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Aprendizagem da análise por componentes principais por meio da atividade experimental problematizada (AEP) com a utilização de um aplicativo de smartphone Learning principal component analysis through problematized experimental activity (PEA) using a smartphone app |
Bruno M. M. SiqueiraI; André L. S. SilvaII; Gabriely S. FolliI; Thalles R. RosaIII; Wanderson RomãoI,IV; Maria F. F. LelisI,*; Paulo R. FilgueirasI; Paulo R. G. MouraI
I. Departamento de Química, Universidade Federal do Espírito Santo, 29075-910 Vitória - ES, Brasil Recebido em: 15/05/2023 *e-mail: mfflelis@yahoo.com.br The article aims to address the use of the theoretical-methodological teaching strategy, Problematized Experimental Activity (PEA), to introduce a method employed in chemometrics, called Principal Component Analysis, through digital images linked to a smartphone app (REDGIM®). The application of a didactic workshop occurred in the pandemic context of SARS-CoV2, in remote teaching, with students of the undergraduate course in Chemistry of a public University of Espírito Santo. The students were divided into two groups and developed solutions to a proposed problem, working with the themes: differentiation of false and true banknotes, and recognition of patterns in vegetable oils. The groups presented promising results in terms of learning in the development of their experimental methodologies and were able to have contact with analysis of chemical problems that are still little explored in the undergraduate course. INTRODUÇÃO A Atividade Experimental Problematizada (AEP) se configura como uma estratégia teórico-metodológica de ensino pautada em procedimentos experimentais, na qual se busca, a partir da definição de um problema de origem teórica, a resolução de questões por meio da experimentação.1 Partindo dessa premissa, também tem sido comprovado que a utilização de experimentos como estratégia de ensino, promovendo uma abordagem investigativa, incentiva a participação ativa e autônoma do aluno no seu próprio processo de aprendizagem.2 Nessa perspectiva, a experimentação no ensino de Química tem se mostrado como um recurso que pode auxiliar na formação e construção de conceitos, ideias e habilidades referentes as matrizes pertinentes à essa disciplina.3 Considerando esse argumento, quando o ensino experimental é orientado pela resolução de problemas, observa-se que ele envolve o enfrentamento de desafios presentes no cotidiano, estimulando o desenvolvimento de habilidades, como a criatividade, e às competências necessárias para lidar com tais situações.4 Assim sendo, essas características são potencializadas na abordagem da AEP como estratégia de planejamento. Desse modo, o problema apresentado ao utilizar a AEP, deve estimular nos alunos o interesse, motivação e a capacidade de argumentação para exporem suas ideias, propiciando a autoconfiança necessária para a resolução de problemas reais de maneira significativa.5 Sendo assim, parte-se da motivação de que o conhecimento estudado e investigado não deve ser interpretado como algo definitivo e imutável que se limita rigidamente à sua aplicação, desconsiderando outras perspectivas possíveis. Em outras palavras, é fundamental ter em mente que tanto o conteúdo abordado quanto a Ciência como um todo são caracterizados por sua natureza dinâmica e contínua, representando o oposto de uma realidade estática.6,1 Mesmo que as atividades práticas/experimentais sejam reconhecidas como métodos eficazes para o ensino, principalmente na área da Química, ainda existem professores que apresentam uma visão fechada a respeito da experimentação. Esse olhar perpassa por uma ideia básica ou sem aprofundamento, assim dizendo, de ser apenas uma comprovação da teoria sem apresentar algum estímulo investigativo de forma que faça sentido e significado.7-10 Justamente para romper com essa percepção e por acreditar que o experimento precisa objetivar a aprendizagem mais do que a transmissão do conhecimento pela prática, a experimentação apresenta a possibilidade de desenvolver o protagonismo, trabalho em equipe e uma educação mais autônoma do aluno.11 Pertinente a esse raciocínio, a estrutura da AEP foi proposta para salientar que o ensino de Ciências possa ser diferenciado, cunhada em uma articulação metodológica entre um objetivo experimental, a proposição de problemas e as diretrizes metodológicas (experimentais). Cabe deixar em destaque que a intercepção entre esses três articuladores é realizada por meio de cinco momentos: "discussão prévia"; "organização/desenvolvimento"; "retorno ao grupo de trabalho"; "socialização" e por último, "sistematização".7,12 Um dos primeiros trabalhos utilizando a AEP como estratégia teórico-metodológica para o ensino, mostra a realização de uma atividade experimental em uma formação continuada com doze professores de Ciências vinculados à rede municipal da cidade de Cruz Alta, RS. A apresentação dessa atividade, foi dada por meio da temática da determinação da densidade de metais elementares e de ligas