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14:37, qui nov 21

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Revisão


Estratégias e materiais utilizados em fotocatálise heterogênea para geração de hidrogênio através da fotólise da água
Strategies and materials used in heterogeneous photocatalysis applied to hydrogen generation through water photolysis

Fabielle C. Marques1; Alexandre M. Stumbo2; Maria C. Canela2,*,#

1. Instituto Federal do Espírito Santo, Rodovia BR 482, Cachoeiro x Alegre - Km 6,5, Morro Grande, 29311-970 Cachoeiro de Itapemirim - ES, Brasil
2. Laboratório de Ciências Químicas, Centro de Ciência e Tecnologia, Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Av. Alberto Lamego, 2000, 28013-602 Campos dos Goytacazes - RJ, Brasil

Recebido em 05/07/2016
Aceito em 24/11/2016
Publicado na web em 10/02/2017

Endereço para correspondência

*e-mail: mccanela@gmail.com
#e-mail alternativo: mccanela@uenf.br

RESUMO

Among the various technologies for the production of hydrogen fuel, heterogeneous photocatalysis is one of the most promising, especially with the use of semiconductors, notably TiO2. However, the use of TiO2 is limited by hindrances for the photolysis of water, such as wide bandgap, a less negative conduction band reduction potential as compared to that of hydrogen evolution and the high electron/hole recombination rate. Deactivation of the semiconductor can be avoided by the addition of electron-rich compounds (sacrificial reagents) which react irreversibly with the hole, leading to a higher quantum efficiency. Another strategy is the Z scheme. In this system, two different photocatalysts (or photosystems) are combined using a suitable redox mediator. Furthermore, the bandgap can be adjusted by doping with transition metal oxides, with control of metal oxide valence band using p-orbitals of an anion, or s-orbitals of p-block metal ions, or by spectral sensitization. In view of these questions, the purpose of this review article is to describe and discuss recent studies that use a variety of materials for the photocatalytic generation of hydrogen.

Palavras-chave: hydrogen; photocatalysis; water splitting; Z scheme.

INTRODUÇAO

A procura por fontes que assegurem o suprimento de energia, os altos preços do petróleo e as emissoes crescentes de gases do efeito estufa constituem desafios ainda nao resolvidos para a economia global e o clima do planeta. Há um consenso na comunidade internacional de que é preciso uma açao urgente para enfrentar os problemas de curto prazo sobre suprimento de energia e mitigar as mudanças futuras do clima, e que a tecnologia e a política sao partes desta soluçao.1

Em 2015 foi publicado pela Agência Internacional de Energia (IEA), em Paris, o World Energy Outlook Special Report - Energy and Climate Change. Este relatório prevê um aumento da demanda por energia de 40% até 2030, e a necessidade de reduçao das emissoes e substituiçao de combustíveis fósseis.2 Com base nas projeçoes apresentadas pela IEA, pode-se esperar por um agravamento do aquecimento global e escassez de recursos fósseis se outras fontes de produçao de energia nao forem utilizadas. Portanto, a produçao e utilizaçao de energias alternativas tornam-se um dos maiores desafios da atualidade. De forma mais dramática, segundo o relatório Energy [R]evolution 2015, publicado pelo Greenpeace, Global Wind Energy Council e Solar Power Europe em setembro de 2015, a única maneira de estabilizar as emissoes de CO2 até 2020 e reduzir a zero em 2050 seria alterar imediatamente a matriz energética mundial para 100% de energias renováveis.3

Dentre as fontes alternativas de energia, o hidrogênio é uma opçao atrativa, pois possui elevada energia por unidade de massa (1 kg de hidrogênio contém aproximadamente a energia de 2,7 kg de gasolina), o que facilita a portabilidade da energia.4 Além disso, sua combustao nao gera contaminante, mas apenas água.

Embora a combustao do hidrogênio nao produza gases de efeito estufa, cerca de 95% do hidrogênio consumido no mundo é gerado a partir de materiais fósseis, sendo obtido principalmente a partir da reforma a vapor de hidrocarbonetos como o metano e nafta (subprodutos do refino do petróleo).5 Este processo, além de demandar grande quantidade de energia para ocorrer (a decomposiçao do combustível em hidrogênio somente ocorre em temperaturas superiores a 700 ºC), produz uma mistura de monóxido de carbono e hidrogênio. Para que a produçao de hidrogênio seja considerada sustentável, é necessário o desenvolvimento de processos que atendam aos seguintes requisitos: que a fonte geradora seja renovável; que nao haja grande demanda de energia; que nao ocorra a produçao de poluentes como subprodutos; e que seja um processo técnica e economicamente viável.

Os avanços tecnológicos nas áreas de produçao de hidrogênio de forma eficiente, econômica e ambientalmente correta, estao acontecendo em todo o mundo. Dentre as diversas tecnologias para a produçao de hidrogênio, destaca-se a de fotocatálise heterogênea, principalmente com uso de semicondutores.5-7 Apesar de ser um processo eficiente, o uso de luz UV artificial ainda torna o processo fotocatalítico pouco aplicável para escalas industriais. Na intençao de prover condiçoes para a mudança neste paradigma, pesquisas recentes estao voltadas ao desenvolvimento de materiais com aproveitamento cada vez maior da luz visível do espectro solar, com o objetivo claro de se utilizar uma fonte de energia limpa, segura, renovável e principalmente abundante.

 

PRINCIPIOS DA FOTOCATALISE HETEROGENEA

A fotocatálise heterogênea tem sua origem na década de setenta, quando pesquisas em células fotoeletroquímicas começaram a ser desenvolvidas, com o objetivo de produçao de combustíveis a partir de materiais baratos, visando a transformaçao da energia solar em química. Em 1972, um trabalho de Fujishima e Honda8 descreveu a oxidaçao da água promovida por TiO2 em suspensao, o qual foi irradiado em uma célula fotoeletroquímica, gerando hidrogênio e oxigênio. A partir desta época, muitas pesquisas foram dedicadas ao entendimento de processos fotocatalíticos envolvendo a oxidaçao da água e íons inorgânicos, quando espécies semicondutoras eram irradiadas por luz. O desenvolvimento teórico que explica os fenômenos associados ao processo de desenvolvimento fotocatalítico dos semicondutores envolve os conceitos de teoria de bandas em sólidos e já foi descrita por vários autores.9-12

Os semicondutores de interesse em fotocatálise sao sólidos em que os átomos constituem uma rede tridimensional infinita. A sobreposiçao dos orbitais atômicos vai além da vizinhança, estendendo-se por toda a rede (N orbitais); resulta, entao, numa configuraçao de estados deslocalizados muito próximos entre si, que formam a banda de valência (BV), de menor energia, e a banda de conduçao (BC), de maior energia. Entre as bandas há intervalos de energia nos quais nao há estados eletrônicos "permitidos", sendo que cada um destes intervalos é chamado de banda de energia proibida ou gap.13

No caso da fotocatálise, a forma de gerar o par lacuna/elétron é via irradiaçao por luz com comprimento de onda dado por: λg = Eg/hc, em que h é a constante de Planck e c é a velocidade da luz. A absorçao de fótons de energia maior que Eg (fotoexcitaçao) promove elétrons da banda de valência para a banda de conduçao (e-BC), e para cada elétron promovido, produz-se uma lacuna na banda de valência (h+BV). Como a maioria dos semicondutores é constituída por sólidos nanocristalinos, as cargas do par elétron/lacuna podem migrar para a superfície da partícula e produzir sítios oxidantes e redutores.

