JBCS



15:18, qui nov 21

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Artigo


Aplicação da espectroscopia raman na caracterização de minerais pertencentes a uma geocoleção
Raman spectroscopy application in the characterization of pertaining minerals of a geocollection

Adriele R. SantosI,II; Denise B. MenezesIII; Javier EllenaI,*; e Marcelo B. AndradeI

I. Instituto de Física de São Carlos, Universidade de São Paulo, 13566-590 São Carlos - SP, Brasil
II. Departamento de Química, Universidade Federal de São Carlos, 13565-905 São Carlos - SP, Brasil
III. Departamento de Engenharia Civil, Universidade Federal de São Carlos, 13565-905 São Carlos - SP, Brasil

Recebido em 31/01/2019
Aceito em 26/03/2019
Publicado na web em 18/04/2019

Endereço para correspondência

*e-mail: javiere@ifsc.usp.br

RESUMO

Lots of Educational Institutions hold their own geocollection due to its utility and versatileness in the practical formation of new generations of skillful professionals in many areas of Science and Technology. The Geoscience laboratory of the Federal University of Sao Carlos has a collection of minerals used in engineering, mineralogy and other technological courses ministered to undergraduates of different programs. Three samples of this collection were identified using Raman spectroscopy. The analysis carried out in this work enabled the characterization of the major mineral components in the samples as well as the identification of other minor crystalline phases present in the sample. It is important to notice that this information could not be obtained using the regular analyses of mineral properties, such as density, streak, hardness, brightness, cleavage, among others. As a result, the samples A170801 and A170802 were characterized as being mainly calcite (CaCO3) and spodumene (LiAlSi2O6), respectively. On the other hand, sample A170803 show the presence of three different minerals: graphite (C), quartz (SiO2) and muscovite [KAl2(Si3Al)O10(OH,F)2].

Palavras-chave: geocollection; Raman spectroscopy; mineralogy.

INTRODUÇAO

Os minerais sempre desempenharam um papel importante no modo de vida da humanidade. Na pré-história, a hematita (Fe2O3), a goethita (α-FeOOH) e os óxidos de manganês eram empregados como pigmentos nas pinturas rupestres.1-4 Minerais também foram utilizados na antiguidade pelas civilizaçoes assíria, egípcia, babilônica, grega e romana, como insumos medicinais.5 Com o passar dos tempos, os minerais tornaram-se cada vez mais relevantes e recorrentes na vida do homem e, hodiernamente, possuem elevada importância devido à profusao de significados e empregabilidade que apresentam.

Eles sao a principal fonte de metais, produtos químicos inorgânicos e matérias-primas essenciais ao desenvolvimento das indústrias farmacêutica, de fabricaçao, construçao civil, petróleo e de alta tecnologia. No Brasil, por exemplo, o espodumênio, principal fonte de lítio do país, é beneficiado para a produçao de hidróxidos e carbonatos desse elemento químico, que sao empregados na confecçao de baterias automotivas, vidros, cerâmicas e lubrificantes.6 Outro mineral importante é a calcita, principal constituinte de calcários de alta pureza, que é utilizada na construçao civil e na otimizaçao das propriedades físicas de cerâmicas, adesivos e tintas.7

Tendo em vista a importância desses recursos geológicos como fontes de matéria prima para o fomento de diversos setores industriais e para o entendimento da história e estrutura da Terra,8 há uma necessidade de formar técnicos e investigadores com conhecimento em geociências e mineralogia. Neste sentido, as geocoleçoes têm se mostrado como uma importante ferramenta na formaçao prática de novas geraçoes de profissionais qualificados em muitos campos da Ciência e Tecnologia.9