metálicas, partindo de duas problematizações. Como conclusão, os pesquisadores puderam perceber que foi possível usar a experimentação como proposta diversificada para o ensino de Ciências, organizada em um processo investigativo e baseado na resolução de problemas.7 Visto o que foi dito, outros estudos ao decorrer dos anos também foram desenvolvidos utilizando a AEP para mediação de conteúdos científicos com diferentes públicos, desde o Ensino Fundamental, perpassando pelo Ensino Superior, como é o caso deste presente artigo, até à formação de professores.13-16 Por essa razão, torna-se essencial tratar das bases organizadoras da AEP para o ensino de Química, especialmente em relação às temáticas relevantes presentes em pesquisas acadêmicas que fazem uso constante de tecnologias. É importante ressaltar que, embora essas tecnologias desempenhem um papel fundamental, muitas vezes sua aplicação não é adequadamente refletida nos cursos de educação formal. Um exemplo desse cenário é a área da Quimiometria no Brasil, que recebe menos atenção em comparação a outros temas científicos. A Quimiometria é uma área da Química que teve o seu início a partir da década de 70, e que faz o uso de ferramentas de trabalho como Matemática, Estatística e Computação para o tratamento de dados multivariados.17-20 Frente a tantas pesquisas difundidas na literatura, um dos métodos quimiométricos utilizados com maior frequência é a Análise por Componentes Principais, do inglês, principal component analysis (PCA).21 Esse método consiste em redimensionar uma matriz de dados X em um novo sistema de eixos, denominados componentes principais, principal components (PC), com objetivo de reconhecer padrões entre as amostras e obter informações importantes (variância explicativa) a partir das variáveis iniciais, auxiliando assim na resolução de problemas químicos frente às demandas recorrentes.22-24 A PCA se caracteriza como um método de análise não supervisionado, pois não se utiliza de um histórico pré-estabelecido referente às amostras (vetores de classe).25,26 A entrada dos dados químicos para a leitura em um software, é dada por uma matriz (i × j) em que cada linha (i) corresponde a uma amostra, e cada coluna (j) equivale a uma variável.27 Nesse método ocorre a decomposição da matriz de dados X de acordo com a Equação 1: em que T, L e E, são matrizes de scores (coordenadas relacionadas com as amostras), loadings (cujos elementos indicam o quanto cada variável original contribuiu para gerar as PC, novo sistema de eixos) e resíduos (o que não conseguiu ser redimensionado), respectivamente. O símbolo T (T transposto), indica o operador da transposição da matriz L.28,24 Por esse ângulo, a matriz original X tem capacidade de ser transcrita como X = + E, onde = TALAT, em que A é a dimensão do subespaço, melhor dizendo, o número de componentes principais retidas na decomposição de X.28 As matrizes TA e LA são constituídas por A vetores-coluna, onde TA = [t1, t2 ... tA] e LA = [l1, l2 ... lA], de modo que se comporte de acordo com a Equação 2:27,29 Analisando a decomposição acima, é possível avaliar com detalhes a representação de X em A componentes principais significativas (A ≤ min {I, J}). As dimensões relacionadas com as matrizes de scores TA e de loadings LA são (I × A) e (J × A), respectivamente, sendo elas dispostas de maneira truncada. Contudo, essa redução da dimensionalidade (ou compressão dos dados), de um espaço de dimensão J para um subespaço de dimensão A, decorre devido as variações sistêmicas nos dados que estão concentradas em um número menor de novos eixos. Isso quer dizer que as últimas PC que são representadas na matriz de resíduo (E) apresentam variações de forma aleatória, como erros experimentais ou de redimensionamento.29 Mesmo a PCA sendo bastante empregada para tratamento de dados na Química, como dito anteriormente, sua inserção na área do ensino vem crescendo aos poucos em relação a suas aplicações. Adicionado a esse cenário, existe também o fato de uma certa limitação aos novos usuários dessa área, não estarem ainda familiarizados com o método, em razão da falta de conhecimento técnico. Isso pode apresentar um grau de dificuldade para compreenderem essa temática, devido à natureza complexa que abrange sua teoria.22 Nesse sentido, o uso de uma atividade experimental, de forma problematizada, como a AEP, pode ser uma estratégia que apresente eficiência para medição da PCA, pois permite que os alunos vejam a aplicação desse método de forma prática aliada às suas vivências do cotidiano, em um contexto real. Em síntese, a AEP para o ensino da PCA, possibilita que os alunos utilizem esse método em uma situação real e significativa, enquanto desenvolve habilidades práticas e criativas para análise de dados, facilitando a compreensão do assunto estudado. No âmbito da obtenção, registro e análise dos dados, houve um constante aprimoramento e estudo das tecnologias e instrumentos, com foco principal na absorção da luz e em sua propagação. Isso possibilitou a obtenção de informações complementares por meio da reflexão.30,31 Nessa