As posiçoes das bandas limites de vários semicondutores sao apresentadas na Figura 1. A escala de energia interna é dada à esquerda por comparaçao com o nível no vácuo e à direita por comparaçao com um eletrodo normal de hidrogênio, (ENH). As posiçoes sao derivadas dos potenciais das bandas dos sólidos em contato com uma soluçao de pH = 1. Enquanto os elétrons fotogerados na superfície podem ser doados para algum aceitador pré-adsorvido, as lacunas localizadas na BV podem mostrar potenciais bastante positivos (oxidantes), na faixa de +0,5 V a +3,0 V, medidos contra um eletrodo normal de hidrogênio (ENH), e, portanto, receber elétrons com muita facilidade de espécies adsorvidas.

 


Figura 1. Principais semicondutores utilizados em fotocatálise: energia de bandgap e potencial redox em soluçao a pH=1. Reimpresso da Ref. 14 com permissao. Copyright 1995 American Chemical Society

 

GERAÇAO DE H2 POR FOTOCATALISE

A geraçao de H2 sem a utilizaçao de um potencial externo, contrariando o método de Fujishima e Honda, é o que conhecemos hoje como Water Splitting, cuja teoria será explanada a seguir. Vários trabalhos insistem na utilizaçao de semicondutores para produçao de hidrogênio, notoriamente o TiO2, devido principalmente ao seu baixo custo, alta estabilidade, insolubilidade em água e baixa toxicidade.15-17

Mesmo que o TiO2 possa ser fotoexcitado por uma irradiaçao acima do bandgap, a molécula de H2O nao pode ser fotodecomposta sobre uma superfície de TiO2 devido à presença de um largo sobrepotencial para a evoluçao de H2 e O2 na superfície do TiO2. Sato e White demonstraram que a evoluçao de hidrogênio em umidade na superfície do TiO2 nao é devido à quebra da molécula de água via fotocatálise, mas causada pela oxidaçao fotoassistida nas vacâncias de oxigênio de TiO2 reduzido.16

Os detalhes do mecanismo para a fotodecomposiçao da água no TiO2, ou reaçoes de reduçao envolvendo o sistema TiO2-água, permanecem controversos até os dias atuais. Um número razoável de pesquisadores tem divulgado a formaçao de muitas espécies de radicais através de medidas de RPE. Gonzalez-Elipe et al.18 relataram a geraçao das espécies HO2· e O-· ou O23. por radiaçao de luz UV em TiO2 hidratado. Anpo et al.19 observaram a formaçao de radicais HO·- a 77 K em anatásio hidratado em condiçoes de energia acima do bandgap. Radicais hidroxila nao sao produtos primários deste processo e sua existência é transiente, devido a sua alta reatividade.18 Este processo ocorre nas seguintes etapas (reaçoes 1-4):

A reaçao total é:

Na ausência de um catalisador, a reaçao global é termodinamicamente desfavorável (ΔGº= +238 kJ mol-1), e a Energia de Limiar (EL) necessária para a ocorrência da fotólise é dada pela Equaçao 1:

Sendo que NA é o número de Avogadro. De acordo com a equaçao, a energia mínima para a fotodecomposiçao pode ocorrer com a incidência de energia luminosa com comprimentos de onda ≤1000 nm, ou seja, >1,23 eV, o que corresponde a fótons com energia na faixa do infravermelho próximo. No entanto, para usar luz visível, o bandgap precisa ser <3,0 eV (>400 nm).20

Teoricamente, se o potencial de reduçao na banda de conduçao de um semicondutor for mais negativo do que aquele da evoluçao do hidrogênio, e se o potencial da banda de valência for mais positivo do que da evoluçao do oxigênio, o material possivelmente pode ser utilizado para decompor a água em H2 e em O2, conforme ilustrado na Figura 2.

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Figura 2. Princípio básico de geraçao fotocatalítica de H2 através da irradiaçao de semicondutores. Reimpresso da Ref. 21 com permissao. Copyright 2007 American Chemical Society

 

Outra dificuldade na utilizaçao do TiO2 é o baixo tempo de vida dos fotoelétrons gerados. O tempo de recombinaçao do par elétron/lacuna é menor comparado ao tempo necessário para o par elétron/lacuna alcançar a superfície. Assim, apenas uma pequena parte dos elétrons gerados consegue migrar para a superfície.15 Além da pouca quantidade de fotoelétrons na superfície, as velocidades das reaçoes de reduçao e oxidaçao da água sao menores comparadas à velocidade de recombinaçao do par elétron/lacuna. Conforme essas condiçoes, a eficiência do TiO2 em água pura é baixíssima, tornando necessária a adiçao de agentes de sacrifício para viabilizar a utilizaçao do TiO2 na produçao de H2.

Combinaçao: doadores de elétrons e fotocatalisador

A razao dos baixos rendimentos de H2 quando se utiliza TiO2 em água pura é a alta velocidade de recombinaçao elétron/lacuna que cessa o efeito fotocatalítico após curto período de iluminaçao. Uma das formas de se evitar a desativaçao do TiO2 é a aplicaçao de compostos doadores de elétrons (reagentes de sacrifício) para reagir de forma irreversível com as lacunas, resultando em uma maior eficiência quântica. Uma vez que o reagente de sacrifício é consumido durante a reaçao fotocatalítica, a adiçao contínua de doadores de elétrons é necessária para sustentar a produçao de hidrogênio.17

Galinska e Walendziewski22 estudaram a influência de I-, IO3-, Na2S, EDTA e metanol na geraçao de H2 pela fotólise da água, usando o sistema Pt-TiO2 irradiado com luz UV, e verificaram que, na presença do metanol, a atividade da reaçao em funçao da geraçao de H2 foi a maior entre os doadores de elétrons utilizados (11,50 mmol/90 min), em funçao do hidrogênio ser parcialmente gerado pelo consumo do metanol. Contrapondo o trabalho de Hara et al.,23 o EDTA, assim como o metanol, teve mais influência na geraçao de H2 do que o Na2S. A geraçao de H2 foi de 2,209 mmol/90 min quando se usou EDTA. Os estudos indicam que o EDTA captura radicais HO·- e impede a recombinaçao do par elétron/lacuna, que resultaria na reaçao de oxigênio com hidrogênio.22

