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Avaliação dos resíduos gerados durante a destruição de pcbs pelo processo catalisado por base Evaluation of residues generated over pcbs destrcution by base catalyzed process |
Cassio P. MeniniI,II; Kassia S. KanieskiI; Martinho J. VichinheskiI; Tarcisio LoddiIII; Marco A. MarinIV; Marilda MunaroI; Joseane V. GulmineI,*
I. Departamento de Eletricidade e Materiais, Instituto de Tecnologia para o Desenvolvimento, Caixa Postal 19067, 81531-990 Curitiba - PR, Brasil Recebido em 17/01/2018 *e-mail: jogulmine@yahoo.com.br There are many processes capable of decontamination of polychlorinated biphenyls in several matrixes. The set of inputs, materials, operation conditions and efficiencies are wide. The base catalyzed dechlorination process shows application potential in great scale, mainly due mild chemical reaction conditions and low cost raw materials. The KPEG is a familiar process of base catalyzed dechlorination. This decontamination treatment was developed mainly on mineral insulating oil. Few information is found related to process residues, usually in reaction sludge means, limited to inform that its destination must fulfill specific territorial laws. In these work KPEG treatment process was performed on decontamination of mineral insulating oils containing between 200 and 330 ppm of polychlorinated biphenyls to evaluation of reaction residues and of the decontamination percentage. Chemical characterization of these residual material allows achievement of important information to explore procedures for recovery, regeneration and/or right disposal. The analysis performed on the residues showed the presence of reaction products containing unsaturation, absents on neat polyethylene glycol, possible organic complexes products with alkali metal as also the presence of chloride ions. In oil was verified the presence of less chlorinated biphenyls, probably formed by partial dechlorination of highly chlorinated biphenyls. INTRODUÇAO Produzidas em larga escala industrial entre as décadas de 1930 e 1960, as bifenilas policloradas (PCBs) sao substâncias químicas organocloradas utilizadas como base de óleos sintéticos que foram utilizados para os mais diversos fins industriais. A maior utilizaçao correspondeu ao setor de energia elétrica, como fluido isolante elétrico nos transformadores. No Brasil, estas substâncias foram comercializadas com o nome de Ascarel®, sendo compostas por misturas de várias moléculas contendo diferentes quantidades e disposiçoes de átomos de cloro nas bifenilas (congêneres) e clorobenzenos.1-3 Devido às características desses óleos, como baixa reatividade química, alta resistência à inflamabilidade e boa rigidez dielétrica, tornaram-se adequados às condiçoes de serviço destes equipamentos elétricos. No entanto, foram observadas doenças crônicas e sintomas de intoxicaçao associadas à exposiçao à PCBs, relacionadas com os efeitos carcinogênicos, mutagênicos e bioacumulativos desses produtos quimicos em seres vivos.1-7 Esses problemas citados, associados à grande resistência a degradaçao ambiental, levou a classificaçao dessas substâncias como poluentes orgânicos persistentes (POPs) pela Convençao de Estocolmo de 2001, sendo que os países signatários, dentre eles o Brasil, estabeleceram o acordo de realizar a total retirada de todas as fontes contaminadas até 2025 e sua total destruiçao até 2028.2,3,6 No setor elétrico além do montante de PCBs retiradas dos equipamentos atendendo à Convençao, ainda ocorreu a contaminaçao de óleo mineral isolante (OMI) utilizado para a substituiçao do Ascarel® nos transformadores de forma inadequada, como, por exemplo, o simples esgotamento do mesmo e enchimento do equipamento com óleo mineral, havendo ainda PCBs impregnadas no papel