As coleçoes de minerais representam um recurso cultural relevante para a difusao do conhecimento científico e tecnológico,10 dado que elas possuem diversas finalidades, tais como pesquisa, exposiçao permanente ou mesmo usos educacionais e didáticos.11 Em virtude disso, várias instituiçoes ligadas às ciências geológicas detêm um acervo mineralógico. O Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Sao Carlos (UFSCar) possui uma coleçao mineralógica que é empregada em disciplinas ministradas aos alunos de graduaçao de diferentes cursos da universidade. Desse modo, a correta identificaçao de seus minerais se faz necessária, pois devido a sua importância, as coleçoes devem ser preservadas e periodicamente revistas e analisadas.11

Considerando o panorama apresentado, este trabalho tem como objetivo caracterizar três amostras pertencentes à coleçao mineralógica do Departamento de Engenharia Civil da UFSCar. Com base nesse objetivo será empregada a Espectroscopia Raman, uma vez que essa se configura como uma técnica rápida e eficiente para a identificaçao de minerais, além de fornecer informaçoes que nao podem ser obtidas por meio da análise das propriedades comuns de caracterizaçao como densidade, traço, dureza, brilho, clivagem, dentre outras. Assim sendo, os resultados oriundos deste trabalho poderao ser empregados em atividades de pesquisa, disciplinas acadêmicas e exposiçoes didáticas.

Espectroscopia Raman

As técnicas espectroscópicas sao constantemente utilizadas na identificaçao, caracterizaçao e elucidaçao de estruturas de moléculas e compostos, bem como no monitoramento e controle de reaçoes químicas. Elas estao fundamentadas na propriedade que átomos e moléculas têm de absorver ou emitir energia em uma determinada regiao do espectro eletromagnético, o que oferece informaçoes sobre a composiçao química e estrutura cristalina da amostra.12

Ao incidir radiaçao sobre um corpo, pode haver uma transiçao entre seus estados energéticos e, dependendo da regiao em que a energia da radiaçao incidente se encontra, ocorrem tipos distintos de transiçoes como as eletrônicas, que estao comumente estabelecidas na regiao do ultravioleta ou visível, as rotacionais, definidas na regiao de micro-ondas, as translacionais e as vibracionais, essas últimas situadas no visível, infravermelho ou infravermelho próximo.13

As transiçoes vibracionais sao estudadas através da espectroscopia vibracional que abrange três tipos de técnicas analíticas: a espectroscopia de absorçao no infravermelho, espectroscopia Raman (espalhamento Raman) e a espectroscopia de espalhamento de nêutrons. Entretanto, as espectroscopias de infravermelho e a Raman sao as mais utilizadas.14 Ambas as técnicas medem os níveis de energia vibratória associados às ligaçoes químicas na amostra através da interaçao da radiaçao eletromagnética com o movimento vibracional dos núcleos, o que gera o espectro vibracional.13 Tais espectros exibem uma maior riqueza de detalhes sobre o material analisado em detrimento dos espectros eletrônicos, que sao constituídos por bandas largas e deformadas, enquanto os vibracionais sao espectros únicos de cada material e das moléculas que o constituem.15

A espectroscopia Raman é uma técnica de espalhamento baseada no Efeito Raman, descoberto e publicado em 1928 pelo físico indiano Chandrasekhara Venkata Raman. O efeito caracteriza-se por uma alteraçao na frequência de uma pequena fraçao da radiaçao incidente quando esta é espalhada por moléculas ou estruturas cristalinas.

Em uma descriçao abreviada, o espalhamento ocorre através da interaçao das moléculas de uma amostra com uma luz monocromática eletromagnética. Nessa interaçao, os fótons incidentes excitam a molécula que está inicialmente em um nível vibracional do estado eletrônico fundamental para um estado virtual (intermediário), do qual ela se recupera imediatamente (cerca de 10 a 14 s),16 de três formas distintas.

