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O químico e o meio ambiente: aspectos históricos e as contribuições do ensino de gestão ambiental Chemicals and the environment: historical aspects and the contributions of environmental management teaching |
Suellen A. Alves*
Departamento de Química, Universidade Estadual de Ponta Grossa, 84030-900 Ponta Grossa - PR, Brasil Recebido em: 19/07/2021 *e-mail: saalves@uepg.br Global environmental issues have gained strength since the 1960 decade and the relationship between the chemical industry and the environment has become increasingly tight since then. In this sense, environmental management has gained more space making organizations think strategically about their business and the possible impacts that they can promote on the environment. The present paper shows two brief timelines: the history of the chemical industry and the important events for environmental issues. In addition, it reports an investigation into the insertion of the discipline of environmental management in curricular matrices of institutions in Paraná and didactic experiments carried out at the State University of Ponta Grossa: simulation of environmental audit and analysis of the environmental management of the chemistry teaching laboratories of that institution a from the survey of environmental aspects and impacts and the elaboration of the environmental risk index. Finally, a questionnaire is shown with the graduates who took the discipline and how they perceive the importance of it in professional life. The reflection on social and environmental responsibility is extremely important for sustainable development and the chemist has a leading role in this path. INTRODUÇÃO A gestão ambiental pode ser compreendida como um conjunto de práticas e procedimentos que auxiliam toda e qualquer organização a ter maior entendimento dos impactos que seus produtos e serviços podem causar ao meio ambiente. Segundo o professor Barbieri, a gestão ou administração ambiental pode ser entendida como as diretrizes e atividades administrativas necessárias para que uma organização, independente do seu porte, possa atingir efeitos positivos sobre o meio ambiente. Ainda, para este autor o termo gestão ambiental pode ser aplicado para qualquer iniciativa que esteja relacionada com a questão ambiental.1 No que se refere à gestão ambiental institucional, especificamente no setor industrial, é observada que sua evolução se deu a partir do maior entendimento das questões ambientais e que as diversas práticas industriais podem ser associadas com crescimento econômico e responsabilidade socioambiental. Tecnologias de remediação e de controle de final de processo industrial são substituídas por uma abordagem estratégica, com atitudes proativas e com a visão de que a sustentabilidade é inevitável para os padrões de consumo atuais.2,3 Os sistemas de gestão ambiental surgiram como meio de associar as funções administrativas e operacionais das organizações em busca da mitigação dos impactos ambientais causados por elas. Historicamente, o primeiro programa de sucesso surgiu no Canadá em 1985 pelas indústrias químicas deste país com o objetivo de promover investimentos nas áreas de saúde, segurança e meio ambiente. O programa chamado de Responsible Care Program teve como maior destaque o diálogo aberto com a sociedade e parcerias com o governo.4 Outros programas foram então surgindo pelo mundo e ganhando cada vez mais espaço e colaborando para as questões ambientais e conquistas de novos mercados. Outro exemplo é o sistema criado pela Câmara de Comércio Internacional (ou International Chamber of Commerce, ICC), a qual é a maior organização não governamental e empresarial mundial. Nesse sistema foram estabelecidos 16 princípios que trazem a gestão ambiental como uma questão estratégica pela administração da organização.5 A contribuição da união européia veio com o programa Eco Management and Audit Scheme (EMAS), um sistema para gestão e auditoria ambiental. Dentre seus princípios estão: melhoria contínua do desempenho ambiental, cumprimento da legislação ambiental, informação pública (declaração ambiental) e participação dos colaboradores das organizações que possuem tal sistema.6 Muitos outros modelos surgiram pelo mundo para obter uma abordagem estratégica em organizações de diferentes setores. Todavia, a primeira norma em relação à gestão ambiental surgiu em 1992 e criada pelo British Standards Institute (BSI) e denominada de BS (British Standard) 7750.3 A primeira versão publicada desta norma cita os requisitos para o desenvolvimento, implantação e manutenção de sistemas de gestão ambiental. As organizações deveriam formular políticas e estabeler objetivos considerando a disponibilização das informações sobre efeitos ambientais significativos e ainda mostrar o cumprimento da política ambiental estabelecida para terceiros. Essa norma foi a base para a publicação de uma norma pelo International Organization for Standardization (ISO).7 Desse modo, a ISO criou a série ou família da ISO 14000 que envolve as diretrizes para um sistema de gestão ambiental e outros temas como ciclo de vida de produto, avaliação de desempenho ambiental entre outros. A norma mais conhecida é a ISO 14001, no Brasil é conhecida como ABNT NBR 14001, uma vez que é a única certificadora desta série. Esta norma auxilia na melhora do desempenho das organizações a partir da utilização eficiente dos recursos e da redução da quantidade de resíduos. A última atualização desta norma foi publicada no ano de 2015.8 Para entender melhor a relação da gestão ambiental na formação de um Bacharel em Química, é necessário viajar pelo tempo e entender a relação da indústria química mundial com o meio ambiente e os principais eventos que contribuíram para que ambos caminhassem lado a lado. A indústria química e o meio ambiente: um breve histórico É imprescindível avaliar a história da indústria química bem como todos os eventos importantes que mudaram a visão dos stakeholders, ou seja, todas as pessoas interessadas na organização, em relação ao meio ambiente. Na Figura 1 é apresentado uma breve linha do tempo com os principais eventos do desenvolvimento da indústria química em âmbito mundial. O marco inicial da produção industrial de produtos químicos se dá com a revolução industrial. Diversos produtos já eram obtidos, tais como H2SO4, pigmentos, entre outros. Todavia, eles eram produzidos pequena escala atentendo apenas pequenos mercados consumidores. O processo de obtenção da barillha, Na2CO3, foi objeto de grande interesse mundial, uma vez que esse produto químico tem grande importância para fabricação de diversos produtos como vidro, papel, têxteis e tantos outros produtos. O processo LeBlanc se estabeleceu em 1773, mas caiu em desuso anos mais tarde principalmente pelos resíduos gerados no processo: CaS e HCl.9 O primeiro produto químico apresentava odor forte característico e posterior liberação de H2S e o segundo era produzido na forma de gás. A partir disso, surgiu em 1863 a Lei Alkali Britânica, a primeira lei ambiental para a qualidade do ar para coibir a descarga no ar de gás nas plantas do processo LeBlanc.8 Em 1864, o pesquisador Solvay desenvolveu um processo para produção da barrilha mais ambientalmente adequado sendo o principal resíduo do processo o CaCl2.9