O uso de reagentes de sacrifício é uma alternativa para remover um dos produtos da fotodecomposiçao e assim deslocar o equilíbrio no sentido de aumentar a geraçao de hidrogênio. Neste caso, a espécie de sacrifício pode ser oxidada pelo produto da reaçao na lacuna (presumidamente O2) ou reduzida pelo produto originário pelo elétron fotogerado (presumidamente H2).17 Por exemplo, quando um álcool, tal como CH3OH, é adicionado a uma suspensao aquosa de TiO2, sustenta-se que a produçao de H2 é observada sob radiaçao UV e a molécula de álcool é oxidada a CO2.14 Um reforço a esta afirmaçao foi um estudo no qual uma grande variedade de componentes derivados de biomassa foi testada por Kondarides et al.,24 a exemplo de monossacarídeos como pentoses (ribose, arabinose) e hexoses (glicose, galactose, frutose e manose), álcoois (metanol, etanol, propanol e butanol) e ácidos orgânicos (ácido acético, ácido fórmico). Em todos os casos, as quantidades de H2 e CO2 produzidas estao de acordo com a estequiometria da reaçao de reforma e todo o processo pode ser representado pela equaçao da reaçao global (6) abaixo:

EDTA, metanol, etanol, CN-, ácido lático e formaldeído foram testados e revelaram-se eficazes para aumentar a produçao de hidrogênio.25-27 Nada et al.28 realizaram uma pesquisa de investigaçao qualitativa para estudar os efeitos de diferentes doadores de elétrons sobre a produçao de hidrogênio. A classificaçao em termos do grau de capacidade de produçao de hidrogênio foi: EDTA > metanol > etanol > ácido lático. Deve-se notar que a decomposiçao destes hidrocarbonetos pode também contribuir para um rendimento mais elevado de hidrogênio, uma vez que o hidrogênio é um dos seus produtos de decomposiçao.28

Outra vertente em que os semicondutores têm sido aplicados como mediadores em processos fotocatalíticos é a de mineralizaçao de poluentes orgânicos concomitante à geraçao de H2 em soluçoes aquosas. Jang et al.29 estudaram a geraçao de hidrogênio simultaneamente à degradaçao fotocatalítica de H2S. Neste caso, os pesquisadores sintetizaram o compósito CdS/TiO2 em suspensao aquosa e irradiaram com lâmpada de Hg de 500 W equipada com filtro para λ≤420 nm. O íon HS- atuou com doador de elétrons, permitindo que a reduçao da água fosse intermitente.

A diversidade de reagentes de sacrifício testados por diversos autores é enorme, e podem ser escolhidos de acordo com as demandas locais. Preocupados com a poluiçao por resíduos provenientes da produçao de óleo de oliva, pesquisadores italianos realizaram testes para geraçao de hidrogênio com concomitante degradaçao de moléculas orgânicas presentes no resíduo. Neste estudo, Speltini et al.30 verificaram que, após 4 h de irradiaçao UV-A, uma suspensao a pH=3 de 2 g L-1 de Pt/TiO2, contendo 3,3% (v/v) de resíduo de produçao de óleo de oliva produziu 44 µmol de hidrogênio. Em outro trabalho do mesmo autor, hidrogênio foi produzido por fotocatálise via water splitting na presença de esgoto proveniente de suinocultura como reagente de sacrifício. No trabalho, o hidrogênio foi gerado sob irradiaçao UV-A e luz solar na presença de óxido de titânio platinizado como catalisador. O resíduo foi coletado num estabelecimento localizado no norte da Itália e, após centrifugado e diluído com água, foi testado para a geraçao de H2 na presença do catalisador e luz. Sob condiçoes ótimas, os autores obtiveram 50 µmol de gás hidrogênio em 4 h de teste fotocatalítico, no qual se utilizou 1,7% em volume do resíduo. No estudo, fez-se uma comparaçao com outros reagentes de sacrifício usuais e o rendimento em termos de hidrogênio foi aproximadamente o dobro em comparaçao com o esgoto de suínos, indicando assim a viabilidade da concomitante geraçao de H2 com eliminaçao de poluentes.31 Neste mesmo propósito, Souza e Silva32 avaliaram a geraçao fotocatalítica de hidrogênio usando lodo de curtume como reagente de sacrifício. No estudo, os pesquisadores utilizaram CdS como fotocatalisador e Pt como co-catalisador e os testes foram realizados sob luz visível. Em condiçoes ótimas (pH=13, 60 mg CdS, 50% de resíduo e ausência de Pt), a quantidade de hidrogênio gerada foi de 184 µmol após 27 h de irradiaçao. Ainda, verificou-se que a concentraçao de íons S-2 (presente no processo de produçao do resíduo) diminuiu durante o teste devido à sua atuaçao como capturador de lacunas fotogeradas.

A degradaçao de corantes acompanhada pela geraçao de hidrogênio também foi explorada por Ravishankar et al.33 No estudo, nanopartículas de TiO2:Ag foram utilizadas num teste fotocatalítico em situaçao real, ou seja, aproveitando a luz solar (750 W m-2) dos meses de novembro a dezembro em Bangalore, India. Testes também foram realizados em situaçao simulada, utilizando-se luz ultravioleta (125 W m-2). O corante utilizado como reagente de sacrifício foi o trypan blue, material muito utilizado para tingimento de náilon, la, algodao, seda e também para a coloraçao de óleos, gorduras, ceras, vernizes, plásticos, etc. Os autores concluiram que as nanopartículas TiO2:Ag geraram 2230 µmol de H2 por 1 g de fotocatalisador, durante 2,5 h de teste. A degradaçao total do corante se processou em concentraçoes menores do poluente (5-15 ppm) e tendeu a diminir a conversao a concentraçoes maiores, atribuída à saturaçao de sítios ativos e diminuiçao da penetraçao de luz.