Na primeira forma (Figura 1, esquema a), o espalhamento ocorre elasticamente (dispersao Rayleigh), uma vez que se emprega o princípio da conservaçao de energia, pois o fóton é espalhado sem sofrer alteraçao em seu valor de comprimento de onda, ou seja, a energia do fóton é a mesma antes e após sua interaçao com a matéria.17 Nas outras duas, há a ocorrência de espalhamento inelástico (efeito Raman), que acontece quando a molécula, ao retornar do estado virtual ao estado fundamental, adquire um nível energético mais alto ou mais baixo quando comparado com seu nível inicial. Se a molécula receber energia através da sua interaçao com o fóton incidente, E = hυ0, o fóton espalhado, E = h (υ0 - υ1), perderá a mesma porçao de energia que a molécula adquiriu. Nesse processo, o fóton espalhado possui energia menor que a do incidente. Esse espalhamento é do tipo Raman Stokes (Figura 1, esquema b).

 


Figura 1. Espalhamento da radiaçao eletromagnética: (a) espalhamento elástico (Rayleigh), (b) espalhamento inelástico (regiao Stokes) e (c) espalhamento inelástico (regiao anti Stokes)

 

Entretanto, devido à distribuiçao de Boltzman (N/N0, = e-(ΔE/kT), em que N é o número de moléculas inicialmente no estado excitado, N0 corresponde ao número de moléculas inicialmente no estado fundamental de vibraçao e ΔE é a diferença de energia entre esses dois estados)15 é possível que, em condiçoes ambientes, um número finito de moléculas já estejam vibracionalmente excitadas e, ao interagir com a radiaçao eletromagnética, elas acabem perdendo energia. Neste caso, o fóton espalhado adquire a energia dissipada pelas moléculas, E = h (υ0 - υ1),18 o que é caracterizado como espalhamento do tipo Raman anti-Stokes (Figura 1, esquema c).

Tendo em vista o potencial da espectroscopia Raman e os avanços no desenvolvimento de fontes lasers e detectores de maior sensibilidade, essa ferramenta tem sido frequentemente utilizada para fins mineralógicos, o que é amplamente destacado na literatura.2,18-25 Ela é comumente empregada na identificaçao de diversos minerais e pedras preciosas, pois fornece informaçoes sobre a composiçao molecular, a estrutura e as interaçoes intermoleculares da amostra.18-20,26-29 Trata-se de uma técnica nao destrutiva e nao invasiva e que requer um preparo mínimo da amostra,20,29,30 além de possibilitar o estudo de regioes micrométricas e das diferentes fases minerais presentes. Ademais, os espectros Raman apresentam alta resoluçao31 e sao como uma "impressao digital" do material analisado,29 concedendo detalhes estruturais que possibilitam a identificaçao de um determinado mineral e de outros materiais sólidos.18,20

 

PARTE EXPERIMENTAL

Minerais

Três amostras pertencentes à coleçao mineralógica do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Sao Carlos foram selecionadas para este estudo. Elas foram caracterizadas por espectroscopia Raman sem qualquer tipo de preparo prévio ou manipulaçao especial.

Espectroscopia Raman

As medidas de espectroscopia Raman deste trabalho foram realizadas no Instituto de Física de Sao Carlos (IFSC-USP) no espectrômetro Raman modelo LabRAM HR Evolution da marca Horiba Scientific, equipado com um monocromador Czerny-Turner, um detector CCD e um microscópio confocal Olympus (objetiva de 50x), que é usado para focalizar o laser no ponto desejado da amostra e para detectar a radiaçao espalhada.

Foram empregadas duas linhas de excitaçao laser: 532 e 633 nm, cujo critério de seleçao consistiu em minimizar efeitos indesejáveis de fluorescência que poderiam prejudicar a identificaçao das bandas características Raman. A potência do laser na superfície das amostras foi de, aproximadamente, 1 mW para evitar possíveis efeitos de degradaçao. Uma grade de difraçao com densidade de 600 linhas/mm e resoluçao de 2 cm-1 também foi utilizada (Tabela 1). O software LabSpec6 (Horiba Scientific) foi empregado na operaçao do equipamento e na aquisiçao dos espectros. Todos os espectros Raman experimentais foram comparados com a base de dados RRUFF (http://rruff.info/) e com a literatura, com o objetivo de identificar a composiçao dos minerais estudados. O ajuste da linha de base, a remoçao do background e a normalizaçao dos espectros ocorreu por meio do software CrystalSleuth, disponível gratuitamente pelo projeto RRUFF.