A produção industrial de H2SO4 também era uma necessidade evidente da época. Desde o século X já sabia como produzir tal ácido mas ainda precisava de um processo em larga escala. As câmaras de chumbo foram desenvolvidas para produzir este ácido, porém sua pureza não ultrapassava 78%. Assim, em 1831 foi desenvolvido o método de contato pelo britânico Peregrine Phillips sendo possível obter H2SO4 com maior pureza e sendo este um insumo fundamental para diversas indústrias químicas e de transformação.9 Em relação à química fina, temos o marco histórico dos trabalhos realizados por William Perkin que abriu caminho para produção de corantes e fármacos. Esse químico tentava sintetizar a quinina, um alcalóide com funções antitérmicas, antimaláricas e analgésicas, e obteve um corante púrpura, a malvaína.10 Dentre os anos de 1860-1870 as gigantes indústrias alemãs foram fundadas e destacaram o papel da ciência e da tecnologia para o mundo a partir do desenvolvimento de produtos químicos de interesse da sociedade, especialmente fármacos. Entre o final do século XIX e início do século XX destaque deve ser dado a todos os esforços para produção industrial de NH3. Grandes nomes como Wilhelm Ostwald, Carl Bosch, Henry Louis Le Chatelier, Fritz Haber, Hermann Walter Nernst, Robert Le Rossignol contribuíram para essa história de sucesso e produção em larga escala pela BASF® a partir de 1916.11 A primeira Guerra Mundial impulsionou a produção de certos produtos químicos, especialmente relacionados com os explosivos. A IG Farben, um conjunto das maiores companhias químicas, foi fundada em 1925 produziram tinturas e depois começaram a dedicar-se a outros setores mais avançados da indústria química. Contudo, em um dos episódios mais triste da história mundial esse conjunto de companhias foi responsável pela fabricação do produto usado nas câmaras de gás e culminou também na evasão de cientistas premiados para outros países.12 Em 1950 os Estados Unidos ganharam espaço no mercado mundial das indústrias químicas produzindo inúmeros produtos químicos e petroquímicos. E no Brasil, maior destaque se dá a partir da década de 1970 com a instalação de grandes indústrias farmacêuticas e pelo crescimento e incentivo ao setor de petróleo.13 A indústria química de modo geral teve uma postura reativa até meados dos anos de 1960. Essa abordagem se reflete nos acidentes que ocorreram ao longo da história conforme mostrado na Figura 2. Desses, podemos citar o ocorrido em 1947 nos Estados Unidos com a explosão de navio que carregava o produto químico NH4NO3 e o vazamento de mercúrio (na forma orgânica de CH3Hg+) e envenenamento da população na cidade de Minamata, Japão.14,15 Neste último caso de repercussão mundial, uma indústria lançava resíduos na baía de Minamata contendo esse composto desde os anos de 1930 e o primeiro caso resultado da intoxicação em humanos foi registrado em 1956.
Um dos grandes marcos na preocupação com o meio ambiente sem dúvidas foi o trabalho da bióloga marinha Rachel Carson que após uma série de investigações publicou o livro Primavera Silenciosa. Nele, a pesquisadora relata de maneira muito clara e compreensível para todo o público o uso desenfreado dos organoclorados, produtos sintéticos destinados ao controle de pragas em plantas, e seus efeitos nocivos aos seres vivos.16 A consequência dessa publicação foi inevitável: maior pressão das ONG's (organizações não-governamentais) ambientalistas e da sociedade. Além disso, órgãos foram criados mundo a fora para tratar do assunto sendo o principal fato resultante desta publicação a própria criação da Agência de Proteção Americana em 1970.17 Outros acidentes ocorreram e registrados na história, tais como: liberação de gás tóxico contendo dioxina de uma indústria química em Seveso na Itália em 1976, vazamento de C2H3NO (isocianato de metila) de uma fábrica de pesticidas em Bhopal na Índia em 1984 e derramamento de pesticidas no rio Reno na Basiléia, Suíça.18-20 E ainda, destaca-se a explosão na plataforma de perfuração no mar do Golfo, Estados Unidos em 2010 após uma série de erros humanos. Esse derramamento de óleo é considerado um dos maiores desastres ambientais dos Estados Unidos.21 A Organização das Nações Unidas (ONU) teve papel fundamental na mudança de postura da indústria química agindo de maneira proativa e trazendo programas que contribuem para o desenvolvimento sustentável. Em 1972 foi criado o PNUMA, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e a publicação da Declaração de Estocolmo na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano. Em 1987 foi publicado o relatório de Bruntland ou também chamado de Nosso Futuro Comum onde o termo desenvolvimento sustentável ganhou ainda mais força.22,23 Em 1995 a ISO cria a série 14000 que tem por objetivo auxiliar as organizações a medirem seus impactos ambientais e agirem de forma estratégica com seus negócios visando o crescimento econômico mas com ações que preservem o meio ambiente. Por fim, em 2015 a ONU lança aos seus países membros a Agenda 2030 com os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 169 metas ambiciosas para que esses países alcancem o desenvolvimento sustentável em todos os âmbitos até o ano de 2030.23 Desse modo, o presente estudo apresenta uma breve investigação das matrizes curriculares paranaenses sobre a oferta de disciplinas de gestão ambiental e correlatas. Além disso, tem como objetivo relatar as propostas didáticas realizadas no curso de Química Tecnológica com ênfase em Química Ambiental da UEPG em Ponta Grossa, PR e avaliar estas práticas a partir da análise da relevância da disciplina para os egressos do curso bem como discutir os desafios e oportunidades de ensino da temática de gestão ambiental.