Alguns trabalhos utilizaram com sucesso o glicerol para reforma via fotocatálise, com concomitante geraçao de H2 pela decomposiçao fotocatalítica da água. Daskalaki e Kondarides34 investigaram a fotorreforma de glicerol com o uso do fotocatalisador Pt/TiO2 por irradiaçao de luz ultravioleta. Os resultados obtidos mostram que o hidrogênio pode ser produzido eficientemente a partir da reforma fotocatalítica de soluçoes aquosas de glicerol e, eventualmente, uma conversao completa de glicerol a H2 e CO2. Os melhores resultados foram obtidos com o fotocatalisador TiO2 carregado com 0,1-2,0% em massa de Pt, proporcionando taxas de produçao de hidrogênio de 24,0 a 28,2 µmol h-1. De maneira similar, Liu et al.35 produziram hidrogênio por fotocatálise utilizando TiO2 impregnado com 10% em massa de NiOx numa suspensao de água e glicerol a 20% (v/v). O teste foi realizado utilizando uma lâmpada de vapor de mercúrio de 500 W, cuja radiaçao se encontra predominantemente em 365 nm, 460 nm e 466 nm. A velocidade inicial para produçao de hidrogênio com concomitante reforma do glicerol foi de 900 µmol h-1. Languer et al.36 também investigaram a fotorreforma do glicerol, utilizando nanotubos de TiO2 impregnados com Pt. Os nanotubos foram preparados pela anodizaçao de Ti, e após tratamento térmico, Pt foi depositada no material. Sob irradiaçao UV, os autores do trabalho observaram a formaçao de 0,2 µmol h-1 cm-2 de hidrogênio numa suspensao contendo o fotocatalisador numa soluçao de água/glicerol na proporçao 1/6,6 (v/v).

Num trabalho semelhante ao de Liu et al.,35 Fujita et al.37 realizaram a reaçao de fotólise da água com a utilizaçao de NiO/TiO2 suspenso numa soluçao aquosa de glicerol, irradiado com lâmpada de vapor de mercúrio de 500 W. No estudo, os pesquisadores verificaram a influência da concentraçao do glicerol na velocidade de geraçao de hidrogênio. A velocidade de geraçao de H2 aumentou linearmente com a concentraçao de glicerol, quando este foi menor que 0,5 mol L-1. Acima disso, a velocidade de reaçao nao aumentou mais que 1200 µmol g-1 h-1. Isto indicou, segundo os autores, que a interaçao do glicerol no catalisador obedece o modelo de adsorçao de Langmuir. A constante da velocidade de adsorçao de pseudo-primeira ordem foi de 1,3 mol g-1 h-1 e a constante de equilíbrio para adsorçao-dessorçao de glicerol foi de 3,0 L mol-1.

Novos materiais empregando o Esquema Z

O sistema convencional de geraçao fotocatalítica de H2, descrita na Figura 2, em que hidrogênio e oxigênio gasosos sao formados em um único passo, apresenta algumas dificuldades experimentais:

a) muitos materiais só sao ativos na regiao do UV;

b) mesmo absorvendo luz visível, apresentam um potencial de reduçao da banda de conduçao mais positivo que o potencial de reduçao do H+ a H2;

c) também requerem o uso de reagentes de sacrifício como doares irreversíveis de elétrons para evitar a recombinaçao elétron/lacuna. Neste caso, a geraçao de H2 nao segue o mecanismo convencional;

d) a maioria dos fotocatalisadores nao gera H2 e O2 em proporçoes estequiométricas (2:1).

O desenvolvimento de fotocatalisadores irradiados por luz visível para decomposiçao da água em duas etapas foi originalmente introduzido por Bard,38 em 1979. Este sistema, inspirado na fotossíntese natural em plantas verdes, em que CO2 e água sao combinados para formar carboidrato e O2, foi chamado Esquema Z. Neste sistema, dois diferentes fotocatalisadores (ou fotossistemas) sao combinados usando um mediador redox apropriado. Neste caso, a luz visível pode ser utilizada de forma mais eficiente do que em sistemas convencionais, porque a energia necessária para conduzir cada fotocatalisador é reduzida.

A estratégia é utilizar materiais ativos no visível, porém em uma combinaçao de tal forma que um dos fotocatalisadores tenha um potencial de reduçao na banda de conduçao mais negativo que o potencial de reduçao do H+ a H2 e outro tenha um potencial na banda de valência mais positivo que o potencial de oxidaçao da água em O2. Por exemplo, o potencial da banda de conduçao do WO3 impede a sua utilizaçao para uma evoluçao de H2, mesmo na presença de metanol.39 No entanto, WO3 é capaz de produzir O2 de uma soluçao aquosa contendo recebedores de elétrons apropriados (Fe2+/Fe3+) sob luz visível, conforme ilustrado na Figura 3.40

 


Figura 3. Exemplo do Esquema Z. Reimpresso da Ref. 40 com permissao. Copyright 2010 Elsevier Inc.

 

No caso acima, as reaçoes envolvidas sao:

Fotossistema 1 (reaçoes 7-10):

A reaçao de oxidaçao do ferro acima ocorre na banda de valência do semicondutor, que apresenta potencial para reduzir a água. A reaçao de reduçao do Fe3+, que ocorre na banda de conduçao do material com a capacidade de evoluir o O2, seria:

Fotossistema 2 (reaçoes 7,8, 11,12):

As vantagens deste sistema sao:

a) Quando o potencial redox do mediador está localizado entre os potenciais de H+/H2O e O2/H2O, a mudança de potencial químico (ΔG) em cada fotossistema é menor do que a reaçao total;

b) É possível dividir os fotocalisadores em dois vasos reacionais, separando-os por membranas, e, neste caso, observa-se a evoluçao dos gases separadamente;

c) Dispensa a utilizaçao de reagentes de sacrifício. No Esquema Z, os mediadores atuam de forma reversível.

As desvantagens deste sistema sao: primeiro, que deve-se utilizar o dobro de fótons, quando comparado com o sistema convencional, apesar de os comprimentos de onda utilizados nos dois fotossistemas serem diferentes. E segundo, requer, obviamente, dois fotocatalisadores, que podem dificultar a operaçao do sistema por suas diferentes características, como, por exemplo, desativaçao.41

Um exemplo de utilizaçao do Esquema Z foi reportado por Higashi et al.,42 no qual os pesquisadores utilizaram oxinitretos mistos de tântalo ATaO2N (A=Ca, Sr, Ba) para geraçao de hidrogênio. Os pesquisadores utilizaram a combinaçao Pt/ATaO2N e Pt/WO3 em água, na presença dos mediadores redox I-/IO3-. Demonstrou-se que a presença do par redox melhora a atividade na regiao visível, para produçao estequiométrica de H2 e O2 pela fotólise da água, e o fotocalisador manteve-se estável quanto a fotodecomposiçao a N2. A evoluçao da produçao de hidrogênio e oxigênio na superfície do Pt/ATaO2N e Pt/WO3, respectivamente, é mostrada na Figura 4:

 


Figura 4. Evoluçao no tempo para o H2 e O2 sobre a mistura de do Pt/BaTa-O2N (30 mg) e Pt-WO3 (30 mg) em soluçao aquosa de 5 mmol/L de NaI sob luz visível (λ > 420 nm). Reimpresso da Ref. 42 com permissao. Copyright 2009 American Chemical Society

 

Em outro trabalho, Yan et al.43 utilizaram a combinaçao de TiO2 com C3N4 para a reaçao de fotólise da água. O material foi suspenso numa soluçao de mediadores redox I-/IO3- ou Fe2+/Fe3+ e irradiado com lâmpada de xenônio (comprimento de onda variando de 200 a 2500 nm). Os autores relataram que o material apresentou boa estabilidade, e a velocidade de reaçao em funçao da evoluçao de hidrogênio foi de 154 µmol h-1.