isolante do transformador.8-10 Diante desse cenário, diversos métodos de tratamento para descontaminaçao de matrizes com PCBs foram criados.11-14 Dentre estes, os processos de descloraçao catalisados por base sao tratamentos químicos com menor impacto ambiental que podem gerar a matriz descontaminada (oléo mineral isolante), a lama reacional e gases de exaustao.9,14,15 A lama reacional, geralmente com consistência pastosa, é formada por resíduo da matriz e reagentes nao consumidos, além de compostos formados pelo processo de descloraçao das bifenilas.15,16 O processo KPEG, uma das formas de tratamento catalisado por base, recebe esta denominaçao por utilizar hidróxido de potássio (KOH) e polietilenoglicol (PEG). Este processo é vantajoso, pois é um método simples, seguro, versátil, barato e eficiente comparado aos seus principais concorrentes (incineraçao e reaçao com sódio métalico). Alguns trabalhos apresentam hipoteticamente os principais produtos formados durante a reaçao, baseados em compostos modelo de PCBs, em que o PEG atua tanto como agente de transferência de fase, quanto como doador de hidrogênio para a descloraçao das bifenilas, produzindo poliaril glicolatos insolúveis em óleo isolante e facilmente separados e removidos, após o resfriamento.3,9,17,18 No entanto, este mecanismo nao é comprovado na literatura para misturas comerciais de PCBs e nao sao apresentados resultados analíticos que provem a formaçao da ligaçao química entre as bifenilas e o polietilenoglicol, bem como o mapeamento da descloraçao, levando em conta as diferenças de reatividade dos congêneres. Segundo a literatura, os resíduos gerados neste processo nao apresentariam risco ambiental imediato, desde que dispostos adequadamente por outras técnicas como por exemplo incineraçao.3,9,16,19-24 Testes de toxicidade aguda mostraram baixos riscos, mas nao foram feitos ainda estudos a médio e longo prazos.9,16 A caracterizaçao química dos resíduos gerados na reaçao pode contribuir no aprofundamento do conhecimento para auxiliar na tomada de decisao com relaçao à correta destinaçao desses materiais ou ainda para reutilizaçao em outros segmentos industriais que permitiria geraçao de valor agregado, reduçao de passivo ambiental e corte de gastos com destinaçao.25 Neste estudo é apresentada a caracterizaçao química dos resíduos do processo de tratamento KPEG aplicado em óleos minerais isolantes contaminados com misturas comerciais de PCBs, sendo uma mistura de Aroclor 1260®, que contém majoritariamente congêneres penta, hexa e heptaclorados e outra mistura de Aroclor 1242®, com congêneres di, tri e tetraclorados, predominantemente. Os resíduos foram analisados por cromatografia gasosa com espectrômetro de massa (GC-MS), espectroscopia vibracional de infravermelho médio com transformada de Fourier acoplado com acessório de reflexao total atenuada (FTIR-ATR), espectroscopia nas regioes ultravioleta e visível (UV-Vis) e espectroscopia com ressonância magnética nuclear (RMN).
PARTE EXPERIMENTAL Materiais e métodos Materiais Para realizaçao dos experimentos foram utilizados os seguintes produtos:
Preparo das soluçoes de PCBs Para o preparo das soluçoes de OMI controladamente contaminado com PCBs foi tomada uma alíquota de OMI retirado de transformador contaminado com alto teor de Aroclor 1260® e adicionada em OMI novo, obtendo uma soluçao contendo 218 ppm de PCBs (identificada neste trabalho como soluçao A). O mesmo procedimento foi feito para o preparo de soluçao contaminada com Aroclor 1242®, obtendo-se uma soluçao com concentraçao de 322 ppm de congêneres (denominada neste trabalho como soluçao B). Utilizou-se esta metodologia para garantir soluçoes contendo a mesma procedência, uma vez que há variaçoes entre lotes de um mesmo tipo de Aroclor® e também para adequar a concentraçao às faixas de contaminaçao geralmente encontradas nos óleos minerais dos transformadores contaminados no Brasil. A identificaçao e quantificaçao realizadas dos congêneres nas soluçoes A e B preparadas para os testes foram baseadas na norma CEI IEC 61619. 