METODOLOGIA Avaliação das matrizes curriculares das instituições públicas paranaenses Inicialmente avaliou-se as matrizes curriculares das 7 instituições de ensino superior (IES) paranaenses, tanto estaduais como federais que apresentam o curso de Bacharelado em Química ou Bacharelado em Química com atribuições tecnológicas a partir da coleta de dados seus respectivos sites, especialmente nos dados das Pró-Reitorias de Ensino ou de Graduação. A partir dessa busca foram contabilizados 9 cursos de graduação uma vez que uma das instituições oferece a possibilidade de habilitação em atribuições tecnológicas e outra instituição apresenta o curso em dois campi distintos. Posteriormente, realizou-se a investigação nos dados dos cursos que apresentavam a disciplina de Gestão Ambiental (ou nome similar) em sua matriz curricular, tanto como disciplina obrigatória como optativa. Após esta etapa de levantamento de dados também foi verificada a inserção de disciplinas correlatas à gestão ambiental, tanto obrigatórias como optativas, nas matrizes curriculares desses cursos de química. A disciplina de gestão ambiental no curso de Bacharelado em Química UEPG: aplicação de propostas didáticas A disciplina de Gestão Ambiental e Metodologia ZERI oferecida ao curso de Bacharelado em Química Tecnológica com ênfase em Química Ambiental da UEPG apresentava carga horária de 68 h no regime semestral e foi oferecida no currículo 3 do referido curso. Desde 2017 até 2020 a disciplina foi ministrada com diferentes propostas pedagógicas no sentido de despertar ao aluno de Bacharelado em Química as questões relacionadas ao meio ambiental, desenvolvimento sustentável e a gestão ambiental empresarial. Nesse sentido, as propostas pedagógicas realizadas foram: simulação de auditoriais ambientais e avaliação da gestão ambiental nos laboratórios de química conforme descrito abaixo. Simulação de auditoria ambiental As simulações de auditoria ambiental são atividades recorrentes na disciplina de gestão ambiental, isto é, foi realizada entre os anos de 2017 e 2020 e consistem em 4 etapas. São elas:
As turmas dos anos citados foram divididas em equipes e cada uma avaliou uma indústria química, nacional ou multinacional, a partir da coleta de informação nos seus sites, especialmente nos relatórios de sustentabilidade, políticas ambientais entre outros documentos publicados por estas indústrias. Esses dados publicados de maneira clara e objetiva possibilitaram aos alunos conhecer a atuação das mesmas bem como suas políticas no que diz respeito as suas responsabilidades socioambientais. O tipo de auditoria nestes três anos relatados foi a auditoria de desempenho ambiental. Essa auditoria tem por objetivo a verificação detalhada do desempenho ambiental da organização em operação e normalmente é solicitada a cada requerimento ou renovação de licença ambiental.1 As equipes divididas tiveram que escolher as funções fictícias para: auditor líder (gerente), auditores e especialistas. Os itens necessários para realização da auditoria bem como da documentação a ser entregue para a professora foram: identificação, plano de auditoria, constatações da auditoria, propostas de melhorias e conclusões da auditoria. Além disso, os alunos tiveram que construir um questionário pré- auditoria e uma tabela com indicadores de desempenho ambiental (identificação dos aspectos ambientais e indicadores de desempenho). Ao final, cada equipe faz apresentação da auditoria e ocorre discussão sobre a atividade realizada e propostas de melhorias. Avaliação da gestão ambiental nos laboratórios de ensino Essa atividade se deu com 13 alunos matriculados na disciplina com duração da atividade de aproximadamente 2 meses no ano de 2018. Para tanto, a atividade tinha como objetivo avaliar como era o sistema de gestão ambiental nos laboratórios de ensino de Química da UEPG. Ao todo, foram avaliados 6 laboratórios, sendo eles: Química Geral e Inorgânica (QGI), Química Orgânica (QO), Química Analítica (QA), Bioquímica (BQ), Físico-Química (FQ) e Análise Instrumental (AI). Um dos grandes desafios para implementação de um sistema de gestão ambiental é o levantamento aspectos e impactos ambientais, bem como uma análise crítica dos mesmos. Para auxiliar nessa abordagem foi utilizado o método denominado Análise dos Modos de Falhas e seus Efeitos, FMEA (do inglês Failure Mode and Effect Analysis) adaptado.24,25 Essa metodologia tem ampla aceitação pelas organizações potencialmente poluidoras, uma vez que permite não somente fazer o levantamento dos dados mas também a aplicação de índices de criticidade e, assim, facilita a implementação das ações corretivas quando necessário. As etapas realizadas são sintetizadas na Figura 3.
Figura 3. Etapas da elaboração da Análise dos Modos de Falhas e seus Efeitos aplicada aos laboratórios de Química da UEPG
No Material Suplementar (Tabela 1S) são apresentadas todas as diretrizes utilizadas para estimar os valores para: índice de gravidade do impacto (G), índice de ocorrência da causa (O) e grau de detecção (D). O índice de risco ambiental (IRA) foi então obtido a partir da multiplicação dos valores definidos para cada um dos três índices assim, obtém-se o IRA total de cada laboratório.26 Ao final, todos os alunos da turma se reuniram e sintetizaram os resultados com a escrita de um relatório no formato de artigo para avaliar criticamente quais as ações realizadas nos laboratórios tem potencial para impactar o meio ambiente e quais as oportunidades para superá-las a partir de um plano de ação. Avaliação das propostas de ensino na disciplina de gestão ambiental Visando o levantamento do impacto que a disciplina de Gestão Ambiental promove na formação de um Bacharel em Química, foi realizada uma análise crítica a partir da avaliação dos egressos da disciplina. Para isso, foi construído um questionário pela docente da disciplina e enviado para os 30 egressos do curso, os quais cursaram a disciplina entre os anos de 2017-2020. Nesse questionário foram colocadas questões relacionadas com a opinião dos alunos sobre a importância de se aprender os conceitos da gestão ambiental empresarial. Ademais, o questionário foi formulado com questões específicas para egressos que estão inseridos atualmente em indústrias químicas ou de transformação e laboratórios de análises químicas com o objetivo de se avaliar se o conhecimento em gestão ambiental foi diferencial na sua contratação e se o mesmo atua ou atuou nessa área específica. A partir de revisão bibliográfica e da percepção da importância do tema na formação de cidadãos, especialmente bacharéis em química foi construída uma avaliação e discussão crítica da responsabilidade sociambiental do químico.
