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Conversão fotoeletrocatalítica de CO2 e biogás em produtos de interesse energético utilizando semicondutores nanoestruturados de Ti/TiO2 modificados com óxido de cobre Photoelectrocatalytic conversion of CO2 and biogas into products of energy interest using Ti/TiO2 nanostructured semiconductors modified with copper |
Laís Bresciani, Letícia Vognach, Carlos Henrique Lagemann; Simone Stülp*
Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas, Universidade do Vale do Taquari, 95914-014 Lajeado - RS, Brasil Recebido em 13/06/2019 e-mail: stulp@univates.br This work describes the superficial modification of Ti/TiO2 nanotubes by copper oxide electrochemical deposition, in different temperatures (25 and 65 ºC), and its application on the photoelectrocatalytic conversion of CO2 and biogas in products of energy interest. The different temperatures deposition resulted in the formation of different geometric forms on the surface of Ti/TiO2 nanotubes and in different photoelectrocatalytic activities. The photoelectrocatalytic conversion in 0.1 mol L-1 Na2SO4 with application of -0.1 V and UV irradiation resulted in the formation of acetone and methanol from CO2 and acetone and ethanol from biogas, being that the acetone production was higher for the semiconductor synthesized at 65 ºC, while the methanol and ethanol production was higher for the semiconductor at 25 ºC. The different characteristics observed, as well as the preferential formation of different products of photoelectrocatalytic reactions for semiconductors synthesized with different electrochemical deposition temperatures are discussed. INTRODUÇÃO A conversão de dióxido de carbono (CO2) emitido na atmosfera e presente no biogás em produtos combustíveis de valor agregado ou em substâncias químicas de interesse industrial tornou-se um dos maiores desafios ambientais da atualidade com o objetivo de minimizar as mudanças ambientais causadas pelas emissões antropogênicas de gases de efeito estufa, que levam ao aquecimento global.1,2 Entre as diversas possibilidades, a conversão de CO2 a produtos de interesse energético e industrial através da técnica de fotoeletrocatálise têm recebido grande atenção.1,3-15 Na sua versão mais comum, a fotoeletrocatálise consiste em um semicondutor que absorve fótons e permite a passagem de elétrons da banda de valência para a banda de condução com geração de pares de elétrons-/lacunas+ (e-/h+). Os elétrons são coletados no fotoânodo e são conduzidos até o contra eletrodo, no qual ocorrem as reações de redução, e no fotoânodo as lacunas geradas são consumidas por reações de oxidação.16 A conversão fotoeletrocatalítica de CO2 ocorre em um processo de múltiplas etapas que estão baseadas na transferência de múltiplos elétrons fotogerados e também na formação de radicais hidrogênio para produzir hidrocarbonetos.17 Esse processo pode levar à formação de uma ampla variedade de produtos, tais como metano, álcoois, aldeídos e ácidos carboxílicos, e uma aplicação promissora para a conversão fotoeletrocatalítica de CO2 em hidrocarbonetos pode ser o enriquecimento energético do biogás. Nesse processo, o CO2 pode ser convertido em um combustível adicional, como metano, metanol, etanol, dentre outros compostos, aumentando assim a eficiência energética da mistura gasosa e evitando sua liberação para a atmosfera.18 Os principais desafios atuais no campo da fotoeletrocatálise estão voltados no desenvolvimento de materiais semicondutores que possuam alta atividade, estabilidade e fotoatividade aprimorada.19 Há na literatura relatos sobre o uso de óxido de cobre como um bom material para a formação de álcoois6,7,9,20 por ser relativamente barato, por ser um semicondutor tipo p com bandgap de Eg = 1,7-2,1 eV e por ter energia da banda de valência apropriada para a redução do CO2.21,22 Porém, esse óxido pode sofrer fotocorrosão nos processos fotocatalíticos, comprometendo sua estabilidade quando aplicado para a redução de CO2 por meio de fotoeletrocatálise.23 Com o objetivo de melhorar a estabilidade do óxido de cobre, além de desenvolver um bom material para a redução de CO2 na formação de álcoois e hidrocarbonetos, a combinação de óxido de cobre com TiO2 tem sido relatada.24-27 Essa combinação é justificada, pois o TiO2 é um dos materiais mais utilizados nas técnicas fotocatalíticas devido às suas características, tais como estabilidade química, insolubilidade em água, não ser tóxico, ser de baixo custo e permitir a ativação por luz solar.28,29 Além disso, a combinação de óxido de cobre com TiO2 proporciona um aumento potencial na eficiência fotocatalítica, especialmente quando a luz visível é utilizada.30 Dentro desse contexto, este trabalho tem como objetivo a aplicação da técnica de fotoeletrocatálise na conversão de CO2 e biogás em produtos combustíveis de interesse energético, por meio da avaliação da eficiência de aplicação de diferentes eletrodos de Ti/TiO2 modificados com óxido de cobre, em diferentes temperaturas.