conjuntura acerca de registrar informações de processos químicos por meio da reflexão da luz em reações que apresentam cor, o meio mais atrativo, e que vem chamando atenção da comunidade acadêmica para tal efeito, junto a sua ampla divulgação na sociedade, são as câmeras digitais.32 Nessa questão, as imagens formadas pela captação da luz são os parâmetros utilizados para analisar o processo de reflexão da luz e seus resultados. Desse jeito, em um dispositivo eletrônico, uma imagem digital é formada por um conjunto de unidades denominada de pixels e desse modo, cada pixel é organizado pelo conjunto de cores vermelho, red (R); verde, green (G) e azul, blue (B), dando origem ao sistema RGB, que tendo essas três cores combinadas, consiste nas outras modulações de cores.33,34 Pesquisadores usam da análise multivariada em imagens para partir do ponto de investigar as matrizes obtidas de R, G e B pelas intensidades dos respectivos canais em cada pixel. Por essa lógica, pela formação dos histogramas de cada canal (R, G e B), ocorre uma representação estatística em uma região de interesse, logo é decorrido o redimensionamento das informações de uma imagem para uma melhor visualização dos dados.33,35,36 Como consequência em relação a praticidade, rápida aquisição de dados e miniaturização de instrumentos analíticos, os smartphones estão ganhando espaço junto à aplicativos que utilizam da análise multivariada por imagens, empregando métodos quimiométricos como a PCA e a regressão por mínimos quadrados parciais (do inglês, partial least squares, PLS), para a resolução de problemas do cotidiano.37-39 No ano de 2016, foi iniciado o desenvolvimento do aplicativo chamado REDGIM® por um grupo de pesquisadores brasileiros da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), em colaboração com pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e do Instituto Federal do Espírito Santo (IFES). Esse aplicativo foi projetado para dispositivos móveis com sistema operacional Android e tem como objetivo auxiliar nas análises químicas utilizando métodos de análise multivariada de dados por imagens, como a PCA e a regressão PLS.40 O REDGIM® proporciona ao usuário a possibilidade de capturar fotos e, em seguida, realizar a análise química diretamente no mesmo dispositivo de forma simples e rápida. Essa funcionalidade permite que a análise seja realizada in loco, eliminando a necessidade de transferência de dados ou utilização de equipamentos adicionais. O crescente uso de imagens digitais e a aplicação da PCA na resolução de problemas na comunidade acadêmica têm gerado uma tendência de aumento nas publicações científicas. Isso ocorre devido à praticidade e rapidez na análise dos resultados, especialmente com a possibilidade de utilizar smartphones como ferramentas nesse processo.41 Com o advento recente dos recursos multimídias, e da popularização do uso dos aplicativos, as tecnologias móveis (celulares, tablets e afins), proporcionaram um novo protótipo educacional (mobile learning), por meio de dispositivos portáteis para atender as necessidades demandadas diante de situações emergentes.42 Nesse contexto, a pandemia do SARS-CoV-2, responsável pela Covid-19, contribuiu com o aumento significativo no uso desses dispositivos como uma tentativa de mitigar os impactos causados pelo isolamento social. Devido ao fechamento de diversos espaços físicos, incluindo escolas e universidades, as aulas foram migradas para o formato remoto, utilizando plataformas digitais.43 Por esse motivo, o uso dos espaços físicos dos laboratórios ficou comprometido, bem como a oferta das aulas práticas referentes às disciplinas experimentais. Diante do que foi apresentado, o objetivo deste trabalho foi introduzir a temática da PCA por meio de imagens digitais utilizando o aplicativo REDGIM®, no período letivo de ensino remoto, no formato de uma oficina didática, tendo a AEP como estratégia teórico-metodológica de ensino para conduzir as aulas. Essa ideia surgiu para minimizar os efeitos causados pela pandemia nas aulas práticas, para que os alunos continuassem a ter contato com experimentos e tecnologias acessíveis.
METODOLOGIA Desde 2018 a AEP está sendo aplicada em algumas disciplinas do curso de graduação em Química da Universidade Federal do Espírito Santo (Vitória, Brasil). O público-alvo para este estudo foram vinte alunos (quinze de bacharelado e cinco de licenciatura) dos cursos de Química, referente ao primeiro semestre letivo de 2021, que participaram de uma roda de conversa sobre as dificuldades da realização de aulas práticas no contexto pandêmico. Inicialmente, foi entregue aos alunos um questionário inicial (material suplementar), para o levantamento dos seus conhecimentos prévios acerca de análises químicas e Quimiometria. A partir das respostas dadas, foi elaborado o escopo do planejamento da oficina didática das atividades experimentais, nos moldes da AEP, de maneira remota, por causa do isolamento social devido a pandemia da Covid-19. Dessa forma, a aplicação da oficina demandou quatro encontros virtuais conforme o Quadro 1.