RESULTADOS E DISCUSSÃO A disciplina de gestão ambiental e correlatas Investigação nas matrizes curriculares de cursos de químicas em instituições públicas paranaenses Analisando as matrizes curriculares das insituições públicas paranaenses que ofertam o curso de Bacharelado em Química ou com atribuições tecnológicas em seus sites observou-se uma carência na existência de disciplinas, tanto de gestão ambiental como correlatas. Além do curso da UEPG que oferecia a disciplina obrigatória e a partir da entrada dos alunos no curso em 2018 como disciplina optativa, encontrou-se a disciplina de Gestão da Qualidade e Ambiental, a qual é oferecida de maneira obrigatória. Em relação às disciplinas correlatas verificou-se as seguintes discplinas: meio ambiente e sociedade, controle da poluição industrial, resíduos sólidos industriais como obrigatórias; energia e meio ambiente, reciclagem e reutilização de materiais, avaliação de ciclo de vida, áreas contaminadas, resíduos sólidos urbanos e auditoria ambiental como optativas. No caso de curso que apresenta ênfase em química e meio ambiente verificou-se ainda a presença das disciplinas de legislação aplicada a problemas ambientais e química dos resíduos. Atualmente, no curso da UEPG são ofertadas as seguintes disciplinas optativas: impactos ambientais, meio ambiente e desenvolvimento sustentável, direito ambiental, energias renováveis e gestão ambiental e sustentabilidade. É fundamental associar disciplinas, mesmo que optativas, que relacionem o desenvolvimento sustentável e que atendam os padrões atuais de produção. O aluno precisa ter essa consciência desde os anos iniciais do curso e entender quais são os impactos ambientais das atividades bem como quais são as possibilidades existentes para mitigar ou evitar danos ambientais. A partir do parecer CNE/CES 1.303/2001 e da resolução CNE/CES 8, de 11 de março de 2002 que estabelecem as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para os cursos de Bacharelado e Licenciatura em Química é esperado que o aluno do curso de Bacharelado em Química tenha conhecimentos relativos ao assessoramento, desenvolvimento e implantação de políticas ambientais além de possuir consciência da importância da sua profissional no contexto social, ou seja, que suas ações profissionais podem desenvolver a sociedade e que estas devem ser feitas com responsabilidade sociambiental.27,28 Claramente, cursos de maior aprofundamento podem realizados pelos mesmos, especialmente os cursos Lato Sensu que abordam conceitos de Gestão Ambiental. Todavia, é preciso refletir que os alunos podem seguir em diferentes caminhos, como academia, indústria, laboratórios, empresas de consultoria, entre outros. Então, trazer esses conceitos ao longo do curso permitem o aluno ampliar o seu pensamento além da química, isto é, vincular a proteção do meio ambiente com a química, independente da área que esteja inserido. A disciplina de Gestão Ambiental e Metodologia ZERI na UEPG O curso de Bacharelado em Química Tecnológica da UEPG ofereceu a disciplina até o ano de 2020 como disciplina obrigatória compondo as disciplinas que fazem parte da ênfase em Química Ambiental com carga horária de 68 h e caráter semestral. A partir de 2018 o curso passou a se chamar Bacharelado em Química Tecnológica e a disciplina de Gestão Ambiental passou a ser optativa, com carga horária de 51 h e regime semestral. Nos dois casos, a disciplina é dada no quarto ano do referido curso. O presente estudo trata da importância da disciplina de Gestão Ambiental na formação do Químico e irá apontar as experiências didáticas e avaliação dos egressos do curso quando a disciplina era obrigatória no curso (currículo 3). O principal objetivo da disciplina é proporcionar ao aluno noções básicas do Sistema da Gestão Ambiental e noções gerais da Metodologia ZERI com enfoque nas diversas organizações que um químico pode atuar. Desse modo, os principais temas abordados são: a evolução história das questões ambientais no âmbito mundial e industrial; noções das série ABNT NBR ISO 14000 - sistemas de gestão ambiental; avaliação do ciclo de vida de produtos; rotulagem ambiental (indicadores e a avaliação do desempenho ambiental). Além disso, outros temas abordados são auditoria ambiental (segundo a norma ABNT NBR ISO 19011: 2018), produção mais limpa; metodologia ZERI; e outros modelos de gestão (tais como: Ecoeficiência e EcoDesing). O sistema de avaliação utilizado em todos os anos traz sempre uma abordagem interativa com os alunos buscando colocá-los em situações próximas de situações reais nas indústrias e laboratórios de análise química em que estes poderão atuar. Ademais, a disciplina conta também, em sua programação, com visitas técnicas em indústrias químicas e de transformação certificadas com a ABNT NBR ISO 14001 na região de Ponta Grossa, PR. As visitas técnicas oportunizam ao aluno o contato com as rotinas industriais e de laboratório, agregam no desenvolvimento do senso crítico, permitem a verificação dos conceitos abordados em sala de aula na prática e ainda motivam os alunos para atuação no mercado. A série da ABNT NBR ISO 14000 merece destaque visto que os setores industriais químicos e petroquímicos vêm cada vez mais buscando a certificação pela ISO 14001 no cenário mundial e brasileiro, tal que organizações de tanto de pequeno, médio e grande porte podem e devem atuar com responsabilidade ambiental medindo o impacto que causam no ambiente e mitigando suas ações no mesmo. Sendo então imprescindível que o aluno de Bacharelado em Química Tecnológica tenha contato as noções de gestão ambiental e que possa implementar ou manter programas destinados ao desenvolvimento sustentável dentro da organização. Desenvolvimento de dinâmicas propostas na disciplina de gestão ambiental na UEPG Simulação de auditoria ambiental A atividade didática de simulação de auditoria ambiental é frequente na disciplina de Gestão Ambiental e Metodologia ZERI. Após a exposição e discussão sobre o assunto, desde o histórico das auditorias ambientais até a norma mais atual em termos de auditoria, os alunos recebem a tarefa de realizar uma auditoria. Para mimetizar um ambiente empresarial, a turma é dividida em equipes e cada um tem um papel como já destacado na metodologia. Para trabalhar com dados mais realísticos, os alunos buscam nos sites de grandes organizações nos ramos de produtos químicos diversos, farmacêutico, papel e celulose entre outras que apresentem informações públicas e claras em seus relatórios de sustentabilidade e políticas ambientais. Além disso, o aluno consegue explorar melhor o processo industrial, assunto que é dado na disciplina de Química Tecnológica e é ministrada concomitantemente a disciplina de Gestão Ambiental. Todas as entradas e saídas dos processos industriais químicos são, então, mais bem compreendidas e o aluno consegue ter a percepção de informações como consumo de água, uso de energia elétrica proveniente de fontes renováveis e possibilidades de reúso e reciclagem internas para essas atividades. O que se destaca nesse tipo de atividade é que a mimetização de uma situação real permite que o aluno fique mais motivado e tenha maior entendimento da escala industrial. Essa atividade, aliada às visitas técnicas, permite ao aluno ter de fato uma vivência tangível do que será vivido por eles quando encerrarem o curso. A Figura 4 apresenta destaques das principais habilidades e competências adquiridas pelos alunos.
