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Quantificação de alquilbenzeno linear sulfonato em estação de tratamento de efluentes e rios por cromatografia líquida de alta eficiência e extração em fase sólida Quantification of linear alkylbenzene sulfonate in sewage treatment plants and rivers by high performance liquid chromatography and solid phase extraction |
Luiz G. Silva; Sávia Gavazza; Lourdinha Florencio; Mario T. Kato*
Departamento de Engenharia Civil, Universidade Federal de Pernambuco, Av. Acadêmico Hélio Ramos s/n, Cidade Universitária, 50740-530 Recife - PE, Brasil Recebido em 28/06/2016 *e-mail: kato@ufpe.br The procedures to implement a chromatographic method for the quantification of linear alkyl benzene sulfonate (LAS) in the influent, effluent and sludge of a wastewater treatment plant (WWTP), and in river water and sediment, are described and evaluated. The columns octylsilane (C8) and octadecylsilane (C18) for high performance liquid chromatography were evaluated for separation of LAS homologues. The results showed that both columns separated the four homologues, but C18 was better for separation of the isomers of each homologue. This enabled to qualitatively evaluate the degradation of homologues in the WWTP, according to their respective isomers. Samples pre-treatment by solid phase extraction (SPE) columns, strong anionic exchange (SAX) and C18, was also evaluated. SPE was necessary for water river samples, either to concentrate LAS or to remove interference in the matrix; however, for WWTP samples, SPE showed unnecessary. The recovery of LAS homologues, after the procedures for sample preparation, was 90 to 110% with an accuracy of 1 to 5%. The WWTP was efficient in LAS removal from domestic sewage; however, the concentrations in water and sediments of the receiving body were higher than the limits established by legislation due to illegal discharges of untreated sewage. INTRODUÇAO Alquilbenzeno linear sulfonato (LAS - linear alkylbenzene sulfonate) é o tensoativo aniônico mais utilizado como princípio ativo dos detergentes e saboes em pó, e por isso, o de maior produçao (3 milhoes de toneladas em 2000) e consumo mundial (18,2 milhoes de toneladas em 2003). O produto comercial é uma mistura de homólogos e isômeros de posiçao com cadeias lineares contendo de 10 a 14 átomos de carbono e foi introduzido no mercado como substituto biodegradável do alquilbenzeno sulfonato (ABS - alkylbenzene sulfonate).1,2 O LAS é produzido pela sulfonaçao do alquilbenzeno linear (LAB - linear alkylbenzene), obtido pela alquilaçao de Friedel Crafts. Neste processo sao usados diferentes catalisadores, alterando o percentual dos isômeros e, consequentemente, a viscosidade, a solubilidade e a aplicaçao do produto final. Quando o ácido fluorídrico é utilizado como catalisador, o percentual dos isômeros em cada homólogo é quase equivalente (17 a 20%); e quando o cloreto de alumínio é utilizado, sao produzidos, majoritariamente, os isômeros 2-fenil (2Ø) (30%), seguido do 3Ø (20%) e decrescendo gradualmente para os isômeros 4Ø a 6Ø (15 a 16%).1,3 O maior consumo doméstico de LAS tem provocado o aumento das suas concentraçoes em esgotos sanitários (1 a 15 mg L-1) que chegam nas estaçoes de tratamento (ETE) ou nas águas de rio, bem como nos lodos de ETE (<1 a 10 g kg-1 de matéria seca) e nos sedimentos de rio (< 0,001 a 0,005 g kg-1 de matéria seca). Concentraçoes de LAS maiores que 0,27 mg L-1 em água ou 0,035 g kg-1 de matéria seca em lodos e sedimentos têm efeito tóxico nos ecossistemas aquático e terrestre. Por isso, há a necessidade de monitoramento das suas concentraçoes e estudos para avaliar os impactos e sua taxa de degradaçao no ambiente. Testes laboratoriais apontaram uma eficiência