PARTE EXPERIMENTAL Síntese dos semicondutores de Ti/TiO2/óxido de cobre Inicialmente, realizou-se a síntese do semicondutor de titânio modificado com óxido de titânio (Ti/TiO2) por meio de oxidação anódica da placa de titânio, conduzida numa solução eletrolítica de fluoreto de amônio 0,25% em glicerol contendo 10% de água ultrapura, seguido pela calcinação em mufla a 450 ºC durante 30 minutos.31 Após a caracterização do semicondutor de Ti/TiO2, realizou-se a modificação superficial com óxido de cobre por deposição eletroquímica de filmes de óxido, conduzida numa solução eletrolítica constituída por sulfato de cobre II pentahidratado 0,4 mol L-1 e ácido lático 3 mol L-1. O cobre é estabilizado por complexação com íon lactato e o pH da solução foi ajustado a 9 pela adição de hidróxido de sódio 3 mol L-1.32 Os filmes de óxido de cobre foram depositados sobre a superfície do Ti/TiO2 em uma célula eletroquímica composta por três eletrodos, sendo o Ti/TiO2 utilizado como eletrodo de trabalho (11,25 cm2), um fio de cobre utilizado como contra-eletrodo e um eletrodo de Ag/AgCl em KCl 3 mol L-1 utilizado como eletrodo de referência. O potencial aplicado foi de -0,45 V e a deposição eletroquímica foi realizada em um potenciostato Autolab/PGSTAT 128N da Autolab/Eco Chemie durante 30 minutos. Além disso, para fins comparativos, realizou-se a deposição eletroquímica com a solução à 25 ºC e 65 ºC. Caracterização dos semicondutores sintetizados A morfologia dos semicondutores de Ti/TiO2 e Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizados à 25 ºC e 65 ºC foi analisada utilizando um Microscópio Eletrônico de Varredura (MEV), marca Carl Zeiss LS‑10. Após, realizou-se a avaliação do tamanho dos nanotubos e das partículas estruturais através do software ImageJ. A composição dos semicondutores foi confirmada através da análise de Espectroscopia de Energia Dispersiva (EDS), marca Oxford Instruments, além de análises de Espectroscopia no Infravermelho com Transformada de Fourier (FTIR), a partir da qual os espectros dos semicondutores de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizados à 25 ºC e 65 ºC foram obtidos utilizando um acessório de ATR (refletância total atenuada) e um espectrômetro IRAffinity-1 da Shimadzu na faixa de 4000 a 400 cm-1. Para verificar a fotoatividade dos semicondutores, foram realizados ensaios de fotocorrente utilizando o método de voltametria de varredura linear por meio de um potenciostato Autolab/PGSTAT 128N da Autolab/Eco Chemie. As análises foram realizadas em solução de Na2SO4 0,1 mol L-1 com e sem irradiação de luz UV/Vis (lâmpada de vapor de mercúrio de 250 W de alta pressão), condições de claro e escuro. Utilizou-se um sistema eletroquímico de três eletrodos, sendo o semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre utilizado como eletrodo de trabalho, uma placa de 70TiO2/30RuO2 DSA® utilizada como contra-eletrodo e Ag/AgCl em KCl 3 mol L-1 utilizado como eletrodo de referência. Aplicou-se um potencial de -0,8 V até 0,1 V, utilizando uma velocidade de varredura de 0,01 V s-1.7 O ensaio foi realizado para os semicondutores de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizados à 25 ºC e 65 ºC. Conversão fotoeletrocatalítica de CO2 e biogás sobre semicondutores de Ti/TiO2/óxido de cobre A conversão fotoeletrocatalítica de CO2 e biogás foi realizada em sistema aberto e em meio aquoso. Para as análises, utilizou-se CO2 industrial (White Martins) e biogás obtido após o processo de digestão anaeróbica de biomassas residuais de uma Cooperativa de alimentos do Vale do Taquari - RS, com composição aproximada de 