Diante disso, no primeiro momento da etapa de discussão prévia, foi apresentado o problema proposto decorrente de uma situação intrinsecamente vivenciada pelos alunos do curso de Química, naquele momento, relacionado à pandemia da Covid-19: "Como é possível utilizar recursos tecnológicos do cotidiano em análises químicas distantes do laboratório para a resolução de problemas específicos?". Na apresentação do tema, perguntas como "o que são análises químicas?", "como posso encontrá-las no espaço do cotidiano e para que servem?" foram levantadas para poder ajudar a construir uma linha de raciocínio e corrigir alguns conceitos errados que os alunos mostraram ter no questionário prévio. Em seguida, foi dialogado com alunos acerca de análises qualitativas e quantitativas e como podem ser realizadas, incluindo alguns métodos de análise por meio de instrumentos como a espectrofotometria na região do UV-Vis, por exemplo. Na etapa da organização do conhecimento, conforme proposto pela AEP, os alunos foram expostos de maneira simples à métodos alternativos de processos de análises químicas que utilizam imagens digitais por meio da Quimiometria. Essa etapa foi importante, pois foram formuladas algumas perguntas orientadoras aos alunos, as quais podem ser visualizadas no Quadro 2.
Foram abordados conceitos relacionados ao sistema RGB, bem como a leitura dessas imagens por dispositivos técnicos analíticos e suas aplicações em diferentes áreas. Além disso, foi fornecida uma visão geral sobre o tratamento dos dados obtidos por meio de métodos quimiométricos, apresentando os principais conceitos nos campos da pesquisa e a teoria subjacente à Análise por Componentes Principais. No encerramento dessa etapa, os alunos foram apresentados ao aplicativo REDGIM®, no qual foram demonstradas a utilização de seus comandos. Como forma de registro para os alunos acompanharem o manuseio do REDGIM®, os professores da oficina produziram um vídeo explicando todos os passos das análises utilizando o aplicativo pelo método de PCA e a interpretação dos dados. Com o acompanhamento dos alunos ao longo de cada encontro, lhes foram concedidos como material de suporte, artigos científicos a respeito do uso da PCA em dados obtidos por imagens digitais. Vale ressaltar que devido a não utilização do laboratório, os momentos de organização/desenvolvimento da atividade experimental e retorno ao grupo de trabalho foram realizadas nas casas dos alunos por intermédio dos mediadores, tudo por meio de encontros on-line que não foram contabilizados como aulas, além das reuniões para discutir a respeito do andamento do experimento proposto. Durante essas duas etapas, cada grupo teve um período de três semanas para elaborar as diretrizes metodológicas experimentais e realizar as práticas. Nos moldes da AEP, a oficina didática foi elaborada a partir dos três articuladores teóricos (problema proposto, objetivo experimental e diretrizes metodológicas), que foram dissolvidos e organizados ao longo das cinco etapas citadas anteriormente. Logo, juntamente com os alunos, o objetivo experimental definido da AEP foi desenvolver uma prática acessível com o uso do aplicativo REDGIM® por meio da PCA, para compreender a empregabilidade desse método quimiométrico. O experimento consistiu na utilização da análise multivariada por imagens para tratar das seguintes temáticas: (i) diferenciação de notas de banco (dinheiro) e (ii) reconhecimento de padrões entre azeite (refinado) e óleos vegetais comestíveis, de uso doméstico, adquiridos nos comércios locais e conservados sob refrigeração doméstica. Os temas escolhidos tiveram como referência alguns trabalhos relacionados à essas temáticas.22,37,44 Portanto, os alunos organizaram os procedimentos experimentais adequados ao uso do aplicativo. Salienta-se que os fatores envolvidos como: o que analisar, os aportes teóricos e os aparatos adaptados que foram utilizados para a execução dos experimentos, incluindo a livre escolha dos materiais de análise, surgiram das discussões prévias e da organização das atividades realizadas pelos alunos, tendo a mediação do professor sem o auxílio de um roteiro pré-estabelecido. Para registrar o que foi realizado na etapa de socialização, os alunos entregaram um relatório descrevendo suas atividades, juntamente com a apresentação oral