26-28 Reaçoes de descontaminaçao Para realizaçao das reaçoes de descontaminaçao utilizou-se um reator de bancada Mini-reactor 4563 com agitaçao mecânica por acionamento magnético, com controlador de temperatura e velocidade de rotaçao Automatic Controller 4848, ambos da marca Parr Instruments. O sistema de filtraçao a vácuo era composto por bomba (Tecnal), funil e kitassato. Para cada teste no reator, foram colocados 250 mL de OMI contaminado (soluçao A ou B) e os reagentes KOH (previamente triturado em liquidificador industrial) e PEG. Foram utilizados 10% (m/m) de PEG em relaçao ao OMI contaminado e uma proporçao molar de 7:1 de KOH em relaçao ao PEG (mol:mol). Foram utilizados dois PEGs com massas molares médias de 300 e 2000, conforme Tabela 1, para avaliar a influência deste parâmetro na reaçao. Depois de inseridos os reagentes, o reator era fechado e pressurizado a 20 psi com uma mistura gasosa contendo 96% de N2 e 4% de O2. Em seguida, foram iniciados os processos de agitaçao a 700 rpm e o aquecimento. A contagem do tempo de reaçao foi iniciada a partir do momento em que a temperatura atingiu o valor pré-estabelecido para o teste (100 ou 130 °C). Transcorrido o tempo de reaçao de cada teste, o sistema foi resfriado naturalmente até a temperatura ambiente, ocorrendo a separaçao entre as fases pastosa polar (PEG + KOH) e apolar (OMI). O material foi retirado do reator fazendo-se lavagens com acetona. As fases foram separadas por filtraçao a vácuo e o filtrado foi aquecido a 60 °C e lavado com hexano para retirada de resquícios de óleo que tenham permanecido na fase polar. Foi realizada também uma reaçao controle denominada como RC, contendo os reagentes KOH e PEG de massa molar média 300, mas utilizando OMI sem contaminaçao com PCB, nas mesmas condiçoes de temperatura, atmosfera, pressao e tempo das reaçoes R1 e R2 (Tabela 1) para avaliaçao e comparaçao do resíduo pastoso obtido (PEG + KOH).
Análises de GC/MS Para as análises de GC/MS, foi utilizado o cromatógrafo a gás, marca Agilent, modelo 7890 B, acoplado ao espectrômetro de massas, marca Agilent, modelo 5977 A, com amostrador automático e coluna capilar fase HP-5 (5%-difenil 95% dimetilpolisiloxano) de dimensoes 30 m x 0,25 mm x 0,25 µm. Foi injetado 1 µL de amostra em modo splitless com temperatura do injetor de 225 °C. Foi utilizado hélio como gás de arraste a 1 mL min-1. A programaçao do forno foi feita como segue: temperatura inicial de 60 °C, permanência por 4 minutos, aquecimento a 5 °C min-1 até 220 °C, permanência por 5 minutos, aquecimento a 3 °C min-1 até 230 °C, permanência por 21 minutos. A temperatura na interface foi mantida a 250 °C. A ionizaçao das moléculas foi realizada por impacto de elétrons. A temperatura da fonte de íons foi de 230 °C e do quadrupolo de 150 °C. As análises foram realizadas em modo de monitoramento de íons selecionados (SIM - Selected Ion Monitoring). A quantificaçao foi realizada com base na norma CEI IEC 61619, que considera o fator de resposta de cada analito no cálculo da concentraçao.26-28 Este fator de resposta foi calculado com base na biblioteca construída utilizando-se os padroes comerciais dos 209 congêneres de PCBs. Antes da injeçao e análise, as amostras passaram por um processo de clean-up em cartucho de SPE, procedimento conforme instruçoes do fabricante, que tem por objetivo promover a concentraçao do analito de interesse eliminando as interferências causadas pelo óleo e seus produtos de degradaçao. Após o pré-tratamento foi adicionado 30 µL do padrao interno 