de degradaçao superior a 99% em ambiente aeróbio, com tempo de meia vida de 12 a 18 h em água de rio e de 0,6 a 1,3 h em ETE com tratamento aeróbio por lodos ativados. Em ETE com tratamento anaeróbio, estudos apontaram para uma baixa taxa de biodegradaçao, destacando-se a sua precipitaçao como sais de cálcio e magnésio, adsorçao ao lodo, sólidos suspensos e em sedimentos como os principais mecanismos da sua remoçao.2-10 No Brasil nao existe um valor padrao para concentraçoes de LAS em efluentes tratados e águas superficiais, mas somente um valor padrao para a concentraçao de surfatantes aniônicos totais, determinados pelo método das substâncias ativas ao azul de metileno (MBAS - methylene blue active substance).11 O Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) determinou que as concentraçoes de surfatantes aniônicos totais, quantificadas pelo método MBAS, deveriam ser expressas em unidades de mg L-1 de LAS, e nao deveriam ser maiores que 0,5 mg L-1 de LAS em águas superficiais.12 A Uniao Europeia e a Austria definiram valores padroes para as concentraçoes de LAS em águas superfíciais de 0,35 e 0,27 mg L-1, respectivamente.13,14 No entanto, como no Brasil, nao há um limite máximo definido para a concentraçao de LAS em efluentes tratados. A quantificaçao do LAS pode ser realizada pela cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas (CG/EM)15-17 e pela cromatografia líquida de alta eficiência com fase reversa (CLAE-FR), com detectores de espectrometria de massas, fluorescência ou UV-vis.10,18-21 A extraçao do LAS de lodo e sedimento de rio pode ser realizada pela extraçao líquida pressurizada, extraçao assistida por micro-ondas, ultrassom ou Soxhlet.20,22,23 A concentraçao do LAS, quando abaixo do limite de quantificaçao do método cromatográfico, é realizada pela evaporaçao de uma alíquota adequada da amostra e o resíduo é redissolvido com um volume e proporçao adequados de uma soluçao metanol:água. Ou ainda, pela extraçao em fase sólida (SPE - solid phase extraction), que também atua na remoçao de interferentes que coeluem com os homólogos do LAS, utilizando as colunas de troca aniônica muito forte (SAX - strong anionic exchange) e fase reversa octadecilsilano (C18), já que o LAS possui na sua estrutura uma porçao nao polar, a cadeia alquílica, e outra polar, o grupo fenilsulfonato, fazendo com que ele seja retido nas duas colunas.4,5,9,20,23-25 Dada a crescente preocupaçao sobre a presença de LAS em amostras ambientais, líquidas e sólidas, e levando-se em conta o maior uso de tratamento anaeróbio para esgotos sanitários, bem como os avanços nos estudos sobre a sua biodegradabilidade, é importante que a sua concentraçao seja quantificada por método analítico adequado. O objetivo do trabalho foi implantar uma metodologia empregando CLAE e SPE para a quantificaçao de LAS em afluente, efluente e lodo de ETE e em água e sedimento de rio.
PARTE EXPERIMENTAL Reagentes e materiais Foram utilizados acetonitrila e metanol grau cromatográfico da Merck; trietilamina, ácido etanoico, ácido clorídrico e hidróxido de sódio p.a. da Merck; água com resistividade de 18 MΩ cm, purificada em sistema Merck Millipore; as colunas de SPE utilizadas foram C18 e SAX AcuBond II de 500 mg e 3 mL da Agilent. O padrao do surfatante aniônico comercial continha 25,5% de LAS (em massa) e a composiçaodos homólogos C10, C11, C12 e C13 era de 14,1%, 31,6%, 30,2% e 23%, respectivamente; e a dos isômeros 2-fenil-C8 (2ØC8) e 2-fenil-C16 (2ØC16) era de 81% e 91% (surrogates), respectivamente. Os padroes do LAS e surrogates foram obtidos com a CEPSA Química (San Roque, Espanha). Equipamentos Foi utilizado um cromatógrafo a líquido Agilent series 1100 com sistema de bomba quaternária, degaseificador da fase móvel, injetor