersos em soluçao de HNO3 5% (v/v) para descontaminaçao por, pelo menos, 24 h e depois lavados com água.

Procedimento para combustao iniciada por radiaçao micro-ondas

Considerando que as amostras apresentavam diferentes aspectos (algumas amostras de RAT eram materiais viscosos e outras de RV eram sólidas), as amostras foram preparadas como invólucros de até 500 mg, utilizando um filme de PE (12 mg). O invólucro foi posicionado na base do suporte de quartzo, sobre um disco de papel filtro umedecido com 50 µL de iniciador (NH4NO3). O suporte com o invólucro foi colocado dentro do frasco de quartzo, contendo 6 mL de soluçao absorvedora (3, 7 ou 14,5 mol L−1 de HNO3). Após o fechamento dos frascos e a colocaçao destes no rotor, estes foram pressurizados com 20 bar de oxigênio. O rotor contendo os frascos foi, entao, colocado dentro da cavidade e as amostras foram submetidas à radiaçao micro-ondas para decomposiçao. O programa utilizado no procedimento da MIC pode ser visualizado na Tabela 2. Após a liberaçao dos gases gerados no processo de combustao, a soluçao resultante foi aferida a 25 mL com água para a posterior determinaçao de Ba, Co, Fe, Mg, Mn, Ni, V e S por ICP-OES. Para a descontaminaçao dos frascos e dos suportes, foi utilizada uma soluçao de HNO3 14,5 mol L-1 e aquecimento em forno de micro-ondas por 10 min a 1400 W, seguidos de 20 min de resfriamento (0 W). Após, os frascos e os suportes foram lavados com água e secos com ar comprimido.

 

 

Procedimento para decomposiçao por via úmida assistida por radiaçao micro-ondas (MAWD)

O procedimento utilizado foi baseado em um estudo anterior para petróleo14 no qual, aproximadamente, 500 mg de amostra foram pesados diretamente no interior dos frascos de quartzo, contendo 6 mL de HNO3 14,5 mol L-1. Após, os frascos foram imediatamente fechados, fixados ao rotor do sistema de decomposiçao e as amostras foram submetidas ao programa de aquecimento também apresentado na Tabela 2.

Após o término do programa e resfriamento do sistema, as soluçoes obtidas foram recolhidas em frascos volumétricos e aferidas a 25 mL com água. Os frascos de quartzo utilizados na decomposiçao por MAWD foram descontaminados com 6 mL de HNO3 14,5 mol L-1 e aquecimento em forno de micro-ondas por 10 min a 1400 W, seguidos de 20 min de resfriamento (0 W). Posteriormente, os frascos foram lavados com água e secos com ar comprimido.

 

RESULTADOS E DISCUSSAO

Otimizaçao da MIC: preparaçao dos invólucros para as amostras

O método da MIC foi desenvolvido, inicialmente, para a decomposiçao de amostras sólidas,19 sendo que outros tipos de amostras necessitam ser adaptadas para um melhor desempenho deste método. Neste sentido, o uso de cápsulas de policarbonato e de invólucros com filmes de PE podem ser uma alternativa para que as amostras possam ser colocadas no suporte. Essas alternativas foram propostas inicialmente por Pereira e colaboradores14 para a decomposiçao de petróleo extrapesado e posterior determinaçao de metais por ICP-MS.14 Desta maneira, no presente trabalho, foi investigada a adequabilidade de cápsulas de policarbonato e de invólucros com filmes de PE para a decomposiçao de RAT e RV.

No caso das cápsulas de policarbonato, devido as suas dimensoes, foi possível utilizar uma massa máxima de 300 mg de RAT ou de RV. Para o preenchimento da cápsula, a parte inferior desta foi colocada em um suporte e a amostra foi introduzida na cápsula com o auxílio de uma espátula. Após, foi colocada a parte superior da cápsula (tampa) para o fechamento da mesma. Assim, após a pesagem, foi possível colocar a amostra sobre o suporte para combustao. A formaçao do invólucro com filme de PE foi, também, avaliada para a decomposiçao de RAT e RV. Neste sentido, foram utilizados filmes de PE, previamente descontaminados, cortados em pedaços de, aproximadamente, 15 mg. A formaçao dos invólucros consistiu no posicionamento de um filme de PE sobre uma placa de politetrafluoretileno (PTFE), com lacunas de cerca de 1 cm de profundidade e 1 cm de diâmetro. Para a formaçao do invólucro, o filme de PE foi pressionado com auxílio de um bastao, formando uma cavidade na qual foi inserida a amostra. Em seguida, o invólucro foi fechado com o auxílio de uma resistência elétrica. A Figura 1 mostra a preparaçao (Fig. 1A) e o aspecto (Fig. 1B) da amostra de RAT em uma cápsula de policarbonato e a preparaçao (Fig. 1C) e o aspecto (Fig. 1D) de uma amostra de RAT em invólucro de filme de PE.