1,2,3-triclorobenzeno em cada amostra. O padrao interno também foi adicionado aos padroes de PCBs utilizados. Análises de FTIR-ATR As análises de espectroscópicas vibracionais de FTIR-ATR foram realizadas em equipamento espectrofotômetro Tensor 27 (fabricante Bruker) com acessório Platinum ATR, com cristal de diamante, utilizando DLATGS (sulfato de triglicina deuterada dopada com L-alanina). As amostras de resíduo foram depositadas diretamente no cristal de diamante, obtendo-se os espectros com 32 varreduras, com resoluçao de 4 cm-1, na faixa espectral de 4000 a 400 cm-1. Análises de UV-Vis As análises espectroscópicas de UV-Vis foram realizadas no equipamento espectrofotômetro Carry 60 de duplo feixe (fabricante Agilent). Analisaram-se as amostras de resíduo dissolvidas em água destilada (R1 com concentraçao de 0,0021 g mL-1, R2 com 0,0002 g mL-1 e RC com 0,0025 g mL-1), com a obtençao dos espectros na faixa de 200 a 800 nm, resoluçao de 0,5 nm e cubetas de quartzo com 1 cm de caminho ótico. A amostra da reaçao R2 foi mais diluída que as outras duas para adequar sua absortividade espectral. Análises de 13C-RMN As análises de 13C-RMN foram feitas usando tetrametilsilano (TMS) como padrao interno em soluçao 1% (v/v) em clorofórmio deuterado, ambos Sigma-Aldrich, P.A., em um equipamento Bruker Advance a 200 MHz. As amostras de resíduo foram dissolvidas em clorofórmio deuterado e foi adicionado o padrao de TMS.
RESULTADOS E DISCUSSAO Avaliaçao dos resíduos encontrados na fase apolar (OMI) Para avaliar a descontaminaçao do óleo, durante o processo, foram feitas análises de GC/MS no OMI contaminado antes e após a reaçao. Essa quantificaçao foi realizada para cada congênere individualmente, utilizando seu fator de resposta previamente calculado por meio do uso de padroes. As condiçoes de cada reaçao e os valores iniciais e após o processo se encontram na Tabela 2. Para as reaçoes conduzidas na soluçao A (reaçoes R1 e R2), houve significativa reduçao da quantidade de PCBs após 4 h de processo, chegando-se a valores bem inferiores a 50 ppm. Para a soluçao B (contendo majoritariamente congêneres menos clorados) o teste (reaçao R3) realizado nas mesmas condiçoes da soluçao A (soluçao contendo majoritariamente congêneres mais clorados) nao mostrou eficiência no processo de descontaminaçao, removendo em torno de 56% dos contaminantes. Por esse motivo foram realizados dois testes aumentando o tempo e a temperatura para tentar melhorar o rendimento da reaçao. Aumentando somente o tempo de 4 para 7 h (reaçao R4) nao houve melhora na descontaminaçao, mas aumentando também a temperatura de 100 °C para 130 °C (reaçao R5) se observou significativa diminuiçao da quantidade de PCBs desta soluçao.
Os resultados de identificaçao e quantificaçao para as reaçoes com OMI contendo congêneres da soluçao A estao apresentados na Figura 1. Neste trabalho foi utilizada a nomenclatura recomendada na norma IEC 61619 (apresentada no anexo B da norma), que nomeia os congêneres numericamente de PCB1 até PCB209, levando em conta a posiçao e quantidade de cloros presentes nas bifenilas. Observa-se que na amostra inicial a grande maioria dos congêneres presentes eram penta, hexa e heptaclorados. Após a reaçao estes foram praticamente eliminados do óleo, restando principalmente os tetraclorados, alguns tri, di e monoclorados. Nota-se aumento da concentraçao das PCBs 1, 18 e 31 em ambas as reaçoes (R1 e R2), provavelmente devido à descloraçao parcial de congêneres mais clorados. A massa molar média do polietilenoglicol utilizado (300 ou 2000) teve pouca influência no resultado final da descontaminaçao destes testes (vide valores finais de concentraçao após as reaçoes, apresentados na Tabela 2), havendo pequena diferença na reatividade dos congêneres eliminados e/ou formados.