Outras estratégias e materiais usados em fotocatálise na geraçao de H2

Decompor a água utilizando um óxido metálico sob luz visível (λ>400 nm) permanece um desafio. Em geral, o potencial da banda de conduçao de um fotocatalisador de óxido metálico é formado pelos orbitais d vazios de um metal de transiçao ou orbitais s, p de um típico metal, que se encontra acima do potencial de reduçao do H+ a H2 (0 V vs ENH a pH 0). Por outro lado, o potencial da banda de valência, que consiste de orbitais 2p do oxigênio, é consideravelmente mais positivo do que o potencial de oxidaçao da água (1,23 V vs ENH a pH 0). Scaife44 estudou esta situaçao, examinando a relaçao entre o potencial de flat-band (VFB) e o bandgap (Eg) de vários óxidos metálicos, encontrando a seguinte Equaçao 2 empírica:

A banda de conduçao de semicondutores do tipo-n é quase sempre o mesmo que o potencial de flat-band, e a energia de bandgap de semicondutores para se utilizar a luz visível dever ser menor que 3 eV. Assim, o potencial da banda de conduçao para muitos óxidos semicondutores que sao ativos no visível deveria ser positivo, tornando inviável a reduçao da água a H2. No entanto, a equaçao empírica, relatada por Scaife, nao é obedecida para alguns óxidos que contêm metais de transiçao, tais como Cr3+, Ni2+ e Fe3+.45

Do ponto de vista da conversao de energia solar, no entanto, o desenvolvimento de um fotocatalisador que decompoe a água de forma eficiente em luz visível (λ> 400 nm) é indispensável. Até o início dos anos 1990, apenas alguns calcogenetos e óxidos metálicos (por exemplo, o CdS e WO3) eram conhecidos por serem fotocataliticamente ativos sob luz visível.45-47 Certos calcogenetos metálicos, incluindo CdS e CdSe, pareciam ser fotocatalisadores adequados para decomposiçao da água, exibindo energias de bandgap suficientemente pequenas para permitir absorçao de luz visível e ter potenciais da banda de conduçao e de valência apropriados para a reduçao da água e para a oxidaçao. Estes calcogenetos metálicos, no entanto, nao sao estáveis, porque os anions S2- e Se2- sao mais suscetíveis à oxidaçao do que a água, fazendo com que os catalisadores CdS ou CdS e sejam oxidados e degradados. Ainda assim, recentes trabalhos sugerem que o ajuste principalmente de pH e salinidade do meio podem aumentar a estabilidade de CdS por reduzir a solubilidade do sulfeto em soluçao aquosa, ou mesmo que esta estabilidade pode ser melhorada com a utilizaçao de sulfetos metálicos em sistemas fotocatalíticos multifases, como por exemplo, Cd1-xZnxS/Zn(OH)2.48-51

Apesar do WO3 funcionar como um fotocatalisador estável para a evoluçao de O2 sob luz visível, na presença de um aceitador de elétrons apropriado, a banda de conduçao do material é mais alta do que o potencial de reduçao de água e, como resultado, nao ocorre a reduçao do H+ a H2. A Figura 5 mostra uma ilustraçao esquemática das estruturas de banda de alguns fotocatalisadores, destacando o dilema acima referido.

 


Figura 5. Ilustraçao esquemática das estruturas de banda de vários fotocatalisadores semicondutores e suas limitaçoes. Reimpresso da Ref. 21 com permissao. Copyright 2007 American Chemical Society

 

De acordo com Maeda,39 a dificuldade no desenvolvimento de um fotocatalisador adequado pode ser atribuído à falta de materiais conhecidos que satisfaçam a três requisitos:

1 Potenciais adequados para a decomposiçao da água

2 Energia de bandgap inferior a 3 eV

3 Estabilidade do fotocatalisador

As possíveis saídas sugeridas para estes problemas podem ser:

a) A dopagem de óxidos com íons de metais de transiçao com configuraçao eletrônica do tipo dn (0<n<10)

b) controle da banda de valência de óxidos metálicos usando orbitais p de um ânion ou os orbitais s de íons de metal do bloco p

c) sensibilizaçao espectral

A maioria dos óxidos metálicos que sao ativos no visível apresentam potencial da banda de conduçao um pouco abaixo de 0 V em pH=0 e potencial da banda de valência acima de 3 V. Isto faz com que apresentem um bandgap muito grande para absorçao de luz visível, mas sugere que fotocatalisadores baseados em óxidos metálicos tenham potencial suficiente para oxidar a molécula de água por conta da diferença entre o potencial de oxidaçao de H2O a O2 (1,23 V vs NHE) e a banda de valência (cerca de 3 V vs NHE). Por isso é importante modificar um óxido para absorçao no visível, porém, mantendo o potencial da banda de conduçao.

Alguns trabalhos mostraram a potencialidade da fotocatálise heterogênea visando a produçao de hidrogênio utilizando as sugestoes acima. Sato et al.52 verificaram a decomposiçao de água ausente de impurezas em H2 e O2 sobre catalisadores de RuO2 impregnado com MIn2O4 (M = Ca, Sr, Ba), Sr2SnO4 e NaSbO3 e irradiados por lâmpada de Xe. Estas combinaçoes de óxidos com íons metálicos do bloco p com configuraçao d10 (In3+, Sn4+ e Sb5+) revelaram-se inovadores em relaçao aos fotocatalisadores convencionais que utilizam metais com coordenaçao octaédrica (d0), tal como Ti4+, Zr4+, Nb5+ e Ta5+.

Ye et al.53 estudaram a geraçao de H2 pela decomposiçao da água utilizando o vanadato de índio (InVO4) impregnado com óxido de níquel em suspensao de água pura e irradiado com luz visível, usando uma lâmpada de xenônio de 400 W com filtro para λ<420 nm. A velocidade de formaçao de H2 sob as condiçoes descritas acima foi de 5,0 mmol g-1 h-1. A boa atividade fotocatalítica do material foi atribuída ao baixo bandgap (2 eV), estimado por espectroscopia UV-Vis, e indicaçao de diminuiçao do potencial da banda de conduçao.