automático com loop de 100 µL, compartimento termostatizado para coluna cromatográfica, detectores UV-vis e fluorescência. As colunas analíticas eram Agilent Zorbax eclipse, XDB, C8 (150 x 4,6 mm e 5 µm) e LiChrospher 100 RP-18 (250 x 4,6 mm e 5 µm) da Merck. Procedimentos experimentais Local das coletas As amostras de esgoto e lodo foram coletadas numa ETE composta por um reator anaeróbio de manta de lodo e fluxo ascendente (UASB - upflow anaerobic sludge blanket), seguido de uma lagoa de polimento para pós-tratamento (ETE Mangueira, Recife PE, coordenadas 08°05'41" de latitude sul e 34°55'31" de longitude oeste). As amostras de água e sedimento foram coletadas no corpo receptor do efluente final dessa ETE, o rio Jiquiá, com um leito de cerca de 9 km de extensao, da sua nascente até sua confluência com o rio Tejipió. O rio Jiquiá recebe tanto efluentes tratados, como nao tratados de muitos outros bairros da bacia hidrográfica.26 As amostras da ETE foram coletadas no afluente (P1), efluente do UASB (P2), efluente da lagoa de polimento (P3) e lodo do reator. As amostras de água e sedimento no Jiquiá foram coletadas no ponto de encontro do canal do efluente da ETE com o leito do rio (J2), e em um ponto à montante (J1) e outro à jusante (J3). Método cromatográfico No uso das colunas C8 e C18, a fase móvel foi água com 5 mmol L-1 de ácido etanoico e 5 mmol L-1 de trietilamina (solvente A) e acetonitrila (solvente B); o fluxo da fase móvel foi de 1 mL min-1, o volume da amostra de 100 µL, a temperatura do compartimento termostatizado da coluna de 40 ºC, a detecçao UV-Vis em 230 nm e a fluorescência em 230 nm (excitaçao) e 290 nm (emissao). Para a separaçao dos constituintes do LAS foi aplicado um gradiente na fase móvel; no método com a coluna C8, iniciou-se com 20% do solvente B, atingiu-se 60% em 20 min, retornou-se a 20% depois de 1 min e assim permaneceu por 6 min; com a coluna C18 iniciou-se com 30% do solvente B, atingiu-se 60% em 20 min, permanecendo assim por 13 min, retornou-se a 30% em 1 min e assim permaneceu por 6 min. Extraçao do LAS do lodo da ETE e do sedimento do rio As amostras de lodo da ETE (1 g) ou de sedimento do rio (10 g) foram secas a 105 ºC por 24 h e incorporadas com os surrogates para a concentraçao de 20 mg L-1. Em seguida, foram transferidas para o Soxhlet. Metanol (150 mL) foi utilizado para extrair o LAS e os surrogates por 8 h, e o extrato obtido foi evaporado para 100 mL. Preparaçao das amostras da ETE e do rio sem utilizaçao de SPE Os extratos de lodo da ETE ou de sedimento do rio, em alíquotas de 1 mL e 10 mL, respectivamente, foram evaporados a 60 ºC e o resíduo redissolvido com 1 mL de metanol:água (2:3 v/v). As amostras do afluente da ETE (5 mL), efluente do reator UASB (10 mL), efluente da lagoa de polimento (10 mL) ou da água do rio (10 mL) foram incorporados com os surrogates para a concentraçao de 20 mg L-1; em seguida, a fase aquosa foi evaporada a 60 ºC e o resíduo redissolvido com 1 mL de metanol:água (2:3 v/v). Preparaçao das amostras da ETE e do rio com utilizaçao de SPE O pré-tratamento das amostras com colunas SPE foi realizado com SAX e C18, individualmente e combinadas. Estas foram inicialmente ativadas, a SAX com n-hexano (5 mL), metanol (5 mL) e água (5 mL); e a C18 com metanol (5 mL) e água (5 mL). Em seguida, foram percolados os extratos do lodo (1 mL) ou sedimento do rio (10 mL), previamente diluídos com metanol:água (7:13 v/v), para nao comprometer a adsorçao do LAS e surrogates nas colunas; ou as amostras do afluente da ETE (5 ou 10 mL), efluente do reator UASB (10 ou 20 mL), efluente da lagoa de polimento (10 ou 20 mL) e água do rio (10, 50 ou 100 mL), previamente incorporadas com os surrogates para a concentraçao de 20 mg L-1. Em seguida, foi