 

 

RESULTADOS E DISCUSSAO

As amostras A170801, A170802 e A170803 (Figuras 3, 5 e 7) foram analisadas por espectroscopia Raman, buscando nao apenas a caracterizaçao do mineral majoritário que as constituía, mas também a identificaçao da presença de outras espécies de minerais que compunham tais amostras. Os espectros apresentados a seguir sao representativos das amostras supracitadas e as frequências de vibraçao neles encontrados foram discutidas de acordo com a literatura.

 


Figura 2. Estrutura cristalina da calcita, CaCO3: Ca em cinza, C em marrom e O em vermelho.34

 

 


Figura 3. Amostra A170801 (calcita) e seu espectro Raman

 

 


Figura 4. Estrutura cristalina do espodumênio, LiAlSi2O6: tetraedros Si em azul, Al em cinza, Li em verde e O em vermelho45

 

 


Figura 5. Amostra A170802 (espodumênio) e seu espectro Raman

 

 


Figura 6. Estrutura cristalina da muscovita, KAl2(Si3Al)O10(OH,F)2: octaedros K em roxo, tetraedros Si em azul, octaedros Al em cinza, O em vermelho e (OH,F) em verde51

 

 


Figura 7. Amostra A170803 e os espectros Raman dos minerais que a constitui: espectro (a) muscovita, (b) quartzo e (c) mistura de grafita e muscovita

 

Espectroscopia Raman

Amostra A170801

O espectro Raman obtido para a amostra A170801 (Figura 2) é característico do mineral calcita (Figura 3). Ela é uma das formas polimórficas do carbonato de cálcio (CaCO3) na natureza, sendo o mineral carbonático mais importante e abundante.32,33

Os espectros Raman da calcita sao comumente divididos em três seçoes,32 sendo elas a regiao de 1700-1200 cm-1 relacionada com os modos de estiramento assimétrico das ligaçoes C-O do grupo CO3-2, a regiao de 1200-600 cm-1, que é característica ao estiramento simétrico C-O do CO3-2 e a regiao 500-100 cm-1, atribuída às vibraçoes externas do CO3-2. Analisando-se a Figura 3, é possível observar a presença de quatro bandas bem definidas que foram comparadas com dados presentes na literatura (Tabela 2).

 

 

Examinando atentamente a faixa de 1200-600 cm-1 no espectro medido, é notória a presença de uma banda intensa em 1085 cm-1 referente à vibraçao de estiramento simétrico do grupo carbonato.35 De acordo com Frost e colaboradores,35 a posiçao desta banda deriva da estrutura cristalina do mineral carbonático. Corroborando com isso, Faria4 esclarece que o carbonato de cálcio é encontrado na natureza em três formas cristalinas: calcita, aragonita e vaterita, as quais podem ser diferenciadas por espectroscopia Raman porque, apesar de terem a mesma composiçao, possuem arranjos cristalinos distintos. Ainda, a deformaçao angular no plano do íon CO32- origina uma banda Raman de baixa intensidade em 709 cm-1, sendo esta considerada uma banda característica da calcita.32,36 Na regiao do espectro Raman de 500-100 cm-1, sao observadas duas bandas nos comprimentos de onda, 152 e 279 cm-1, sendo a última mais intensa que a primeira. Essas bandas estao relacionadas às vibraçoes externas do grupo CO32-, que envolvem oscilaçoes translacionais e rotatórias desse grupo.37