Contrapondo as ideias de Sato et al.52, Iwase et al.54 insistiram com o sistema de óxido misto, K4Nb6O17, Sr2Nb2O7, KTaO3, NaTaO3, porém, realizando a foto deposiçao de Au sobre a superfície desses materiais. A evoluçao de O2 e H2 pela decomposiçao da água foi avaliada irradiando a partícula do catalisador com uma lâmpada de Xe de 300 W. Neste caso, o Au atuou como eficiente co-catalisador e os resultados mostraram que quando se utilizou NaTaO3:La na ausência de Au, a atividade em termos de H2 foi de 191 µmol h-1, porém, na presença de Au (0,3% em massa), a atividade foi elevada para 472 µmol h-1.

Zou et al.55 estudaram a evoluçao de H2 de uma suspensao de água pura irradiada por luz visível (λ>420 nm) usando NiOx/InTaO4 e NiOx/InNbO4 e verificaram que a atividade foi 4,0 µmol g-1 h-1 e 3,5 µmol g-1 h-1, respectivamente. A atividade fotocatalítica na regiao do visível foi atribuída ao bandgap dos materiais, que foi calculado em 2,6 eV para o InTaO4 e 2,5 eV para o InNbO4. A diferença de atividade dos dois materiais foi relacionada ao potencial da banda de conduçao. No caso do InNbO4, a banda encontra-se no orbital 4d, enquanto que a do InTaO4 está no 5d. Estes potenciais das bandas dos fotocatalisadores indicam que o potencial da banda de conduçao do InTaO4 é mais negativo, o que favorece a evoluçao do H2.

A dopagem no TiO2 por metais de transiçao, como sugerido acima, também se mostra como alternativa para o incremento da atividade fotocatalítica do óxido frente à irradiaçao visível. Dholam et al.56 fizeram um estudo no qual filmes de TiO2 eram dopados com Cr e Fe e, posteriormente, foi verificada a atividade frente a geraçao de hidrogênio. Os materiais após a síntese eram testados como fotoanodos, mergulhados numa mistura água+eletrólito e iluminados com lâmpada de tungstênio de 250 W, num reator de vidro borosilicato, que era utilizado como filtro de UV.

A geraçao de hidrogênio no TiO2 dopado com Fe+3 foi maior que no dopado com Cr+3, devido à habilidade dos íons ferro em trapear ambos elétron e lacuna e evitar a recombinaçao. Além disso, os resultados de DRS-UV-Vis mostraram boa absorçao dos materiais na regiao do visível.

Muitos trabalhos envolvendo a geraçao fotocatalítica de hidrogênio estao baseados principalmente na utilizaçao de óxidos, sulfetos e oxinitretos semicondutores, como alguns já citados acima. Há de se considerar a utilizaçao recente de materiais sustentáveis, livres de metais, e com boa atividade no visível. Cita-se, por exemplo, o g-C3N4 (nitreto de carbono grafítico), um polímero semicondutor que tem se mostrado um bom fotocatalisador para geraçao de H2 ou O2 via water splitting sob irradiaçao de luz visível. No entanto, o uso de g-C3N4 sozinho é limitado devido à alta recombinaçao do par lacuna-eletrón. Xiang et al.57 prepararam um compósito de grafeno/C3N4 e testaram a atividade para a geraçao fotocatalítica de hidrogênio no visível. Os autores verificaram que a condiçao ótima de 1,0% em massa de grafeno impregnado no g-C3N4 houve a geraçao de H2 a uma velocidade de 451 µmol h-1, sendo aproximadamente 3 vezes superior à atividade do g-C3N4 puro. A melhora no desempenho do material se deveu, segundo os autores, à presença do grafeno, que atuou como aceitador de elétrons fotogerados e, consequentemente, a recombinaçao do par lacuna-elétron foi evitada. Lan et al.58 também utilizaram o g-C3N4, porém, dopado com Br para geraçao de hidrogênio por fotólise da água. Neste trabalho, 50 mg do material foi adicionado a 100 mL de soluçao aquosa contento 10% em volume de trietanolamina como reagente de sacrifício. Ainda, em soluçao, a superfície do polímero foi impregnada com 3% em massa de Pt por fotodeposiçao utilizando H2PtCl6. A suspensao foi iluminada com uma lâmpada de xenônio equipada com filtro para eliminar radiaçao UV. A velocidade de reaçao determinada para o H2 foi de 20 µmol h-1 quando se utilizou polímero puro e 48 µmol h-1 com o polímero dopado numa quantidade otimizada de Br. O trabalho indicou que a melhora da atividade do polímero com a presença do heteroátomo se deveu à formaçao de um nível de energia acima da banda de valência do semicondutor, diminuindo assim o bandgap.

Outra estratégia investigada é a heterojunçao de semicondutores. Em contraste com o uso de fotocatalisadores individuais, a heterojunçao de semicondutores forma um sistema eficiente para minimizar a recombinaçao elétron-lacuna. Diferentemente do Esquema Z, em que é necessária a presença de um mediador redox na soluçao aquosa para retardar a recombinaçao dos portadores de carga, na heterojunçao de semicondutores, elétrons ou lacunas podem migrar de um material para outro, na ausência de um mediador. No último caso, os semicondutores devem estar em contato.

Yaojun et al.59 avaliaram a geraçao fotocatalítica de hidrogênio utilizando nanocompositos CdS/titanotubos em suspensao aquosa (utilizando Na2S e Na2SO3) irradiada com uma lâmpada de xenônio equipada com filtro para eliminar radiaçao UV. Os resultados mostraram que o compósito exibiu excelente atividade no visível, com geraçao de H2 de 1708 µL g-1, após 6 h de irradiaçao, e 230 µL g-1 quando utilizou-se TiO2, nas mesmas condiçoes acima.

A boa atividade do material se deveu à heterojunçao de CdS em fase hexagonal com tamanho de partícula de 8 nm (bandgap de 2,3 eV), que ejetou elétrons no TiO2 após a irradiaçao no visível, fazendo com que houvesse separaçao de cargas (elétron - lacuna) neste último semicondutor, conforme mostrado na Figura 6 abaixo:

 


Figura 6. Esquema de separaçao de cargas utilizando-se a heterojunçao de semicondutores Reimpresso da Ref. 60 com permissao. Copyright Willey-VCH Verlag GmbH & KGaA

 

Na mesma linha de pesquisa anterior, Long et al.61 realizaram a síntese de titanotubos (TNT), nos quais foram formadas nanopartículas confinadas de CdS a partir da sulfurizaçao com tiouréia, conforme a Figura 7.