66,45% de CH4, 23,89% de CO2 e 9,66% de outros gases. A solução eletrolítica utilizada foi de Na2SO4 0,1 mol L-1, sendo ela saturada com o gás (CO2 ou biogás), por borbulhamento, durante 40 minutos antes do início da FEC. As análises de conversão fotoeletrocatalítica foram realizadas em uma célula eletroquímica de três eletrodos contendo o semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre, utilizado como eletrodo de trabalho, uma placa de 70TiO2/30RuO2 DSA®, utilizada como contra-eletrodo e Ag/AgCl em KCl 3 mol L-1 utilizado como eletrodo de referência, além de uma lâmpada de vapor de mercúrio de 250 W de alta pressão inserida em um tubo de quartzo. A temperatura do sistema foi mantida a 10 ºC através de uma camisa dupla, com auxílio de um banho termostatizado. Para o processo FEC, o eletrodo de trabalho foi submetido a um potencial de -0,1 V, com borbulhamento de gás durante todo o experimento (2 horas). Além do tempo total, experimentos com tempos intermediários foram realizados para compreensão das reações ocorridas. Após, alíquotas foram retiradas da solução eletrolítica para analisar os produtos de conversão fotoeletrocatalítica de CO2 e biogás. As análises foram realizadas para os semicondutores de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizados à 25 ºC e 65 ºC, em triplicatas. Os resultados são expressos como médias acompanhadas de desvio padrão. Identificação e quantificação dos produtos da conversão fotoeletrocatalítica de CO2 e biogás Os produtos formados na redução do CO2 e biogás através da técnica de FEC foram identificados e quantificados por meio da técnica de cromatografia a gás, utilizando um cromatógrafo gasoso modelo GCMS - QP2010 Ultra, da Shimadzu. A solução da redução do CO2 e do biogás após a técnica de FEC foi submetida à técnica de headspace estático, em vial de vidro. No procedimento adotado, transferiu-se 10 mL da solução para um recipiente próprio para headspace, adequadamente fechado, o qual foi submetido a uma temperatura de 80 ºC durante 7 min com agitação constante. Após, 250 µL do vapor foram injetados no cromatógrafo. Utilizou-se uma coluna Rtx® - Wax (polietilenoglicol), da Restek (30 m × 0,25 mm × 0,25 µm) e a temperatura do injetor e do detector foi de 220 °C. A rampa de aquecimento foi de 35 °C por 4 min, a 40 °C min-1 até 220 °C durante 2 minutos. Curvas de calibração para a quantificação de acetona, metanol e etanol foram construídas com uma relação linear de 1 a 100 ppb, r = 0,99780, r = 0,999409 e r = 0,98507, respectivamente.
RESULTADOS E DISCUSSÕES Características morfológicas e composição dos semicondutores A Figura 1 apresenta as características morfológicas obtidas para o Ti/TiO2 antes (a) e após a deposição eletroquímica de óxido de cobre à 25 ºC (b) e 65 ºC (c). Avaliando a morfologia superficial do eletrodo apresentada na Figura 1a, pode-se verificar que após o processo de oxidação anódica seguido de calcinação em mufla houve a formação de nanotubos de TiO2 sobre a placa de Ti com diâmetro interno médio de 90,3 nm, sendo essa formação o resultado de uma competição entre a formação de óxido poroso superficial e sua dissolução.33 Após a deposição eletroquímica de óxido de cobre à 25 ºC na superfície do Ti/TiO2 (Figura 1b), verifica-se que há o recobrimento dos nanotubos de Ti/TiO2 com partículas de óxido, com comprimento médio de 0,41 µm e formato esférico, e após a deposição eletroquímica de óxido de cobre à 65 ºC, Figura 1c, é possível verificar que a superfície dos nanotubos de Ti/TiO2 foi recoberta com partículas de óxido de geometria piramidal com comprimento médio de 1,14 µm.