dos slides que mostraram os resultados obtidos. Isso permitiu a troca de conhecimentos e uma análise coletiva dos experimentos realizados pelos grupos. Após a apresentação dos resultados pelos alunos na etapa de socialização, o encontro seguinte foi reservado para a sistematização, onde ocorreu uma síntese das discussões dos trabalhos apresentados e das temáticas estudadas, além de feedbacks por parte dos alunos. Ao final do último encontro, um questionário final (material suplementar) foi enviado aos alunos por meio da plataforma on-line, visando obter suas opiniões sobre a utilização do REDGIM®, os conteúdos abordados e a metodologia empregada (AEP) durante os encontros. Essa avaliação permitiu uma análise mais aprofundada da percepção dos alunos em relação às atividades realizadas e auxiliou na avaliação do impacto da abordagem na dinâmica dos encontros. Os dados deste trabalho foram registrados e coletados por meio dos questionários on-line, slides das apresentações, relatos de conversas e gravação de áudio durante os encontros mediados, com a permissão e consentimento dos alunos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO Para análise do conhecimento prévio que os alunos traziam, foi aplicado inicialmente um questionário com os temas que contemplavam a oficina como por exemplo, análises químicas, imagens digitais e Quimiometria. A importância da aplicação desse questionário prévio foi para o pesquisador ter uma direção no momento da problematização pertinente a cada temática e usar a experiência dos alunos para a condução da oficina. Disserta-se em um panorama que as explicações referentes aos fenômenos estudados por parte dos alunos representam conhecimentos prévios que devem ser identificados e considerados pelos professores.45 Para um melhor entendimento do processo referente a oficina e de seu desenvolvimento, a análise dos resultados referente aos questionários se encontra no material suplementar. Grupo 1: experimento utilizando cédulas de dinheiro Na etapa de socialização, o primeiro grupo apresentou os resultados obtidos a partir do experimento proposto por eles. Inicialmente foi realizado um processo de contextualização a respeito de como ocorreu o surgimento do dinheiro, partes que compõem uma cédula de dinheiro, curiosidades sobre apreensão à notas falsas em cada região do Brasil, métodos de identificação de notas falsas e como a teoria da PCA pode auxiliar ao longo das análises. Em seguida, o grupo afirmou que o objetivo do experimento foi a diferenciação entre notas falsas e verdadeiras (nos valores de 2, 10 e 50 reais (R$)) utilizando o aplicativo REDGIM®. Como materiais e acessórios utilizados para a realização do experimento, os integrantes fizeram o uso de um smartphone modelo Moto G9 Plus para a captura das imagens, uma folha de papel para contabilizar como o branco no aplicativo, quatro (4) cédulas falsas impressas a laser e quatro (4) cédulas de dinheiro autênticas nos respectivos valores citados anteriormente. Na configuração do aplicativo para o tamanho da região de interesse (do inglês, region of interest, ROI) a ser analisada, foi configurado no REDGIM® a medida 80 × 80 pixels. Os alunos fizeram um planejamento, antes de começarem as análises, em relação as condições de luminosidade para tirarem as fotos, como pode ser visto na Figura 1. Eles verificaram que as melhores condições para diminuir os interferentes e ruídos dos resultados obtidos das imagens, foram aquelas que utilizaram fonte de luz artificial associada a pouca luminosidade natural. A região da marca d'água foi a faixa de estudo das cédulas de onde se obteve as informações para o aplicativo.
A primeira análise feita pelo grupo foi das cédulas de 2 reais (R$), com variância explicativa de 35,1 e 27,4% pela PC1 (primeira componente principal) e PC2 (segunda componente principal), respectivamente, de acordo com a Tabela 1S (material suplementar). Isso significa que foi atribuído 62,5% de variância acumulada (somatório das variâncias explicativas relativo às duas componentes principais). Diante dos resultados em relação ao reconhecimento de padrões entre as cédulas, o aplicativo gerou o gráfico de scores para verificar a distribuição referente às amostras falsas e verdadeiras de acordo com a PC1 (eixo x) e PC2 (eixo y) como mostrado na Figura 2a.