percolado metanol:água (7:13 v/v) para limpeza das colunas (5 mL), e por fim os solventes para eluiçao do LAS e surrogates; com SAX, utilizou-se ácido clorídrico 4 mol L-1 em metanol (5 mL), e com C18, metanol (5 mL). Os eluatos tiveram toda fase orgânica evaporada a 60 ºC e o resíduo redissolvido com 1 mL de metanol:água (2:3 v/v). Quando as colunas de SPE foram combinadas, a SAX foi a primeira a ser utilizada, o seu eluato foi neutralizado com soluçao aquosa de hidróxido de sódio 4 mol L-1 e percolado na coluna C18. O fluxo médio de percolaçao dos solventes e amostras nas colunas foi de 10 mL min-1. Validaçao dos métodos analíticos Após os procedimentos analíticos estabelecidos, eles foram validados em termos de (i) adequaçao do modelo matemático linear (faixa linear de trabalho) para o intervalo de concentraçao das curvas analíticas e da sua significância estatística pela ANOVA;27 (ii) dos limites de detecçao e quantificaçao a partir dos parâmetros das equaçoes de regressao;28 e (iii) do efeito matriz,29,30 para o método cromatográfico. Para os procedimentos de preparaçao das amostras com e sem utilizaçao de SPE, foram verificadas a recuperaçao do LAS, os surrogates e a precisao dos métodos.31,32
RESULTADOS E DISCUSSAO Método cromatográfico Condiçoes cromatográficas As condiçoes cromatográficas com as colunas analíticas C8 e C18 resultaram na separaçao dos quatro homólogos do LAS (Figura 1). No entanto, no método com a coluna C8, apenas um isômero foi separado (Figura 1a), ao passo que com a coluna C18, um mínimo de quatro isômeros foram separados em todos os homólogos (Figura 1b). Se o único propósito fosse a análise quantitativa dos homólogos, o método com a coluna C8 seria melhor, pois o tempo de análise foi mais curto (27 min) do que o do método com a C18 (40 min). Entretanto, se fosse para identificar em produtos comerciais a utilizaçao de LAS sintetizado com o catalisador HF (Figura 1b) ou AlCl3 (Figura 1c), como ocorreria a degradaçao dos homólogos, e consecutivamente do LAS, em termos dos isômeros (Figura 1d), o método com a coluna C18 seria melhor. Observa-se que a degradaçao dos homólogos do LAS iniciou-se nos isômeros com o grupo fenilsulfonato mais distante do final da cadeia linear (2Ø a 4Ø) (Figura 1d).
Figura 1. Cromatograma da separaçao dos homólogos e isômeros do LAS com a coluna C8 (a) e C18 (b) sintetizado com HF; da separaçao dos homólogos e isômeros do LAS com a coluna C18 (c) sintetizado com AlCl3 e degradaçao dos isômeros do LAS com a coluna C18 (d)
Validaçao do método cromatográfico A adequaçao do modelo linear ao intervalo de concentraçao das curvas analíticas foi verificada pela razao entre a média quadrática da falta de ajuste e a média quadrática do erro puro (MQfaj/MQep), para qual os valores de Fcalculado(Tabela 1) foram menores que Ftabelado (3,97) com 5 e 7 graus de liberdade e p = 0,05, indicando nao haver falta de ajuste do modelo no intervalo de concentraçao das curvas analíticas. A significância estatística das equaçoes de regressao foi verificada pela razao entre a média quadrática da regressao e a média quadrática dos resíduos (MQR/MQr), para qual os valores de Fcalculado (Tabela 1) foram maiores que Ftabelado (4,75) com 5 e 7 graus de liberdade e p = 0,05, indicando que o modelo linear foi significativo. O efeito matriz foi pouco pronunciado, com valores na faixa que corresponde à baixa interferência da matriz no sinal do detector (-20% < efeito matriz < 20%) (Tabela 1); portanto, nao influenciando nos limites de detecçao e quantificaçao do método, calculados a partir dos parâmetros das equaçoes de regressao.25 Os resultados apresentados na Tabela 1 referem-se ao método com a coluna analítica C18, mas os do método com a C8 foram muito semelhantes.