Figura 4. Algumas habilidades e competências desenvolvidas com a simulação de auditoria ambiental
As habilidades de comunicação e trabalho em equipe são de grande importância para a formação de um Bacharel em Química e esta atividade promove o maior desenvolvimento das mesmas uma vez que o aluno precisa trabalhar com colegas escolhidos via sorteio e devem se comunicar entre o próprio grupo e para os demais colegas mostrando o desenvolvimento da sua função. O desenvolvimento do pensamento crítico é inerente à qualquer profissional e o que observa-se dos alunos é que eles conseguem visualizar possibilidades em termos de reúso de água, uso de energias renováveis, aproveitamento de resíduos para o desenvolvimento de novos produtos que podem ser usados na cadeia produtiva ou não. Essas habilidades são preconizadas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Bacharel em Química e podem ser contempladas em atividades e projetos que visem a aplicação dos conhecimentos de química e desenvolvimento de consciência e conceitos de gestão ambiental.27,28 A habilidade de liderança é necessária tanto para um químico que atue na indústria, laboratório químico como na academia. Essa habilidade normalmente não é contemplada de maneira clara e objetiva nas disciplinas de formação básica, justamente porque outras habilidades e conhecimentos precisam ser explorados nas mesmas. O que se observa nessa atividade que o aluno consegue de fato motivar a equipe e principalmente, inspirar os colegas para os resultados e ideias. Percebe-se, inclusive, que alunos que já tiveram experiência profissional conseguem ensinar os demais colegas e mostrar seus conhecimentos em prol do desenvolvimento da equipe. Esse tipo de treinamento é fundamental para preparar os alunos para futuras entrevistas de estágio e emprego bem como para a vida profissional, de fato. Por fim, a habilidade em destaque na atividade é a escrita, de maneira clara e objetiva, na linguagem técnica bem como organização e atualização de documentação. É inerente a qualquer curso de química a escrita de relatórios científicos e demais textos. Todavia, percebe-se que muitas vezes o aluno tem dificuldade de relacionar isso com as futuras atividades profissionais. Logo, trazer esse tipo de documentação fortalece a habilidade de escrita e ainda desperta ao aluno para as situações reais. A simulação de auditoria foi relatada por Olivares e colaboradores, onde os autores relatam uma experiência didática a respeito do Sistema de Gestão da Qualidade para Laboratório, segundo a norma NBR ISO/IEC 17025. O docente da discplina criou um ambiente fictício e o escopo era a auditoria em um laboratório de para análise de contaminantes em alimentos. Após a contextualização teórica sobre o assunto, os alunos foram divididos em grupos e os integrantes tinham suas responsabilidades atribuídas nas áreas técnicas, administrativas e de qualidade. Os alunos então realizaram uma simulação de auditoria criando na própria sala de aula um ambiente organizacional e destaca-se todos os alunos desempenharam o papel de auditor ou auditado. Em relação à percepção dos alunos, verificou-se que a atividade foi desafiadora e gerou expectiva. Ademais, a simulação de um ambiente real foi bem recebida pelos alunos e os autores reportam que esta atividade superou as expectativas e acreditam na importância da prática para a vida profissional dos alunos.29 Em relação à importância do tema, Monteiro e colaboradores apontaram o uso das auditorias ambientais compulsórias como ferramenta de avaliação do desempenho ambiental em uma indústria química situada no Sudeste do país. A partir da coleta de dados entre os anos 2011-2014, os autores verificaram que a auditoria ambiental compulsória é uma ferramenta de avaliação do desempenho ambiental que traz informações extremamente importantes sobre o desempenho ambiental da organização. Neste estudo de caso, a indústria química em questão projetava e fabricava equipamentos criogênicos. A partir dos dados de auditoria ambiental dos anos escolhidos, verificou-se que a organização conseguiu a redução no consumo de água e de energia, além da melhoria do grau de atendimento das condicionantes da licença ambiental. Assim, a auditoria ambiental possibilitou a melhora no sistema de gestão ambiental e nas conformidades legais bem como na relação com seus clientes.30 Segundo Vieira, a auditoria ambiental está se tornando uma ferramenta básica na avaliação da saúde ambiental de uma organização de qualquer porte e pode diagnosticar os riscos que podem se transformar em sérios passivos ambientais.31 Logo, a importância da auditoria ambiental é indiscutível, uma vez que as organizações estão cada vez mais preocupadas na melhoria contínua dos seus serviços e produtos mas também mostrar que apresentam a capacidade de colocar o meio ambiente como protagonista de suas ações. O aluno de química que tem conhecimento e participa de uma situação próxima da real neste tema apresentará então diferencial competitivo no mercado de trabalho. A gestão ambiental nos laboratórios de ensino de Química da UEPG Essa atividade didática teve como objetivo mobilizar os alunos para verificar os potenciais impactos ambientais das ações realizadas em laboratórios de química. Para tanto, escolheu-se realizar o estudo nos próprios laboratórios de ensino da Química uma vez que os alunos já estão familiarizados com a rotina dos mesmos e organização. Além disso, os alunos puderam ter mais contato com o gerenciamento dos resíduos gerados nas aulas experimentais e também fazer um levantamento dos principais aspectos e impactos ambientais das ações, conforme mostrado na Tabela 1.