Figura 2. (a) Gráfico de scores das cédulas de 2 reais (R$): grupamento A (verde) - cédulas verdadeiras e grupamento B (lilás) - cédulas falsas. (b e c) Gráficos de loadings das cédulas de 2 reais (R$): PC1 (b) e PC2 (c)
Observando o gráfico de scores, os alunos explicaram da seguinte maneira durante a etapa de socialização: "do lado do quadrante positivo (lado direito) da PC1, se encontram as amostras das cédulas verdadeiras. Em relação ao quadrante negativo (lado esquerdo) da PC1, estão as amostras das cédulas falsas agrupadas". Nesse contexto os alunos puderam comprovar a autenticidade da análise, utilizando o REDGIM®, mostrando a separação das cédulas falsificadas e verdadeiras devido ao padrão de similaridade entre elas. Com isso, pelo gráfico de scores pôde-se concluir que a PC1 foi suficiente para mostrar a distinção entre as amostras verdadeiras e falsas. Na mesma interface do aplicativo, também foi gerado os gráficos de loadings (Figuras 2b e 2c), para evidenciar qual variável teve maior influência para que as amostras ficassem mais próximas ou afastadas umas das outras, pelas perspectivas da PC1 (Figura 2b) e da PC2 (Figura 2c). Os alunos expuseram que as variáveis dos canais (G) e (B) foram as que apresentaram maior influência para que as amostras verdadeiras ficassem alocadas no quadrante positivo da PC1, e que o canal (G) foi a variável mais relevante para que as amostras não verdadeiras ficassem agrupadas no quadrante negativo da PC1. Em seguida, na mesma concepção, o grupo mostrou os resultados obtidos com as amostras relacionadas às cédulas falsas e verdadeiras de 10 reais (R$). Consoante a isso, observou-se que pela PC1 e pela PC2 foram obtidas as variâncias explicativas de 52,7 e 28,3%, respectivamente, totalizando o valor de 81% como variância acumulada, de acordo com a Tabela 2S (material suplementar). Na Figura 3a pode ser visto o agrupamento das amostras pelo gráfico de scores, no qual é possível discriminar as amostras falsas das verdadeiras. Analisando a PC1, os alunos relataram que duas amostras das cédulas falsas e todas as amostras das cédulas verdadeiras ficaram retidas no quadrante positivo, porém em uma conjectura mais apurada, a avaliação dos resultados somente pela PC1 não foi possível, fazendo assim a análise também pela PC2. Logo ao averiguar o desfecho obtido, os alunos relataram que diante à PC2 foi viável concluir a organização das amostras em grupos, onde as cédulas verdadeiras se concentraram agrupadas na parte inferior (negativa) e as cédulas falsificadas se concentraram na parte superior (positiva).
Figura 3. (a) Gráfico de scores das cédulas de 10 reais (R$): grupamento A (verde) - cédulas verdadeiras e grupamento B (lilás) - cédulas falsas. (b e c) Gráficos de loadings das cédulas de 10 reais (R$): PC1 (b) e PC2 (c)
Observando a Figura 3b, referente ao gráfico de loadings pela visão da PC1, os alunos puderam concluir que o canal da variável (G) foi o que mais interferiu para que as amostras verdadeiras ficassem alocadas no quadrante positivo, pois foi o canal de maior intensidade em relação ao canal de (B) e (R). Por outro lado, os canais de (G) e (R) tiveram uma influência maior para que as duas amostras das cédulas falsas ficassem no quadrante negativo. Em relação ao gráfico de loadings da PC2 (Figura 3c), pode-se perceber que as variáveis que mais tiveram influência para que as amostras falsas ficassem na parte superior foram as variáveis (B) e (R) e as variáveis de maior intensidade que contribuíram para que as amostras verdadeiras ficassem na parte inferior, foram os canais (G) e (R). Por último, os integrantes do grupo fizeram as análises para as cédulas de 50 reais (R$) e as informações obtidas das variâncias explicativas foram de 34,9 e 24,2%, respectivamente, para PC1 e PC2. Logo, os alunos conseguiram uma variância acumulada de 59,1% para suas análises das cédulas, como consta na Tabela 3S (material suplementar). Observando a Figura 4a, os alunos evidenciaram que ao analisar o gráfico de scores pela PC1 não seria plausível a evidência da separação dos grupos formados, pois em ambos os quadrantes havia cédulas verdadeiras e falsas.