Preparaçao das amostras Métodos de preparaçao das amostras com e sem a utilizaçao de SPE A SPE foi utilizada nos casos em que interferentes coeluiram com os homólogos do LAS utilizando 5 e 10 mL da amostra, e nos casos de amostras com concentraçoes dos homólogos abaixo do limite de quantificaçao do método cromatográfico; nesse último foi necessária maior quantidade da amostra (>10 mL), o que levou à baixa exatidao e precisao e aumento dos interferentes na análise cromatográfica quando a SPE nao foi utilizada. Na Figura 2 tem-se o cromatograma da amostra concentrada sem SPE (>10 mL) (Figura 2a) e da amostra concentrada com SPE utilizando apenas a coluna C18 (50 mL) (Figura 2b); em ambos foram observados interferentes coeluindo com o homólogo C10. A remoçao desses interferentes (Figura 2c) foi realizada com a coluna de SPE SAX, seguida da C18, e o cromatograma resultante foi similar ao do padrao do LAS (Figura 2d), garantindo a seletividade da metodologia analítica. A coluna SAX atuou na remoçao dos interferentes nao polares e a C18, dos polares. Para as amostras da ETE, a coluna de SPE SAX ou C18 foi suficiente para remoçao dos interferentes quando presentes, sendo utilizadas sequencialmente (SAX seguida da C18) apenas nas amostras do rio.
Figura 2. Cromatograma da separaçao dos homólogos e isômeros do LAS na amostras sem pré-tratamento com SPE (a), com pré-tratamento com coluna de SPE SAX (b), com pré-tratamento com colunas de SPE SAX seguida da C18 (c) e da soluçao padrao do LAS (d)
Recuperaçao e precisao Validaçao dos métodos de preparaçao das amostras com e sem utilizaçao de SPE A recuperaçao para os homólogos do LAS foi de 100 a 110% com precisao de 1 a 4% para as amostras do afluente da ETE, efluente do reator UASB, efluente da lagoa de polimento e água do rio; e de 90 a 103% com precisao de 1 a 5% para amostras de lodo da ETE e de sedimento do rio (Tabela 2). Esses percentuais podem ser considerados satisfatórios e se encontram dentro da faixa de valores encontrada na literatura.19,28,33,34 A análise estatística (teste-t de Student independente) entre a recuperaçao dos homólogos do LAS e surrogates, nos casos sem e com utilizaçao de SPE, revela que nao houve diferenças significativas; ou seja, os valores do tcalculado foram menores que ttabelado (1,860) com 8 graus de liberdade e p = 0,05, com exceçao dos casos em que interferentes coeluiram com os homólogos do LAS. Na Tabela 2 sao apresentados os valores da recuperaçao pelos dois métodos utilizados na preparaçao das amostras. Aos valores da recuperaçao dos surrogates e homólogos do LAS das amostras do lodo da ETE e sedimento do rio, foram somadas também as variaçoes nas concentraçoes devido ao processo de extraçao com o Soxhlet.
O emprego dos surrogates possibilitou avaliar as interaçoes dos homólogos do LAS com as matrizes e determinar os erros aleatórios devido a essas interaçoes e os procedimentos de extraçao e preparaçao das amostras, principalmente para o lodo da ETE, para o qual foram obtidos os menores valores de recuperaçao (Tabela 2). O surrogate 2ØC8 apresentou valores maiores que os do 2ØC16, demonstrando que, quanto maior a cadeia linear do homólogo, maior sua adsorçao e, consecutivamente, sua concentraçao no lodo da ETE e no sedimento do rio. Como observado na Figura 3a, a concentraçao dos homólogos do LAS em ordem crescente foi: C10< C11< C12< C13. O inverso ocorreu para o afluente da ETE, efluente do reator UASB e água do rio (Figura 3b).