 


Figura 1. (A) Preparaçao da amostra de RAT em cápsula de policarbonato, (B) cápsula de policarbonato contendo a amostra de RAT, (C) preparaçao da amostra de RAT em invólucro de PE e (D) invólucro de PE contendo a amostra de RAT

 

O uso do invólucro de PE permitiu a decomposiçao de maiores massas de amostra (até 500 mg), quando comparado às cápsulas de policarbonato. Além disso, a massa de PE, necessária para a formaçao dos invólucros foi mínima (15 mg), o que nao afetou os valores para os brancos analíticos ou a combustao da amostra. Cabe salientar que cápsulas de policarbonato também podem ser usadas com massas de até cerca de 300 mg e com contribuiçao pouco significativa para os brancos analíticos. Contudo, é importante destacar que a preparaçao das amostras nestas cápsulas é mais difícil, em funçao das características das amostras (pastosas, semi-sólidas ou sólidas) e do tamanho das cápsulas. Ainda, o uso de invólucros com filme de PE nos procedimentos de combustao proporciona queimas reprodutíveis, pois o PE é facilmente decomposto por MIC e envolve facilmente as amostras, evitando perdas durante a igniçao, com pressoes máximas mais baixas em relaçao ao uso de cápsulas de policarbonato.

Avaliaçao da massa de amostra no procedimento da MIC

Para o estudo da massa de amostra máxima que pode ser decomposta com segurança utilizando a MIC, foram feitos experimentos com RAT e com RV. Inicialmente, a pressao original de oxigênio foi fixada em torno de 20 bar e a massa de amostra foi avaliada entre 100 e 550 mg, preparadas na forma de invólucro de PE. Desse modo, a pressao máxima atingida e a variaçao da pressao alcançada, foram monitoradas de acordo com a massa utilizada. Os resultados obtidos para RAT e RV podem ser observados na Figura 2.

 


Figura 2. Pressao máxima gerada no sistema (barras) e variaçao de pressao (linhas) durante a decomposiçao por MIC em funçao da massa de RAT (●) e de RV (), n=3. A pressao inicial foi de 20 bar para todos os experimentos

 

Como esperado, com o aumento da massa de amostra ocorreu, também, um aumento da pressao máxima atingida. Utilizando massas de 500 mg, para ambas as amostras, a pressao máxima atingida pelo sistema foi bem menor (35 bar) do que a pressao máxima permitida pelo fabricante (80 bar).20 Nestas condiçoes, a decomposiçao é completa e uma soluçao límpida é obtida (Figura 3A). Massas de amostra superiores a 500 mg apresentaram decomposiçao incompleta, tanto para RAT quanto para RV (Figura 3B).

 


Figura 3. Soluçao obtida após a decomposiçao de 500 mg (A) e 550 mg (B) de RAT por MIC (6 mL de HNO3 14,5 mol L-1 como soluçao absorvedora em ambos os testes)

 

Dessa maneira, a massa máxima de amostra que foi possível decompor utilizando a MIC nestas condiçoes foi de 500 mg para ambas as matrizes, o que pode ser considerado uma massa relativamente elevada, considerando-se a decomposiçao em sistema fechado. Isso contribui para a obtençao de limites de detecçao mais baixos, o que é importante para a determinaçao de elementos em baixas concentraçoes.

Avaliaçao da soluçao absorvedora no procedimento da MIC

É conhecido que o tipo e a concentraçao da soluçao absorvedora usada para a retençao dos analitos liberados com os produtos gasosos gerados durante o processo de combustao sao extremamente importantes. A escolha da soluçao absorvedora depende do elemento a ser determinado e da técnica de determinaçao utilizada. Para a determinaçao de metais, há diversos trabalhos na literatura que utilizam HNO3 como soluçao absorvedora.19 Dessa maneira, neste trabalho foram avaliadas três concentraçoes de HNO3 (3, 7 e 14,5 mol L-1) para a determinaçao de metais e S, em RAT e em RV. No procedimento da MIC, foram decompostos 500 mg de RAT e de RV com uma etapa de refluxo de 5 min nos ciclos de decomposiçao. Na Tabela 3 estao apresentados os resultados obtidos para RAT e para RV com o uso das soluçoes absorvedoras avaliadas.