Figura 4. (a) Gráfico de scores das cédulas de 50 reais (R$): grupamento A (verde) - cédulas verdadeiras e grupamento B (lilás) - cédulas falsas. (b e c) Gráficos de loadings das cédulas de 50 reais (R$): PC1 (b) e PC2 (c)
Em contrapartida, vendo os resultados pela PC2, os alunos explicitaram de maneira argumentativa que foi possível o agrupamento das amostras verdadeiras e falsas. Pela perspectiva da segunda componente principal, as amostras de cédulas falsas ficaram na parte superior e, na parte inferior, da mesma PC, se concentraram as amostras das cédulas verdadeiras. No gráfico de loadings da PC1 (Figura 4b), as variáveis de (R), (G) e (B) apresentaram influência proprorcional para que algumas amostras de ambos os grupos ficassem no quadrante positivo, porém, ao se averiguar as variáveis (canais (G) e (R)), os alunos notaram que elas tiveram maior influência para que uma maior quantidade das amostras dos dois grupos ficasse no quadrante negativo. De fato, isso pode ter ocorrido pela maior intensidade dos dois canais para a direção do quandrante negativo. Em vista do gráfico de loadings da PC2 (Figura 4c), os alunos relataram que o canal (B) preponderou para que as amostras falsas ficassem mais agrupadas na parte superior, enquanto os canais (G) e (R) tiveram mais influência para que as amostras das cédulas verdadeiras ficassem alocadas na parte inferior. Por todos esses resultados obtidos pelo primeiro grupo, os alunos puderam expor na prática os conhecimentos adquiridos a respeito do reconhecimento de padrões pelo método da PCA, além de trocarem informações relevantes com os integrantes do outro grupo pela experiência proporcionada pela AEP. Esse processo também salientou a possibilidade de construir significados e exercer o processo de autonomia nos alunos, como proposto na metodologia de aprendizagem.6 Outro relato que os alunos frizaram ao longo da apresentação, foi que é possível a verificação de análises utilizando tecnologias portáteis longe do ambiente de laboratório, fazendo o uso de um instrumento acessível (smartphone), na resolução de problemas do cotidiano da vivência de cada um. Grupo 2: experimento utilizando azeite refinado e óleos vegetais comestíveis Os alunos do segundo grupo apresentaram inicialmente uma breve contextualização sobre os conceitos introdutórios de Quimiometria junto a PCA. Outro ponto relevante em referência à apresentação no momento da etapa de socialização desse grupo, foi acerca de informações e curiosidades a respeito do consumo de azeite de oliva no Brasil junto com a demanda da alta procura do produto. Nesse caminho, os alunos apresentaram também em relação a justificativa da importância da análise de óleos vegetais comestíveis, justamente por causa da alta ocorrência de adulteração em azeite de oliva. Mostraram também as dificuldades enfrentadas em análises de óleos vegetais comestíveis, estudos sobre técnicas espectroscópicas para esse propósito, tais como métodos auxiliares para identificação de padrões entre as amostras utilizando a PCA com dados de infravermelho médio22 e a elaboração de um planejamento experimental para a determinação e quantificação de óleo de soja em azeite de oliva extra virgem usando um espectroscópio portátil Raman.46 Em seguida os alunos relataram o objetivo do experimento proposto por eles, ao qual se configurou no reconhecimento de padrões entre as amostras de azeite e óleos vegetais comestíveis utilizando o método de PCA com o auxílio do REDGIM®. O experimento decorreu da seguinte maneira: Foram utilizadas doze amostras (quatro de azeite; quatro de óleo de girassol e quatro de óleo de algodão). É importante ressaltar que os alunos tiveram a liberdade de escolher o material a ser analisado, incluindo os tipos de óleos vegetais comestíveis. Além disso, vale destacar que qualquer tipo de óleo vegetal comestível poderia ser utilizado, como óleo de soja, canola ou milho. Essa flexibilidade permitiu uma maior diversidade nas amostras analisadas e contribuiu para uma abordagem mais abrangente dos experimentos. Para uma melhor percepção da análise feita pelos alunos, durante a apresentação, eles mostraram um vídeo de como eles realizaram todo o processo utilizando o aplicativo. De acordo com os resultados obtidos, o grupo mostrou as porcentagens das variâncias explicativas respectivas às duas componentes principais nos valores de 37,1 e 30,5%, tendo como variância acumulada o valor de 67,6% de acordo com a Tabela 4S (material suplementar). Com isso, foi possível descrever mais de 50% dos dados, facilitando a análise dos agrupamentos das amostras de azeite, óleo de girassol e óleo de algodão. Os resultados podem ser vistos na Figura 5A, que apresenta o gráfico de scores, bem como nos gráficos de loadings (Figuras 5b e 5c), que mostram as variáveis que influenciam na distribuição das amostras.