![]() Figura 1. (a) Morfologia superficial do semicondutor de Ti/TiO2-NTS, aumento de 50.000 vezes (b) morfologia superficial do semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 25 ºC, aumento de 30.000 vezes e (c) morfologia superficial do semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 65 ºC, aumento de 20.000 vezes
Segundo Sui et al.,34 o óxido de cobre pode apresentar diferentes formas geométricas quando depositado em uma superfície e isso depende de parâmetros, tais como temperatura e tempo de reação. Analisando as Figuras 1b e 1c, observa-se que há uma diferença morfológica em função das diferentes temperaturas de deposição, ou seja, as diferentes formas geométricas dos semicondutores sintetizados podem ser explicadas em função das diferentes temperaturas de deposição eletroquímica de óxido de cobre. O cobre pode existir em vários estados de oxidação: Cu0, CuI, CuII e CuIII, sendo que nos sistemas fotocatalíticos de TiO2 as espécies de cobre ativas são os óxidos de cobre (Cu2O, CuO) e cobre metálico. O band gap de energia do CuO é menor do que o band gap do Cu2O e, por isso, o CuO é capaz de absorver mais fótons. No entanto, as posições das bandas de condução e de valência para o CuO são insuficientes para catalisar a produção de radicais hidroxila e superóxido, o que limita a eficiência do semicondutor para as reações de oxidação e redução fotocatalíticas. Assim, a maior atividade fotocatalítica é atribuída ao Cu2O para a degradação de compostos orgânicos.35 Com base na literatura,32,36 é importante destacar que a deposição eletroquímica de óxido de cobre na superfície dos nanotubos de TiO2, realizada em diferentes condições (incluindo a temperatura), pode formar óxidos com diferentes estados de oxidação do cobre, como CuO (Cu2+) e Cu2O (Cu+), sendo que nas condições experimentais utilizadas no presente estudo, em função do potencial aplicado e temperaturas utilizadas,37,38 a formação preferencial é a do Cu2O. Isso é corroborado por análises de FTIR realizadas, onde na análise dos espectros dos filmes de óxido de cobre depositados, existe uma banda em 650 cm-1, atribuído ao Cu2O. A análise de EDS confirmou a presença de Cobre, Titânio e Oxigênio no semicondutor de Ti/TiO2 com deposição eletroquímica de óxido de cobre à 25 ºC e 65 ºC. A porcentagem em massa dos elementos presentes na superfície do semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 25 ºC foi de 65,77% ± 0,76 de Cu, 22,79% ± 0,13 de O2 e 11,44% ± 0,90 de Ti e para o semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado a 65 ºC foi de 83,97% ± 0,42 de Cu e 17,79% ± 0,46 de O2 e 1,24% ± 0,014 de Ti. Ainda, a espessura da camada de óxido depositada foi determinada, sendo que para o eletrodo à 25 °C a espessura foi de 1,34 µm, e para o eletrodos à 65 °C foi de 5,14 µm. Com esses resultados, percebe-se que além das diferenças morfológicas em função das diferentes temperaturas de deposição de óxido de cobre, há uma maior deposição de cobre na superfície dos nanotubos de Ti/TiO2 quando a temperatura da solução de deposição eletroquímica é maior. Ensaios de fotocorrente Os resultados dos ensaios de fotocorrente podem ser visualizados na Figura 2, que mostra a voltametria linear do semicondutor, demonstrando o comportamento do Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 65 ºC em meio Na2SO4 0,1 mol L-1, na presença e ausência de irradiação UV (nas condições de claro e escuro), e na presença e ausência de CO2.
![]() Figura 2. Densidade de corrente vs. potencial em meio de Na2SO4 0,1 mol L-1 para o semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 65 ºC, condições (A) escuro, (B) claro, (C) escuro com CO2 e (D) claro com CO2, v = 0,01 V s-1
Ao comparar as curvas nas condições claro e escuro, percebe-se que nos potenciais mais negativos as curvas são influenciadas pela redução da água levando à evolução de hidrogênio no meio reacional, que ocorre em função dos elétrons gerados na superfície do eletrodo por meio da separação dos pares e-/h+ devido à ativação do semicondutor sob ação de irradiação UV. Já quando o eletrodo é submetido às mesmas condições, porém com o borbulhamento do CO2 no meio, há variação nos valores de corrente medidos, em regiões de potenciais menos negativos, o que pode indicar uma redução preferencial do CO2 em relação à água. Quando o biogás é borbulhado no meio estudado, há também variação do perfil das curvas na presença e ausência do gás, porém essa é menos intensa, podendo ser devido à menor quantidade de CO2 presente no meio (Figura 1S). Esse resultado indica a fotoatividade do semicondutor, apresentando-se como um bom material para aplicação na redução do CO2 e do biogás. Esse comportamento é mais acentuado para o eletrodo sintetizado à 65 °C quando comparado ao eletrodo à 25 °C (Figura 2S), e isso pode estar relacionado com as diferentes morfologias de óxido de cobre formadas na superfície do semicondutor de Ti/TiO2 em função das diferentes temperaturas de deposição eletroquímica, além da maior quantidade de óxido presente quando a deposição é realizada à 65 °C. Com isso, pode-se inferir que o semicondutor modificado com óxido de cobre à 65 °C possui maior atividade fotocatalítica, em função da estrutura piramidal, em comparação com o semicondutor modificado com óxido de cobre à 25 °C. Esse resultado corrobora com os descritos na literatura,35,39 que indicam que diferentes óxidos formados apresentam diferentes atividades fotocatalíticas. Produtos da conversão fotoeletrocatalítica de CO2 e biogás Acetona e metanol foram os produtos obtidos nas reações de conversão do CO2 através da FEC sobre os semicondutores de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizados à 25 ºC e 65 ºC e estão apresentados na Figura 3. Para o semicondutor Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 25 ºC a produção de metanol foi cerca de 2,5 vezes maior e para o semicondutor Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 65 ºC a produção de acetona foi cerca de 12 vezes maior.