 

 

Os resultados obtidos nao apresentaram diferença estatística significativa, (ANOVA, nível de confiança de 95%), independentemente da soluçao absorvedora avaliada. Concentraçoes de HNO3 inferiores a 3 mol L-1 nao foram investigadas pois, conforme relatado por Pereira e colaboradores na literatura,21 nao é possível obter recuperaçoes satisfatórias para alguns elementos, como Ba, por exemplo. Em geral, o RAT apresentou menores concentraçoes de Ni, V e S e maiores concentraçoes de Fe, Mg e Mn. Isso pode ser explicado levando-se em consideraçao que Ni e V, além de S, podem estar acumulados nas fraçoes mais pesadas durante o processo de refino do petróleo.

De um modo geral, o método por MIC mostrou-se adequado para a decomposiçao de RAT e RV com o emprego de soluçao de HNO3 3 mol L-1 como soluçao absorvedora. Nesse sentido, o desenvolvimento de métodos analíticos que possibilitem o uso de soluçoes diluídas é de grande importância, pois está de acordo com os princípios da química verde, possibilitando a geraçao de menores quantidades de resíduos e consumo de reagentes, além de evitar interferências espectrais e nao espectrais na etapa de determinaçao, principalmente quando sao utilizadas as técnicas espectrométricas, como a ICP-OES.

Avaliaçao da exatidao dos resultados obtidos por MIC e por MAWD

A avaliaçao da exatidao foi feita utilizando um CRM de matriz similar, haja vista a inexistência de CRM para resíduos de destilaçao do petróleo. Os resultados obtidos, por ICP-OES, após a decomposiçao do CRM NIST 1634c (residual fuel oil) por MIC utilizando-se uma soluçao de HNO3 3 mol L-1 como soluçao absorvedora e 5 min de refluxo, estao apresentados na Tabela 4. Os valores obtidos após decomposiçao por MIC e determinaçao por ICP-OES nao apresentaram diferença estatística significativa (teste t - Student, nível de confiança de 95%) em relaçao aos valores certificados obtidos nas mesmas condiçoes.

 

 

A exatidao empregando a MIC também foi avaliada através da comparaçao dos resultados obtidos empregando a decomposiçao por MAWD. Os resultados respectivos estao apresentados na Tabela 5.

 

 

É possível observar que nao houve diferença significativa entre o método proposto (MIC) para a decomposiçao das fraçoes de petróleo e a MAWD, utilizada como método comparativo. Ademais, os teores de C para os digeridos obtidos pelo método da MAWD foram superiores (1800 a 2500 mg L-1) aos obtidos por MIC (<10 mg L-1), o que contribui para minimizar interferências na etapa de determinaçao de metais e S por ICP-OES. Outra vantagem do procedimento proposto é a possibilidade do uso de ácidos diluídos durante o preparo das amostras, que contribuem para menores brancos analíticos, como pode ser observado para os LODs na Tabela 5, bem como para a minimizaçao do consumo de reagentes.22

 

CONCLUSOES

Pode-se concluir que os procedimentos da MAWD e da MIC foram adequados para o preparo de amostras de RAT e de RV para a posterior determinaçao de metais e enxofre por ICP-OES. A MIC pode ser considerada uma alternativa eficaz para o preparo deste tipo de amostra pois, contrariante à MAWD, permite o uso de ácidos diluídos, resultando em digeridos mais adequados para a determinaçao por ICP-OES. O uso de ácidos diluídos é uma tendência na área de preparo de amostras, haja vista que concentraçoes de ácido elevadas podem causar interferências na etapa de determinaçao e aumento dos valores dos brancos. Além disso, a minimizaçao do uso de ácidos concentrados e, como consequência, dos resíduos gerados, está de acordo com os preceitos da química verde.

O teor de C dos digeridos obtidos por MIC foi da ordem de 10 mg L-1, enquanto que para a MAWD foram de cerca de 1800 a 2500 mg L-1, o que ajuda na reduçao de interferências durante a etapa de determinaçao por ICP-OES. O método por MIC pode ser utilizado para análise de rotina de RAT e de RV, para a determinaçao de metais e enxofre, uma vez que agrega rapidez, simplicidade e elevada eficiência de decomposiçao, adequadas à determinaçao multielementar por ICP-OES.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Fundaçao de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Coordenaçao de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

 

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