Figura 5. (a) Gráfico de scores das amostras de azeite e óleos vegetais comestíveis: grupamento A (verde) - azeite, grupamento B (lilás) - óleo de girassol e grupamento C (laranja) - óleo de algodão. (b e c) Gráficos de loadings das amostras de azeite e óleos vegetais comestíveis: PC1 (b) e PC2 (c)
Pelo gráfico de scores (Figura 5a) apresentaram bons resultados, pois as amostras ficaram agrupadas de acordo com a sua origem. Pela PC1, é visto que ocorreu a separação em dois grupos no quadrante positivo e um grupo no quadrante negativo. Com isso, as amostras de azeite (grupo A) e as amostras de óleo de algodão (grupo C) ficaram no quadrante positivo e as amostras de óleo de girassol (grupo B) ficaram no quadrante negativo. Por outro lado, observando a análise do gráfico de scores pela visão da PC2, os integrantes do grupo mostraram que as amostras de azeite (grupo A) se localizaram na parte inferior e as amostras de óleo de algodão (grupo C) e óleo de girassol (grupo B) se localizaram na parte superior. Com relação aos gráficos de loadings (Figura 5b), notou-se que o canal (R) teve intensidade um pouco maior do que os canais (G) e (B), mesmo assim, os três canais tiveram influência para que as amostras de azeite e de óleo de algodão ficassem no quadrante positivo. Nesse mesmo sentido, o canal (B) apresentou uma intensidade um pouco maior do que os canais (G) e (R), porém as três variáveis influenciaram para que as amostras de óleo de girassol ficassem do lado negativo da PC1. Pelo olhar da PC2 no gráfico de loadings (Figura 5c), os alunos relataram que as amostras de óleo de girassol e óleo de algodão ficaram agrupadas na parte superior sob maior influência do canal (R), mas também com contribuição dos canais (G) e (B) por estarem com intensidades semelhantes. Quanto as amostras de azeite estarem alocadas na parte inferior, o grupo mostrou que praticamente teve influência também dos três canais (R), (G) e (B) por estarem com intensidades similares. Por fim, os alunos concluíram que é possível fazer o reconhecimento de padrões entre as amostras de azeite e óleos vegetais comestíveis utilizando imagens digitais por meio do REDGIM® de maneira fácil, prática e de baixo custo em relação as técnicas e métodos já estabelecidos, respondendo o problema proposto. Após a apresentação desses resultados, o grupo também levantou alguns tópicos que podem vir a serem discutidos futuramente, como a respeito da identificação dos óleos por colorimetria e a mudança de coloração das amostras quando se altera o azeite com óleo de soja, por exemplo. Isso mostra que um ensino contextualizado e com a utilização de recursos acessíveis pode ajudar na promoção do saber científico por meio da experimentação, havendo um diálogo entre os questionamentos, teoria e prática.47 Após as duas apresentações, na etapa de sistematização, os alunos entregaram os relatórios das práticas realizadas e participaram de uma roda de conversa para compartilhar suas perspectivas sobre os temas estudados, visando a síntese do conhecimento adquirido. Como etapa final da oficina, foi conduzido um momento de discussão seguido do preenchimento de um questionário final, com o objetivo de obter o feedback dos alunos em relação às aulas. A análise de algumas perguntas desse questionário final encontra-se disponível no material suplementar.
CONCLUSÕES A aplicação da Atividade Experimental Problematizada apresenta potencial para contribuir no processo de construção do conhecimento de maneira que incentiva o lado investigativo do aluno, ao ponto de o próprio discente ter o amadurecimento de valorizar cada etapa realizada incluindo seus próprios erros e não os negligenciando. A introdução dos assuntos levantados no decorrer dos encontros que foram inclusos com o cotidiano dos alunos, como futuros profissionais da área da Química, é um fator de grande valia para o seguimento das aulas, pois é algo que promove o significado do saber científico que vai sendo moldado no conjunto pela troca de informações e experiências vivenciadas por cada indivíduo. Também é evidente que o uso do aplicativo REDGIM® para a abordagem da PCA por meio de imagens digitais transcende o propósito técnico do assunto, pois se converte em uma ferramenta educacional de suporte para a solução de desafios. Isso capacita os alunos a conceberem soluções concretas por iniciativa prória, especialmente quando combinado com a AEP, que promove uma integração significativa entre a prática e a teoria. Por fim, ao analisar os resultados obtidos pelos alunos, o primeiro grupo conseguiu apresentar resultados concretos na diferenciação das notas nos diferentes valores apresentados pelo uso do método. Os alunos do segundo grupo, também foram capazes de mostrar a eficiência da metodologia desenvolvida no reconhecimento de padrões das amostras de azeite e óleos vegetais comestíveis. Portanto em ambos os casos os grupos conseguiram propor experimentos estruturados como uma forma de solucionar o problema apresentado, utilizando referências e destacando as variáveis para a interpretação dos dados, demonstrando assim a capacidade de compartilhar informações, mostrando a eficiência da AEP para o que foi proposto.
MATERIAL SUPLEMENTAR Algumas imagens, tabelas sobre as variâncias explicativas e acumuladas, as análises dos questionários inicial e final utilizados para a confecção deste trabalho estão disponíveis, para melhor compreensão, em http://quimicanova.sbq.org.br, na forma de arquivo PDF, com acesso livre.
AGRADECIMENTOS Os autores gostariam de agradecer aos alunos participantes da oficina, ao departamento e o Programa de Pós-Graduação em Química da Universidade Federal do Espírito Santo por todo suporte concedido, bem como ao CNPq e à empresa parceira Vale S.A., pelo fomento à pesquisa realizada (Programa MAI-DAI).
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