Figura 1. Quantificaçao dos congêneres de PCBs antes e após a reaçao de descontaminaçao, utilizando a soluçao A e diferentes massas molares do PEG - R1 utilizando PEG 2000 e R2 utilizando PEG 300: A) congêneres mono, di, tri e tetraclorados e B) congêneres penta, hexa, hepta e octaclorados
Na Figura 2 estao apresentados os resultados para os testes de descontaminaçao da soluçao B, com maior tempo e temperatura de reaçao. Observa-se que, majoritariamente, esta amostra continha congêneres di, tri e tetraclorados antes da reaçao. Na reaçao R4 com tempo de 7 h e temperatura de 100 °C houve a eliminaçao dos penta e hexaclorados e a reduçao dos menos clorados que atingiu valor final de 142,9 ppm. Com a reaçao sendo conduzida a 130 °C (reaçao R5 da Tabela 2) a descontaminaçao foi mais eficiente, reduzindo significativamente a quantidade dos congêneres presentes no início, eliminando além dos penta e hexaclorados, também todos os tetra e praticamente todos os triclorados. Nesta reaçao restaram somente os di e monoclorados, além de pequena quantidade da PCB18 triclorada. Houve a formaçao e aumento de congêneres monoclorados, pela possível descloraçao parcial dos mais clorados, chegando à quantidade total de 11,3 ppm após o processo.
Figura 2. Quantificaçao dos congêneres de PCBs antes e após a reaçao de descontaminaçao, utilizando a soluçao B e diferentes temperaturas de reaçao - R4 a 100 °C e R5 a 130 °C: A) congêneres mono, di, e triclorados e B) congêneres tetra, penta e hexaclorados
Como apontado por Mantzavinos et al., o início da formaçao de radicais livres no PEG começa pela abstraçao de um radical hidrogênio (H) da cadeia principal devido a cisao homolítica causada por temperatura, presença de oxigênio ou ambos.29 Um radical hidrogênio é altamente reativo e sua interaçao com PCBs fornece excelente potencial para promover a hidrodescloraçao. No entanto, outras formas de hidrodescloraçao a partir de doador de hidrogênio, como é o caso do PEG, que pode fornecer os hidrogênios dos grupos -OH das extremidades de cadeia, geralmente estao apoiadas na formaçao de íon hidreto, um forte agente nucleófilo capaz de realizar a remoçao de átomos de cloro da estrutura da bifenila.22 Uma hipótese para explicar o alto teor de descontaminaçao nos testes realizados neste trabalho poderia ser a descloraçao total de grande número de PCBs, formando bifenilas e/ou a quebra das ligaçoes entre as fenilas formando clorobenzenos e benzeno. Para averiguar isto foi realizada a análise de GC/MS pesquisando a presença dessas substâncias no óleo de uma das reaçoes que obteve bom desempenho de remoçao de PCBs (R2), mas o detector de massas nao identificou qualquer destes compostos. Com este resultado, somente o mecanismo de hidrodescloraçao nao explicaria a descontaminaçao observada, sendo forte indício de que outro mecanismo também estaria ocorrendo concomitantemente, transformando e/ou transferindo boa parte das PCBs para a fase de polietilenoglicol. Avaliaçao dos resíduos encontrados na fase polar (PEG) Uma alternativa que explicaria a eficiência de descontaminaçao do óleo observada seria a reaçao entre o PEG e as PCBs, ocorrendo a ligaçao química entre o oxigênio do grupo álcool na ponta de cadeia do PEG com as PCBs, reaçao essa que já foi observada em substâncias aromáticas organocloradas e álcoois primários.30 Para avaliar essa hipótese foram realizadas análises espectroscópicas de FTIR-ATR, UV-Vis e 13C-RMN no resíduo pastoso da fase polar. Na Figura 3 estao apresentados os resultados de espectroscopia vibracional de infravermelho, nos quais se observam bandas referentes à estrutura química do PEG300. As bandas com maiores absorbâncias nos intervalos de 3540 a 3200 cm-1, 3000 a 2840 cm-1 e 1150 a 1085 cm-1, correspondentes às ligaçoes oxigênio-hidrogênio (O-H), carbono-hidrogênio (C-H) e carbono-oxigênio-carbono (C-O-C), respectivamente. Nos resíduos das reaçoes, inclusive da reaçao controle RC, observa-se o aparecimento de uma banda em torno de 1645 cm-1. Essa regiao é referente a ligaçoes duplas entre carbonos (-C=C-), que podem ter sido geradas pela degradaçao do PEG no