Figura 3. Cromatograma da distribuiçao dos homólogos do LAS em lodo da ETE e sedimento do rio (a) e afluente da ETE, efluente do reator UASB e água do rio (b)
A razao das áreas dos picos cromatográficos do surrogate 2ØC8 e homólogos C10 e C11 gerou valores muito próximos, assim como do surrogate 2ØC16 e os homólogos C12 e C13. Isso permitiu criar um fator para corrigir os desvios nas concentraçoes dos homólogos devido aos processos de preparaçao das amostras e análise cromatográfica, atuando também como um padrao interno. Aplicaçao dos métodos para quantificaçao do LAS em ETE e rio As concentraçoes de LAS no afluente da ETE (P1), efluente do reator UASB (P2) e efluente da lagoa de polimento (P3) diminuíram gradativamente de P1 para P3 (Figura 4a). A remoçao total do LAS na ETE foi considerada satisfatória, sendo uma parcela removida no reator UASB e outra na lagoa de polimento (LP). Nesta unidade ocorreu uma maior eficiência de remoçao do LAS (Figura 4b). No reator UASB, a remoçao foi predominantemente por adsorçao do LAS no lodo (Figura 4c). A massa de LAS adsorvida no lodo foi 461 a 1367 vezes maior que a massa dissolvida no afluente da ETE e efluente do reator UASB, respectivamente. Essa comparaçao foi realizada assumindo os mesmos volumes para as três amostras e as respectivas concentraçoes de LAS. Para o caso do lodo, foi determinada previamente a sua densidade (d = 1,07 ± 0,05 mg L-1).
Figura 4. Concentraçao do LAS na ETE Mangueira em P1 (afluente), P2 (efluente do reator UASB) e P3 (efluente da lagoa de polimento - LP) (a), eficiência de remoçao do LAS na ETE, reator UASB e LP (b), concentraçao do LAS no lodo do reator UASB (c), concentraçao do LAS no ponto de encontro do efluente da ETE com o rio Jíquiá (J2), em um ponto à montante (J1) e à jusante (J3) do ponto de encontro (d) e no sedimento do rio Jiquiá nos pontos J1, J2 e J3 (e)
Na LP, os mecanismos atuantes na remoçao do LAS foi a adsorçao nos sólidos suspensos e degradaçao biológica. A sua degradaçao foi constatada qualitativamente a partir dos cromatogramas das análises do seu efluente com o método cromatográfico com a coluna analítica C18, como apresentado previamente na Figura 1d. Nesse, constatou-se a falta de sinal (picos) para os isômeros com o grupo fenilsulfonato mais distante da cadeia linear. Essa constataçao também foi coerente com o ambiente da LP, o qual é predominantemente aeróbio, com níveis de oxigênio dissolvido de até 8 mg L-1, portanto, em condiçoes nas quais a degradaçao biológica do LAS é largamente comprovada. Na Figura 4d sao apresentados os resultados das concentraçoes de LAS nas águas do rio Jiquiá; observa-se que, em geral, elas nao diferiram entre os três pontos de coleta, exceto em setembro de 2009, quando ocorreram as maiores concentraçoes. Em todo o período de monitoramento e em todos os pontos de coleta, as concentraçoes de LAS foram superiores aos limites definidos por orgaos de controle ambiental para águas de rios. Nos sedimentos as suas concentraçoes foram acima de 0,035 g kg-1 de matéria seca (Figura 4e), que pode causar efeito tóxico para os organismos do ecossistema terreste.2,3 Essas concentraçoes maiores de LAS, tanto nas águas, como nos sedimentos, foram associadas ao aumento de moradias desordenadas às margens do rio e em seu entorno. Como nem todas as moradias existentes ou novas sao atendidas por sistemas de tratamento de efluentes, o resultado foi um aumento gradual do lançamento de efluentes domésticos nao tratados no rio Jiquiá ao longo dos anos. Caso isso nao ocorresse, a única fonte de LAS para o rio, apesar de possuir baixíssima concentraçao, seria o efluente da ETE, o qual ao se misturar com as águas do rio ainda seria mais diluído; consequentemente, as concentraçoes do LAS no rio certamente se enquadrariam no valor padrao definido pela legislaçao ambiental. O método com a coluna C18 também foi utilizado para avaliar a degradaçao do homólogo C10 e seus isômeros (2ØC10, 3ØC10, 4ØC10 e 5ØC10) (Figura 5a) por micro-organismos facultativos em reator em escala de laboratório. Ele mostrou que a degradaçao do homólogo C10 iniciou-se nos isômeros 2ØC10 e 3ØC10 (Figura 5b), seguido do 4ØC10 (Figura 5c). Esse resultado foi associado ao efeito do impedimento estérico, causado pelo grupo fenilsulfonato, o qual é menor nos isômeros em que ele está mais distante do final da cadeia linear, onde a degradaçao é iniciada.35,36 Essa constataçao pode ser estendida aos demais homólogos, pois têm a mesma funçao química, diferindo apenas no número de átomos de carbonos na cadeia linear. Ainda, os isômeros com o grupo fenilsulfonato em uma mesma posiçao sao mais facilmente degradados nos homólogos com cadeias lineares maiores, pois estao mais distantes do final da cadeia. Por exemplo, o isômero 2ØC13 é degradado mais rapidamente que o 2ØC12 e assim sucessivamente, logo, os homólogos com maior cadeia alquílica sao também os mais facilmente degradados.