Deve-se ressaltar que os aspectos ambientais são os elementos das atividades, produtos e serviços que interagem com o meio ambiente e que podem trazer impactos ambientais, tanto positivos ou negativos. Dentre os principais aspectos ambientais levantados, destacam-se o consumo de água, energia elétrica e gás e produção de resíduos (sólidos e líquidos) bem como as emissões atmosféricas. Os alunos apontaram quais são os impactos ambientais desses aspectos levantados e destacaram-se o comprometimento dos recursos naturais bem como possíveis danos à saúde da comunidade acadêmica e externa. Em relação ao gerenciamento dos resíduos, a UEPG atua constantemente para melhorar e aplicar o sistema de gerenciamento de resíduos químicos tal que a Central de Reagentes e Resíduos Químicos (CRRQ) é o órgão responsável por todas as etapas relacionadas aos produtos químicos, desde a sua compra até o seu destino. Então, os resíduos gerados pelos laboratórios são encaminhados para essa central. Importante evidenciar que a partir da presente atividade os alunos entenderam melhor a importância de ações como essa promovidas pela instituição para evitar a poluição e promover o desenvolvimento sustentável em suas ações que podem impactar o meio ambiente. A gestão e tratamento dos resíduos químicos é um tema de grande relevância nas instituições de ensino superior. Nesse sentido, projetos que fortalecem a consciência ambiental e gerenciam os resíduos gerados pela própria instituição são essenciais para o progresso da sustentabilidade e estas ações devem ser de conhecimento público, tanto da comunidade acadêmica como externa. Alberguini e colaboradores relataram a experiência de um programa de resíduos que foi realizado no campus de São Carlos da USP. O Laboratório de Resíduos Químicos (LRQ) implantou no ano de 1993 o Programa de Gestão e Gerenciamento de Resíduos Químicos e trouxe como relevante aplicação a associação com o ensino, isso é, permite que o aluno amplie sua conscientização do descarte adequado de resíduos químicos gerados em práticas laboratoriais e assim, contribuir para a preservação ambiental. Os autores apontam que a gestão dos resíduos no campus associada com discplinas optativas que tratam de resíduos e preservação do meio ambiente permitem que o profissional de química consiga ter tomadas de decisão mais conscientes e corroborando com a comportamento ético da vida profissional.32 Oliveira e colaboradores realizaram uma pesquisa a partir de instrumentos de diagnóstico com estudantes dos cursos de Bacharelado em Química, Química Industrial e Engenharia Química da UFRGS a partir do entendimento que processo de ensino e aprendizagem dos conceitos científicos é fundamental para a formação da consciência dos futuros profissionais da área de Química. Assim, a gestão de resíduos e a educação ambiental tornam-se fundamentais nas discussões e construção do pensamento dos alunos desde o ínicio de cursos de graduação nesta área. Pela pesquisa realizada foi constatada a necessidade de aperfeiçoamento dos conceitos que envolvem resíduos químicos. Além disso, os autores afirmam que a partir de ações, discussões e projetos sobre gestão e gerenciamento de resíduos os egressos podem ter subsídios suficientes para que sejam atuantes e responsáveis nos âmbitos social e ambiental.33 Após o levantamento dos principais aspectos e impactos ambientais dos laboratórios de química, os alunos então seguiram para a próxima etapa: uso do método Análise dos Modos de Falhas e seus Efeitos e cálculo do índice de risco ambiental (IRA), de acordo com a Figura 5.