decorrer da reaçao, segundo mecanismo apresentado na literatura.29 Vale esclarecer que poderia ocorrer uma pequeníssima contribuiçao de ligaçoes duplas dos anéis aromáticos presentes na composiçao do OMI e de seu antioxidante nesta banda, mas pela quantidades relativas dessas substâncias presentes no óleo e ainda pela pequena porçao de óleo que tenha ficado impregnado na fase polar, a concentraçao provavelmente estaria abaixo do limite de detecçao da técnica analítica, nao influenciando significativamente a intensidade desta banda. Nao foi possível observar bandas referentes à ligaçao entre C-Cl que comprovariam a presença das PCBs nos resíduos sólidos do PEG e nem ligaçoes entre anel aromático e oxigênio que corroborassem com as propostas de mecanismo da literatura que defendem a formaçao de ligaçao química entre algum carbono do anel das bifenilas e o oxigênio presente na ponta da cadeia do PEG (no grupo -OH terminal), talvez pelas baixas concentraçoes desses grupos químicos que poderiam ser formados, ficando abaixo do limite de detecçao do FTIR-ATR.
Figura 3. Espectros FTIR-ATR do PEG300, resíduo RC e resíduos das reaçoes de descontaminaçao: A) regiao espectral analisada e B) ampliaçao entre 2000 e 1300 cm-1
Na Figura 4 estao apresentados os espectros de UV-Vis do PEG300, do resíduo da reaçao controle (RC) e do óleo mineral isolante (OMI) com e sem PCBs, além dos espectros das reaçoes de descontaminaçao dos óleos da soluçao A. Observa-se que o PEG300 nao possui absorçao acima de 250 nm, o que era esperado visto que este material quando novo nao contém duplas ligaçoes em suas moléculas. O óleo mineral, por sua vez, apresentou uma banda em torno de 270 nm que deve ser proveniente dos compostos aromáticos que fazem parte de sua composiçao (em torno de 4%), além da contribuiçao de seu aditivo antioxidante 2,6-di-terc-butil p-cresol (DBPC), que apresenta também um anel aromático em sua molécula. Foi feita a análise também do óleo mineral contendo PCBs (soluçao A), nao havendo diferença entre os espectros deste óleo e do óleo nao contaminado. Isto pode ser devido à baixa concentraçao de PCBs presentes no óleo contaminado (218,3 ppm na soluçao A analisada), podendo estar abaixo do limite de detecçao da técnica, pois, segundo Andersson et. al., as PCBs apresentariam bandas em 200 a 225 nm e 245 a 265 nm.31
Figura 4. Espectros UV-Vis do óleo mineral isolante, PEG300, resíduo RC e resíduos R1e R2
O resíduo da reaçao RC e das reaçoes de descontaminaçao apresentaram bandas em 270 e 353 nm. A primeira banda pode estar relacionada com a presença de resquícios de óleo mineral impregnado no resíduo polar de PEG e KOH. A atribuiçao para a segunda banda, em 353 nm, pode estar relacionada com a formaçao de um complexo entre o PEG e os cátions do potássio provenientes no KOH. A hipótese da formaçao deste complexo é defendida no trabalho de Brunelle.15 Também segundo outros trabalhos na literatura envolvendo a síntese e caracterizaçao de complexos organometálicos, estes compostos absorvem em comprimentos de onda acima 300 nm.32-34 Com o intuito de investigar a formaçao de ligaçao química entre as PCBs e o PEG, foi realizada também a análise dos resíduos das reaçoes da soluçao A por 13C-RMN. O espectro do resíduo R1 que utilizou PEG2000 (Figura 5) mostra picos intensos de deslocamento químico em 70-72 ppm referentes a carbonos da estrutura das cadeias poliméricas do PEG. Foi observado também um pico em 87 ppm que provavelmente está relacionado a carbonos de ligaçoes duplas e/ou triplas. Este pico poderia também estar relacionado com carbonos ligados ao grupo hidroxila de álcool e/ou oxigênio de éter, mas neste caso seria esperado que estivesse presente também no espectro do resíduo RC, o que nao ocorreu. O pico em 152 ppm tem relaçao com carbonos de alcenos, mas também com heteroaromáticos. Muito provavelmente este pico tenha relaçao somente com insaturaçoes criadas pela degradaçao do PEG, pois, segundo Egolf, as bifenilas policloradas apresentariam pico em torno de 130 ppm de deslocamento químico.35 O pico em 76 ppm é referente ao solvente clorofórmio deuterado.