Figura 5. Cromatograma do homólogo C10 com os isômeros 2ØC10, 3ØC10, 4ØC10 e 5ØC10 (a), com os isômeros 4ØC10 e 5ØC10 (b) e o isômero 5ØC10 (c)
CONCLUSAO Os métodos cromatográficos com as colunas C8 e C18 foram excelentes na quantificaçao dos homólogos do LAS. No entanto, o método com a C18 foi melhor na separaçao dos isômeros e com isso foi possível avaliar qualitativamente a degradaçao dos homólogos do LAS em funçao da degradaçao dos seus respectivos isômeros. A quantificaçao do LAS nas amostras do rio foi mais exata e precisa quando se utilizou as colunas de SPE SAX seguida da C18, já para as amostras da ETE a SPE se mostrou desnecessária. A recuperaçao do LAS e surrogates após extraçao do lodo anaeróbio e sedimento de rio com Soxhlet, e os procedimentos para concentraçao do LAS utilizando ou nao a SPE, foi alta, assim como a precisao dos métodos, para todas as matrizes estudadas. Os surrogates mostraram que as interaçoes do LAS com as diferentes matrizes e colunas de SPE sao constantes, o que permitiu utilizá-los também como padrao interno, para corrigir desvios na concentraçao do LAS, desde a preparaçao da amostra até a análise cromatográfica. A ETE Mangueira foi eficiente na remoçao do LAS, caracterizando o reator UASB na sua remoçao por adsorçao ao lodo e a lagoa de polimento por adsorçao aos sólidos suspensos e degradaçao biológica. Nas águas do rio Jiquiá, as concentraçoes de LAS foram superiores aos valores definidos por órgaos ambientais; e no sedimento também apresentaram valores considerados tóxicos para os organismos do ecossistema terrestre. Ambas as ocorrências sao atribuídas ao lançamento de efluentes nao tratados. Os métodos propostos apresentaram a possibilidade de aplicar a coluna C18 para avaliar qualitativamente a degradaçao do LAS em funçao de seus isômeros, as diferentes possibilidades de utilizaçao da SPE em relaçao a diferentes matrizes ambientais; e que o uso do Soxhlet, para extraçao do LAS de lodo de ETE e sedimento de rio, tem eficiência similar aos métodos de extraçao ultimamente descritos na literatura, como a extraçao líquida pressurizada e micro-ondas, estes porém, com maiores custos de aquisiçao e manutençao.
MATERIAL SUPLEMENTAR Algumas tabelas que nao foram apresentadas neste texto estao disponíveis em http://quimicanova.sbq.org.br, na forma de arquivo PDF, com acesso livre.
AGRADECIMENTOS A DETEN Química (Camaçari - BA) e à CEPSA Química (San Roque, Espanha) pelo apoio a pesquisa sobre LAS; à COMPESA e à Fibra Revestimentos LTDA pelo apoio aos trabalhos de campo e na estaçao experimental da UFPE na ETE Mangueira; às agências de fomento Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Coordenaçao de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Fundaçao de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (FACEPE) pelo auxílio financeiro ao trabalho e pelas bolsas concedidas.
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