 


Figura 7. Esquema de deposiçao de nanopartículas de CdS em cavidades de TNT's. Reimpresso da Ref. 61 com permissao. Copyright IOP Publishing

 

Para efeito de comparaçao, as nanopartículas de CdS foram depositadas no exterior do TNT. Os materiais foram testados para geraçao fotacatalítica de H2 utilizando um reator de Pyrex irradiado com uma lâmpada de xenônio de 300 W, utilizando filtros para remoçao de radiaçao UV. O material foi disperso em água contendo Na2S e Na2SO3 e foi adicionado H2PtCl6 para fotodeposiçao de platina.

O resultado de geraçao de H2 está mostrado na Figura 8, na qual se pode observar a diferença de atividade entre o material com CdS na área externa do titanotubo (ex-TNTs) e CdS depositado dentro do TNT (in-TNTs)

 


Figura 8. Evoluçao de hidrogênio utilizando titanotubos com CdS depositado. Reimpresso da Ref. 61 com permissao. Copyright IOP Publishing

 

A boa atividade fotocatalítica do in-TNTs foi atribuída pelos autores à baixa recombinaçao elétron/lacuna.61

Pérez-Larios et al.62 comprovaram que a mistura de óxidos semicondutores TiO2-ZnO aumenta a atividade fotocatalítica para geraçao de hidrogênio em soluçoes água:etanol (1:1) irradiadas com luz em 254 nm. Os pesquisadores concluíram que a atividade destes óxidos em contato é seis vezes maior que a atividade do TiO2 sozinho, graças à transferência de elétrons do ZnO para o TiO2.

Xu e Cao63 sintetizaram, por método hidrotérmico, um compósito a base de MoS2/CdS e testaram o material para fotólise da água. Uma massa de 0,1 g do material em uma soluçao aquosa de ácido lático foi exposta a uma lâmpada de xenônio de 300 W equipada com filtro para luz UV. Os pesquisadores realizaram uma proposiçao para o mecanismo, cujo esquema está mostrado na Figura 9.

 


Figura 9. Proposta de mecanismo para geraçao fotocatalítica de hidrogênio utilizando o compósito CdS/MoS2 como catalisador. Os valores de energia no gráfico sao em relaçao ao vácuo. Adaptada da Ref. 63

 

Sob excitaçao pela luz, elétrons e lacunas sao geradas na banda de conduçao e de valência do CdS, respectivamente. Devido à heterojunçao, os elétrons fotogerados no CdS (microesferas com diâmetro de 1-6 µm) sao injetados no MoS2, realizando a separaçao elétron/lacuna e evitando a recombinaçao. A velocidade de produçao de hidrogênio aumentou cerca de 17 vezes com a presença de MoS2 em relaçao ao CdS sozinho, com velocidade de 4,06 mmol g-1 h-1.

Ainda utilizando heterojunçao, Li et al.64 utilizaram 0,2 g CuInS2/TiO2 disperso numa mistura de 80 mL de água destilada e 20 mL de etanol e a suspensao foi irradiada com lâmpada de xenônio de 300 W, simulando a luz solar. Os autores obtiveram uma produçao de hidrogênio ótima com o teor de 2,5% em massa de CuInS2. Além disso, este material foi cerca de 7 vezes mais ativo que o TiO2 puro. De acordo com os autores, a heterojunçao CuInS2/TiO2 promoveu a transferência de carga de forma fotoinduzida do semicondutor CuInS2 para o TiO2, devido ao primeiro ter um bandgap baixo o suficiente para excitaçao dos elétrons na regiao do visível. Esta transferência de elétrons para o TiO2 na presença do reagente de sacrifício causou a separaçao elétron/lacuna, evitando a recombinaçao no anatásio. Este processo também tornou a atividade fotocatalítica estável por um longo período de tempo.

De maneira similar à estratégia de heterojunçao de semicondutores, pesquisas recentes estao se baseando na utilizaçao de sensibilizadores, moléculas organometálicas ou simplesmente moléculas orgânicas. Abe et al.,65 por exemplo, estudaram a sensibilizaçao de TiO2 utilizando Eosina Y na presença de dietilamina para geraçao de H2. Por outro lado, Zheng et al.66 sintetizaram um composto de coordenaçao, o [RuL(bpy)2](PF6)2, sendo L= ácido 2-hidroxi-5-(imidazo[4,5-f]-1,10-fenantrolina) benzóico e bpy = 2,2'-bipiridina, chamado pelos autores de TM1. O composto organometálico foi depositado na superfície do TiO2, utilizando Pt como co-catalisador. O teste fotocatalítico foi realizado utilizando-se materiais com diferentes concentraçoes de TM1, suspensos em água com trietanolamina (TEOA), e irradiados com lâmpada de Xe de 300 W equipada com filtro para λ<420 nm.

O mecanismo de sensibilizaçao proposto para o TiO2 está baseado na conjugaçao TiO2-sensibilizador e geradora de efeito antena (similar à fotossíntese de plantas). Como mostrado na Figura 10, PS (do inglês photosystem) que representa a molécula organometálica, é excitado por luz visível a PS*, que injeta elétrons na banda de conduçao do TiO2, fazendo a separaçao de cargas no semicondutor, com consequente transferência de elétrons para a Pt e início do processo catalítico. Além disso, a presença da trietanolamina evitou a recombinaçao elétron/lacuna.66

 


Figura 10. Mecanismo de geraçao de H2 por sensibilizaçao do TiO2 (b) utilizando TM1(a). Adaptada da Ref. 66

 

Similarmente, Rao et al.67 utilizaram dois complexos de níquel para a fotólise da água, chamados de [Ni(Hqt)2(4, 4'-Z-2, 2'-bpy)] (Hqt = 8-quinolinetiol, sendo Z = - H [1] ou - CH3 [2], bpy = bipiridina. O teste fotocatalítico foi realizado com os catalisadores dissolvidos na soluçao, ou seja, do tipo homogêneo. O catalisador foi adicionado a uma mistura de 50% de etanol em água e irradiado com lâmpada de xenônio de 300 W (λ> 420 nm). Os resultados do trabalho mostraram boa atividade dos materiais e concluiu-se que o hidrogênio gerado resultou da formaçao de hidretos intermediários.