![]() Figura 3. Produtos formados na conversão fotoeletrocatalítica do CO2
As reações de redução do CO2 por meio de fotoeletrocatálise ocorrem em um processo de múltiplas etapas, incluindo adsorção, transferência de elétrons e reações subsequentes.40 A redução do CO2 para a formação de metanol41 e acetona envolve a transferência de vários elétrons na reação e estão apresentadas a seguir. A formação preferencial desses produtos depende da atividade fotoeletrocatalítica dos semicondutores utilizados, do potencial aplicado e também da composição do eletrólito suporte.41 ![]() O comportamento fotoeletrocatalítico dos semicondutores corrobora com os resultados apresentados na discussão das diferenças morfológicas dos semicondutores, como consequência das diferentes temperaturas de deposição eletroquímica. Como discutido anteriormente, dependendo da estrutura do óxido formado,39 ele pode apresentar maior atividade fotocatalítica35 e a partir dos resultados apresentados na Figura 3 percebe-se que o semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 65 ºC possui a maior atividade fotoeletrocatalítica e é mais eficiente em termos de geração de produtos. Isso porque a aplicação deste semicondutor levou à formação de produtos que exigem um maior número de elétrons para a sua geração,42 sendo que a eficiência faradaica específica para formação de acetona, a partir da utilização do eletrodo formado à 65 °C, foi de 87% para as duas horas de reação fotoeletroquímica. Segundo Brito e colaboradores,9 o radical CO2- é o principal intermediário de redução do CO2, seguido de reações de adição / protonação de elétrons. As reações de formação de metanol e acetona a partir da redução fotoeletrocatalítica de CO2 estão apresentadas a seguir. O mecanismo foi proposto de acordo com a literatura43,44 e está baseado na transferência de e- e H. De acordo com Qi et al.,45 o Cu2O possui alta seletividade e preferência para a formação de metanol, então, o mecanismo provável para a formação dos produtos obtidos é via metanol, que é considerado como um produto sacrificial que precisa ser formado inicialmente para posterior geração de acetona. ![]() A fotoconversão de CO2 em produtos químicos de valor agregado é uma estratégia para buscar opções energéticas viáveis e de baixo impacto ambiental.46 O metanol obtido na redução de CO2 através da técnica da FEC pode ser utilizado como aditivo/substituto de combustíveis convencionais, como a gasolina,47 e a acetona pode ser utilizada como aditivo para a gasolina48 ou em misturas com butanol como combustível aditivo para o diesel convencional.49 Além disso, outra possível aplicação para a conversão fotoeletrocatalítica de CO2 utilizando semicondutores de Ti/TiO2 modificados com óxido de cobre pode ser o enriquecimento energético do biogás. Esse processo consiste na conversão do CO2 da mistura gasosa em hidrocarbonetos de interesse energético, aumentando assim a eficiência energética do biogás e reduzindo as emissões de CO2 na atmosfera.18 Acetona e etanol foram os produtos obtidos na conversão fotoeletrocatalítica do biogás sobre os semicondutores de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizados à 25 ºC e 65 ºC e estão apresentados na Figura 4. Analisando os resultados, percebe-se que para o semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 25 ºC a formação de etanol foi cerca de 2,9 vezes maior em comparação com a quantidade de acetona formada. Já no semicondutor de Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado à 65 ºC a formação de acetona foi cerca de 1,9 vezes maior em relação à formação de etanol, resultados estes semelhantes aos obtidos na reação de redução de CO2, para os diferentes eletrodos. Na reação com o biogás, diferentemente do ocorrido com a presença de CO2, os produtos formados foram acetona e etanol.