Figura 5. IRA calculado para os laboratórios de ensino de Química da UEPG
A partir dos índices de gravidade do impacto, ocorrência da causa e grau de detecção calculou-se então o IRA para cada laboratório. Analisando o gráfico com os resultados observa-se que os laboratórios com os maiores índices de risco ambiental são: laboratório de química analítica, química orgânica e química geral e inorgânica. O destaque para o laboratório de química analítica apresentar alto índice de risco ambiental se deve pela produção de resíduos, sólidos e líquidos, provenientes de práticas como marcha analítica e titulações volumétricas. Também é um laboratório de amplo uso, não somente para os cursos de química, mas também farmácia e as engenharias de alimentos e materiais. No caso do laboratório de química orgânica o resultado do alto IRA deve-se ao consumo de água, energia elétrica, resíduos líquidos (especialmente solventes orgânicos) e emissões atmosféricas a partir de práticas como extração, destilação e síntese orgânica. Já o laboratório de química geral e inorgânica apresentou potencial risco ambiental pelo seu amplo uso, tanto pelos cursos de química, quanto por outros cursos da instituição (engenharias de materiais, cívil, computação, agronomia, entre outros), o que provoca um grande consumo de energia elétrica e consumo de água (principalmente pela prática de destilação). Em relação ao plano de ação, os alunos apontaram quais seriam as principais ações para minimizar ou até mesmo evitar o impacto ambiental que pode ser gerado. Um resumo dos planos de ação é destacado na Tabela 1. Os alunos apontaram ações como manutenção preventiva, práticas alternativas e reuso de água. Ações relativamente simples como estas podem minimizar os impactos ambientais visto que os laboratórios de química são reconhecidos por serem potenciais poluidores do meio ambiente e assim, os alunos puderam perceber que é possível promover práticas de acordo com o desenvolvimento sustentável tornando o ambiente mais seguro e ambientalmente correto. A importância de metodologias para medir falhas e impactos ambientais nas indústrias é extremamente importante. Por exemplo, Fontolan e colaboradores realizaram um estudo de caso descritivo em uma indústria de cosmético localizada no norte do Paraná. A metodologia empregada foi a FMEA para avaliar processo de produção de gluco-oligossacarídeos a partir do acompanhamento do processo produtivo e coleta de dados. A análise dos dados permitiu aos autores verificarem que as etapas do processo que possuem maior número de prioridade de risco são conversão enzimática, purificação e concentração. Além disso, os autores apontaram que treinamentos e manutenções dos equipamentos poderiam trazer melhorias no processo.34 Em relação à gestão ambiental dentro de uma instituição de ensino superior, é de extrema importância, visto que diversos resíduos são gerados, tanto químicos como biológicos, provenientes de práticas de ensino e da pesquisa além de outros resíduos como plásticos, papéis e vidros. Ações de educação ambiental devem ser priorizadas além do contínuo levantamento de dados para compor o PGRS (Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos) conforme preconizado na Política Nacional de Resíduos Sólidos de 2010. Arana e Bizarro destacaram em 2018 os desafios da gestão ambiental nas instituições de ensino superior. Para esses autores, apesar da existência do gerenciamento de resíduos na insituição paulista estudada, sugerem a necessidade de plano de logística ambiental sustentável para viabilização das propostas bem como iniciativas de educação ambiental no público envolvido.35 Araújo e colaboradores realizaram uma pesquisa exploratória-descritiva em uma instituição de ensino superior federal multicampi. Para eles, existe a necessidade de definição de uma Política Ambiental institucional para auxiliar nas questões de sustentabilidade.36 Portanto, fica evidente a importância da gestão ambiental e uma proposta de ensino que envolva os alunos conforme destacado no presente estudo na questão da gestão ambiental é extremamente importante para as ações que são realizadas na instituição, mas para formação dos alunos que estarão inseridos em atividades potencialmente poluidoras. Isto é destacado nas competências e habilidades de um Bacharel em Química contidas nas Diretrizes Curriculares Nacionais, tal que é necessário que o químico tenha conhecimento dos procedimentos para descarte de materiais e rejeitos em prol da preservação da qualidade do meio ambiente.27,28 Além disso, pode-se verificar que segundo a Resolução Normativa Nº 36, de 25 de abril de 1974 do Conselho Federal de Química umas das atribuições do profissional de química refere-se ao tratamentos prévios e complementares de produtos e resíduos, de acordo com as diferentes modalidades da profissional. No caso dos cursos com atribuições tecnológicas ou industriais, tal atribuição pode ser contemplada de acordo com as matrizes curriculares dos cursos.37 Percepções e valores: avaliação das práticas didáticas na disciplina de gestão ambiental A avaliação do impacto da disciplina foi realizada com os egressos e que cursaram a disciplina de Gestão Ambiental e Metodologia ZERI nos anos de 2017, 2018 e 2019, conforme Figura 6a-d. A primeira questão (Figura 6a) se refere à opinião dos mesmos em relação ao caráter da disciplina, uma vez que eles cursaram a disciplina quando ela se enquadrava de maneira obrigatória e atualmente essa disciplina é optativa no curso. Para a grande maioria, isto é, 94% dos egresssos que responderam o questionário, a disciplina deveria ter caráter obrigatório no curso devido à sua relevância. Além disso, para todos os respondentes ao questionário a disciplina é relevante uma vez que nenhum respondeu que consideram irrelevante e metade dos egressos já conseguiram colocar os conhecimentos aprendidos na mesma em prática, tanto na área acadêmica quanto em indústrias e laboratórios de análises químicas (Figura 6b).