Figura 5. Espectro de 13C-RMN do resíduo da reaçao teste R1
Na Figura 6 é mostrado o espectro de 13C-RMN, obtido para o resíduo da reaçao R2, que foi realizada com PEG 300. Observa-se que os picos mais intensos sao praticamente os mesmos encontrados no espectro do PEG 2000 (Figura 5). O pico intenso em 76 ppm é referente ao solvente clorofórmio deuterado.
Figura 6. Espectro de 13C-RMN do resíduo da reaçao teste R2
Os resultados obtidos com a análise dos óleos após as reaçoes mostram que, provavelmente, vários congêneres migraram para a fase polar de polietilenoglicol, mas pelas técnicas analíticas aplicadas aos resíduos pastosos nao foi possível saber se elas estao somente aderidas ao resíduo ou quimicamente ligadas ao PEG, muito provavelmente pela quantidade de PCBs estar abaixo do limite de detecçao das técnicas espectroscópicas utilizadas. Para investigar este aspecto, foi realizada a análise por GC/MS do solvente hexano utilizado para lavagem do resíduo de PEG da reaçao R2, com o intuito de investigar a presença de PCBs na fase polar. Caso as bifenilas policloradas estivessem apenas adsorvidas no resíduo, estas seriam extraídas passando para o solvente e seriam detectadas no espectrômetro de massas. Após a análise foram encontrados apenas 11 congêneres, os mesmos encontrados na análise do óleo após a reaçao R2 de descontaminaçao (ver Figura 1), sendo que inicialmente estavam presentes 75 congêneres. Este resultado pode indicar que os 64 congêneres que foram extraídos do óleo estejam ligados quimicamente ao PEG, formando um novo material polimérico, embora nao tenha sido possível identificar em qual regiao da cadeia polimérica do PEG esta ligaçao se forma.
CONCLUSAO Todos os tratamentos realizados apresentaram percentuais de descontaminaçao do óleo. Pelos resultados obtidos, dois processos de descloraçao estao ocorrendo durante as reaçoes. Um deles, que levou ao aumento de alguns congêneres menos clorados inicialmente existentes ou formaçao de novos, identificados nos óleos, devido a um processo de hidrodescloraçao, em que átomos de cloro sao retirados da molécula de PCB e substituídos por átomos de hidrogênio. O outro processo leva à abstraçao de cloro da PCB, com a formaçao de uma ligaçao química entre o carbono da bifenila da qual foi retirado o cloro e a cadeia polimérica do PEG, formando um novo material polimérico. A massa molar do PEG parece nao influenciar em grande extensao nos teores de descontaminaçao do óleo, bem como nos resíduos formados que contem fragmentos de cadeia e formaçao duplas ligaçoes C=C, evidenciadas por FTIR-ATR, UV-Vis e 13C-RMN.
AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à ANEEL pelo Programa de P&D, à COPEL DIS e à COPEL GET pelo suporte financeiro, ao CNPq pelo benefício da Lei 8010/90, à CAPES, à UFPR e aos Institutos Lactec.
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