Amostra A170802

A análise por espectroscopia Raman da amostra A170802 permitiu caracterizá-la como sendo constituída pelo mineral espodumênio (Figura 4). O espodumênio possui a formula química LiAlSi2O6 e pertence ao grupo dos piroxênios, fórmula geral M2M1Si2O6, apresentando simetria monoclínica e grupo espacial C2/c à baixa pressao.40 Na estrutura desse mineral, o sítio M1 forma cadeias de AlO6 que separam as cadeias tetraédricas de SiO4 e o sítio M2 apresenta coordenaçao 6, sendo este ocupado por Li.41 O espodumênio também apresenta três oxigênios em posiçoes simetricamente nao equivalentes: O1, O2 e O3. Os oxigênios O1 localizam-se no ápice do tetraedro de SiO4, os oxigênios O2 estao na base do tetraedro juntamente com os oxigênios O3, que sao considerados oxigênios em ponte (Op) por estarem ligados a dois átomos de silício, enquanto que os oxigênios O1 e O2 nao estao em ponte (Onp), pois cada um está ligado a apenas um átomo de silício.42,43

O espectro Raman dos silicatos de cadeias simples, como o espodumênio, sao caracterizados por quatro tipos de vibraçoes: as de estiramento dos oxigênios que nao estao em ponte (Si-Onp), as de estiramento de oxigênios em ponte (Si-Op), as vibraçoes de deformaçao da ligaçao O-Si-O e os modos de vibraçao cátion-oxigênio (M-O), que incluem os cátions M1 e M2.44

O espectro Raman obtido para a amostra A170802 é mostrado na Figura 5. As bandas correspondentes às vibraçoes Si-Onp sao observadas em 1016 cm-1, 1069 cm-1 e 1101 cm-1. Os modos de estiramento das ligaçoes Si-Op estao localizados em 703 cm-1 e 783 cm-1.

A banda atribuída ao dobramento da ligaçao O-Si-O é observada em 519 cm-1 e a situada em 439 cm-1 corresponde ao estiramento da ligaçao Al-O pertencente ao grupo AlO6. As demais bandas presentes na regiao de baixa frequência do espectro sao atribuídas às interaçoes cátion-oxigênio. Esses dados foram comparados com a literatura e se encontram sumarizados na Tabela 3.

 

 

Amostra A170803

As análises de espectroscopia Raman da amostra A170803 possibilitaram a identificaçao de três minerais nesse espécime: a muscovita, o quartzo e a grafita.

A muscovita (Figura 6) é um mineral pertencente ao grupo das micas, cuja fórmula química é KAl2(Si3Al)O10(OH,F)2.46,47 Sua estrutura é constituída por camadas tetraédricas-octaédricas-tetraédricas (TOT) unidas pelos cátions de K+, que ocupam os sítos octaédricos. O potássio é coordenado por dois íons OH- e por quatro oxigênios apicais que nao estao em ponte (Onp) e que pertencem às camadas tetraédricas superiores e inferiores. As camadas estruturais de muscovita possuem dois sítios tetraédricos, T1 e T2, que estao majoritariamente ocupados por Si4+. Tais camadas apresentam tetraedros individuais que estao unidos através do compartilhamento de oxigênios basais que se encontram em ponte (Op). Os cátions Al3+ formam uma camada de octaedros coordenados por quatro Onp e dois OH-.48,49

O espectro Raman obtido para a muscovita (Figura 7a) está de acordo com os dados da literatura e estes se encontram registrados na Tabela 4. As bandas localizadas nas frequências de 1092 cm-1 e em 906 cm-1 sao referentes às vibraçoes de estiramento de Si-O-Si e Si-O-Al, respectivamente. Já as bandas presentes em 747 e 701 cm-1, surgem em decorrência das vibraçoes de O-Al-O.48 As bandas localizadas em torno de 420 e 260 cm-1 envolvem vibraçao de tipos variados, sendo elas associadas principalmente às translaçoes O-Al-O e O-Si-O. O pico Raman em 189 cm-1 pode ser atribuído ao estiramento das ligaçoes Al-OH.50

 

 