Figura 6. Resultados das avaliações para os egressos sobre: (a) opinião sobre o caráter da disciplina, (b) aplicação dos conceitos na sua rotina profissional, (c) a organização dos egressos que atuam na indústria ou laboratório de análises químicas apresenta ou não algum sistema de gestão e (d) opinião sobre o conhecimento em gestão ambiental como diferencial para contratação
O gráfico apresentado em 6c apresenta o resultado da pergunta aos egressos que estão inseridos atualmente em indústrias químicas e de alimentos bem como em laboratórios se as organizações que atuam apresentam algum sistema de gestão ambiental. Do total de respondentes, 67% dos egressos inseridos nessas áreas responderam a organização que atuam apresentam algum sistema de gestão ambiental. Por fim, o gráfico apresentado em 6d mostra os resultados obtidos quando foi perguntando aos egressos se eles têm a percepção que conhecer noções de gestão ambiental foi um diferencial para sua contratação, no caso de egressos inseridos em indústrias e laboratórios. Para 67% dos entrevistados, ter conhecimento em noções de gestão ambiental foi diferencial para contratação, especialmente por conhecimentos na norma ABNT NBR ISO 14001:2015 (sistemas de gestão ambiental) e auditoria ambiental, de acordo com a norma ABNT NBR ISO 19011:2018. Com essa avaliação, é possível identificar que os conhecimentos em sistemas de gestão ambiental tiveram impacto positivo na vida dos egressos, especialmente os inseridos no meio industrial. Ademais, pela própria experiência dos egressos verifica-se que eles acreditam que a disciplina deve ser obrigatória por toda a contribuição que a mesma traz, especialmente porque as organizações atuais cada vez mais buscam inserir medidas estratégicas na diminuição dos impactos ambientais causados pelas suas atividades e serviços. E assim, estão cada vez mais alinhadas com o desenvolvimento sustentável e buscando práticas sustentáveis em seus negócios. Não há dúvidas que o químico exerce um papel fundamental em prol do desenvolvimento sustentável. Desse modo, instigar o aluno a pensar de maneira crítica sobre a relação da indústria química com o meio ambiente e quais são as perspectivas de desenvolvimento econômico aliado a preservação dos recursos naturais é fundamental para garantir o futuro da sociedade, uma vez que esta indústria é tão estratégica para o crescimento do país.38 Desse modo, oferecer disciplinas que promovam este ponto de vista é indispensável desde os anos iniciais de um curso de Bacharelado em Química, seja com atribuições tecnológicas e as mais diversas ênfases. O profissional de química deve ser capaz de atender todas as exigências do mercado de trabalho, cada vez mais globalizado, com ética e visão humanística para atender as necessidades atuais da sociedade e das futuras gerações.27,28 Já é uma realidade a mudança de filosofia das organizações caminhando para mudança dos seus processos produtivos, envolvimento e desenvolvimento da comunidade local, atividades de educação ambiental entre tantas outras ações.39 Todavia, segundo Paffarini e colaboradores, a responsabilidade socioambiental corporativa ainda não alcançou níveis razoáveis de efetividade para conciliar os sistemas de produção em uma sociedade consumista com a preservação ambiental. E assim, o químico exerce protagonismo em alinhar os interesses econômicos das organizações com o desenvolvimento sustentável.40 Cohen e colaboradores realizaram uma pesquisa investigar o impacto da responsabilidade socioambiental (RSA) na atração e retenção de jovens profissionais. Os resultados sugerem que a RSA é um quesito relevante tanto na atratividade exercida por uma empresa no recrutamento de jovens profissionais, na área de administração. Para os autores, a responsabilidade ambiental desempenha um papel relevante na atração de jovens talentos e ainda, os próprios estudantes universitários preferem empresas mais social e ambientalmente responsáveis.41 Esse pensamento é válido também para aqueles que seguem na vida acadêmica. Toda a pesquisa deve se basear em atender os anseios da sociedade. Assim, o químico terá a responsabilidade de refletir sobre todos os pontos de vista da sua pesquisa, isto é, não somente suas conquistas e desafios para àquele estudo, mas também avaliar o impacto ambiental que isso trará ao longo dos anos, especialmente em relação à toxicidade dos produtos por eles desenvolvidos e seu ciclo de vida. Tal discussão vem sendo intensificada pelo Sistema CFQ/CRQ's nos últimos anos para destacar a importância dos profissionais de química na área ambiental, tanto para monitorar, diagnosticar e propor soluções frente à problemas ambientais como para impulsionar o pensamento de que os processos químicos ambientais devem ser vistos também com a preocupação de diminuir impactos sobre o meio ambiente e sociedade.42 O químico deve ter o pensamento que a poluição é disperdício de matéria-prima e insumos e, assim, ele tem papel central na modernização de processos industriais com substituição de matérias-primas, processos e fontes energéticas.43
CONCLUSÕES A relação do químico com o meio ambiente é evidente. As ações de mudança de pensamento, do ciclo produtivo, das substituições de matérias-primas e insumos são fundamentais para o desenvolvimento sustentável da organização que estejam inseridos. Nesse contexto, ações reativas perderam espaço ao longo do tempo passando para ações estratégicas na preservação dos recursos naturais e mitigação dos impactos ambientais que possam ser causadas não somente pela produção, mas também pelo produto que pode permanecer por anos no meio ambiente. A gestão ambiental é fundamental no mundo atual e esta disciplina (ou correlatas) é a peça chave para que os futuros químicos possam contribuir para o cuidado com o planeta que vivemos. As atividades didáticas realizadas na UEPG na disciplina de gestão ambiental e metodologia ZERI favoreceram o aprimoramento de habilidades e competências essenciais para um profissional, especialmente os químicos de acordo com os resultados da avaliação dos egressos. Trazer situações próximas do real, tais como auditoria ambiental e cálculo do índice de risco ambiental, trouxeram motivação, responsabilidade e senso crítico. Finalmente, a avaliação dos egressos sobre a disciplina e sua aplicabilidade mostraram que os mesmos consideram a disciplina relevante, metade dos respondentes da pesquisa utilizaram os conceitos de forma coerente com o aceito na literatura e a maioria acredita que o conhecimento de noções de gestão ambiental foi essencial para a contratação (no caso daqueles que estão atuando em indústrias e laboratórios de pesquisa). Portanto, é imprescindível que o químico atual tenha um olhar aprofundado e crítico de suas atividades e que elas podem trazer esgotamento dos recursos naturais, bem como danos irreparáveis ao meio ambiente. Disciplinas das IES que impulsionem a responsabilidade sociambiental são então necessárias para que o bem estar dessa e das futuras gerações. Sendo assim, as propostas didáticas apresentadas podem ser utilizadas como exemplo para encorajar a discussão sobre gestão ambiental e o desenvolvimento sustentável.
MATERIAL SUPLEMENTAR Alguns dados para o cálculo do IRA utilizados neste trabalho estão disponíveis em http://quimicanova.sbq.org.br, na forma de arquivo PDF, com acesso livre.
AGRADECIMENTOS Agradeço a todos os professores e servidores do Departamento de Química, UEPG, bem como aos alunos, atuais e egressos, por sempre acreditarem na química como um pilar do desenvolvimento sustentável e por se empenharem nas atividades que os fizeram pensar além dos horizontes da química.
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