Na tentativa de viabilizar a utilizaçao do TiO2 na fotocatálise, diversas alternativas de modificaçoes como as citadas acima estao sendo estudadas. Essas modificaçoes estao relacionadas com as propriedades elétricas e estruturais do material. O aumento da eficiência do semicondutor no fenômeno de Water Splitting é dependente da estrutura cristalina, da morfologia, da estrutura de bandas e da faixa de absorçao da radiaçao eletromagnética.15 Os óxidos de metais de transiçao, quando incorporados nas estruturas de zeólitas e de peneiras moleculares mesoporosas, geram atividade nao somente para reaçoes catalíticas, mas também para as reaçoes fotocatalíticas.68

Em particular, óxidos de metais de transiçao altamente dispersos, tais como os de titânio, vanádio, e molibdênio têm exibido elevada reatividade fotocatalítica para várias reaçoes, devido a processos de transferência de carga, principalmente quando expostos à irradiaçao UV, de acordo com o Esquema 1:

 


Esquema 1. Formaçao de um estado excitado pela transferência de carga em óxidos de metais de transiçao, sob irradiaçao de luz69

 

Cui et al.70 estudaram a geraçao fotocatalítica de H2 por fotocatálise de vapor de metanol empregando zeólita beta com titânio incorporado em sua estrutura (Ti-beta). A reaçao fotocatalítica foi processada num reator de quartzo com 6 mL de capacidade e utilizando uma lâmpada de mercúrio de baixa pressao (4 W e comprimento de onda principal em 254 nm). A quantidade de hidrogênio gerada foi de 0,01204 mmol g-1 após 3 h de iluminaçao para a zeólita Ti-beta e foi aproximadamente 10 vezes maior que em uma zeólita impregnada com TiO2. A maior atividade encontrada para a zeólita Ti-beta foi relacionada à alta adsorçao de metanol na superfície do material e também em funçao da incorporaçao de Ti na estrutura da zeólita. Os autores propuseram um mecanismo de reaçao, no qual se sugere a formaçao do estado excitado (Ti3+-O-)*.

Liu71 estudou a geraçao de H2 pela decomposiçao da água utilizando MCM-41 modificada com zircônio (Zr-MCM-41), em suspensao de água pura e irradiada com uma lâmpada de mercúrio de alta pressao, com potência de 400 W. A decomposiçao da molécula de H2O produziu 112 mmol de H2 em 5 h de reaçao. O trabalho mostrou que a atividade fotocatalítica do Zr-MCM-41 em luz UV é cerca de 2,5 vezes maior que a do ZrO2, devido à alta dispersao da zircônia na superfície da peneira molecular.

Shen e Guo72 verificaram a formaçao de H2 usando peneiras moleculares MCM-41 modificadas com Ti e Cr, sintetizadas pelo método hidrotérmico. A atividade fotocatalítica foi avaliada utilizando 0,2 g do material disperso em 200 mL de soluçao aquosa com ácido fórmico (proporçao de 3:1), irradiada com uma lâmpada de xenônio de 350 W equipada com filtro para λ<430 nm. A peneira molecular com razao molar Si/Cr=100 apresentou maior atividade fotocatalítica (146,4 µmol g-1 h-1). A alta atividade na regiao do visível foi associada à baixa recombinaçao elétron/lacuna em funçao da presença de mais de um centro metálico.

Utilizando uma peneira da mesma família da MCM-41, Zhao et al.73 realizaram a síntese hidrotérmica da MCM-48 com Ti incorporado nas razoes molares Si/Ti=25-200 e testaram a atividade fotocatalítica para geraçao de hidrogênio de uma suspensao de 2 mg do material em 1,6 mL de água e 0,4 mL de metanol, utilizando uma lâmpada de xenônio de 500 W equipada com filtro para eliminar os comprimentos de onda maiores que 230 nm e menores que 380 nm. A atividade fotocatalítica foi de 12,75 mmol h-1 (gTi)-1 para a peneira molecular Ti-MCM-48-1-200. Neste caso, espécies de Ti tetraedricamente coordenadas foram associadas aos sítios ativos para a reaçao fotocatalítica na regiao do UV, na ausência de Pt como co-catalisador.

Em outro estudo, Liu et al.74 sintetizaram peneiras moleculares CdS/M-MCM-41 (M = Zr, Ti) pelo método de troca iônica e testaram para a produçao fotocatalítica de H2. Diferentes soluçoes aquosas de cinco reagentes de sacrifício (etanol, ácido acético, ácido propanóico, ácido butírico e trietanoamina) com os fotocalisadores foram expostas à radiaçao visível, utilizando uma lâmpada de xenônio de 300 W. Os resultados de difratometria de raios-X de baixo ângulo dos materiais sintetizados mostraram que o Ti influencia mais na desorganizaçao da estrutura mesoporosa da MCM-41 do que o Zr. As maiores atividades fotocatalíticas encontradas foram para CdS/Zr(0,005)-MCM-41 e CdS/Ti(0,02)-MCM-41 (onde o valor entre parênteses representa a razao M/Si) com velocidades de geraçao de H2 de 6,058 µmol h-1 e 9,422 µmol h-1, respectivamente. Ainda, os pesquisadores verificaram melhor atividade para geraçao de hidrogênio quando se utilizou trietanolamina como reagente de sacrifício.

Outros resultados de trabalhos recentes sao compilados na Tabela 1, na qual sao mostrados os materiais, condiçoes do experimento e a atividade fotocatalítica em funçao da geraçao de hidrogênio.

 

 

CONSIDERAÇOES FINAIS

A crise energética e o agravamento do efeito estufa impulsionaram pesquisas para a produçao de hidrogênio. Há na literatura e também em fase de comercializaçao diversas metodologias para sua geraçao, dentre elas a reduçao da água usando fotocatalisadores. Apesar de ser um processo eficiente, o uso de luz UV artificial ainda torna o processo fotocatalítico pouco aplicável para escalas industriais. Na intençao de prover condiçoes para a mudança neste paradigma, pesquisas recentes estao voltadas ao desenvolvimento de materiais com aproveitamento cada vez maior da luz visível do espectro solar, com o objetivo claro de se utilizar uma fonte de energia limpa, segura, renovável e principalmente abundante. Além da dificuldade em utilizar luz UV, aqueles poucos materiais que absorvem luz visível apresentam um potencial de reduçao da banda de conduçao mais positivo que o potencial de reduçao do H+ a H2 e ainda requerem o uso de reagentes de sacrifício como doares irreversíveis de elétrons para evitar a recombinaçao elétron/lacuna.

Pesquisas recentes apontam soluçoes e alternativas para mitigar os problemas citados acima. Por exemplo, no Esquema Z dispensa-se a utilizaçao de reagentes de sacrifício. Neste caso, os mediadores atuam de forma reversível. De todo modo, existe uma forte tendência na utilizaçao de poluentes como reagentes de sacrifício, já que deste modo é possivel reduzir a quantidade de resíduos paralelamente à geraçao de H2. A resoluçao da diminuiçao do bandgap e a busca de potenciais adequados para a fotorreduçao da água sao sugeridos, através de abordagens como: a dopagem de óxidos com íons de metais de transiçao com configuraçao eletrônica do tipo dn (0<n<10); controle da banda de valência de óxidos metálicos usando orbitais p de um ânion ou os orbitais s de íons de metal do bloco p e sensibilizaçao espectral.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à FAPERJ (proc. E-26/010.002631/2014) e à FAPES (proc. 67677258).

 

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