O mineral quartzo (Figura 8) foi encontrado em uma pequena regiao da amostra A170803 após comparaçao do espectro obtido com a base de dados RRUFF.52 O quartzo, SiO2, possui sistema hexagonal e grupo espacial P3121 ou P3221. Ele é um dos minerais mais abundantes da crosta terrestre, representando cerca de 12% de seu peso e podendo ser encontrado em rochas ígneas e sedimentares.53 O espectro Raman obtido para esse mineral (Figura 7b) apresentou dez bandas relacionas a três tipos de vibraçoes, sendo elas o estiramento das ligaçoes Si-O, a deformaçao angular de O-Si-O e a deformaçao angular de Si-O-Si.54 As informaçoes obtidas foram comparadas e estao de acordo com dados presentes na literatura (Tabela 5).

 


Figura 8. Estrutura cristalina do quartzo, SiO2: Si em azul e O em vermelho55

 

 

 

Outro mineral encontrado na amostra A170803 foi a grafita (Figura 9). A grafita pertence ao sistema hexagonal, grupo espacial P63/mmc ou Rm e é estruturalmente construída a partir do empilhamento de planos hexagonais formados por átomos de carbono sp2. Os átomos de C presentes em um plano estao unidos por ligaçoes covalentes, e esses planos se mantêm sobrepostos por meio de uma interaçao fraca de Van der Waals.59,60 O espectro Raman da grafita é composto por uma única banda, conhecida como banda G, que pode ser observada nas proximidades de 1580 cm-1,61,62 sendo ela atribuída às vibraçoes longitudinais e transversais das ligaçoes C-C no plano.63 No espectro obtido para a amostra A170803 (Figura 7c), a banda G foi localizada em 1579 cm-1, o que condiz com os dados presentes na literatura.59-63 Entretanto, nao foi possível obter o espectro da grafita isoladamente, pois este mineral estava presente em grande quantidade na amostra juntamente com a muscovita. Deste modo, o espectro obtido possui bandas características da muscovita e a banda G da grafita, que foi identificada após comparaçao com a base de dados e com a literatura.

 


Figura 9. Estrutura cristalina da grafita, C.64

 

CONCLUSAO

Os dados espectroscópicos coletados para as três amostras mineralógicas pertencentes à coleçao de minerais do Departamento de Engenharia Civil da UFSCar permitiram obter informaçoes necessárias para a correta caracterizaçao dos seus constituintes, sendo este o objetivo deste trabalho. A comparaçao dos espectros Raman das amostras com os dados presentes na literatura possibilitou identificar que a amostra A170801 é formada pelo mineral calcita (CaCO3), que é um dos polimorfos do carbonato de cálcio encontrados na natureza. Também foi possível inferir que a amostra A170802 é constituída por espodumênio, LiAlSi2O6, e que a amostra A170803 apresenta uma composiçao heterogênea, sendo formada pelos minerais grafita (C), quartzo (SiO2) e muscovita [KAl2(Si3Al)O10(OH,F)2]. É válido ressaltar que tais informaçoes sobre A170803 nao poderiam ter sido obtidas por meio da análise das propriedades comuns de caracterizaçao de minerais como densidade, traço, dureza, brilho e clivagem; o que demostra o potencial da espectroscopia Raman para a caracterizaçao de minerais. Ademais, as descobertas desse trabalho possibilitam o uso das três amostras corretamente identificadas em disciplinas e atividades acadêmicas, auxiliando a formaçao prática de novas geraçoes de profissionais qualificados em muitos campos da Ciência e Tecnologia.

 

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Drª Marcilene Dantas Ferreira do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Sao Carlos por ter cedido as amostras analisadas neste trabalho. Agradecem ainda à Fundaçao de Amparo à Pesquisa do Estado de Sao Paulo (FAPESP - processos 2017/15761-8 e 2013/03487-8) e ao CNPq (113844/2018-2) pelo suporte financeiro.

 

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