![]() Figura 4. Produtos formados na conversão fotoeletrocatalítica do biogás
Esses resultados demonstram que a formação de acetona ocorreu a partir da conversão do CO2 presente na mistura gasosa do biogás, conforme apresentado na reação 2. Além disso, corroboram com a discussão anterior sobre a maior atividade fotoeletrocatalítica do semicondutor sintetizado à 65 ºC que levou à formação preferencial de um produto que exige um maior número de elétrons envolvidos na reação para a sua formação.41 No entanto, a produção de acetona a partir do biogás foi 2 vezes menor do que a partir do CO2, indicando que o metano presente na mistura, e a menor quantidade de CO2, pode ter papel fundamental na formação dos produtos. Isso pode ser observado principalmente a partir da formação de etanol, que não foi observado na conversão fotoeletrocatalítica do CO2. Na literatura são reportados estudos nos quais há a produção de etanol a partir da redução de CO2, ou ainda a partir do metano,50-53 em ambas reações um dos intermediários reportados é o metanol.51 Cabe aqui mencionar que no sistema estudado com a presença de biogás, há maior número de carbonos disponíveis e, portanto, a disponibilidade de CH.3 é maior, em função da concentração de metano presente. Neste estudo, a formação de metanol não é observada, nos tempos intermediários de 30 minutos e 1 hora, pois ele provavelmente é formado em etapas iniciais, nos primeiros instantes da reação, como já observado em outros trabalhos da literatura,9 sendo posteriormente consumido na formação de etanol. As reações de conversão fotoeletrocatalítica de CO2 e biogás sobre semicondutores de Ti/TiO2/óxido de cobre em produtos combustíveis de interesse energético54 são estratégias promissoras para evitar o acúmulo de CO2 na atmosfera e para aumentar a eficiência energética do biogás. Outra possível aplicação pode ser a conversão do CO2 após a purificação do biogás, que consiste na remoção do CO2 e no aumento da concentração de CH4. Após a purificação, o CO2 pode ser armazenado e convertido em produtos de interesse a partir da técnica da fotoeletrocatálise, evitando assim sua liberação na atmosfera. Vale ressaltar que a escolha do semicondutor fotoeletrocatalítico e da aplicação depende das necessidades e da viabilidade para os processos atuais.
CONCLUSÃO A partir dos resultados obtidos, pode-se concluir que a deposição eletroquímica de óxido de cobre à 65 ºC formou um semicondutor mais eficiente e com maior atividade fotoeletrocatalítica, pois levou à formação de produtos que exigem um maior número de elétrons para a sua geração. A conversão fotoeletrocatalítica resultou na formação de acetona e metanol a partir do CO2 e acetona e etanol a partir do biogás. Esses resultados demonstram que além do CO2, o metano presente no biogás teve papel fundamental na formação dos produtos das reações de conversão do biogás. Esses resultados contribuem na busca por materiais semicondutores que sejam eficientes para aplicação na fotoconversão de CO2, que possuam alta atividade, estabilidade e fotoatividade aprimorada para o campo da fotoeletrocatálise. Além disso, esse trabalho fornece opções alternativas para converter o CO2 e o biogás em produtos combustíveis de interesse energético com o intuito de evitar o acúmulo de CO2 na atmosfera e de aumentar a eficiência energética do biogás.
MATERIAL SUPLEMENTAR No material suplementar, disponível em http://quimicanova.sbq. org.br na forma de arquivo PDF, com acesso livre, encontram-se os resultados dos ensaios de fotocorrente do Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado a 65 ºC em meio Na2SO4 0,1 mol L-1, na presença e ausência de irradiação UV (nas condições de claro e escuro), e na presença e ausência de biogás é apresentado na Figura 1S. E os resultados dos ensaios de fotocorrente do Ti/TiO2/óxido de cobre sintetizado a 25 ºC em meio Na2SO4 0,1 mol L-1, na presença e ausência de irradiação UV (nas condições de claro e escuro), e na presença e ausência de CO2 na Figura 2S.
AGRADECIMENTOS Os autores agradecem aos técnicos Dra. M. B. Horn e Dr. V. Ilha, à CAPES e o CNPq (310253/2016-0) pelos auxílios financeiros concedidos.
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